
N�o � para qualquer um a entrega. Tanto que teve ator que desistiu quando soube que n�o teria “fala”. No teatro dos sentidos, especialmente, o texto � efeito. Em quest�o est� a alma. Ontem, o Mercado Central de Belo Horizonte foi laborat�rio para esse rico experimento humano de sensa��es. Pelos m�ltiplos corredores do quadrante mais disputado das manh�s de s�bado na cidade, 12 atores abriram m�o da vis�o para explorar e dilatar a presen�a em outros sentidos.
O exerc�cio faz parte da prepara��o para o espet�culo Feliz Ano Novo, que a atriz, poeta e diretora Paula Wenke traz a Belo Horizonte de 11 a 14 de dezembro. A montagem re�ne 14 atores mineiros preparados pela encenadora carioca, que tamb�m est� no elenco. Paula, graduada em artes c�nicas pela Universidade de Bras�lia (UnB), fundou o Teatro dos Sentidos em 1997. “Onde o teatro n�o vai?” “Onde eu posso servir?” Estavam na cegueira as respostas para o dilema de rec�m-formada.
De l� para c� foram tr�s as pe�as encenadas para n�o se ver: Pluft, o fantasminha e O rapto das cebolinhas – ambas de Maria Clara Machado e para crian�as –, e Feliz Ano Novo, escrita por Paula Wenke. Nos espet�culos da poeta encenadora, a plateia � vendada. Cegos e pessoas que t�m boa vis�o, “em igualdade”, s�o provocados e levados a construir as imagens nas profundezas da percep��o. No palco, a roupagem, o acabamento visual d�o lugar aos efeitos de provoca��o pesquisados e trabalhados pelos atores. Tudo pelo realismo al�m do horizonte das hist�rias.
� a primeira vez que Paula Wenke tem um ator cego no elenco. Oscar Capucho, de 31 anos, � ator desde 2008. Formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), integra o grupo mineiro N�s Cegos. � um dos mais empolgados com o processo. “Paula explora os sentidos muito al�m das provoca��es. Ela trabalha muito as inten��es do texto. Se eu falo ‘dist�ncia’, eu preciso saber mostrar a dist�ncia na palavra”, diz. Para a diretora, Oscar � o “ninja”, o “faixa-preta” da trupe.

O mo�o de queijo na m�o ficou interessado no trabalho. Luis Henrique, de 34, professor de educa��o f�sica, ao saber do que se tratava, elogiou a a��o: “Isso vai fazer ficar mais verdadeiro. Trabalho s�rio � assim mesmo, tem que ter pesquisa. Muito bom.” Al�pio Costa, de 80, gastou o alem�o para comentar a imers�o de Rodrigo Estev�o e Flaviana L�o: “Sehr interessant”. “Muito interessante.” Frequentador ass�duo do ponto comercial, o prot�tico acha o ser humano “curioso, muito curioso. At� se faz de cego”, sorri.
Menotti Orlandi, ator, diz ter feito descoberta: “De olhos vendados, o doce de leite ganhou mais sabor. Quando voc� v�, chega a sentir o gosto antes. N�o sabia o que era e quando senti foi muito bom”, descreve. Danillo se confundiu com os sabores da melancia e do mel�o. O artista revela ainda nunca ter ouvido t�o bem os sons ao redor. Glauce, o “anjo” da vez, diz que no in�cio estava bastante preocupada em guiar o colega. “Depois foi tranquilo. Acabei sendo guiada por ele.” A atriz diz com gosto que as pessoas foram bem solid�rias no caminho.
EM CARTAZ
A estreia de Feliz Ano Novo em Belo Horizonte ocorre na quinta-feira, dia 11, no Espa�o Aberto Pierrot Lunar, na Rua Ipiranga, 137, Bairro Floresta. A pe�a fica em cartaz at� s�bado, �s 21h, e no domingo, �s 19h. Ingressos: R$ 24 (inteira) e R$ 12 (meia). Deficientes f�sicos t�m ingresso gratuito e acompanhantes pagam meia. Informa��es: (31) 3658-9743.