
Os temporais que castigam Belo Horizonte em um come�o de mar�o especialmente chuvoso mostram que o perigo na cidade n�o tem endere�o. Em um cen�rio de precipita��es sem tr�gua, o risco de deslizamentos de terra e desabamento de muros cresce na mesma propor��o, extrapolando �reas de vilas e favelas mais propensas a esses tipos de risco e levando o problema tamb�m para a cidade formal. As �ltimas ocorr�ncias de maior destaque na capital mostram que, com precipita��o acumulada que chega a representar quase o dobro do esperado para o m�s em apenas nove dias, as amea�as chegam at� �reas de alto padr�o construtivo. A principal demonstra��o ficou evidente quando um muro de seis metros de uma casa de luxo no Bairro S�o Bento, na Regi�o Centro-Sul, desabou, espalhando toneladas de entulho e terra pela Rua Abel Ara�jo e bloqueando o tr�nsito de ve�culos na via.
Segundo o propriet�rio da casa, o muro foi constru�do h� cerca de 40 anos e, como choveu bastante – foram 307 mil�metros (mm) em nove dias na Regi�o Centro-Sul, contra m�dia hist�rica de 163,5mm nos 31 dias de mar�o –, a infiltra��o da �gua no terreno foi muito significativa, o que contribuiu para o desabamento. Al�m do risco que se espalha pela capital sem distin��o de �rea, o excesso de chuva provocou ocorr�ncias diversas espalhadas tamb�m pela regi�o metropolitana. Em Sabar�, parte de uma encosta deslizou e acertou uma casa onde estavam cinco moradores, por pouco n�o causando uma trag�dia. O tempo chuvoso tamb�m contribuiu para o tombamento de uma carreta carregada de etanol na BR-040, pr�ximo � sa�da para Ouro Preto, em Nova Lima, na Grande BH. O resultado foi a rodovia totalmente fechada por quase nove horas.
Na ocorr�ncia registrada no Bairro S�o Bento, em BH, o colapso do muro de arrimo da constru��o de luxo provocou surpresa, e chegou a levantar suspeita de que pudesse ter havido morte no epis�dio. “Estava chovendo muito forte. Eu estava na varanda e ouvi um barulho muito alto e, quando fui ver, o muro j� tinha ca�do”, contou uma testemunha da queda da estrutura. A dom�stica Carla Marisqueira, de 47 anos, trabalha em uma das casas em frente ao local onde parte de uma quadra do im�vel e a grade de prote��o desabaram sobre a Rua Abel Ara�jo. “Geralmente, nesse hor�rio tem muito carro na rua e funcion�rios chegando para trabalhar nas casas. Gra�as a Deus, a rua n�o estava cheia. Mas uma mulher chegou a se machucar e um homem quase foi pego pela terra,” completou Carla. O Corpo de Bombeiros foi at� o local e, com a ajuda de c�es farejadores, procurou por poss�veis v�timas soterradas, mas constatou que n�o havia ningu�m soterrado.
Os militares foram chamados no in�cio da manh�. “Chegamos no local e fomos conversar com os vizinhos para, assim, avaliar a possibilidade de haver um ve�culo debaixo do material. Posteriormente, os c�es chegaram para descartar a possibilidade de haver v�tima sob a lama”, informou o tenente S�rgio Magalh�es J�nior, do Corpo de Bombeiros. A corpora��o informou que o muro s� poder� ser removido depois que a chuva diminuir e, por isso, a via ficar� interditada por, pelo menos, uma semana. A Avenida Professor Sylvio Vasconcelos ficou parcialmente obstru�da e a Rua Abel Ara�jo, totalmente fechada. Nesse per�odo, os escombros permanecer�o na rua, j� que eles est�o ajudando a conter o deslizamento. “A �gua infiltrou na terra e deve continuar a haver deslizamento. Acreditamos que ainda devem descer cerca de dois metros de lama”, completou o tenente. Na pr�tica, ser� necess�rio demolir o muro para a reconstru��o.
O desmoronamento pode ter sido provocado por problemas de drenagem. Segundo a Defesa Civil, o morador foi notificado e deve apresentar um plano de a��o para enfrentar os riscos e um laudo de estabilidade do restante do muro. “Esse muro foi projetado h� 40 anos, quando comecei a fazer casa e, desta vez, parece que houve uma infiltra��o. Mas � uma obra muito estruturada, com vigas, ent�o realmente � uma fatalidade, acho que � o excesso de �gua descendo com a chuva dos �ltimos dias”, contou o propriet�rio, Salvatore Luce, de 69. Ainda segundo ele, o arrimo foi nivelado justamente por ser uma regi�o montanhosa. Naquela ocasi�o, h� 23 anos, a quadra de t�nis e o quiosque foram constru�dos. “Foi a primeira casa do Bairro S�o Bento”, completou o morador.
