
Com as b�n��os de Santo Ant�nio, sob as gra�as de Santana e protegidos pelo manto de Nossa Senhora Aparecida. Ao longo da hist�ria de Minas, o “casamenteiro” celebrado no pr�ximo dia 13, a av� de Jesus e a padroeira do Brasil s�o os preferidos, entre os nomes de santos e de santas e as denomina��es da Virgem Maria, para batizar cidades, vilas, povoados, fazendas, serras, rios, ribeir�es, cachoeiras e outros acidentes geogr�ficos dos 853 munic�pios. “Analisando-se os mapas dos s�culos 18 e 19, nota-se a forte religiosidade. E, baseada na rela��o entre l�ngua, cultura e sociedade, parti da hip�tese de que, em nosso estado, o emprego de nomes religiosos estaria diretamente ligado ao processo de povoamento”, afirma a professora de l�ngua portuguesa Ana Paula Mendes Alves de Carvalho, do Instituto Federal de Educa��o, Ci�ncia e Tecnologia de Minas Gerais (IFMG) em Ouro Branco, na Regi�o Central.
O costume de dar nome de santos a lugares surgiu na segunda metade do s�culo 6, na Europa, quando igrejas particulares come�aram a ser constru�das em honra de um santo protetor, que passava, ent�o, a simboliz�-la. Tal denomina��o se estendia tamb�m �s terras de entorno. “A tradi��o encontrou terreno f�rtil aqui, com a chegada dos bandeirantes. Tanto a tend�ncia contempor�nea quanto a hist�rica privilegiam os nomes de santos”, afirma Ana Paula. Um dos dados importantes do trabalho se refere � “regionaliza��o” dos padroeiros, como ocorre com S�o Geraldo.
Na sexta-feira, a professora visitou a Igreja de S�o Jos�, no Centro da capital, e falou sobre as pesquisas desenvolvidas durante quatro anos para a tese de doutorado Hagiotopon�mia em Minas Gerais, defendida recentemente na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). “Sou de Barra Longa, na Zona da Mata, chamada nos prim�rdios S�o Jos� da Barra Longa. Curiosamente, o nome n�o se deve ao pai adotivo de Jesus, mas sim em homenagem a dom Jos� IV, rei de Portugal”, conta ela, que decidiu, ao concluir o mestrado em 2008, mergulhar nesse universo fascinante e revelador. S�o Jos� � o segundo nas denomina��es, sendo encontrado em 472 “acidentes” f�sicos (rios, ribeir�es, morros) e humanos (vilas, cidades, fazendas e demais espa�os constru�dos pelo homem).
Para chegar aos resultados, foram estudados 5.649 hagiotop�nimos (nomes de lugares com refer�ncia a santos e santas cat�licos), sendo 3.801 dedicados aos masculinos, 1.658 aos femininos e 190 a Nossa Senhora. “Santo Ant�nio, o campe�o, com 565 denomina��es, predomina em Minas certamente por ser um santo portugu�s. E a tradi��o se manteve com as gera��es que sucederam os colonizadores pioneiros”, afirma a professora. Ela dever� lan�ar, em breve, um gloss�rio com os hagiotop�nimos identificados.
Depois de Santo Ant�nio e S�o Jos�, ca�ram nas gra�as S�o Jo�o, S�o Domingos, S�o Sebasti�o, S�o Francisco e S�o Miguel (ver o quadro). Apesar de n�o aparecerem nos levantamentos hist�ricos, S�o Pedro, S�o Bento, S�o Geraldo, S�o Louren�o, S�o Joaquim e S�o Vicente s�o muito recorrentes nos dados contempor�neos, figurando em todas ou, em pelo menos 11 das 12 regi�es estudadas.

M�E E FILHA Entre as santas, a primeira (277 denomina��es) � a m�e de Maria e av� de Cristo, e, nesse caso, Ana Paula encontrou diversas grafias: Santana, Santa Ana, Sant’Anna, Sant’Ana, Santa Aninha e Santaninha, muitas vezes acompanhada da palavra “mestra”, j� que a imagem traz Ana com um livro nas m�os ensinando a Maria a ler. “Santana � tamb�m protetora dos mineradores, s�mbolo dos professores”, ressalta. Na sequ�ncia, est�o Santa Rita, Santa Rosa, Santa Luzia, com a varia��o de Santa L�cia, por ser de origem italiana, Santa Clara e Santa Terezinha.
Especificamente sobre Nossa Senhora, encontrada tamb�m nas formas de Madre e Virgem da Lapa, foram localizados 190 nomes. “Nesse caso, chamei os hagiotop�nimos de mariotop�nimos (invoca��o a Maria) e as prefer�ncias, que s�o mais recentes, se referem a Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora das Gra�as e Nossa Senhora de F�tima, revela a professora, explicando que houve uma redu��o nos nomes, a partir de 1943, com a retirada do “Nossa Senhora” dos nomes das localidades.
