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Estado de Minas Patrim�nio Hist�rico

Trag�dia repetida: h� 50 anos, fogo consumiu livros raros no Cara�a

Cinquenta anos antes de o Brasil perder parte de seu acervo cultural no inc�ndio do Museu Nacional, labaredas devastavam o Cara�a e livros raros da biblioteca do col�gio mineiro


08/09/2018 06:00 - atualizado 08/09/2018 08:05

O fogo destruiu o colégio e o seminário e encerrou a história de um dos primeiros educandários de Minas na madrugada de 28 de maio de 1968(foto: Arquivo EM 29/5/68)
O fogo destruiu o col�gio e o semin�rio e encerrou a hist�ria de um dos primeiros educand�rios de Minas na madrugada de 28 de maio de 1968 (foto: Arquivo EM 29/5/68)

O ano de 2018 ser� lembrado, no futuro, como aquele em que o pa�s perdeu parte da sua mem�ria em meio aos escombros do Museu Nacional, no Rio de Janeiro. Mas os brasileiros de agora t�m como registro e li��o para n�o esquecer os 50 anos de outro inc�ndio devastador para a educa��o e a cultura, que p�s fim a um dos primeiros col�gios de Minas: o Cara�a, cujas terras ficam entre Catas Altas e Santa B�rbara, na Regi�o Central. Numa madrugada fria de 1968, o fogo destruiu quase por completo a escola e o semin�rio. Cerca de 15 mil livros, alguns deles raros, se transformaram em cinzas. N�o houve v�timas.

As investiga��es mostraram que a origem das labaredas estava num fogareiro el�trico com 500ml de cola de couro de boi usada na recupera��o dos livros. A subst�ncia transbordou e o fogo se propagou no primeiro andar, num ambiente prop�cio, j� que o interior era todo de madeira. No escuro, um ex-aluno que estava na enfermaria, dormindo – a porta desse servi�o era em frente � encaderna��o – acordou assustado sentindo o forte cheiro de queimado e deu o alerta. A partir da�, os seminaristas, nos dormit�rios do terceiro andar, foram retirados. N�o houve feridos e se encerrou ali um cap�tulo na hist�ria da institui��o.

O tempo passou e o Santu�rio do Cara�a, chamado de “Porta do C�u” se tornou, junto da religiosidade que o marca, um grande centro tur�stico, ambiental e cultural de Minas – administrado pela Prov�ncia Brasileira da Congrega��o da Miss�o, recebe milhares de visitantes do mundo inteiro. E quem estudou l� tem vivas as mem�rias de uma �poca. Nos pr�ximos dias 28 e 29, como ocorre anualmente, um grupo de ex-alunos vai se reencontrar no local, viajando de trem, para falar dos tempos de estudante e da trag�dia que atingiu o antigo col�gio em 28 de maio de 1968. “N�o podemos nos esquecer, at� para que n�o ocorra mais em lugar nenhum. Ficou um sentimento de tristeza e preocupa��o com o patrim�nio”, diz o presidente da Associa��o dos Ex-alunos dos Lazaristas e Amigos do Cara�a (Aealac), Mariano Pereira Lopes, de 74 anos, que estudou no Cara�a entre 1957 e 1962.

PERDAS Na edi��o de 29/5/1968, o assunto foi destaque no Estado de Minas: “O Col�gio Cara�a foi quase completamente destru�do, ontem, por um inc�ndio que durou oito horas e deu preju�zos de quase dois bilh�es de cruzeiros antigos. O fogo come�ou �s 3 horas da madrugada e foi debelado com o concurso de 100 homens do Corpo de Bombeiros. Somente a cole��o de livros da biblioteca do educand�rio, destru�da pelas chamas, estava avaliada em mais de um bilh�o de cruzeiros antigos. Outros danos foram provocados pela destrui��o dos laborat�rios, dormit�rios e salas de aula. Apenas a ala de resid�ncia dos padres, o refeit�rio e a igreja n�o foram atingidos”.

Com o tempo, o santuário do Caraça se tornou um grande centro turístico, ambiental e cultural(foto: Arquivo/EM)
Com o tempo, o santu�rio do Cara�a se tornou um grande centro tur�stico, ambiental e cultural (foto: Arquivo/EM)
E mais: “O Corpo de Bombeiros utilizou seis viaturas de pequeno e grande portes para conter o inc�ndio. N�o houve feridos, apesar de alunos e padres se encontrarem dormindo � hora em que se iniciou o sinistro. O grito de um aluno foi o sinal de alarme. No mesmo instante, padres e estudantes come�aram a abandonar o interior do col�gio, atirando roupas, livros, sapatos e dinheiro pelas janelas dos dormit�rios, no terceiro andar. Era a corrida contra a morte. As escadas que conduzem ao t�rreo foram envolvidas pelas chamas e muitos alunos encontraram dificuldades para transp�-las. O fogo consumiu quase tudo, desde obras dos grandes escritores modernos at� preciosidades liter�rias das l�nguas francesa, italiana e latina. Somente uma cole��o em latim, uma das �nicas ainda existentes no mundo, tinha seu valor calculado em mais de vinte milh�es de cruzeiros antigos”.

