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Estado de Minas

Sa�da de seminaristas de Mariana durante a ditadura militar vira livro

Conhecido como 'A di�spora de Mariana', epis�dio que levou mais de 100 estudantes do Semin�rio Maior a deixar a institui��o em sinal de protesto completa 50 anos e vira livro


postado em 27/12/2016 06:00 / atualizado em 27/12/2016 08:04

"Os padres deixaram de usar batina, passaram a rezar a missa em portugu�s e de frente para os fi�is. Eram muitas as inova��es. Isso tudo mexeu com os seminaristas de Mariana, que temiam um destino med�ocre" - J.D. Vital, autor de A revoada dos anjos de Minas (foto: Beto Novaes/EM/DA Press)
Os anos eram de chumbo e os sonhos, de ouro, muitas vezes leves como as asas de um anjo em busca de novos voos. Foi nesses tempos sombrios, h� 50 anos, durante a ditadura militar no Brasil, que um grupo de seminaristas de Mariana, na Regi�o Central, parou para pensar e viu que o mundo l� fora estava mudando – e rapidamente. Decidido, resolveu mudar com ele. Como resultado, o Semin�rio Maior de Mariana, ent�o com mais de 200 anos de funda��o, ficou fechado durante cinco meses – de setembro de 1966 a fevereiro de 1967 – e os 115 estudantes de teologia e filosofia bateram em retirada, num epis�dio conhecido como “A di�spora de Mariana”. O fato ganhou repercuss�o nacional e mereceu at� cr�nica do escritor e poeta Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), O fim, publicada no Estado de Minas.

Escreveu o itabirano Drummond: “O Semin�rio fizera por merecer da Hist�ria; agora, quem restava? Os seminaristas atuais, ouvidos em consulta sigilosa, foram un�nimes em confessar que a casa n�o lhes apetecia mais. Era velha, no sentido de gasta, n�o recebia o sopro das novas ideias ou, pelo menos, das novas pr�ticas que se sup�em ideias novas (…) J� n�o restavam gl�rias entre as paredes c�lebres. Restava o sentimento de insatisfa��o, de come�ar tudo de novo, que rege o mundo”. O epis�dio na primeira vila, cidade e diocese das Gerais vem agora � tona com o lan�amento do livro A revoada dos anjos de Minas, do jornalista J.D. Vital, autor de Como se faz um bispo, integrante da Academia Marianense de Letras e fundador e integrante do comit� diretor da Associa��o Internacional de Jornalistas de Religi�o (IARJ), com sede em Nova Iorque.

Imagens da época mostram a instituição de ensino religioso que ficaria fechada por cinco meses e os seminaristas que bateram em retirada, depois de críticas ao conteúdo das aulas na unidade e ao celibato exigido pela igreja(foto: Evandro Santiago/EM)
Imagens da �poca mostram a institui��o de ensino religioso que ficaria fechada por cinco meses e os seminaristas que bateram em retirada, depois de cr�ticas ao conte�do das aulas na unidade e ao celibato exigido pela igreja (foto: Evandro Santiago/EM)
“Era um tempo de mudan�as, per�odo p�s-conciliar. Havia muita inquieta��o entre os jovens”, afirma Vital, em refer�ncia �s transforma��es trazidas pelo Conc�lio Vaticano II, iniciado em 1961, pelo papa Jo�o XXIII (canonizado em 2014) e conclu�do pelo sucessor Paulo VI, em dezembro de1965. “Os padres deixaram de usar batina, passaram a rezar a missa em portugu�s e de frente para os fi�is. Eram muitas as inova��es. Isso tudo mexeu com os seminaristas de Mariana, que temiam um destino med�ocre, como se tornar, no futuro, um 'padre de sacristia', a exemplo do interpretado por Dion�sio Azevedo no filme O Pagador de promessas”, acrescenta. Grande sucesso nos cinemas, o longa brasileiro ganhou a Palma de Ouro, no Festival de Cannes, na Fran�a, em 1962.

O planeta estava em convuls�o naqueles distantes anos de 1960. A banda inglesa Beatles enlouquecia os cabeludos e garotas de minissaia com os novos sons, a p�lula anticoncepcional mudava o comportamento das mulheres, os jovens franceses pregavam a liberdade nas ruas, enquanto os seminaristas de Mariana, na institui��o comandada havia 100 anos pelos padres lazaristas, se queixavam do tipo de leitura. “Enquanto liam o conservador ao extremo Gustavo Cor��o (1896-1978), os seminaristas de Belo Horizonte tinham em m�os a obra do fil�sofo franc�s Jacques Maritain (1882-1973)”, afirma Vital.

