
A origem de tudo foi uma m�quina de costura de m�o, daquelas de ferro, adquirida h� mais de 30 anos. Comprou uma, duas, consertava, limpava, at� que tomou gosto. Passou, ent�o, para os lustres, ferramentas, r�dios e, aos poucos, para outros objetos, garimpados em lojinhas e casas no interior, em brech�s e at� mesmo na Rua Itapecerica, na Lagoinha, tradicional reduto de com�rcio do tipo topa-tudo e de antiqu�rios de Belo Horizonte – "um para�so".
Com a censura nem tanto velada da mulher, Rosemeire, e dos filhos Rafael, de 29, Bruno, de 27, e Leandro, de 23, Elio, muitas vezes, escondia seus achados por alguns dias dentro do carro e, aos poucos, ia levando para a casa, um apartamento no mesmo bairro da loja. “Imagina tudo isso dentro de um apartamento... Era s� chegar em casa com alguma coisa que a briga recome�ava.”

Um r�pido olhar pelo antiqu�rio de Elio Juli�o �, como n�o poderia deixar de ser, uma volta ao tempo. �s m�quinas e lustres do in�cio se juntaram ferros a carv�o, bules, rel�gios, pe�as de porcelana, cristal e prata, ventiladores, rel�gios de ponto, panelas, enceradeiras, liquidificadores, r�dios, candeias usadas antigamente na ilumina��o e at� um pente de ferro que era aquecido em brasas para alisar cabelos crespos.
Uma infinidade de coisas de encher os olhos de consumidores �vidos por coisas “sem utilidade”, como gostava de dizer a fam�lia de Juli�o, mas que t�m sempre um lugar reservado na decora��o de uma casa, de um restaurante, um jardim, enfim, de um cantinho charmoso de qualquer ambiente. “Sei que s�o pe�as n�o assinadas, mas de grande valor.”
HERAN�A Perguntado se existe algo na loja que ele n�o pretende se desfazer “de jeito nenhum”, Elio diz sem titubear: as coisas herdadas do pai, Jo�o Marques de Souza, ferreiro da Central do Brasil, falecido h� 26 anos, aos 89. S�o ferramentas feitas por ele, o aparelho de barbear e uma m�quina fotogr�fica Yashica, “totalmente manual”, comprada por seu Jo�o nos anos 1960. Elio tem planos ainda de trazer de Sete Lagoas a placa da rua e o n�mero da casa dos pais em Sete Lagoas, que ser� vendida. “Uma das casas mais antigas do lugar, ainda de adobe”, conta. Sua liga��o com os pais � t�o grande que o pr�prio nome da loja, Juli�o Antiqu�rio, � uma esp�cie de homenagem a eles – J, de Jo�o, e o A, de Ana, sua m�e, tamb�m falecida.

CHURCHILL Elio conta que praticamente tudo que tem na loja est� catalogado. Mostra, por�m, um objeto que n�o conseguiu ainda descobrir do que se trata: um quadro de ferro com o rosto de um homem talhado. “Ser� Churchill?”, pergunta, referindo-se ao primeiro-ministro brit�nico Winston Churchill, que ficou na hist�ria por sua atua��o durante a Segunda Guerra Mundial. O objeto, sa�do sabe-se l� de onde, d� uma pista do que um acumulador considera um achado, enquanto pessoas ditas comuns n�o dariam o seu devido valor.
E como neg�cio? Transformar o v�cio em um antiqu�rio valeu a pena, ou � apenas uma forma de manter por perto os objetos acumulados por mais de 35 anos? Elio Juli�o explica que o primeiro ano foi muito bom. Todos que entravam acabavam levando uma pe�a – os pre�os variam muito. H� chaleiras de ferro por R$ 65, mas, tamb�m, objetos que custam R$ 720, como as lumin�rias estilo anos 20, e R$ 1,2 mil, como um baleiro de tr�s andares. “Se gostavam, levavam sem pensar. Hoje � diferente. Com a crise, principalmente depois da Copa do Mundo, as pessoas parecem ter medo de comprar. Preferem pensar antes.” Para ele – um “achismo”, como diz –, s�o raros os pa�ses que depois de Copas do Mundo escaparam ilesos, sem crise.
Mesmo assim, ele diz que o que ganha d� para pagar as despesas da loja. E se declara muito satisfeito. No trabalho, al�m de ocupar o tempo, ocioso depois da aposentadoria, tem feito amigos. As pessoas parecem gostar do ambiente e, assim como ele, t�m uma hist�ria para contar a respeito de alguns objetos. “� tamb�m uma oportunidade de passar um pouco da hist�ria para as pessoas mais jovens”, diz Elio, mostrando sua �ltima aquisi��o: uma carteira escolar de madeira com a palavra Brasil gravada nos p�s de ferro e com lugar para a caneta e o tinteiro, comprada de um brech� promovido por um criador de c�es para ajudar a bancar o canil. “Pena que cheguei tarde”, lamenta Juli�o.
Um par�ntese
Recorrer � internet em busca de uma defini��o melhor sobre o tema central de uma reportagem � quase um caminho natural. Neste caso, um par�ntese merece ser aberto diante das surpresas sobre o significado de “acumulador”, termo que deu origem a esta reportagem. O Dicion�rio On-line revelou-se uma surpresa como primeira defini��o: aparelho el�trico que acumula energia sob a forma qu�mica, para restitu�-la em forma de corrente. Logo abaixo, o Dicion�rio Informal d� a seguinte resposta, mais surpreendente ainda: “Vixe!!! (sic). Acumulador ainda n�o possui nenhuma defini��o”. A� aparece o Michaelis, que, enfim, d� uma defini��o mais pr�xima. Al�m do tal aparelho, esse dicion�rio informa o seguinte: “Que acumula ou amontoa v�rias coisas, ajuntador, coletor”. Mais adiante, no entanto, um site de psiquiatria tocou no ponto certo: “Transtorno com fort�ssima repercuss�o comportamental e cognitiva caracterizada por recolhimento excessivo de coisas e incapacidade de descart�-las”. Por coisas, entenda-se o que a maioria das pessoas chama de quinquilharias. Fecha par�ntese.