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Estado de Minas

Sem �gua, moradores de Itambacuri, no Vale do Mucuri, vivem situa��o de calamidade p�blica

Reservat�rio da cidade est� praticamente vazio e especialistas criticam falta de planejamento


postado em 22/11/2015 11:00 / atualizado em 22/11/2015 13:00

Um filete de água escorre em meio à terra seccionada pela seca extrema no período mais crítico da estiagem na região(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Um filete de �gua escorre em meio � terra seccionada pela seca extrema no per�odo mais cr�tico da estiagem na regi�o (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Itambacuri - O semblante triste e cansado dos moradores � o primeiro sinal de que alguma coisa est� errada. Juntando esse retrato ao tr�nsito de caminh�es-pipa para todos os lados e � presen�a de tambores, gal�es, baldes e outros recipientes na porta das casas e na carroceria de caminhonetes, a conclus�o � certa: a falta de �gua – que at� a �ltima quarta-feira, dia 18, secou as torneiras de 16 mil dos 23 mil moradores de Itambacuri, munic�pio do Vale do Mucuri, encostado na BR-116, entre Governador Valadares e Te�filo Otoni, a 420 quil�metros de Belo Horizonte – revela uma situa��o de calamidade p�blica. Apesar de o abastecimento ter sido retomado na quinta-feira, a cidade vive um quadro de racionamento de �gua.

No reservat�rio que abastece a sede da cidade, o cen�rio � inimagin�vel. Um filete de �gua escorre em meio � terra seccionada pela seca extrema. A Esta��o de Tratamento de �gua (ETA) est� praticamente � m�ngua. O pouco que chega n�o tem for�a para subir os morros, deixando a periferia completamente desabastecida. A chuva do �ltimo fim de semana levou esperan�a aos moradores, mas ainda n�o representa a recupera��o da barragem, que continua seca.
Longas filas se formam para conseguir o mínimo de água necessário à sobrevivência(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Longas filas se formam para conseguir o m�nimo de �gua necess�rio � sobreviv�ncia (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

A reportagem do Estado de Minas esteve em Itambacuri e conversou com a popula��o, com a administra��o municipal e com especialistas, chegando � conclus�o de que a situa��o vivida hoje na cidade � resultado da falta de planejamento, aus�ncia de controle do uso e at� da distribui��o da �gua, desperd�cio e sucessivas agress�es ao meio ambiente. Tudo isso amplificado pela falta de chuvas que assola todo o estado h� pelo menos tr�s temporadas chuvosas, entrando agora na quarta esta��o das �guas ainda sem precipita��es dentro das m�dias hist�ricas.

Especialistas apontam que situa��es vividas em anos anteriores j� eram suficientes para nortear a atua��o da prefeitura de forma a minimizar o quadro. A administra��o sustenta que o fato de t�o severa falta de �gua nunca ter se repetido na hist�ria da cidade � suficiente para complicar o trabalho. E a popula��o sofre com o drama de ficar sem �gua.

O per�odo mais cr�tico come�ou em 20 de outubro. O prefeito de Itambacuri, Vicente Guedes (PHS), diz que, um dia depois, a �gua se esgotou no reservat�rio que armazena o recurso oriundo do C�rrego do Poquim, um bra�o do Rio Itambacuri, que faz parte da Bacia do Rio Doce. “Come�amos tentando levar caminh�es-pipa para a ETA, mas ficou invi�vel, j� que o consumo da cidade gira em torno de 2,5 milh�es de litros por dia e os caminh�es carregam apenas 10 mil. Come�amos a pegar �gua da Copasa em Te�filo Otoni, mas foi insuficiente. Por fim, come�amos a estourar represas rio acima.” O prefeito admitiu que isso n�o garante o abastecimento.

