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Estado de Minas

Saiba o que realmente foi a Inconfid�ncia Mineira e o que resta do per�odo no Brasil

Na data em que se lembra a morte de Tiradentes, professor fala sobre mitos e ensinamentos da Inconfid�ncia Mineira, que h� 230 anos agitava a mais rica das possess�es portuguesas no mundo


postado em 21/04/2018 06:00 / atualizado em 21/04/2018 13:30

Luiz Carlos Villalta diz que os inconfidentes eram gente de carne e osso, sujeitos a vícios e fraquezas, mas exalta a figura de Tiradentes: 'Tinha noção crítica do momento pelo qual a colônia passava'(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)
Luiz Carlos Villalta diz que os inconfidentes eram gente de carne e osso, sujeitos a v�cios e fraquezas, mas exalta a figura de Tiradentes: 'Tinha no��o cr�tica do momento pelo qual a col�nia passava' (foto: Beto Novaes/EM/D.A Press)

Conspira��o, reuni�es na calada da noite e encontros secretos em fazendas e casar�es das vilas coloniais. H� 230 anos, na Capitania de Minas – a mais rica entre todas as possess�es portuguesas na �sia, Am�rica e �frica –, atingia o auge o movimento que entrou para a hist�ria como Inconfid�ncia Mineira e teve ramifica��es em S�o Paulo e Rio de Janeiro.

Certo de que h� muito para ser estudado, e comparado com o Brasil atual, o professor de hist�ria Luiz Carlos Villalta, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG),  desfaz alguns equ�vocos sobre o levante, que teve como figura mais representativa o alferes Joaquim Jos� da Silva Xavier, o Tiradentes (1746-1792).

No dia em que ocorre, em Ouro Preto, a tradicional cerim�nia c�vica para reverenciar a mem�ria dos inconfidentes, o especialista fala das li��es que nos chegam daquela �poca.

“Se 1789 ficou como marco, � bom saber que a grande agita��o ocorreu no ano anterior. Em abril de 1789, o movimento j� estava morto”, conta o autor dos livros Hist�ria de Minas Gerais – A Prov�ncia de Minas e Minas Setecentista, em parceria com a professora Maria Efig�nia Lage de Resende.

Diante do monumento a Tiradentes, na esquina das avenidas Afonso Pena e Brasil, em Belo Horizonte, Villalta diz que o “21 de abril” � outro ponto fundamental na hist�ria, pois confunde a cabe�a de muita gente. A data se refere � morte por enforcamento de Tiradentes, em 1792, no Rio.

Portanto, nada a ver com fim do levante ou a decreta��o da derrama, uma das palavras-chave no epis�dio.

“Na �poca, Portugal tinha o direito de cobrar o ‘quinto do ouro’, taxa de at� 20% sobre a produ��o do metal. Mas, se os mineradores n�o pagassem ao governo 100 arrobas de ouro anuais, a Coroa portuguesa poderia decretar a derrama, obrigando as c�maras municipais a fazer o povo pagar o valor necess�rio para chegar �quele total”, explica Villalta.

Passados dois s�culos e tr�s d�cadas do ponto alto do movimento, a li��o est� bem atual, “pois ficaram de heran�a a corrup��o desenfreada e o funcionamento da Justi�a”. Na avalia��o de Villalta, paulista de Taubat� e estudioso da Inconfid�ncia Mineira, “a Justi�a no Brasil n�o �, nem nunca foi para todos”.


“Um exemplo foi Tiradentes, o �nico dos inconfidentes punido com mais severidade pela Coroa. O funcionamento da Justi�a era tratar desigualmente os desiguais, n�o havendo igualdade jur�dica. Hoje a lei � igual, mas a Justi�a praticamente n�o � igual para todos.”

Lideran�a


Outro erro que se comete, alerta o professor, � nomear Tiradentes como l�der do movimento. “Na verdade, ele foi o homem a levar as ideias para o espa�o p�blico”, esclarece. E, destaca, quem se horroriza com a corrup��o nos dias de hoje � porque desconhece as falcatruas do per�odo colonial, em todas as esferas.


“A corrup��o sempre existiu naqueles tempos e os inconfidentes nunca foram santos. Muitos eram ricos, recebiam vantagens da Coroa, tinham poder e estavam envolvidos em neg�cios il�citos, entre eles o contrabando de ouro. Para resumir, eram pessoas de carne e osso.”

Mas Villalta faz quest�o de enaltecer a imagem de Tiradentes.

