
A crise carcer�ria que assusta o pa�s, com superlota��o e enfrentamento entre facc��es, encontra em Minas ingredientes para come�ar ainda na inf�ncia e adolesc�ncia. No estado, o Judici�rio informa haver um d�ficit enorme de vagas no sistema socioeducativo, com impactos graves na aplica��o de medidas a autores de atos infracionais. S�o 1.477 vagas para interna��o definitiva ou provis�ria e para o cumprimento de medida de semiliberdade – provid�ncias mais extremas no processo de ressocializa��o. No entanto, h� hoje 1.862 menores acautelados, dividindo alojamentos superlotados, boa parte com infraestrutura prec�ria. A Subsecretaria de Atendimento Socioeducativo (Suase) da Secretaria de Estado de Seguran�a P�blica (Sesp) reconhece a falta de 385 vagas no sistema, o que representa d�ficit de 26%, equivalente a mais de um quarto da estrutura existente, e admite: “h� pedidos judiciais que n�o s�o atendidos”. Ou seja, mesmo operando acima de sua capacidade, o sistema n�o d� conta de acolher todos os casos encaminhados pela Justi�a.
Al�m da falta de espa�o para receber mais menores, a estrutura existente no sistema socioeducativo mineiro enfrenta outros problemas. J� convive com a superlota��o, que, para o Tribunal de Justi�a de Minas Gerais, atinge na capital m�dia de 30% em algumas unidades e no interior chega a 36%, em m�dia. E, assim como no sistema prisional, tamb�m � alvo de cr�ticas sobre a efici�ncia da ressocializa��o, como relatam os pr�prios funcion�rios dessas unidades. “N�o temos problemas de seguran�a, mas h� muitos de infraestrutura, que � prec�ria. A unidade � pequena, o pr�dio � adaptado e temos que organizar v�rias a��es em um mesmo ambiente, inclusive visitas de familiares. Isso nos limita a desenvolver poucas atividades com os adolescentes, e o resultado do trabalho fica comprometido”, afirma um servidor p�blico que deu o depoimento � equipe do Estado de Minas sob condi��o de anonimato.
A execu��o de medidas socioeducativas aplicadas a adolescentes autores de ato infracional � organizada pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), que entre suas diretrizes estabelece padr�es para constru��o das unidades de interna��o. Em Minas, h� pr�dios que atendem a essas exig�ncias e t�m estruturas modernas, segundo servidores do sistema. Mas, ainda assim, operam atendendo mais adolescentes do que suportariam. “Existem unidades na regi�o que s�o modernas e, mesmo funcionando acima da quantidade de vagas, conseguem funcionar com mais tranquilidade. Mas nossa unidade � muito pequena, n�o nos permite fazer todas as atividades que deveriam ser oferecidas aos internos”, afirma um funcion�rio de um dos centros de interna��o do interior, que tamb�m pediu para n�o ser identificado.
Segundo ele, o im�vel n�o tem refeit�rio ou sala de visitas e � todo adaptado. “Faltam camas para adolescentes e parte deles tem que dormir em colch�es no ch�o”, disse. Nessa unidade, h� atualmente 30% mais menores do que o im�vel comportaria. “Existe projeto aprovado para reforma, para fazer mais alojamentos, mas estamos aguardando uma resposta do governo do estado. Enquanto isso, a gente vai trabalhando como d�”, disse.
Menos atividades e maior tens�o
Al�m da infraestrutura f�sica prec�ria, h� queixas de falta de materiais de trabalho e profissionais. Segundo servidores, equipes reduzidas representam diminui��o das atividades, e consequentemente mais estresse e irrita��o, o que resulta na ocorr�ncia de mais brigas entre adolescentes.
As medidas restritivas de liberdade, como s�o as interna��es provis�rias, definitivas ou a semiliberdade, s�o consideradas as �ltimas alternativas em busca da ressocializa��o de adolescentes autores de atos infracionais cometidos com amea�a grave ou viol�ncia � v�tima. Atualmente, das 1.477 vagas divididas em diversas regi�es Minas, 1.240 s�o destinadas �s interna��es, enquanto 207 se relacionam ao cumprimento das demais medidas, em que o adolescente � recolhido em unidade, mas tem sa�da permitida para atividades externas. Essas vagas se distribuem em 36 unidades: 24 centros socioeducativos, 11 casas de semiliberdade e o Centro Integrado de Atendimento ao Adolescente Autor de Ato Infracional (CIA), em Belo Horizonte .