Domingas Gonçalves Pereira, 56 anos, levanta o balde de 14 litros com dificuldade(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
Domingas Gon�alves Pereira, 56 anos, levanta o balde de 14 litros com dificuldade (foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
A chegada da reportagem no Bairro Coqueiros foi vista como uma chance de a �gua voltar a sair pelas torneiras. De longe, j� na fila para conseguir �gua, um dos moradores gritou: “Tem que denunciar essa situa��o. Como que pode acabar a �gua da gente?”. A lavradora Domingas Gon�alves Pereira, de 56 anos, carregava o des�nimo na express�o do rosto. Com dificuldades para levantar um balde de cerca de 14 litros, ela s� se preocupava em matar a sede de quatro filhos e seis netos. “A gente vai sendo vencida pelo cansa�o. Quando faz barulho de caminh�o, isso aqui vira um alvoro�o, menino. Todo mundo quer pegar �gua para n�o correr o risco de morrer de sede”, conta.

INSUFICIENTE A dona de casa Roseli Soares da Silva ostenta dois gal�es de 20 litros vazios. “A prioridade � cozinhar e beber. Roupa a gente s� lava quando realmente est� no limite, mas a� carrega a trouxa na cabe�a e leva at� algum po�o que ainda tenha sobrado”, diz.

J� no Bairro Santa Clara, o caminh�o abastece uma caixa-d’�gua colocada na regi�o para evitar problemas causados pelo desespero, misturado � quantidade de pessoas sem o recurso. A pr�pria popula��o vai enchendo baldes e gal�es, esperando a oferta de �gua, que costuma aparecer de duas a tr�s vezes por dia.

MEDIDAS PALEATIVAS O problema da seca vivido na cidade de Itambacuri, no Vale do Mucuri, divide especialistas, a popula��o desabastecida e o prefeito Vicente Guedes (PHS), que esteve ontem em Belo Horizonte reunido com o secret�rio de Desenvolvimento de Integra��o do Norte e Nordeste de Minas Gerais. Enquanto o chefe do Executivo municipal garante que uma interven��o para reconstituir uma barragem antiga vai resolver o problema da falta de �gua, professores e t�cnicos n�o enxergam em uma a��o pontual o fim do drama. Eles apontam problemas de gest�o e s� acreditam na solu��o com investimento focado em a��es de recomposi��o das microbacias. Vereadores de corrente pol�tica contr�ria � do prefeito tamb�m denunciam irregularidades na gest�o, como mau uso de dinheiro enviado pelo Minist�rio da Integra��o Nacional para lidar com problemas de enchentes em 2014.

O certo � que a degrada��o do meio ambiente e a precariedade do abastecimento p�blico levaram a popula��o a uma situa��o extrema de falta d’�gua. O fim de semana foi de chuva na cidade, mas ainda n�o na quantidade necess�ria para salvar emergencialmente o abastecimento. O professor Leonel de Oliveira Pinheiro, que � coordenador do Grupo de Extens�o e Pesquisa em Agricultura Familiar (Gepaf), da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM), diz que desde 2010 a universidade vem estudando a cidade e o que est� ocorrendo hoje � resultado de um processo que n�o veio da noite para o dia. Ano passado, por exemplo, o volume da barragem que atende a sede do munic�pio reduziu drasticamente e ela ficou praticamente seca, mas a chuva evitou o desabastecimento.


Ele critica a falta total de planejamento. “H� apenas solu��es imediatistas de apagar fogo. Agora, a popula��o est� furando po�os artesianos desmedidamente e sem licenciamento ambiental, o que acaba piorando a situa��o, porque o len�ol fre�tico j� est� comprometido e est� sendo ainda mais sugado sem recarga”, afirma. O gerente regional da Rural Minas, Leonardo Machado Natalino, que tamb�m � ge�grafo ambiental, diz que a barragem atual nunca passou por um processo de manuten��o, com o objetivo de promover, por exemplo, o desassoreamento. H� 10 dias, quando a represa secou completamente, o excesso de sedimentos apareceu claramente.

“As a��es devem ser direcionadas para a bacia que atende o munic�pio, para aumentar o poder de infiltra��o da �gua no solo e recuperar o len�ol fre�tico”, diz. O vereador L�cio Pacheco (Pros), que � presidente da C�mara Municipal de Itambacuri, critica a demora do prefeito em tomar uma atitude frente ao desabastecimento. Ele aponta que n�o foi feito um racionamento pr�vio para minimizar os impactos e aponta que apenas dois caminh�es-pipa da prefeitura rodam com frequ�ncia levando �gua aos bairros. O parlamentar tamb�m cita a abertura de um inqu�rito civil pelo Minist�rio P�blico Federal (MPF) para apurar supostos desvios de verba encaminhada pelo Minist�rio da Integra��o Nacional ano passado para reconstruir a cidade depois de chuvas fortes. O valor repassado foi de R$ 1,6 milh�o.