ESTOPIM Vital j� sabia da hist�ria, que ganhou amplitude quando o psicanalista e ex-padre Jo�o Batista Lembi Ferreira, residente no Rio de Janeiro (RJ), sugeriu que o epis�dio fosse contado em livro. “Ele estava no meio daquele furac�o, conhecia todos os detalhes e a trajet�ria do semin�rio fundado por dom Frei Manoel da Cruz, em 1750. Eu sou de Bar�o de Cocais e n�o estudei l�, mas meu irm�o, Miguel, sim, e tocava clarineta na orquestra”, relata o autor. Tudo come�ou com a aplica��o de um question�rio � turma, no qual 90% dos seminaristas se declaravam contra o celibato sacerdotal obrigat�rio. E mais: criticavam o arcebispo de Mariana, dom Oscar de Oliveira, e o ensino inadequado no semin�rio.

O certo mesmo � que o resultado da pesquisa assustou a dire��o do semin�rio. E em 9 de setembro de 1966, o arcebispo dom Oscar de Oliveira e os padres lazaristas decidiram antecipar as f�rias. De in�cio, o primeiro jornal a falar sobre o caso foi O Di�rio, curiosamente, uma publica��o da Arquidiocese de Belo Horizonte e considerado o maior jornal cat�lico da Am�rica Latina. Na p�gina tr�s, estava a mat�ria “Semin�rio Maior (de Mariana) fecha as portas”. N�o demorou muito para que o jornal O Globo, do Rio, e as revistas Manchete e O Cruzeiro, de circula��o nacional e j� extintas, entrassem no caso.

“Os jovens foram embora e poucos retornaram. O Estado de Minas escalou o rep�rter Jesus Rocha e o fot�grafo Evandro Santiago, que flagraram muitos dos seminaristas deixando o Semin�rio em Mariana. Outros rep�rteres entrevistaram os seminaristas na rodovi�ria de BH tocando viol�o. Havia jovens de todo o Brasil e v�rios deles n�o tinham para onde ir”, conta Vital. Ele explica que a ditadura n�o teve nada a ver com o epis�dio, e que apenas um ou outro padre teve problema com os militares. “Foi mesmo uma mudan�a de atitude da turma, numa institui��o de grande import�ncia e que formou tr�s cardeais – dom Carlos Carmelo Motta, dom Lucas Moreira Neves e dom Raymundo Damasceno –, centenas de padres e religiosos como o beato Padre Victor e acolheu outros em processo de beatifica��o, a exemplo de dom Vi�oso e dom Luciano.” O semin�rio, destaca Vital, � a mais antiga institui��o em funcionamento no pa�s para forma��o de padres.

Segundo Jo�o Batista Lembi Ferreira, Vital “optou por escrever a hist�ria pela narra��o dos envolvidos, sens�vel ao protesto, � revolta, ao riso e �s l�grimas, ouvindo o canto dos hebreus de Mariana com absoluta isen��o, registrando ora lamento, ora exalta��o, a insatisfa��o de uns ao lado da gratid�o de outros”.
(foto: Evandro Santiago/EM)
(foto: Evandro Santiago/EM)


Novos tempos

Atualmente, o processo de forma��o de padres no Semin�rio de Mariana se desenvolve em quatro etapas.O primeiro est� no Grupo de Orienta��o Vocacional (GOV), que acompanha os jovens no per�odo do ensino m�dio, nas modalidades externo e interno, sendo que os segundos integram a Comunidade Vocacional na Par�quia de S�o Sebasti�o, em Barbacena, na Regi�o Central. Depois tem o Proped�utico, instalado na Par�quia do Bom Pastor, em Barbacena, que recebe os candidatos que conclu�ram oensino m�dio e os prepara para a sequ�ncia do processo formativo; o curso de filosofia, com dura��o de tr�s anos, na Faculdade Arquidiocesana Dom Luciano Mendes de Almeida; e o de teologia, etapa final da forma��o presbiterial, com quatro anos de dura��o, no Instituto de Teologia do Semin�rio S�o Jos�. A partir de fevereiro, o GOV funcionar� em Mariana.


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