No mesmo bairro, uma �rvore de grande porte tamb�m caiu, danificando parte da cal�ada e atingindo o muro de uma casa e cabos de rede el�trica na Avenida Bento Sim�o. Tronco e galhos ocuparam a pista durante o fim da manh� de ontem. No vizinho Santa L�cia, o temporal fez descer uma enxurrada de lama que invadiu a Pra�a Arc�ngelo Maleta. Um trator tentou minimizar os danos, mas a passagem ficou praticamente interditada para carros e pedestres.
INTERDI��ES
Na quinta-feira, o ac�mulo de chuvas j� havia provocado outros deslizamentos e desabamentos de muros em �reas da chamada cidade formal, perfil que normalmente � mais comum em �reas consideradas de risco, em vilas e favelas. Na quinta-feira, o escorregamento de uma encosta da Avenida Ant�nio Carlos, levando junto o muro que protegia uma casa da al�a de acesso ao Viaduto Rep�blica do Congo, obrigou a Defesa Civil a interditar a moradia. Tamb�m foram bloqueados os acessos a outros dois im�veis do mesmo endere�o. Na quarta-feira, parte de uma rua no Bairro Gutierrez, na Regi�o Oeste de Belo Horizonte, tamb�m foi interditada devido ao risco de queda de um muro de aproximadamente seis metros de altura. A barreira pertence a um condom�nio localizado ao lado do Col�gio Santo Agostinho, na Rua Daniel de Carvalho.
A falta de manuten��o em sistemas de drenagem e chuvas mais fortes provocam esse tipo de ocorr�ncia. “Muita chuva em pouco tempo encharca a terra e sobrecarrega o sistema de drenagem. Todas as edifica��es precisam de manuten��o. Logicamente, a cidade informal n�o tem acompanhamento t�cnico necess�rio, ou seja, a chance de haver problema � muito maior. J� na cidade formal, a maioria das casas e apartamentos � feita com projetos aprovados. Mas, ainda assim, acontece”, disse o engenheiro e presidente do Instituto Brasileiro de Avalia��es e Per�cias de Engenharia (Ibape-MG), Cl�menceau Chiabi.
BAIRROS CR�TICOS
De acordo com o engenheiro, bairros no entorno da Serra do Cultural cont�m um solo composto por filito, que � propenso a escorregamento na presen�a de �gua. “A regi�o j� � ingrime e, com a �gua da chuva, aumenta significativamente o risco de deslizamentos de terra na faixa que come�a l� pelo Barreiro, indo em dire��o aos bairros Olhos D’�gua, Buritis, Belvedere, Vila da Serra (Nova Lima), Mangabeiras, Serra, Cafezal e S�o Lucas, chegando at� Sabar�”, disse Clemenceau.
Ainda segundo ele, existe uma cultura de investir as economias dos condom�nios de pr�dios em outros tipos de reforma, como as de fins est�ticos, deixando as vistorias de lado. “� preciso cuidar da drenagem. Direcionar a �gua para que ela n�o fique acumulada”, alertou o especialista. � melhor investir na preven��o: Cl�menceau alerta que a reconstru��o de um muro de aproximadamente cinco metros pode chegar a custar R$ 120 mil. Normalmente, ap�s os cinco primeiros anos � importante fazer vistorias peri�dicas. “Trincas, estufamentos e �gua de drenagem com ac�mulo de sujeira podem indicar problemas. � preciso ficar atento para que, caso os sinais apare�am, se chame um especialista para analisar”, completou.
De olho no c�u
Volumes de chuva (em mm) por regional de BH, da 0h �s 11h30 de ontem (valores entre par�nteses indicam percentual em rela��o � m�dia de chuva esperada para todo o m�s)
Barreiro 66,6 (41%)
Centro-Sul 107,4 (66%)
Leste 72,2 (44%)
Nordeste 81,4 (50%)
Noroeste 80,4 (49%)
Norte 7,4 (5%)
Oeste 82,2 (50%)
Pampulha 76,0 (46%)
Venda Nova 54,6 (33%)
Volumes de chuva (em mm) no m�s de mar�o por regional de BH at� as 11h30 de ontem (valores entre par�nteses indicam percentual em rela��o � m�dia de chuva esperada para todo o m�s)
Barreiro 246,6 (151%)
Centro-Sul 307,4 (188%)
Leste 274 (168%)
Nordeste 287,6 (176%)
Noroeste 280,4 (171%)
Norte 142,0 (87%)
Oeste 342,2 (209%)
Pampulha 194,8 (119%)
Venda Nova 171,4 (105%)
M�dia hist�rica: 163,5mm