Doze bispos das dioceses da Bacia Hidrogr�fia do Rio Doce divulgaram hoje, data em que se completa os dois anos do desastre com a Barragem de Fund�o, em Mariana, uma declara��o cobrando provid�ncias mais c�leres em rela��o aos atingidos e ao meio ambiente.
No texto, os bispos destacam que a trag�dia revelou "a fragilidade e a grave insufici�ncia dos crit�rios utilizados para a defini��o de novas �reas de minera��o, dos m�todos utilizados, das t�cnicas de produ��o e gest�o de barragens, das tecnologias da engenharia de minera��o".
Confira a nota na �ntegra
Declara��o dos bispos das dioceses da Bacia Hidrogr�fica do Rio Doce
"No dia 5 de novembro de 2015, as popula��es da Bacia do Rio Doce foram brutalmente atingidas pelo maior desastre socioambiental do Brasil, com o rompimento da Barragem de Fund�o, das mineradoras Samarco-Vale-BHP Billiton, no distrito de Bento Rodrigues, munic�pio de Mariana-MG.
A lama t�xica destruiu comunidades, ceifou vidas, desalojou popula��es inteiras, devastou o meio ambiente, atingiu o Rio Doce e chegou ao Oceano Atl�ntico, jogando na incerteza e na inseguran�a milhares de pessoas.
Como pastores do povo de Deus, atentos aos “sinais dos tempos” e fi�is � nossa miss�o evangelizadora, queremos dirigir nossa palavra e nos solidarizar com os atingidospela lama t�xica que provocou um preju�zo incalcul�vel, que engloba aspectos ambientais, sociais e econ�micos, envolve a vida de grande parte dapopula��o estabelecida nesta bacia hidrogr�fica e ultrapassa as localidades situadas �s margens do Rio Doce.
Esperar contra toda esperan�a (Rm 4,18)
Nas localidades atingidas, a lama de rejeitos de min�rio afetou o sentimento de pertencimento demoradores, povos ind�genas, ribeirinhos, pescadores, quilombolas, areeiros, artes�os, comerciantes,agricultores, pois muitos perderam casas, estilo de vida, mem�ria, postos de trabalho, sa�de, seguran�a e perspectiva de futuro.
Mesmo em meio a tanto sofrimento, n�s crist�os somos chamados a alimentar a chama da esperan�a. Esse crime socioambiental, cujos efeitos repercutem na vida e nas atividades da popula��o desta regi�o,incide fortemente na hist�ria da Bacia do Rio Doce.
Lamentamos que, passados dois anos, pouco foi feito, sobretudopor parte dos respons�veis, diante do muito que h� por fazer. A atua��o da Funda��o Renova, criada pela Samarco, Vale e BHP Billiton, com o aval do governo Federal e dos estados de Minas Gerais e Esp�rito Santo, tem sido insuficiente diante da magnitude das consequ�ncias incalcul�veis dessa trag�dia.
H� promessas n�o cumpridas, o que gera des�nimo e descr�dito em muitas pessoas. Muitos atingidos n�o foram reconhecidos como tais, ficando sem receber a devida assist�ncia da empresa respons�vel pelo rompimento da barragem.
� preciso recordar que n�o se faz justi�a sem respeito aos direitos e � dignidade da pessoa humana.Entretanto, at� o presente, n�o houve puni��o aos culpados, nem pleno ressarcimento �s popula��es atingidas, nem o devido reparo aos danos causados ao meio ambiente. S�o conhecidos tamb�m outros casos de rompimentos de barragens de conten��o de res�duos de min�rios ocorridos em Minas Gerais: Itabirito (1986), S�o Sebasti�o das �guas Claras (2001), Mira� (2007), Itabirito (2014) e Mariana (2015).
A d�vida contra�da pelas empresas respons�veis ainda n�o foi plenamente saldada e a atua��o dos �rg�os p�blicos n�o � satisfat�ria. Apesar desse quadro sombrio, h� pontos luminosos que brilham nos gestos de solidariedade de muitas pessoas e institui��es p�blicas e privadas para minorar o sofrimento causado pelas duras consequ�ncias dessa trag�dia. A solidariedade alimentaa esperan�a. H� princ�pios �ticos que est�o sendo feridos especialmente pela irresponsabilidade, neglig�ncia e omiss�o por parte de empresas e de institui��es governamentais.
Prova disso � a assinatura de acordos referentes a repara��o, compensa��o e indeniza��o dos danos; a reduzida participa��o das comunidades atingidas nas decis�es que lhes dizem respeito;e a falta da devida avalia��o sist�mica e estrat�gica dos impactos provocados. � responsabilidade do Minist�rio P�blico e do Poder Judici�rio garantir o efetivo respeito aos direitos dos atingidos, o fiel cumprimento da justi�a e a devida puni��o dos respons�veis.
A quest�o da minera��o:
O rompimento da barragem de Fund�o tornou inadi�vel a reflex�o cr�tica sobre a complexa quest�o da minera��o. Essa trag�dia revelou a fragilidade e a grave insufici�ncia dos crit�rios utilizados para a defini��o de novas �reas de minera��o, dos m�todos utilizados, das t�cnicas de produ��o e gest�o de barragens, das tecnologias da engenharia de minera��o.
