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Estado de Minas

Pesquisa feita em BH revela que quanto mais nova a crian�a, maior a viol�ncia dom�stica

Pesquisadora passa seis meses debru�ada em prontu�rios do HPS Jo�o XXIII colhendo relatos de viol�ncia dom�stica. Meninos s�o as principais v�timas e respondem por 70% dos casos


postado em 13/07/2015 06:00 / atualizado em 13/07/2015 08:55

Para a pesquisadora e assistente social Fernanda Flaviana, a agressão contra menores ainda é vista como um método educativo (foto: Cristina Horta/EM/D.A PRESS)
Para a pesquisadora e assistente social Fernanda Flaviana, a agress�o contra menores ainda � vista como um m�todo educativo (foto: Cristina Horta/EM/D.A PRESS)
Crian�as com idades entre 0 e 6 anos s�o as principais v�timas de viol�ncia dom�stica atendidas no Hospital de Pronto-Socorro Jo�o XXIII (HPS), em Belo Horizonte. Elas representam 36,7% de um total de 1.152 casos de viola��o dos direitos das crian�as e adolescentes, registrados em um per�odo de seis meses pela unidade hospitalar, que � refer�ncia em atendimento de urg�ncia em Minas Gerais. Os dados s�o de uma tese de doutorado em psicologia, da assistente social Fernanda Flaviana de Souza Martins, que resultaram no livro “An�lise Institucional na Sa�de – O Impacto da Viol�ncia Intrafamiliar nas Crian�as e Adolescentes”, lan�ado quinta-feira. A obra relata v�rias hist�rias de viol�ncia f�sica e psicol�gica contra menores, realidade que, segundo a autora do trabalho cient�fico, pouco mudou nos 25 anos do Estatuto da Crian�a e do Adolescente (ECA), comemorados hoje. “Uma coisa que me preocupa muito � que, passados 25 anos do ECA, a viol�ncia continua presente na sociedade e subnotificada. Nem todos os casos s�o registrados, nem pelo campo da educa��o, nem pela sociedade. As pessoas ainda t�m medo de retalia��es”, conclui a pesquisadora.


O levantamento mostra ainda que os meninos s�o os  mais s�o agredidos (70,9%). As meninas representam 29% dos atendimentos. Para Fernanda, os garotos s�o menos d�ceis que as meninas e est�o mais sujeitos � agress�o f�sica.
Foram quatro anos de estudos aprofundados em viol�ncia e an�lise institucional, dos quais Fernanda passou seis meses mergulhada em 1,7 mil prontu�rios do HPS. Ela pesquisou hist�rico de v�timas com idade at� 18 anos. Paralelamente, Fernanda entrevistou m�dicos, psic�logos, assistentes sociais e parentes de menores v�timas de viol�ncia internados no Centro de Tratamento Intensivo (CTI). “O hospital me solicitou uma investiga��o, pois muitos casos deram entrada como acidentes dom�sticos. Havia uma viol�ncia oculta”, disse a pesquisadora. “Pude confirmar nesse estudo que a viol�ncia � realmente uma quest�o de sa�de p�blica. N�o tem impacto somente na vida da crian�a e do adolescente, mas tamb�m tem um custo social, econ�mico e cultural na sociedade”, refor�a.


Para a pesquisadora, a agress�o f�sica contra menores ainda � vista como uma f�rmula de educa��o, sendo diversas vezes naturalizada e banalizada. “Os pais se acham no direito de bater nos filhos, embora existam leis proibindo” comenta. Quando esse espa�o privado da viol�ncia se torna p�blico, segundo ela, � preciso uma interven��o por parte das autoridades e da sociedade. “Parentes e vizinhos das v�timas t�m a obriga��o de relatar �s autoridades pelo disque-den�ncia 100. A liga��o � sigilosa”, orienta.



Dos 1,7 mil prontu�rios analisados, 10,2% foram por agress�o f�sica. Os acidentes dom�sticos correspondem a 14,3%, mas muitos dos relatos de pais e respons�veis s�o para encobrir agress�es f�sicas. As quedas foram 20,5% dos casos e, ingest�o de corpos estranhos, 7,6%. “H� muita viol�ncia oculta em quedas e queimaduras. Houve o caso de uma menina de 14 anos que deu entrada no hospital com o corpo queimado por acidente. Depois, o pai da menina confirmou ao servi�o social que a sua mulher havia jogado �lcool na filha e ateado fogo”, relata a pesquisadora. Em outra ocorr�ncia, envolvendo um menino de 5 anos, que teve o bra�o quebrado, a av�, ao ser entrevistada pela assistente social do HPS, desmentiu a filha que alegava acidente dom�stico e a denunciou por agress�o. O menino j� havia sido internado anteriormente com queimaduras e a av� relatou outra a��o violenta da filha. “Casos de reincid�ncia precisam ser olhados com muito cuidado”, disse Fernanda.
O HPS recebe v�timas de todo estado, mas a maioria (43%) � de BH. Outras 32,6% s�o da Grande BH, com destaque para Ribeir�o das Neves (5,9%), Contagem (5%), Sabar� e Santa Luzia (4,2%). Os bairros da capital com maiores incid�ncias de viol�ncia dom�stica contra menores s�o o Taquaril, Independ�ncia e Vera Cruz. “� v�lido ressaltar que a viol�ncia dom�stica n�o tem classe social. � cometida em todas elas”, concluiu Fernanda.