O prefeito Vicente Guedes (PHS) nega a falta de planejamento, j� que a crise que secou a barragem da cidade n�o tem precedentes hist�ricos. “O ano passado apenas refor�ou um projeto que n�s j� t�nhamos, que � inclusive a solu��o do problema: a constru��o do novo reservat�rio, a barragem de cima”, diz. Guedes garante que, com a nova barragem, que j� tem projeto, regulariza��o do terreno e licenciamento, o munic�pio ter� autonomia de 200 dias sem chuva. A represa seca garantia aporte de apenas 40 dias. A obra est� estimada em R$ 1 milh�o e aguarda publica��o do edital pela Secretaria de Estado de Desenvolvimento e Integra��o do Norte e Nordeste de Minas Gerais (Sedinor), j� que o barramento antigo se rompeu em 1979 e deixou ru�nas de concreto no local.

Sobre o inqu�rito no MPF, o prefeito diz que a investiga��o partiu de den�ncias de advers�rios pol�ticos e que os recursos recebidos foram devidamente usados principalmente para recompor o pavimento arrancado pela chuva em alguns lugares e para construir redes de drenagem. “As contas foram prestadas e aprovadas pelo Minist�rio da Integra��o Nacional.” Vicente Guedes ainda garante que tem 11 caminh�es-pipa � disposi��o, entre ve�culos do estado, da Uni�o e de prefeituras vizinhas, fora aqueles de doa��es. Mas reconhece que eles n�o ficam todos juntos � disposi��o. Por fim, o prefeito reclama de pouca ajuda do estado e da Uni�o no momento de dificuldade, principalmente pelo n�o reconhecimento do estado de calamidade p�blica.

A Sedinor informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que o projeto da reconstru��o emergencial da barragem de cima est� em an�lise t�cnica e o conv�nio ser� assinado nos pr�ximos dias com recursos pr�prios da secretaria.


Enquanto isso...
...LENTA RECUPERA��O NA GRANDE BH

A intensifica��o das chuvas nos �ltimos dias tem contribu�do para o elevar o n�vel dos reservat�rios do Sistema Paraopeba, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte. A Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa) informou, ontem, que a capacidade total das represas chegou a 20,8%. O volume de �gua come�ou a aumentar na quinta-feira, quando o �ndice saiu dos 20% (o mesmo dos tr�s dias anteriores) para 20,2%. O maior respons�vel por esse resultado positivo � o Sistema V�rzea das Flores, que, de sexta-feira para s�bado, registrou aumento de 21,9% para 24,7%. J� a capacidade do Sistema Serra Azul saltou de 5,4% para 5,5%. Por outro lado, o volume do Sistema Rio Manso se manteve nos 28,7%, pelo segundo dia consecutivo. Apesar do aumento, o Sistema Paraopeba conserva o menor �ndice da hist�ria, desde 2013, o que mant�m o estado de alerta.

Personagem da not�cia
Jos� Galdino, pedreiro, 52 anos

Como no Nordeste

 Na parte mais alta do bairro, o pedreiro Jos� Galdino, de 52, aguardava em frente a outra caixa que tinha acabado de ser abastecida. Morando h� 23 anos em Itambacuri, ele s� tinha presenciado situa��o semelhante no interior do Nordeste. “Sem �gua, � imposs�vel viver. Minha maior preocupa��o � com as pessoas bebendo e cozinhando com uma �gua que, muitas vezes, n�o sabemos se � pr�pria para isso. Portanto, aqui pretendo conseguir uma pequena quantidade pelo menos para garantir o m�nimo de limpeza da casa”, afirma. Para matar a sede da mulher e de oito filhos, Jos� Galdino diz que vai se virando com o pouco que ganha. “Tem que tentar comprar para que um problema n�o acabe criando outro, deixando a fam�lia toda doente”, diz.


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