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Estado de Minas

Onde est�o os macacos? Sumiram com a chegada da febre amarela

Surto da doen�a que se alastra em Caratinga provocou a morte de n�mero expressivo de esp�cies em reserva. Preocupa��o � grande diante da amea�a de extin��o


postado em 19/02/2017 06:00 / atualizado em 19/02/2017 07:28

Caratinga – O guinchar grave e cavernoso que ecoa pelos vales cobertos pela mata atl�ntica � sinal certo de que do alto das �rvores dois grupos de barbados disputam territ�rio. A vocifera��o que pode ser ouvida a quil�metros era uma constante na Reserva Particular do Patrim�nio Natural (RPPN) Feliciano Miguel Abdala, em Caratinga, no Vale do Rio Doce, que, segundo o ICMBio, dispunha de pelo menos 19 grupos desse primata de colora��o vermelha, somando aproximadamente 150 indiv�duos. Mas, desde dezembro, quando um surto de febre amarela se alastrou pela regi�o, o sil�ncio tem tomado conta das copas, uma vez que especialistas calculam que o n�mero de mortos pode beirar 80% desses animais s� na �rea da reserva. Nas estradas e picadas da mata os guias acharam 20 corpos e carca�as, mas estima-se que a maior quantidade, cerca de 70%, tenha morrido no interior das florestas.

A preocupa��o com a reserva � grande, j� que praticamente desapareceram tamb�m os macacos-prego, saguis-da-serra e a �rea det�m um ter�o da popula��o criticamente amea�ada de extin��o do muriqui-do-norte, o maior primata das Am�ricas, com cerca de 450 indiv�duos em Caratinga. Nesta semana, um novo senso vai tentar quantificar a devasta��o que a enfermidade causou na natureza e saber se alguns muriquis que n�o t�m sido vistos morreram tamb�m de febre.

Entre a popula��o humana, sobretudo em Minas Gerais, a doen�a provocou corrida aos postos de sa�de para a vacina��o, levando p�nico a algumas cidades da Zona da Mata e vales dos rios Doce, Jequitinhonha e Mucuri, chegando agora � Grande BH. At� a sexta-feira, �ltimo boletim da Secretaria Estadual de Sa�de (SES) aponta que foram notificados 1.012 casos de febre amarela, sendo que desses 57 foram descartados e outros 220 s�o casos confirmados, com 174 �bitos suspeitos, sendo 78 confirmados para a enfermidade. S�o 84 munic�pios com casos suspeitos, 42 confirmados. Foram distribu�das 5.735.400 doses de vacina, sendo aplicadas 3.102.757 at� sexta-feira, 1.472.538 nos munic�pios com surto. Os macacos s�o reservat�rios do v�rus da febre amarela e n�o a transmitem para os homens, dependendo do mosquito Haemagogus para picar o homem. Esse homem, caso chegue a um meio urbano, se torna reservat�rio da febre e pode transmitir a forma humana da doen�a se for picado pelo Aedes aegypti (o mesmo da dengue).

A população do barbado, conhecido também como bugio ou guariba, diminuiu drasticamente na Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) Feliciano Miguel Abdala(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
A popula��o do barbado, conhecido tamb�m como bugio ou guariba, diminuiu drasticamente na Reserva Particular do Patrim�nio Natural (RPPN) Feliciano Miguel Abdala (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
VULNERABILIDADE De acordo com a SES, n�o h� um n�mero fechado de epizootias, que s�o os animais achados mortos, no caso, primatas n�o humanos. H� rumores de mortes de macacos em 97 munic�pios, 57 em investiga��o e 66 confirmadas para a febre amarela. No estado vizinho, o Esp�rito Santo, as mortes j� superam 700 casos. O Minist�rio da Sa�de registrou 736 mortes por enquanto em Minas Gerais e no Esp�rito Santo.

A popula��o total do barbado, que � conhecido tamb�m como bugio ou guariba, � de cerca de 10 mil macacos em todo o Brasil e no Norte da Argentina, de acordo com o ICMBio. Mas sua extrema vulnerabilidade � febre amarela o levou praticamente � extin��o na Argentina. Em 2009, um surto no Rio Grande do Sul matou nada menos do que 2 mil primatas, reduzindo drasticamente a quantidade desses animais. “Os n�meros mineiros n�o s�o confi�veis, pois o registro das mortes s� passou a ser relacionado com a febre amarela depois que os casos em humanos apareceram, entre dezembro e janeiro. Ou seja, quando o auge da mortandade j� estava passando”, afirma o primatologista S�rgio Lucena, que � professor do Laborat�rio de Biologia de Conserva��o de Vertebrados da Universidade Federal do Esp�rito Santo (UFES).

