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Estado de Minas

EM passa um dia em povoado isolado ap�s trag�dia em Mariana

Com aten��es voltadas para Valadares, reportagem do EM fica 24 horas em segunda comunidade mais afetada por desastre e mostra que popula��o vaga entre escombros sem ajuda de bombeiros ou Defesa Civil


postado em 13/11/2015 06:00 / atualizado em 13/11/2015 11:24

A família de Maria de Oliveira resiste à luz de lamparinas em uma das poucas casas que restaram na comunidade semiabandonada: 'Daqui, só saio morta'(foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
A fam�lia de Maria de Oliveira resiste � luz de lamparinas em uma das poucas casas que restaram na comunidade semiabandonada: 'Daqui, s� saio morta' (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
Paracatu de Baixo (Mariana) – No dia em que a zona quente da crise deflagrada pelo rompimento de barragens da Samarco foi transferida para Governador Valadares, que teve visita presidencial, an�ncio de multa de R$ 250 milh�es para a mineradora, batalha por �gua e protestos na linha da ferrovia Vit�ria a Minas, a situa��o em um dos povoados mais atingidos em Mariana denuncia o abandono de moradores afetados pelos primeiros impactos da onda de lama liberada pela trag�dia. Durante um dia e uma noite, a equipe do Estado de Minas testemunhou a situa��o da comunidade de Paracatu de Baixo, onde, em vez de bombeiros e agentes da Defesa Civil, moradores se arriscam sozinhos em constru��es condenadas e improvisam passarelas atirando peda�os de pau sobre uma camada de lama e min�rio que varia da altura dos joelhos � do queixo de um adulto.

Sem ningu�m para avaliar a solidez das casas, 80% delas destru�das pela avalanche, entram nas moradias trincadas e at� sem partes das paredes para resgatar m�veis, objetos de valor, utens�lios dom�sticos, documentos e recorda��es de fam�lia que foram poupados da onda de rejeitos. Enquanto um vasto n�mero de equipes atua em Bento Rodrigues, o povoado de Mariana que foi mais destru�do pela avalanche de rejeitos, no dia 5, Paracatu de Baixo, a segunda comunidade mais afetada do munic�pio da Regi�o Central, s� conta com o apoio dos pr�prios habitantes, que n�o aceitaram uma remo��o para Mariana, nas buscas pelo que sobrou do desastre.

Do total de uma centena de casas, restaram intactas duas dezenas. E � dessas habita��es no alto da comunidade, com a luz fraca do fim da madrugada ofuscando a ilumina��o de postes, que surgem os primeiros a despertar em Paracatu de Baixo. S�o os vaqueiros, trazendo cordas, baldes de alum�nio e banquinhos nas m�os. Os melhores pastos, que ficavam nas v�rzeas do Rio Gualaxo do Norte, foram varridos pela lama que seguiu pela calha do curso d’�gua e obrigou que tocassem o gado para os morros. Em um desses altos � que Livaldo Marcelino, de 37 anos, improvisou um curral para tirar leite de sete vacas. “Foi uma corrida desesperada, com a lama subindo depressa atr�s da gente – e eu ainda tenho um joelho quebrado. Por causa desse aperto todo, as vacas est�o estressadas, arredias. Como n�o deu tempo de apartar todos os bezerros, eles est�o mamando � vontade. S� consigo tirar metade dos 40 litros que conseguia antes”, lamenta o vaqueiro.

Durante o dia, o movimento no distrito � intenso. O ru�do dos tratores e caminh�es de suc��o de prestadoras de servi�o da Samarco ecoa pelos quarteir�es ainda tomados por lama e �gua barrenta, enquanto tentam desimpedir a avenida principal. Fileiras de desabrigados passam se espremendo pelas trilhas �ngremes batidas de gado nas colinas que beiram a lama ou dentro do pr�prio terreno movedi�o. “Minha casa ficava no meio do lote e as dos meus filhos, em volta. Est�o todas debaixo do min�rio. Estamos dormindo em Mariana e de dia a gente vai e volta uma 20 vezes, para carregar o que pode ser salvo. Como sou da folia de reis, estou mais preocupado com os nossos instrumentos. Por enquanto s� salvei uma sanfona e uma bandeira”, conta o lavrador Jos� Patroc�nio de Oliveira, de 85.

As cercas de arame das propriedades se tornaram varais para secar roupas, equipamentos eletr�nicos, el�tricos e at� uma b�blia. No amontoado que foi arrancado das casas e misturado pelo lama�al se encontra de tudo: camas, geladeiras, televisores, bonecas, bicicletas, roupas, cosm�ticos, tacos de sinuca e livros. Engradados de cerveja entupidos de barro s�o empilhados perto das portas dos cinco bares que funcionavam no povoado, agora arrasados, antes famosos por fritar os melhores past�is da regi�o.

Os lavradores Jos� Horta, de 50, e Raimundo Gon�alves, de 48, enfrentaram as rachaduras nas casas para recuperar pelo menos suas ferramentas de trabalho. Mas, mesmo quando conseguiram vencer a lama, improvisando passarelas com peda�os de pau, a decep��o foi grande. “Desenterrei a motosserra e a moto. Mas nenhuma das duas funciona mais. Estou sem saber como fazer, porque eram meu ganha p�o. Como vou conseguir servi�o e ter dinheiro para minha fam�lia comer?”, indagava Jos� Horta.

Mensurar danos da lama a estruturas ainda é desafio para moradores, que denunciam falta de suporte (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)
Mensurar danos da lama a estruturas ainda � desafio para moradores, que denunciam falta de suporte (foto: Sidney Lopes/EM/D.A Press)

MATILHAS FAMINTAS
�s 19h, as m�quinas da Samarco se silenciam e as vans levam para Mariana os trabalhadores e a maioria dos moradores de Paracatu de Baixo. A escurid�o acentua a sensa��o de deserto em ruas e casas vazias. Logo os uivos de c�es abandonados ecoam de todas as partes. Bandos desses animais famintos perambulam entre as ru�nas sobre o lama�al. Qualquer um que porventura trombe com a matilha � logo cercado e farejado pelos animais de rabos inquietos, sedentos por aten��o.

Luzes de lamparinas e velas avistadas por entre as casas mais altas levam � dona de casa Maria de Oliveira, de 76, que vagava pela vizinhan�a com filhos e parentes procurando os poucos que, como ela, resistem. “Daqui, s� saio morta. No dia da lama, quando me levaram para Mariana, passei a noite sem dormir, sem comer, s� esperando a manh� para voltar. Comprei querosene e velas para ter luz, trouxe �gua e comida (doados). Agora, n�o saio mais”, disse. Um dos filhos dela, Pedro de Oliveira, de 26, conta que o medo de que outra barragem se rompa ressurge a cada chuva. “A gente mal dorme. Fiquei com a trag�dia na cabe�a. Ainda me lembro do rio sendo tomado, da lama vindo e de todo mundo correndo para o alto. As crian�as choravam, as mulheres berravam, os velhos pediam socorro. Teve at� quem dormisse no cemit�rio”, conta ele, que diz se sentir abandonado por autoridades e at� por quem se disp�e a ajudar. “Estamos esquecidos”, resume.

V�deo mostra situa��o de Paracatu de Baixo



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