
Manh� de domingo, coral da Vener�vel Ordem Terceira do Carmo ensaiando em meio a um contraste dos tempos, frente a frente, na nave da Igreja de Nossa Senhora do Carmo, em Sabar�, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte: m�quina scanner de �ltima gera��o a um metro da imagem de S�o Sim�o Stock, esculpida entre 1779 e 1780 por Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1737-1814), cujo bicenten�rio de morte � lembrado este m�s. A cena se completa horas depois com outra joia dos altares: a escultura de S�o Jo�o da Cruz, do mesmo autor e �poca, tamb�m digitalizada em terceira dimens�o (3D) por uma equipe da Universidade Federal do Paran� (UFPR). Com o projeto Aleijadinho Digital, a obra do patrono das artes no pa�s ganha documenta��o de car�ter cient�fico, o que servir� para gerar mais conhecimento, nortear pesquisas e abastecer de informa��es a comiss�o nacional empossada na semana passada e encarregada de estudar o legado do mestre.
O trabalho patrocinado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico (CNPq), vinculado ao Minist�rio da Ci�ncia, Tecnologia e Inova��o (MCTI), come�ou em Ouro Preto, mas tem motiva��o especial em Sabar�. “Essas pe�as de cedro s�o comprovadamente de Aleijadinho, com documenta��o espec�fica, pois as demais s�o atribui��es. Ent�o, temos as duas como refer�ncia. Com a digitaliza��o, ser� poss�vel fazer compara��es, ver detalhes das m�os, conhecer o tipo de ferramenta usada, enfim, saber com exatid�o a caligrafia do artista”, explica o restaurador e professor da Fumec Antonio Fernando Santos, que acompanha o projeto e integra a comiss�o formada pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan).
H� dois anos, a equipe paranaense, coordenada pelos professores Luciano Silva e Olga Bellon, trabalhou em Congonhas, na Regi�o Central, digitalizando em 3D os 12 profetas do adro da bas�lica do Santu�rio do Senhor Bom Jesus de Matosinhos, obra de Aleijadinho do per�odo 1800-1805. A diferen�a � que tais esculturas s�o de pedra-sab�o e, em Sabar�, de madeira policromada, medindo 1,50m de altura. Antonio Fernando afirma que houve um elemento facilitador na atual empreitada: como as pesadas pe�as foram retiradas do altar para serem admiradas de perto por moradores e visitantes, durante a programa��o do bicenten�rio e Ano do Barroco, a equipe p�de trabalhar com tranquilidade e bem de perto.
Antonio Fernando ressalta que o material gerado n�o � para divulga��o da obra de Aleijadinho, que, na Igreja do Carmo de Sabar�, fez ainda a fachada em pedra-sab�o, os dois atlantes de madeira e a imagem de Santana Mestra, considerada uma das mais bonitas por especialistas e em exposi��o no Museu do Ouro, vinculado ao Instituto Brasileiro dos Museus (Ibram). “Em Sabar�, ser� poss�vel desenhar o DNA do artista”, diz o restaurador, ao lado da professora Lucienne Elias do Centro de Conserva��o e Restaura��o de Bens Culturais M�veis da Escola de Belas Artes da Universidade Federal de Minas Gerais (EBA/UFMG) e do conservador-restaurador Andr� Andrade.
“As imagens geradas pelo equipamento s�o de alt�ssima defini��o e v�o estar em arquivos disponibilizados na internet”, afirma o professor, certo de que a documenta��o digital garante “vida eterna” �s pe�as, permite a atribui��o de autoria, comparando-se pe�as com outras, e afasta as atribui��es equivocadas, como vem ocorrendo nos �ltimos anos. Esse tipo de biometria permitir� que sejam feitas associa��es com outras obras. O diretor de Patrim�nio da Vener�vel Ordem Terceira do Carmo de Sabar�, Jos� Bouzas, se mostrou satisfeito com o servi�o, pois ele ajuda a confirmar a autoria das pe�as.
TECNOLOGIA O in�cio do trabalho coincidiu com a chegada do coral para o ensaio e as m�sicas sacras deram um tom especial ao trabalho, que tem apoio do Iphan e da Organiza��o das Na��es Unidas para a Educa��o, Ci�ncia e Cultura (Unesco). A equipe estava vigilante e, a cada momento, pedia para que ningu�m tocasse nas pe�as, pois o suor e resqu�cios de gordura podem manchar a policromia. “Essas esculturas t�m elementos �nicos na arte colonial mineira. Vejam os resplendores, que, geralmente, s�o de ouro e prata, mas, nas imagem de S�o Sim�o Stock e S�o Jo�o da Cruz, s�o de madeira”, mostrou o restaurador.
"Para resumir esse projeto, podemos dizer que se trata de barroco high-tech”, contou o estudante de doutorado da UFPR Leonardo Gomes – ele trabalhou em novembro de 2012 em Congonhas e, desta vez, tem como parceiro o aluno de mestrado da mesma institui��o Fl�vio Zavan.
COMISS�O Ter�a-feira passada, quando foram lembrados os 200 anos de morte de Aleijadinho, quatro especialistas em arte colonial, hist�ria, restaura��o e investiga��o foram empossados em Ouro Preto, na Igreja de Nossa Senhora da Concei��o, onde Aleijadinho est� sepultado. Al�m de Antonio Fernando e Lucienne Elias, a dire��o do Iphan indicou para estudar a obra do mestre o promotor Marcos Paulo de Souza Miranda, coordenador das Promotorias de Justi�a de Defesa do Patrim�nio Cultural e Tur�stico de MG (CPPC/MPMG), e a professora Myriam Andrade Ribeiro Oliveira, mestre e doutora em arqueologia e hist�ria da arte, que atuar� como consultora. A equipe vai pesquisar o legado do artista e estudar as pe�as a ele atribu�das.
O rob� e os projetos
Com uso de um rob� (foto), devido � posi��o das pe�as, foi feita em 2011 a digitaliza��o em 3D dos 12 profetas esculpidos em pedra-sab�o por Aleijadinho, em Congonhas. Para os coordenadores, o processo garante seguran�a �s esculturas ao armazenar as informa��es sobre elas. Al�m disso, permite a produ��o de r�plicas de tamanhos diversos. Iniciativa da Unesco em parceria com a empresa Comau do Brasil, o servi�o foi desenvolvido pelo Imago, �rg�o da Universidade Federal do Paran�. Conforme a Unesco, foi a primeira vez no mundo que um rob� industrial pr�prio de linhas de produ��o foi usado num projeto de preserva��o de obras de arte.