Psicol�gico


As tentativas de autoexterm�nio s�o muito presentes entre os jovens, observou a pesquisadora, muitos com indicadores de depress�o. “S�o muitas meninas que tomam rem�dios, muitas vezes por sofrerem viol�ncia psicol�gica ou sexual dentro de casa”, alerta Fernanda. H� casos de meninas de 8 anos que tentaram se matar, segundo ela. “A marca f�sica � superada de uma certa forma, mas as consequ�ncias de ordem psicol�gica e social perpetuam por muitos anos na vida de uma pessoa”, alerta.

Um caso de viol�ncia contra rec�m-nascidos, muito comum e que muitas vezes n�o deixa marcas, � a S�ndrome do Beb� Sacudido. Em momentos de descontrole, adultos, principalmente os pais, agitam fortemente a crian�a e isso pode causar danos ao c�rebro do beb�, com risco, inclusive, de ficar em estado vegetativo, segundo a pesquisadora.
Outro problema detectado no HPS � um transtorno mental conhecido por S�ndrome de M�nchausen por procura��o, que � uma modalidade de abuso infantil em que um dos pais ou respons�vel, em geral a m�e, falsificam sintomas ou sinais na crian�a para consider�-la doente. “�s vezes, eles d�o rem�dios pesados � crian�a e causam sequelas que podem levar � morte”, relata. Uma m�e levou o filho ao hospital e foi descoberto que ela j� havia causado a morte de um outro por causa da S�ndrome de M�nchausen, conta a pesquisadora. Em outra ocorr�ncia, um beb� de sete meses deu entrada no HPS com queimaduras profundas no pulso, causadas por �leo quente e tamb�m traumatismo craniano. A fam�lia entrou em contradi��o na hora de relatar o que havia acontecido e os m�dicos conclu�ram que a crian�a havia sido agredida.

M�es cometem maior parte das agress�es


As m�es aparecem como as principais respons�veis pela viola��o dos direitos das crian�as atendidas no HPS, segundo Fernanda Martins. Em muitos casos, elas t�m problemas de alcoolismo ou est�o desempregadas. “H� uma vincula��o patol�gica. S�o fam�lias que trazem um hist�rico de viol�ncia intergeracional”, refor�a a assistente social, que pesquisou casos de viol�ncia contra crian�as e adolescentes registrados no  Hospital de Pronto-Socorro Jo�o XXIII (HPS), em Belo Horizonte.

Os anos de vig�ncia do ECA, segundo Fernanda, n�o foram suficientes para romper com a viol�ncia que est� enraizada culturalmente na sociedade. At� hoje, afirma , h� uma viol�ncia aceita, naturalizada e banalizada. “A cada 10 minutos, uma crian�a � v�tima de viol�ncia no Brasil. O que me surpreende muito � que esse n�mero est� crescendo”, lamenta a pesquisadora, ao citar o levantamento das den�ncias de maus tratos contra crian�as no ano passado, divulgado pela Secretaria Nacional de Direitos Humanos do Governo Federal. Mais de 150 mil den�ncias foram feitas em 2014 ao Disque 100.

A conclus�o da pesquisadora � que as crian�as precisam ter um lugar central nas pol�ticas p�blicas, o que significa, segundo ela, acesso � educa��o formal, principalmente � infantil. Ela tamb�m defende uma pol�tica de fortalecimento de v�nculos familiares e cita como exemplo os Centros de Refer�ncia de Assist�ncia Social (Cras), que trabalham com a preven��o.

Passados 25 anos do ECA, suas regras n�o sa�ram totalmente do papel, segundo Fernanda. Ela lembra que nesse per�odo surgiram duas leis importantes, a da palmada (Lei 13.010/2014), que diz que qualquer agress�o contra a crian�a e adolescente � crime e a Lei da Ado��o (12.012/2010). “A ado��o � a �ltima alternativa. A crian�a tem o direito de conviver com a sua fam�lia biol�gica. Em muitos casos de viol�ncia, a crian�a � levada � institucionaliza��o. S�o retiradas de seus pais e encaminhadas ao acolhimento, quando deveriam fazer um trabalho social com as fam�lias para desenvolvimento de v�nculos e afetos”, defende a especialista.


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