
Passados mais de sete anos do crime, � a comerci�ria que est� na mira. Na semana passada, depois de sofrer 18 meses nas m�os do companheiro, ela reuniu for�as e procurou pela primeira vez a Delegacia Especializada de Atendimento � Mulher, em BH, para tentar mant�-lo distante. Mesmo revestida de coragem para romper o sil�ncio, ela admite que o medo de morrer agora cresceu: “Ele vai ficar irado quando souber e vai me matar, porque ele � o tipo de homem que n�o tem medo de nada”, diz.
O temor que perturba as noites de sono de L.G. e a fez perder os v�nculos com amigas, vizinhos e se privar de uma vida tranquila vem de um homem que ela define como sem v�cios, religioso, mas extremamente possessivo e ciumento. “Ele � evang�lico. N�o fuma. N�o bebe. N�o usa drogas. Mas me bate, mesmo sem ter motivo. Um dia me bateu muito porque n�o fui pra sala assistir � televis�o com ele”, conta com o p�nico no olhar. Em uma das investidas, L.G. diz que as pancadas na cabe�a foram t�o fortes que ela foi parar no hospital.
E mesmo com tanta viol�ncia, o resultado � sempre o mesmo. “Ele vai pra casa da m�e depois de me agredir. Uma semana depois volta, com a mala, e diz que vai mudar, que o que aconteceu com ele foi coisa do dem�nio, que n�o vai mais ocorrer.” Minutos antes de entrar em uma das salas da Delegacia de Mulheres, ainda sem saber quais seriam os cap�tulos seguintes dessa conhecida hist�ria de sofrimento, a mulher desaba em l�grimas: “Vim pedir uma medida protetiva porque n�o aguento mais. N�o sei se vai dar certo, porque ele vai se aproximar. Mas eu preciso fazer a minha parte”, diz.
AMEA�AS CONSTANTES Relatos colhidos em ocorr�ncias policiais revelam bem esse drama. Em um dos casos, registrado em um bairro da regi�o da Pampulha, a v�tima, mesmo protegida pela medida prevista na Lei Maria da Penha, foi violentamente surpreendida, em casa, pelo ex-companheiro. Ainda durante o relacionamento, no ano final de conviv�ncia, o suspeito manteve comportamento agressivo e violento, principalmente quando bebia. No dia em que esteve na casa da v�tima, em meio a uma discuss�o, ele arremessou uma faca contra a mulher, que caiu e ficou com fortes dores na perna. A pol�cia esteve no local e constatou que, a exemplo do ocorrido no dia, as agress�es e amea�as eram constantes, bem como as viola��es de medidas protetivas impostas ao ex-companheiro pelo Judici�rio.
Em um caso no interior, no Vale do Mucuri, uma mulher foi puxada pelo bra�o, com viol�ncia, pelo seu ex-companheiro, e levada a um bar, mesmo com a determina��o da Justi�a de que ele n�o poderia se aproximar da v�tima. O ataque s� n�o teve um desfecho tr�gico porque ela conseguiu, num momento de distra��o do autor, fugir e buscar ajuda. A pol�cia localizou o suspeito e n�o s� identificou que ele havia descumprido a medida protetiva, bem como havia amea�ado a mulher de morte no dia anterior, fato que constava em queixa policial prestada pela v�tima na ocasi�o.
A viola��o da medida protetiva – instrumento m�ximo da Lei Maria da Penha para frear condutas violentas antes de chegar � pris�o do agressor – soa como um alarme perigoso para as v�timas. Isso porque, quando s�o determinadas as regras de prote��o, como proibi��o de contato com a v�tima ou familiares; proibi��o de os mesmos locais sejam frequentados; imposi��o de limite de dist�ncia; afastamento do agressor do lar, entre outras, a garantia do sossego se restabelece � v�tima. Mas, quando esse ‘contrato’ � quebrado pelo homem, todo esse amparo se desfaz.
� o que explica o juiz Marcelo Gon�alves de Paula, da 14ª Vara Criminal de Belo Horizonte, uma das quatro especializadas em viol�ncia dom�stica da capital. Respons�vel por cerca de mil despachos mensais e entre 300 a 400 senten�as, no mesmo per�odo, relacionadas ao tema, ele relata o tom do depoimento das v�timas e tra�a um perfil do homem que viola a medida protetiva. “A indisciplina para n�o aceitar o limite estabelecido e o sentimento de que nada vai ocorrer a ele caso transgrida o limite de aproxima��o s�o o que, de modo geral, levam o homem a uma nova aproxima��o, mesmo proibido. Outros fatores que precisam ser destacados � a predisposi��o � conduta violenta que muitos homens t�m e a cultura do machismo, ainda t�o imersa em nossa sociedade”, afirma o magistrado.
´Ao colocar a quest�o de g�nero de forma equ�nime, Marcelo Gon�alves chama a aten��o para a necessidade de mudan�a dessa educa��o que violenta e agride a mulher, lembrando que a Lei Maria da Penha traz em seu texto um discurso de igualdade e de garantia aos seus direitos. E diz que a v�tima que recorre � medida protetiva, prevista nessa legisla��o, busca por socorro, acolhimento e prote��o. “Quando essa medida � concedida, ela traz seguran�a, conforto, paz e equil�brio. Na hora em que o agressor descumpre essa regra, esse medo se potencializa, o desequil�brio se instala e os fantasmas voltam”, afirma o juiz, lembrando que a prote��o n�o se encerra mesmo com a descumprimento pelo agressor.
COMO FICOU?
Condenado a 15 anos de pris�o, em regime fechado, o borracheiro F�bio William Soares, acusado de matar a ex-mulher, a cabeleireira Maria Islaine, est� no regime semiaberto desde 2015 na Penitenci�ria Inspetor Jos� Martinho Drumond, em Ribeir�o das Neves. O crime ocorreu em 20 de janeiro de 2010. F�bio deu entrada no sistema prisional em 27 de janeiro, uma semana depois. O julgamento, presidido pelo juiz Christian Gomes, foi realizado pelo 1º Tribunal do J�ri do F�rum Lafayette. O borracheiro confirmou ter matado a v�tima, mas negou que tenha sido por raz�es materiais. Ele alegou ainda que a cabeleireira era constantemente assediada por outros homens e atendia aos telefonemas deles em sua presen�a. Ele afirmou que, no dia do crime, exibiu a arma para intimidar a ex-companheira, mas que perdeu a cabe�a quando ela disse que ele n�o era homem para atirar e ele disparou os tiros. A acusa��o alegou que ele planejou o crime, pois chegou ao sal�o da v�tima j� com a arma em punho. O representante do Minist�rio P�blico referiu-se ainda � partilha de bens, que teria gerado desentendimento entre o casal. A promotoria enfatizou ainda que foram registrados oito boletins de ocorr�ncia, e citou ainda as medidas protetivas da Lei Maria da Penha aplicadas pelo Judici�rio, entre elas separa��o de corpos com determina��o para afastamento, mas que teriam sido descumpridas por F�bio.