“O decreto nº 5.901/43 recomendou a n�o ado��o de top�nimos (nome pr�prio de lugar) compostos com mais de duas palavras. Assim, Carmo do Cajuru, Concei��o dos Ouros e Dores do Indai� foram, anteriormente, chamados de Nossa Senhora do Carmo do Cajuru, Nossa Senhora da Concei��o dos Ouros e Nossa Senhora das Dores do Indai�”, explica Ana Paula. Das 110 denomina��es de munic�pios dedicadas a Nossa Senhora e existentes antes do decreto, restaram apenas cinco: Madre de Deus de Minas, Senhora de Oliveira, Senhora do Porto, Senhora dos Rem�dios e Virgem da Lapa.
Busca por prote��o Uma leitura importante que se faz da tese de doutorado � a regionaliza��o ou distribui��o geogr�fica dos hagiotop�nimos nas regi�es de Minas. A maior presen�a de hagiotop�nimos foi registrada na Zona da Mata, no Vale do Mucuri, no Vale do Rio Doce e no Sul/Sudoeste. “Essa �ltima se destaca por ser a regi�o por onde entraram os bandeirantes em busca de ouro e pedras preciosas na �poca do povoamento. As tr�s primeiras, de povamento mais tardio, se caracterizam por solos f�rteis, que serviram a plantios diversos e, consequentemente, ao abastecimento da capitania”, explica a pesquisadora.
Essas regi�es fazem fronteira com outros estados e eram marcadas, na �poca de sua ocupa��o, pela presen�a ainda abundante da mata atl�ntica. “Creditamos o significativo n�mero de ocorr�ncias hagiotopon�micas nessa regi�o a um fato relevante. Ao se aventurar floresta adentro em busca de novas terras, o homem, frente ao desconhecido, pedia prote��o a Deus por meio da invoca��o dos santos e santas de sua devo��o”, explica.
Geralmente, os hagiotop�nimos decorriam de louvor aos santos de devo��o ou simplesmente por ser o dia em que os bandeirantes chegavam a um lugar. Na pesquisa, Ana Paula trabalhou com santos reconhecidos pela Igreja Cat�lica, embora tenha encontrado alguns n�o constantes da lista oficial do Vaticano, entre eles, as santas Em�lia, Delfina, Helo�sa e M�rcia e Santo J�lio. “Podem ser nomes de parentes dos donos das terras, mas encontrei at� uma Nossa Senhora da Gula em uma fazenda”, revela.
HOMENAGEM NAS FAZENDAS O n�mero de fazendas com nomes religiosos aparece com destaque na tese de doutorado Hagiotopon�mia em Minas Gerais, de Ana Paula Mendes Alves de Carvalho, sob orienta��o da professora da UFMG e coordenadora do Atlas Topon�mico do Estado de Minas Gerais (Atemig) Maria C�ndida Trindade Costa de Seabra. “Em rela��o aos mariotop�nimos (invoca��o � Virgem Maria), s�o 151 ocorr�ncias . Assim, podemos levantar a hip�tese de que os nomes de propriedade rurais passam pelo crivo da subjetividade, diferentemente da nomenclatura de munic�pios, que, al�m de serem regidos por legisla��o topon�mica, dependem da aprova��o da comunidade”, diz Ana Paula. As fazendas s�o preferencialmente designadas por hagiotop�nimos femininos. Entre eles, a maioria se refere a nomes de santas n�o reconhecidas oficialmente pela Igreja. Essa ocorr�ncia, segundo dados da pesquisa, poderia ser explicada pela escolha de nomes para homenagear esposas, m�es, filhas e av�s dos propriet�rios.
ESTADO DE F�
» 106 munic�pios mineiros t�m nome de santos, com destaque para Zona da Mata, vales do Mucuri e do Rio Doce e regi�es Sul e Sudoeste
» Dos 5.649 lugares batizados com nomes de santos e santas da tradi��o cat�lica (hagiotop�nimos) pesquisados, 3.801 foram batizados com nomes de santos, 1.658, de santas, e 190 em homenagem a Nossa Senhora
» Santo Ant�nio � o campe�o no estado, com 565 munic�pios, vilas, fazendas, rios, ribeir�es e outros lugares batizados em sua homenagem. Na sequ�ncia, v�m S�o Jos� (472), S�o Jo�o (363), S�o Domingos (195), S�o Sebasti�o (181), S�o Francisco (162) e S�o Miguel (94)
» Santana � a mais recorrente entre as santas (277), seguida de Santa Rita (194), Santa Luzia (104), Santa Clara (93), Santa Helena (84) e Santa Terezinha (31)
» Nas denomina��es de Nossa Senhora, as prefer�ncias s�o por Nossa Senhora Aparecida, Nossa Senhora das Gra�as e Nossa Senhora de F�tima
» Nos acidentes geogr�ficos, os c�rregos figuram como os que mais receberam denomina��es hagiotopon�micas, representando 59,4% dos nomes de santos, 66% dos nomes de santas e 42% dos mariotop�nimos