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Estado de Minas GARIMPO COTIDIANO

Este 'ca�ador de objetos' criou um museu com 100 mil pe�as de todo o mundo

Espa�o inaugurado recentemente em Belo Horizonte comporta acervo com cerca de 100 mil pe�as do mundo inteiro garimpadas por um apaixonado pelas hist�rias do cotidiano


postado em 21/08/2016 06:00 / atualizado em 21/08/2016 08:46

À frente do museu que criou, Antônio Carlos Figueiredo sempre teve um olhar clínico para adquirir bens de interesse cultural(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
� frente do museu que criou, Ant�nio Carlos Figueiredo sempre teve um olhar cl�nico para adquirir bens de interesse cultural (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Tudo aqui tem hist�ria, significado e import�ncia – de uma fechadura de esta��o ferrovi�ria � chuteira da Sele��o Brasileira campe� da Copa de 1958, do primeiro celular usado em Belo Horizonte � menor televis�o fabricada, acompanhada de lente de aumento, ou da cole��o de cinco mil chaveiros a objetos �teis e divertidos, como secador de unhas, cabide de luvas ou galocha para sapato de salto alto. No rec�m-criado Museu do Cotidiano, no Bairro Funcion�rios, Regi�o Centro-Sul da capital, o visitante encontra pe�as do mundo inteiro – para ser quase exato, cerca de 100 mil – garimpadas em ferro-velho, topa-tudo, antiqu�rio, estabelecimentos comerciais e at� em lixeiras e ca�ambas de entulho, em Minas. � frente da iniciativa est� Ant�nio Carlos Figueiredo, guardi�o apaixonado, observador dos costumes urbanos e, desde a inf�ncia, com o olhar cl�nico para adquirir bens de interesse cultural.


Nos �ltimos dias, Ant�nio Carlos tem se dedicado � organiza��o das pe�as, selecionando o gigantesco acervo por temas, e pretende at� o fim do ano terminar o servi�o. Por enquanto, ainda prevalece, na maioria do ambiente, a placa pendurada numa vassoura: “Deus aben�oe esta bagun�a”. O espa�o de 600 metros quadrados se tornou “falta de espa�o”, segundo Ant�nio Carlos, ocupante do local h� 30 anos. Quem pensa que terminou, precisa esper�-lo contar que disp�e de mais oito locais, compreendendo mais 20 mil objetos, numa empreitada pr�pria, sem receber qualquer ajuda do poder p�blico ou projetos via leis de incentivo. “Mas n�o vou chegar ao d�cimo”, avisa com bom humor.

“O fundamental � a fun��o da pe�a, a peculiaridade, o diferencial. E apresentar tamb�m a evolu��o, as mudan�as ao longo do tempo. Na minha mesa de trabalho, por exemplo, h� um torno de bronze – algu�m j� ouviu falar em torno de bronze? –, a caderneta de um velho armaz�m localizado na Avenida Paraopeba, atual Augusto de Lima, no Centro da cidade, cujo telefone era o n�mero 14, e um minicat�logo telef�nico de 1971 distribu�do como brinde por uma empresa”, mostra o criador do museu. Com seu tradicional chap�u branco, ele se apressa a dizer que n�o acumula, nem coleciona, muito menos � antiqu�rio. “Sou objeteiro”, afirma satisfeito com o neologismo inventado para sua miss�o. E, determinado, avisa que o museu � totalmente anal�gico, f�sico, sem toque virtual.

Par de chuteiras usadas pela Seleção Brasileira em 1958, na Suécia(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Par de chuteiras usadas pela Sele��o Brasileira em 1958, na Su�cia (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Para clarear o ambiente, Ant�nio Carlos transformou em lumin�ria um antigo aparelho de raios X odontol�gico, de 1953, ent�o pertencente � Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). E como tudo tem uma hist�ria, ele conta que o equipamento foi adquirido pelo dono de um ferro-velho num leil�o da universidade, e depois comprado por ele. “Mas logo vi que o aparelho estava com a l�mpada original e, para, n�o descart�-la no meio ambiente, devolvi � institui��o federal.” Da mesma forma, o objeteiro vai entregar, em Sabar�, pe�as do acervo da esta��o ferrovi�ria, como sino, carrinho de bagagens, carrinho de m�o e as placas de sinaliza��o. “Se est� aqui e � de interesse de algu�m, tenho o maior interesse em entregar ou ceder temporariamente”, afirma Ant�nio Carlos.

Macacão usado por Ayrton Senna no Grande Prêmio do Japão(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Macac�o usado por Ayrton Senna no Grande Pr�mio do Jap�o (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
MAMADEIRA Nos labirintos existentes atr�s da porta de a�o, ainda sem placa do museu, e tendo o propriet�rio como guia, � poss�vel fazer descobertas cent�metro a cent�metro. �s vezes, os olhos do visitante brilham e o sorriso n�o escapa tal a surpresa. “Objetos t�m energia, e um vai atraindo o outro”, avisa ele, para esclarecer que pe�as semelhantes acabam se agregando. Num canto, ainda � espera de prateleira, est�o tr�s pias de trem de ferro, da mesma forma que h� aparelhos de televis�o, como o primeiro girat�rio de fabrica��o norte-americana, de 1953, dezenas de bicicletas, m�quinas fotogr�ficas e de filmagem, livros, lou�as, lustres, r�dios de v�lvula, um modelo a pilha, menor e acoplado a um porta-papel higi�nico, chuveiro a �lcool, e fog�o el�trico a chapa, de 1940.