Al�m disso, a trag�dia mostrou a vulnerabilidade da atual legisla��o socioambiental; a insuficiente fiscaliza��o dos �rg�os competentes; a baixa qualidade e a morosidade das a��es emergenciais; o despreparo da sociedade e dos governos para planejar, discutir, condicionar, negociar e garantir as estrat�gias de desenvolvimento centradas na busca da sustentabilidade. Ademais, n�o � suficientemente considerada a situa��o em que se encontram as diversas minas de explora��o e os altos riscos socioambientais nelas envolvidos.
Os grandes empreendimentos miner�rios t�m sido concebidos e gerenciados sem a efetiva considera��o sobre a exaust�o das jazidas, os processos de fechamento de minas e as alternativas para a diversifica��o da economia local. � preciso estender nosso olhar tamb�m para o impacto da minera��o sobre a �gua. Trata-se de um bem que � finito e, ao mesmo tempo, essencial para a vida, por isso, de direito universal.
A explora��o insustent�vel das atividades mineradoras amea�a esse bem indispens�vel,prejudicando o meio ambiente, destruindo vegeta��es, provocando desequil�brio no regime de circula��o de �guas superficiais e subterr�neas, modificando essencialmente o len�ol fre�tico,causando a destrui��o de in�meras nascentes, levando � escassez desse bem precioso e gerando impactos prejudiciais � sa�de, � produ��o de alimentos e � pr�pria vida.
Economia a servi�o da vida:
Na raiz dessa trag�dia de dimens�es incalcul�veis, encontra-sea sede desenfreada de lucro a ser obtido a qualquer pre�o, mesmo causando danos � natureza e ao ser humano: “Isto acontece porque no centro desse sistema econ�mico est� o deus dinheiro e n�o a pessoa humana. Sim, no centro de cada sistema social ou econ�mico deve estar a pessoa, imagem de Deus [...]. Quando a pessoa � deslocada e chega o deus dinheiro d�-se essa invers�o de valores [...]. Um sistema econ�mico centrado no deus dinheiro tem tamb�m necessidade de saquear a natureza” diz o Papa Francisco, no Discurso aos participantes do Encontro Mundial dos Movimentos Populares, em Roma, no dia 28 de outubro de 2014.
O Papa � incisivo ao afirmar: “A primeira tarefa � p�r a economia a servi�o dos povos. Os seres humanos e a natureza n�o devem estar a servi�o do dinheiro. Digamos N�O a uma economia de exclus�o e desigualdade, onde o dinheiro reina em vez de servir. Esta economia mata. Esta economia exclui. Esta economia destr�i a M�e Terra [...]. A casa comum est� sendo saqueada, devastada, vexada impunemente. A covardia em defend�-la � um pecado grave [...].
Os povos e os seus movimentos s�o chamados a clamar, mobilizar-se, exigir – pac�fica, mas tenazmente – a ado��o urgente de medidas apropriadas. Pe�o-vos, em nome de Deus, que defendais a M�e Terra” (Discurso em Santa Cruz de laSierra, na Bol�via, no dia 9 de julho de 2015). Ao mesmo tempo em que expressamos nossa solidariedade com os atingidos por essa grande trag�dia, olhamos com preocupa��o para as pr�ximas gera��es.
O futuro est� comprometido!Diante dessa triste e desafiadora realidade, os �rg�os governamentais e jur�dicos fa�am valer a justi�a social e ambiental; as empresas causadoras da trag�dia assumam plenamente suas responsabilidades com o ressarcimento pelos preju�zos causados e a reconstru��o da vida humana e do meio ambiente; as popula��es locais sejam vigilantes e solid�rias, buscando sempre a uni�o e participando ativamente nos movimentos eclesiais, sociais e populares comprometidos com a defesa dos direitos e apromo��o da vida digna para todos.
Apelo final
Como bispos das Dioceses da Bacia do Rio Doce, dirigimos este apelo: Apoiem os atingidos pela trag�dia do rompimento da barragem de Fund�o para que tenham seus direitos respeitados, sua dignidade reconhecida, seus bens ressarcidos e seu protagonismo considerado na busca de solu��es que atendam a seus leg�timos interesses. Estimulem os que lutam em defesa da “casa comum” para que n�o desanimem diante dos obst�culos e da prepot�ncia dos grandes e poderosos. Ajudem a salvar o Rio Doce, com tudo o que ele significa para tanta gente em Minas Gerais e no Esp�rito Santo. Perseverem na luta a favor da vida e da esperan�a, na certeza de que “a paz � fruto da justi�a” (Is 32, 17).
Mariana,05 de novembro de 2017
Dom Geraldo Lyrio Rocha, Arcebispo de Mariana-MG
Dom Luiz Mancilha Vilela, Arcebispo de Vit�ria-ES
Dom Rubens Sevilha, Bispo Auxiliar de Vit�ria-ES
Dom Emanuel Messias de Oliveira, Bispo de Caratinga-MG
Dom Ant�nio Carlos F�lix, Bispo de Governador Valadares-MG
Dom Joaquim Wladimir Lopes Dias, Bispo de Colatina-ES
Dom Marco Aur�lio Gubiotti, Bispo de Itabira-MG
Dom Paulo Bosi Dal’B�, Bispo de S�o Mateus-ES
Dom Aldo Gerna, MCCJ, Bispo Em�rito de S�o Mateus-ES
Dom Werner Siebenbrock, Bispo Em�rito de Governador Valadares-MG
Dom Odilon Guimar�es Moreira, Bispo Em�rito de Itabira-Fabriciano-MG
Dom D�cio SossaiZandonade, Bispo Em�rito de Colatina-ES