
Mariana, Barra Longa e Governador Valadares – A estudante do �ltimo per�odo de direito Michelle Gomes Martins, de 22 anos, n�o foi ao escrit�rio onde faz est�gio, na �ltima quinta-feira, em Belo Horizonte. Marina Bocelli Falconi, tamb�m moradora da capital, faltou �s aulas no curso t�cnico de meio ambiente em que est� matriculada. J� Luiz Carlos de Deus, de 50, deixou o Rio de Janeiro h� uma semana. Eles s�o apenas tr�s de uma legi�o de volunt�rios que largaram seus afazeres por um ou mais dias para ajudar as v�timas do tsunami de lama da Samarco, que devastou o subdistrito de Bento Rodrigues, em Mariana, e Barra Longa, cidade vizinha ao munic�pio, e percorreu quil�metros de dist�ncia, afetando o abastecimento de �gua em Governador Valadores, no Vale do Rio Doce.
S�o homens e mulheres de diferentes regi�es do pa�s, classes sociais, credos, op��o sexual e ra�as. Todos, por�m, unidos para levar uma palavra amiga e pelo menos um pouco de conforto �queles que perderam parentes ou bens materiais com o rompimento das barragens do Fund�o e Santar�m, na �rea rural de Mariana, a 130 quil�metros de BH, na tarde de 5 de novembro. O desastre provocou como��o al�m das montanhas de Minas. E muita gente que mora longe da regi�o atingida pelos restos de min�rio n�o se conformou em ficar em casa.

Michelle, a estudante de direito, e sete amigos se mandaram para Barra Longa, a primeira cidade atingida pela lama, depois dos povoados da �rea rural de Mariana. Acostumados a manusear processos, eles enfiaram as m�os na lama. “Ajudamos no servi�o bra�al”, conta a jovem, acrescentando que o grupo arrecadou brinquedos e gal�es de �gua para os moradores da cidade cuja origem remonta ao in�cio dos anos 1700.
Em Mariana, os galp�es est�o lotados e, apesar de o prefeito Duarte J�nior agradecer e decretar o fim das doa��es, a solidariedade dos brasileiros n�o tem fim. Em frente ao Centro de Conven��es da cidade, a cada minuto, estacionam dezenas de carros, caminhonetes e caminh�es abarrotados com alimentos, roupas, produtos de higiene e �gua. O material doado chega de diversas regi�es do pa�s, como Porto Alegre, S�o Paulo, Bras�lia, Rio de Janeiro, entre outros. Somente ontem, dois caminh�es com �gua sa�ram do munic�pio e foram para Governador Valadares, no Vale do Rio Doce. Ve�culos tamb�m seguem com mantimentos para os distritos atingidos pela lama de rejeitos que vazaram de duas barragens da Samarco.

ALEGRIA NA TRISTEZA A quantidade de materiais arrecadados ainda n�o foi contabilizada. Mais de seis caminh�es com mantimentos j� deixaram o Centro de Conven��es, onde est�o armazenados mais de 200 mil garrafas de �gua. Para separar todo esse material, volunt�rios se revezam durante o dia e a noite. Um deles � o mec�nico Alexander de Oliveira, de 41. “Gra�as a Deus, o povo brasileiro � excelente neste aspecto. Tem que aprender a votar, mas no quesito solidariedade � sensacional”, comentou. Mesmo em meio � trag�dia, ele demonstra alegria ao trabalhar para ajudar as v�timas do desastre. “� espetacular. N�o sei nem explicar o que estou sentindo”, completou.
A felicidade em ajudar tamb�m � estampada no rosto de quem chega com doa��es. Morador de Betim, na Grande BH, o t�cnico em eletr�nica, Alisson Fernandes Rom�o, de 38 chegou em uma caminhonete com 100 fardos de �gua mineral, com 12 garrafas em cada. “At� mesmo colegas que moram nos EUA mandaram dinheiro. O que � pouco para gente, � muito para quem est� nesta situa��o.”
AL�VIO Em meio ao desabastecimento que deixou cerca de 280 mil pessoas sem �gua em Governador Valadares, por conta da lama que interrompeu a capta��o no Rio Doce, a solidariedade de algumas pessoas levou um pouco de esperan�a aos bairros Santos Dumont e Porto das Canoas, na periferia da cidade. O caminh�o do empres�rio Lucas Muniz Ramos, de 34, chegou para aliviar o tormento. “Trouxe de S�o Jo�o do Manhua�u (Zona da Mata) uma doa��o de 10 mil litros de �gua pot�vel e 100 gal�es de 20 litros de �gua mineral. Nesse momento, � a solidariedade que acalma as pessoas”, afirmou o empres�rio, que viajou 300 quil�metros com a �gua.
Aux�lio de ex-dependentes
O corpo de volunt�rios � engrossado na cidade por ex-dependentes qu�micos. Alguns frequentavam as chamadas cracol�ndias, regi�es em onde o consumo de drogas ocorre � revelia do poder p�blico. “H� 13 ex-moradores de rua. A maioria era dependente do crack. Chegamos na ter�a-feira com cerca de 2 mil cestas b�sicas”, contou Ot�lio Moraes de Castro, pastor que atua no projeto Cristol�ndia, da Conven��o Batista Brasileira (CBB). Cl�udio Henrique, de 30 anos, � um ex-dependente qu�mico que deixou a capital mineira para descarregar alimentos para as fam�lias necessitadas em Barra Longa. “Era um farrapo. Morava na rua e frequentava a cracol�ndia. H� alguns meses, amparado na Cristol�ndia, minha vida mudou. Estou ajudando os necessitados aqui por ser grato a Jesus”.

Com p� e enxada nas m�os, a estudante Vit�ria Zuppo, de 19, n�o demonstrou cansa�o. Ela saiu de Belo Horizonte na manh� de s�bado com outras 15 pessoas da Igreja Batista do N�cleo Santo Agostinho. “Quero levar o amor de Deus. Sou fraca e n�o aguento muito o peso da enxada, mas vejo o sofrimento dessas pessoas e Deus fala: vai que voc� consegue”, descreveu.
Os volunt�rios se depararam com cenas chocantes. A pra�a principal do munic�pio foi devastada pela lama. Casas e im�veis comerciais foram danificados. Muita gente perdeu todos os m�veis. O Rio Gualacho do Sul levou o rejeito de min�rio at� o do Pardo, matando centenas de peixes e esp�cies que viviam �s margens dos dois leitos, como capivaras.
A nova paisagem de Barra Longa machucou as vistas de Luiz Carlos, o carioca que deixou o Rio para ajudar fam�lias mineiras. “Cheguei na segunda-feira passada. O objetivo � trazer conforto.” (JHV/PHL)