REFLEXO NAS PRIS�ES A ju�za titular da Vara Infracional da Inf�ncia e da Juventude de Belo Horizonte, Val�ria da Silva Rodrigues, critica a estrutura existente no sistema socioeducativo mineiro e diz que o n�mero de vagas que o estado oferece � muito inferior aos casos encaminhados pelo Judici�rio. “O que se percebe � que o governo vem construindo cada vez mais penitenci�rias, sendo que popula��o carcer�ria � de 18 a 24 anos, principalmente. Com mais investimento no socioeducativo, haveria uma chance muito maior de reduzir essa quantidade de presos”, avalia Val�ria Rodrigues. Segundo ela, a reincid�ncia na criminalidade entre menores � de 15%, enquanto entre adultos chega a at� 70%.
Na capital, segundo a ju�za, a situa��o dos sete centros de interna��o � mais tranquila do que no interior, que tem nas regi�es Sul e Norte e maior car�ncia de unidades para acolhimento de adolescentes em conflito com a lei. “A superlota��o dessas unidades compromete todo o atendimento. Os centros de interna��o tinham salas de inform�tica, bibliotecas, refeit�rios e outros espa�os, que foram aos poucos sendo substitu�dos por alojamentos, para dar conta do aumento da demanda. Ent�o, pegam uma sala de estudo e transformam em alojamento”, afirma a ju�za. Ela critica ainda os impactos de medidas como essa: “Esse tipo de mudan�a gera muito conflito, porque os adolescentes passam mais tempo encarcerados do que fazendo atividades, e isso afeta a execu��o da medida socioeducativa”, diz.
H� 13 anos atuando na �rea da Inf�ncia e Juventude, a ju�za Val�ria Rodrigues afirma ainda que faltam investimentos em pol�ticas sociais para prote��o da crian�a e do adolescente, com a finalidade de evitar que tantos meninos e meninas acabem cometendo atos infracionais. “� muito mais f�cil trabalhar o car�ter de um menino do que buscar alternativas para corrigir um adulto. Mas h� casos em que todos os direitos b�sicos do menor, como moradia, educa��o, sa�de e tantos outros, s� s�o cumpridos dentro de um centro de interna��o”, afirma.
Em nota, a Secretaria de Estado de Seguran�a P�blica informou que os problemas de infraestrutura s�o, em grande medida, consequ�ncia da superlota��o no sistema. Por�m, com a abertura de vagas e obras de recomposi��o das estruturas j� existentes, essas quest�es tendem a ser corrigidas, sustenta. Segundo a pasta, o governo de Minas est� executando o Plano Decenal de Atendimento Socioeducativo, para reduzir o d�ficit no sistema e, neste ano, dobrar o n�mero de vagas da semiliberdade, chegando a 414, al�m de inaugurar duas unidades de interna��o, em Passos (Sul de Minas) e Tupaciguara (Tri�ngulo). A subsecretaria articula, ainda, o in�cio de oito obras que viabiliariam 840 novas vagas at� 2019.
Palavra de especialista
Robson S�vio dos Reis
coordenador do N�cleo de Estudos Sociopol�ticos da PUC Minas, integrante do F�rum Nacional de Seguran�a P�blica
Falta investir em preven��o
“Quando um adolescente comete um pequeno ato infracional, a lei estabelece que sejam cumpridas medidas de liberdade assistida e semiliberdade, porque, se aplicadas, elas permitem que o menor n�o progrida no crime e, com isso, n�o precise ir para centros de interna��o. Essa � uma responsabilidade que cabe aos munic�pios. Mas, erroneamente, em vez de investirem nessas pol�ticas protetivas, os gestores locais entendem que a �nica sa�da � a interna��o – medida cara e de baixa efici�ncia, porque se torna uma pol�tica de aprisionamento para um adolescente que muitas vezes n�o precisa ser internado. A maioria dos que v�o para esses centros cometeu repetidas infra��es que nem sempre merecem priva��o de liberdade. � um pequeno distribuidor de drogas ou aquele que praticou reiterados furtos ou outros crimes de menor potencial ofensivo. Para esses, a interna��o � uma medida desnecess�ria, cara e que n�o vai se resolver, porque depois eles v�o praticar outros crimes e acabar nas unidades prisionais, j� superlotadas.”