
Novo tempo na restaura��o da Igreja Nossa Senhora da Boa Viagem e Santu�rio Arquidiocesano de Adora��o Perp�tua, na Regi�o Centro-Sul da capital. Come�aram, ontem, as obras no interior do templo, que funciona como catedral provis�ria da Arquidiocese de Belo Horizonte e dever� abrigar quatro frentes de trabalho nesta temporada: pintura para devolver a cor original �s paredes, al�m de recupera��o dos vitrais, do piso de tacos e dos altares de m�rmore. Enquanto os servi�os avan�am para ficar prontos em seis meses, uma delicada interven��o enche os olhos de especialistas e apresenta descobertas: trata-se do restauro da imagem da padroeira Nossa Senhora da Boa Viagem, de origem portuguesa, que chegou ao primitivo arraial de Curral del-Rey em 1714.
A expectativa, diz o p�roco � de reentronizar a pe�a sacra em 15 de agosto, data consagrada � padroeira de BH, e quando o altar dedicado a ela estar� conclu�do. Grato � comunidade pela colabora��o no projeto por meio da campanha Juntos pelo restauro, padre Marcelo celebrou domingo missa de “agradecimento e s�plica” pelo bom andamento do projeto com b�n��o para os trabalhadores envolvidos. Ele lembra que, al�m da ajuda popular e de atividades da par�quia, h� recursos provenientes de emenda parlamentar e busca parceiros no setor privado, via Lei Rouanet, para levar adiante a obra. At� agora, j� foram investidos mais de R$ 700 mil nas obras da igreja.
OURO COLONIAL Ficar alguns momentos em sil�ncio no interior da catedral provis�ria representa acolhimento, fortalecimento da f� e descanso para o esp�rito. Mas logo que os oper�rios voltam � ativa, montando os andaimes, v�-se que, para instantes de paz, � preciso muita luta. Basta olhar para o ambiente. O padre explica que h� molduras dos vitrais com ferrugem, infiltra��es em alguns pontos e simplesmente cinco camadas de tinta cobrindo a cor original das paredes, conforme ficou constatado em pesquisas entre 2011 a 2015. “Vamos retornar com o ouro colonial �s paredes internas”, observa.
O piso de tacos tamb�m merece aten��o especial nesta empreitada. “A madeira � muito bonita, embora esteja coberta de cera e outros produtos, ent�o ser� raspada. Apontando as lumin�rias no alto, que destoam da arquitetura, padre Marcelo revela que ser�o colocados lustres. Tombada pelo Instituto Estadual do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico de Minas Gerais (Iepha-MG) e Conselho Deliberativo Municipal do Patrim�nio Cultural e com elementos art�sticos – incluindo a imagem, altar, pia, chafariz e outras pe�as do s�culo 18 sob prote��o do Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan) –, a igreja em estilo neog�tico n�o est� muito longe de completar o centen�rio de inaugura��o, o que ocorrer� em 8 dezembro de 2023. E todos trabalham para mostrar um patrim�nio do qual os belo-horizontinos devem se orgulhar. “No ano passado, celebramos oito d�cadas da Adora��o Perp�tua”, destaca o religioso.
“Fazemos churrascos, barraquinhas, enfim, de tudo para terminar a igreja. � preciso lembrar que a hist�ria da capital surgiu com a imagem que estava na capela original, em torno da qual nasceu o arraial, formou-se a vila e cresceu a capital. S�o mais 300 anos”, ressalta o p�roco.