“A popula��o dos barbados nas matas de Caratinga foi praticamente dizimada. Cerca de 80% deles morreu e isso nos indica que os animais sofrem mais que os homens. Se para a popula��o humana somente 20% t�m febre amarela com sintomas, entre os barbados isso fica em torno de 80% dos indiv�duos”, calcula o especialista. Os barbados que sobreviveram se tornaram imunes � doen�a, mas muitas vezes s�o membros de grupos invi�veis. “Se resistiram num grupo um adulto macho e um filhote, esse grupo � desajustado e s� sobreviver� se houver uma reorganiza��o com outros ou se extinguir�”, destaca Lucena, que segue nesta semana para a reserva Feliciano Miguel Abdala para refor�ar os estudos. “Os macacos s�o as maiores v�timas da febre amarela. Durante um surto, � a morte deles que alerta as autoridades sanit�rias sobre a necessidade de campanhas de vacina��o para bloquear a transmiss�o”, destaca Lucena. Apesar disso, rumores de matan�as de primatas em locais de surto, como Novo Cruzeiro (Jequitinhonha) e Ladainha (Mucuri), chegaram e s�o apurados pela Pol�cia Militar.

(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
Aus�ncia dos barbados acende sinal de alerta
Com o senso nas matas da Reserva Particular do Patrim�nio Natural (RPPN) Feliciano Miguel Abdala, em Caratinga, no Vale do Rio Doce, espera-se saber quantos muriquis foram mortos pela febre. O animal � um dos primatas mais amea�ados do planeta e sua distribui��o na reserva permitiu que a popula��o subisse de cerca de 10, em 1976, quando o propriet�rio Feliciano Miguel Abdala formou a �rea de conserva��o, para os atuais 450. A reportagem do Estado de Minas foi � reserva de Caratinga, onde os funcion�rios respons�veis pelo manejo da �rea de 957 hectares se mostram tensos pelo sil�ncio dos barbados e de outros macacos.

Na mata fechada, entre vales de grandes amplitudes, ainda se ouve com certa regularidade os guinchados parecidos com o relinchar de cavalos, que s�o as marcas dos muriquis em suas passagens elegantes e eretas pelos galhos – alguns at� com filhotes agarrados ao lombo. Mas a aus�ncia dos barbados preocupava. “Desde o fim do ano n�o ouvimos mais aquela grande quantidade de vocifera��es dos macacos, nem avistamos exemplares. A seca foi muito forte e pode ter matado muitos indiv�duos junto com a febre amarela”, disse o guia Roberto Paulino Pereira, conhecedor de trilhas e picadas da reserva.

PISTAS Outra forma de rastrear os animais � seguindo pistas mais sutis. No meio das trilhas, Roberto era capaz de identificar pequenos galhos de �rvores ca�dos e dizer que foram arrancados para servir de alimento para barbados h� poucas horas. Frutos mordiscados tamb�m indicavam a passagem de um bando. S� Roberto encontrou quatro animais mortos, suspeitos de terem contra�do a febre amarela. “Sempre estavam perto de cursos d’�gua e lagos. Por causa da febre, a temperatura do corpo aumenta muito e isso fazia os animais doentes beberem muita �gua para se aliviar”, disse.

Com 2 horas de caminhada, uma sequ�ncia long�nqua de guinchares mais graves e poderosos alertou para a presen�a dos barbados. “Quando escutamos uma vocifera��o dessas � porque h� dois grupos diferentes. Os animais s�o muito territorialistas e s� fazem isso para expulsar invasores”, afirma Roberto. A aproxima��o dos grupos em disputa, no entanto, n�o foi bem-sucedida e os animais desapareceram. S� 3 horas depois, j� do outro lado da reserva, � que foi poss�vel escutar as vocifera��es que poderiam ser o indicativo de dois grupos em disputa por territ�rios. Os animais puderam ser vistos a dist�ncia e a situa��o mostrou a gravidade de mortes levadas pela febre. Tratava-se de um pequeno grupo de tr�s barbados vermelhos berrando para afugentar um outro animal que entrou sozinho no territ�rio alheio. “Pode ser que o grupo inteiro do barbado invasor tenha sido morto e ele est� tentando encontrar uma outra fam�lia”, pondera o guia.


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