“Um grande her�i nacional, personagem consagrado na mem�ria popular como m�rtir e defensor da p�tria. Um homem que tinha no��o cr�tica do momento pelo qual a col�nia passava e queria que a riqueza de sua ‘p�tria’ (seu lugar de nascimento, Minas) n�o fosse drenada para fora por meio de impostos excessivos e do monop�lio comercial. Falava em liberdade e denunciava que altos tributos e monop�lio comercial transformaram Minas, uma capitania rica, em lugar de pobreza”, afirma o professor.


Fazendo jus � trajet�ria, os restos mortais dos inconfidentes repousam no Pante�o dos Inconfidentes, no Museu da Inconfid�ncia, na Pra�a Tiradentes, no Centro de Ouro Preto.

A exce��o � exatamente Tiradentes, que foi esquartejado, teve partes do corpo espalhadas pela Estrada Real e a cabe�a pendurada em pra�a p�blica em Vila Rica. O cr�nio depois desapareceu do lugar de “exibi��o” e nunca mais foi encontrado.


Cartas Chilenas


A mobiliza��o que resultaria na chamada Inconfid�ncia come�ou em 1785, com a circula��o, em Vila Rica, atual Ouro Preto, das Cartas Chilenas, poemas sat�ricos criticando Lu�s da Cunha Menezes, governador da Capitania de Minas de 1783 a 1788.


Nesse �ltimo ano, assinala Villalta, chegava ao Rio, vindo da Europa, o mineiro Jos� �lvares Maciel (filho), cunhado do tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, segunda autoridade militar da Capitania de Minas e um dos inconfidentes.

“Sabe quem o esperava no porto, no Rio? Tiradentes, que logo prop�s a rebeli�o contra Portugal, embora o rec�m-chegado n�o tenha dado muito cr�dito”, narra Villalta. Mesmo assim, o movimento vai crescendo e se espalha pela regi�o de S�o Jo�o del-Rei e outras localidades do Campo das Vertentes.

Em 8 de outubro de 1788, j� n�o havia mais como parar. E pairava sobre as Gerais o fantasma da derrama, pois, naquele ano, Lu�s Ant�nio Furtado de Castro do Rio Mendon�a, visconde de Barbacena, chegara a Minas com ordem de decret�-la. A situa��o gerou descontentamento, em especial nas pessoas ligadas a grupos privilegiados – contratadores, cl�rigos, militares, contrabandistas etc..

Na casa do p�roco Carlos Correia de Toledo, em S�o Jos� del-Rei (atual Tiradentes), alguns dos futuros inconfidentes come�am a arquitetar a conspira��o. H� sucessivos encontros em Vila Rica: no fim de dezembro, na casa do tenente-coronel Francisco de Paula Freire de Andrada, com a presen�a de Alvarenga Peixoto, �lvares Maciel e os padres Toledo e Rolim; e na casa do contratador de impostos Jo�o Rodrigues de Macedo, propriet�rio da Casa dos Contos.


Dela��o premiada


Para ajudar a entender o que estava ocorrendo � imprescind�vel conhecer o cen�rio no s�culo 18: novos ventos sopravam sobre o Ocidente, trazendo a filosofia de pensadores franceses que criticavam o poder absoluto dos reis, a administra��o colonial, o monop�lio comercial, a intoler�ncia religiosa e o sistema de trabalho.


“A Inconfid�ncia floresceu no ambiente de efervesc�ncia intelectual e pol�tica, como ocorria na Europa e Am�ricas, nesse caso em especial com a independ�ncia das 13 col�nias que deram origem aos Estados Unidos (1776)”, observa o professor.

No fim de 1789, a derrama foi suspensa e comunicada em 14 de mar�o do ano seguinte. Com a dela��o “premiada” feita por Joaquim Silv�rio dos Reis, o movimento dos inconfidentes � abortado e as pris�es ocorrem a partir de 2 de maio.

Ao entregar os inconfidentes � Coroa portuguesa, com a qual estava em d�bito, Silv�rio dos Reis teve sua d�vida perdoada.

“Fez uma den�ncia por escrito e uma dela��o premiada, porque teve benef�cios e n�o pagou suas d�vidas � Fazenda Real”, observa o professor. Preso durante tr�s anos, no Rio, Tiradentes foi enforcado em 21 de abril de 1792.