Economista de forma��o, nascido “na segunda metade da d�cada de 1940”, natural de Ouro Preto, na Regi�o Central, e residente na capital desde os 5 anos, Ant�nio Carlos mostra amor paternal pelos objetos e, sem herdeiros, avisa que eles s�o “seus filhos”. Caminhando pelos estreitos corredores, recorda a primeira pe�a que entrou para o acervo. “Foi ainda em Ouro Preto, eu tinha de 4 para 5 anos, e, naqueles tempos, as crian�as eram amamentadas no peito at� essa idade. Um dia, minha m�e me deu o leite numa mamadeira improvisada, feita numa garrafa de guaran� e uma chupeta. Da� em diante n�o parei mais de me interessar pelos objetos e sua funcionalidade.”

Primeiros celulares em BH(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Primeiros celulares em BH (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Mais tarde, em BH, o adolescente gostou de uma cadeira de barbeiro. Falou em casa sobre a vontade de lev�-la e ouviu a m�e dizer que, para fazer isso, precisaria retirar a cama do quarto e dormir na cadeira. Sem pestanejar, comprou a pe�a e se acomodou sobre o seu objeto de desejo por muito tempo. O caso curioso � a senha para Ant�nio Carlos discorrer sobre a evolu��o do que mostra no museu. “Tenho v�rios tipos de cadeira de barbeiro e balan�as de a�ougue. As pessoas podem sentir as altera��es, os tipos produzidos. Minha luta � contra a obsolesc�ncia.” Sempre de olho em estabelecimentos comerciais que cerram as portas e pr�dios que saem de cena, ele conta que todos os dias faz a ronda para encontrar novidades e raridades. Assim, guarda a placa do Supermercado Aimor�, que funcionava no Mercado Central, e as letras do pr�dio, al�m de fotos, placas dos apartamentos e chave de luz do demolido Edif�cio Lucy, no Sion, onde morou Elke Maravilha, falecida no in�cio da semana passada.

Lugar de destaque
A organiza��o do Museu do Cotidiano, ainda com visitas marcadas com anteced�ncia para pequenos grupos, come�a pelo fundo do galp�o. Ant�nio se orgulha em mostrar as prateleiras brancas, no total de mil metros lineares, que encontrou num ferro-velho e eram usadas como g�ndola de supermercado. Bem distribu�das est�o as pe�as de escrit�rio, trof�us sobre o cofre da antiga esta��o ferrovi�ria de BH, bola de futebol autografada por Pel�, m�veis de cart�rio, rel�gios, ourivesaria e lapidaria, tesouras de alfaiate e a se��o de v�cios, com isqueiros de todos os tamanhos e formatos, cachimbos e charutos. Um destaque � o macac�o usado pelo piloto supercampe�o Ayrton Senna (1960-1994) no Grande Pr�mio do Jap�o, e adquirido da vi�va, brasileira, do mec�nico da equipe. No mezanino, j� podem ser vistos os quadros do pintor Lorenzato (1900-1995).

Coleção de cachaças antigas(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Cole��o de cacha�as antigas (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Pegando um pequeno copo de aperitivo, o dono do museu pergunta e responde: “Sabe por que o guardei? � porque o relevo � do lado de dentro, e n�o de fora. Assim, tamb�m mantive esta placa “Ar condicionado”, simplesmente por estar escrito “Ar condiconado”. As placas tamb�m ocupam lugar de destaque, e algumas est�o em exposi��o no Centro Cultural Banco do Brasil, na Pra�a da Liberdade. Certo de que � respons�vel por um tesouro cultural, Ant�nio Carlos cita uma que gosta muito: “Sapataria. Aqui n�o fazemo sapato s� consertamo. As veiz faz”. J� no Espa�o do Conhecimento UFMG, a exposi��o Processaber, aberta para visita��o at� 25 de setembro, exibe parte desse inestim�vel patrim�nio.

Artistas pl�sticos, designers e estudantes, com seus professores, s�o visitantes contumazes do acervo. “N�o quero um museu de antiguidades, mas em constante movimento. Tenho pe�as de 300 anos e tamb�m de dois dias atr�s”, revela o guardi�o. Quando esteve no local, o ex-goleiro da Sele��o Brasileira Emerson Le�o se emocionou ao ver as tesouras de alfaiete, profiss�o que seu pai exerceu. J� o franc�s Pierre Catel, respons�vel por v�rios projetos museogr�ficos em Minas, se espantou ao ver acervo de tal dimens�o. “Ele disse que tenho objetos para 90 museus”, recorda Ant�nio Carlos com alegria.

Ao visitar o acervo, o secret�rio de estado de Cultura e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) Angelo Oswaldo, observou que “Ant�nio Carlos Figueiredo estabeleceu uma cole��o inusitada, que brota do cotidiano de ontem ou do amanh�, ao buscar todo tipo de objeto que referencie a vida que passa. Com isso, criou um formid�vel acervo hist�rico, repleto de narrativas, no qual os espectadores encontrar�o ou formar�o as mais diversas perspectivas de compreens�o do cotidiano”.

SERVI�O
Museu do Cotidiano
Rua Bernardo Guimar�es, 1.296, entre a Avenida Jo�o Pinheiro e a Rua Sergipe, perto da Pra�a da Liberdade
As visitas, com dura��o de no m�ximo duas horas, devem ser marcadas pelo telefone (31) 99612-2431 ou pelo e-mail [email protected]


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