DESCOBERTAS Numa sala da igreja transformada em ateli�, especialistas da Rara – Rel�quia Ateli� de Restaura��o Art�stica trabalham no restauro da imagem de Nossa Senhora da Boa Viagem, que chegou aqui em 1714, pelas m�os de Francisco Homem Del Rey e tem 80 cent�metros de altura, 40cm de largura e 26cm de profundidade. Com equipamentos para verificar todos os detalhes, Luzia Marta Marques Gon�alves e Jussara Maria Rocha Alves revelam a necessidade de remo��o de pintura, pois havia at� quatro camadas de tinta sobre a pe�a sacra policromada e esculpida em madeira de lei. “Havia at� tinta plastificada”, afirma Luzia.
Jussara informa que dois dedos da m�o esquerda da pe�a tinham “sofrido”, no sentido mais exato da palavra, uma interven��o inadequada: no lugar da madeira, colocaram resina ep�xi. O jeito ent�o foi contratar o servi�o do escultor Guilherme Marques, que refez os dedos e tamb�m o nariz de um anjo querubim da base que estava quebrado.
Os olhos da pe�a tamb�m mereceram criteriosa interven��o e as restauradoras revelam uma hist�ria surpreendente, em que talvez nem todos os fi�is tenham reparado ao longo dos anos. � que, no lugar dos olhos de vidro originais, Luzia e Jussara encontraram “massa pintada” que deixava a imagem estr�bica. “Sempre fazemos as interven��es com a decis�o tomada em conjunto com o Iepha e o p�roco”, conta Luzia. A solu��o veio da especialista em pr�tese ocular para humanos Elizabeth Souza, que doou os olhos, com um pedido � par�quia: doar uma pr�tese ocular para uma crian�a que esteja precisando.
TECNOLOGIA “� uma imagem linda, espetacular”, afirma Luzia, contando que no manto da santa, sob as camadas de tinta, descobriu-se um azul mais claro salpicado de flores num tom mais forte. Nas bordas, assim como nas asas dos anjos, havia folhas de ouro, destacam as especialistas. Com todo carinho, as duas apontam um suave tom de rosa encontrado em outra parte do manto, com bot�es de rosa. J� na base, outra surpresa: debaixo de uma azul chapado, foram encontradas as cores que lembram o p�r do sol.
O trabalho do Laborat�rio de Ci�ncia da Conserva��o da Escola de Belas Artes (Lacicor/EBA) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi importante para o restauro da imagem da padroeira, sendo feitos exames como raio x, para conhecimento das t�cnicas construtivas e ultravioleta, para detectar as repinturas, vernizes e pigmentos usados. A equipe aguarda o resultado da espectroscopia de fluoresc�ncia de raio-x (FRX), que mostrar� os componentes qu�micos dos pigmentos.
HIST�RIA A hist�ria da Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem teve in�cio no s�culo 18. Em 1709, o portugu�s Francisco Homem del Rey conseguiu autoriza��o da coroa portuguesa por meio de cartas de sesmarias e se estabeleceu na regi�o onde hoje se encontra Belo Horizonte. Segundo as pesquisas, ele trouxe uma imagem da padroeira dos navegantes portugueses, Nossa Senhora da Boa Viagem, que o acompanhou na travessia do Oceano Atl�ntico.
Para proteger e homenagear a santa, Francisco ergueu em suas terras uma pequena capela de pau-a-pique. Como estava na rota dos tropeiros que passavam pela regi�o transportando riquezas do interior do pa�s, a igrejinha recebeu o nome de Nossa Senhora da Boa Viagem e passou a ser conhecida tamb�m como a padroeira dos viajantes.
Com o passar dos anos e a enorme devo��o dos fi�is, a capelinha ficou pequena para receber tanta gente e em seu lugar foi constru�da uma igreja maior. Mas, com a constru��o da capital, foi necess�rio erguer um novo templo – o atual Santu�rio Arquidiocesano de Adora��o Perp�tua Nossa Senhora da Boa Viagem, inaugurado em 1923, data em que a cidade de Belo Horizonte foi oficializada como arcebispado.

Mem�ria
TAREFA CUIDADOSA
Em 16 de abril de 2016, o Estado de Minas documentou o in�cio da terceira etapa das obras no Santu�rio de Adora��o Perp�tua e Igreja de Nossa Senhora da Boa Viagem. Para perfura��o da base e passagem do novo cabeamento el�trico nas laterais internas do templo houve a cuidadosa tarefa de retirada dos tacos de madeira. Tanta aten��o e, principalmente, per�cia com a talhadeira, eram necess�rias j� que as pe�as do revestimento voltariam, uma a uma, ao local de origem. A catedral recebia, assim, novos sons: no lugar dos c�nticos, dos salmos e das ora��es, ouvia-se o barulho do maquin�rio perfurando o piso. Em 18 de outubro do mesmo ano, ficou pronta a infraestrutura interna, incluindo o sistema de vigil�ncia, e a nova ilumina��o para valorizar a arquitetura neog�tica.
Centro de eventos religiosos

Santu�rio Arquidiocesano de Adora��o Perp�tua e catedral provis�ria de Belo Horizonte, a Igreja da Boa Viagem se tornou o centro de realiza��es dos grandes eventos religiosos da capital, na �poca do primeiro arcebispo dom Ant�nio dos Santos Cabral, o dom Cabral (1884-1967). Sempre em 15 de agosto, dia dedicado a Nossa Senhora, os cat�licos fazem prociss�es, participam de missas solenes e lotam o templo neog�tico localizado na Regi�o Centro-Sul. Em 15 de agosto de 1948, n�o foi diferente, e as festividades � padroeira da cidade foram registradas pelo Estado de Minas, que est� em plena comemora��o dos seus 90 anos de funda��o.