Educa��o


As homenagens aos 230 anos da Inconfid�ncia fortalecer�o os programas de educa��o patrimonial nas escolas de Ouro Preto, diz o secret�rio municipal de Cultura e Patrim�nio de Ouro Preto, Zaqueu Astoni Moreira.

Este ano, a cidade j� celebra, com a��es e eventos, os 280 anos do nascimento de Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, filho ilustre da terra; os 320 anos da chegada do bandeirante paulista Antonio Dias, fundador do primitivo arraial; e os 80 anos de tombamento do conjunto barroco pelo governo federal, quando Get�lio Vargas (1882-1954) era presidente.

(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press - 20/4/11)
(foto: Beto Novaes/EM/D.A Press - 20/4/11)


A face da conjura��o

Ao longo dos seus 90 anos, que se completaram em mar�o deste ano, o EM vem reservando espa�o constante � mem�ria dos inconfidentes. Em abril de 2011, foi publicada reportagem sobre o inconfidente Jos� Resende Costa, que viveu na Regi�o do Campo das Vertentes e morreu, aos 70 anos, em 1798, no degredo na Guin�-Bissau, �frica.

Envolvida com pesquisas e minucioso trabalho sobre os restos mortais desde 1993, na Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), a equipe do professor Eduardo Daruge (foto) fez a reconstitui��o facial do her�i.

Assim, o levante ganhava finalmente um rosto – na verdade, o �nico conhecido, at� hoje, de um integrante do movimento pela liberdade, reprimido em 1789 por ordem da rainha de Portugal, dona Maria I, a Louca.

Em Minas, a primeira a��o pedindo a transfer�ncia das ossadas dos conjurados mineiros partiu do poeta e autor da obra Hist�ria da Inconfid�ncia de Minas Gerais, Augusto de Lima J�nior (1889-1970).

REFRESCO PARA A MEM�RIA

» O dia 21 de abril � marco que se refere � morte de Tiradentes, enforcado no Rio de Janeiro nessa data, em 1792. A Inconfid�ncia ou Conjura��o Mineira se deu entre aproximadamente 1788 e 1789

» A palavra inconfidente tinha um sentido pejorativo e, aos olhos e ouvidos da Coroa portuguesa, significava traidor. Conjura��o quer dizer conspira��o e � mais apropriada aos ideais dos mineiros do s�culo 18

» A bandeira da rep�blica dos inconfidentes tinha no centro do pano branco um tri�ngulo vermelho simbolizando a Sant�ssima Trindade e a inscri��o retirada do poeta Virg�lio: Libertas quae sera tamem – Liberdade ainda que tardia. O formato foi adotado como bandeira de Minas Gerais

» A senha dos conspiradores era: “hoje � o dia do batizado”, uma refer�ncia � data da derrama. Isso foi combinado durante o batizado da filha de Alvarenga Peixoto

» Em Minas, na segunda metade do s�culo 18, houve outros movimentos que receberam o nome de inconfid�ncia: em Curvelo, Sabar� e Mariana. Mas nesses casos n�o houve a mesma repercuss�o da de 1789

» Em Minas, outra revolta memor�vel contra a cobran�a exorbitante de impostos foi a Sedi��o de Vila Rica, em 1720, que teve � frente Felipe dos Santos

enquanto isso...

EXPOSI��O DE DOCUMENTOS

At� sexta-feira poder�o ser vistos no Instituto Hist�rico e Geogr�fico de Minas Gerais (IHGMG), em Belo Horizonte, documentos in�ditos sobre a Inconfid�ncia Mineira (1788-1789).

O destaque vai para as “Cartas de encaminhamento”, enviadas em 1936, pela ent�o col�nia portuguesa de Mo�ambique, sobre o processo investigativo da exuma��o dos restos mortais dos inconfidentes Tom�s Ant�nio Gonzaga, Jo�o da Costa Rodrigues e Vitoriano Gon�alves Veloso, que cumpriram o degredo na �frica ordenado pela Coroa portuguesa.

A mostra � coordenada pela Comiss�o Cultural Permanente de Geografia e Ci�ncias Afins do instituto, formada pelos especialistas M�rcia Maria Duarte dos Santos, Marcos Paulo de Souza Miranda, Maria C�ndida Trindade Costa Seabra e Adalberto Mateus.

O IHGMG fica na Rua dos Guajajaras, 1.268, no Bairro Barro Preto, Regi�o Centro-Sul de BH, e est� aberto para visita��o de segunda a sexta-feira, das 13h30 �s 17h30. Entrada franca. Mais informa��es: www.ihgmg.org.br.


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