O diretor do Cara�a, padre Lauro Pal�, que estudou l� entre 1953 e 1956, acredita que o bem mais precioso que se perdeu com o inc�ndio foi “o ambiente que havia, a meninada estar no meio do mato, vivendo intensamente feliz uma vida de estudos, ora��o, amadurecimento, descobrimento do mundo. Hoje n�o conseguir�amos de novo aquela riqueza de afetos, aquele conjunto de coisas cerimoniosas que nos levavam da inf�ncia, pela adolesc�ncia, a uma juventude aberta, a uma vida adulta cheia de sa�de, de cultura, de desafios que venc�amos com naturalidade, com a simplicidade de quem sentia que estava preparado para a vida e suas tarefas”.

HIST�RIA Chamado de Col�gio Imperial, o Cara�a, por onde passaram mais de 10 mil alunos, abriu como escola em 1820 e s� fechou as portas para os alunos seminaristas em 1968. Quatro anos depois, embora sem deixar de ser uma casa religiosa, se transformou em pousada.

Livros salvos do incêndio, que transformou em cinzas cerca de 15 mil volumes(foto: Arquivo EM)
Livros salvos do inc�ndio, que transformou em cinzas cerca de 15 mil volumes (foto: Arquivo EM)

Al�m do conjunto hist�rico, onde sobressai a igreja em estilo neog�tico, h� a parte ambiental. Integrante da Reserva da Biosfera da Serra do Espinha�o, o Cara�a est� na categoria de Reserva Particular do Patrim�nio Natural (RPPN), com 19 mil hectares. Na regi�o, h� muitas variedades de orqu�deas e vivem centenas de esp�cies de p�ssaros e de dezenas de mam�feros, universo reconhecido pelos naturalistas que visitaram a regi�o, no s�culo 19, entre eles o franc�s Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853).

Conhecer o Cara�a � tamb�m entrar num livro de hist�ria do Brasil. As p�ginas dos prim�rdios citam a carta-patente, datada de 24 de abril de 1766, na qual o fundador do local, o portugu�s Carlos Mendon�a T�vora, conhecido como Irm�o Louren�o de Nossa Senhora – n�o h� registro da data de nascimento, apenas de sua morte, em 1819 – recebe autoriza��o do comiss�rio geral da Terra Santa nos reinos de Portugal e suas conquistas, Frei Manoel de S�o Carlos, para pedir esmolas e arrecadar dinheiro para a Ordem de S�o Francisco.

De acordo com as pesquisas, o Irm�o Louren�o, tido e havido como um homem misterioso, pois sua identidade nunca foi esclarecida, chegou � regi�o em 1763. Pertencente � fam�lia dos T�voras, nobre, ele teria escapado ao exterm�nio comandado pelo Marqu�s de Pombal, em Portugal, depois de um atentado ao rei dom Jos� I. O certo � que, 11 anos depois, ele inaugurou uma pequena capela em estilo barroco, da qual restam dois altares, restaurados, nas laterais da igreja que se v� hoje – datada de 1883, a substituta � considerada a primeira neog�tica do Brasil.

As terras do Cara�a chegaram �s m�os de dom Jo�o VI, que ficou no Brasil de 1808 a 1821, mediante testamento. Ao morrer, em 1819, Irm�o Louren�o, que est� enterrado dentro da igreja, sob o altar de Santo Ant�nio, legou a igreja e toda a �rea ao rei, desejando que ali fosse constru�da uma escola e que mantivesse o cunho religioso. Um ano depois, o monarca doou o conjunto � Congrega��o da Miss�o dos Padres Lazaristas, dando in�cio � fase denominada Cara�a portugu�s.

 

Eterniza��o on-line

Um site criado na internet busca unir a popula��o numa corrente para que o Museu Nacional do Brasil continue vivo, pelo menos em uma vers�o on-line. A p�gina EternoMuseuNacional.com convida todos que algum dia visitaram o local a postar as pr�prias fotos e v�deos do acervo em seus perfis no Instagram, usando a hashtag #EternoMuseuNacional. O conte�do ser� direcionado automaticamente para o site, onde os usu�rios poder�o visualizar todo o material. Aos poucos, o site pretende acrescentar informa��es descritivas para cada pe�a postada.

Tesouro da natureza

(foto: Arquivo EM)
(foto: Arquivo EM)

Tombado desde 1955 pelo Instituto do Patrim�nio Hist�rico e Art�stico Nacional (Iphan), o Cara�a fabrica vinhos, tem biblioteca com25mil livros, entre eles o
Incun�bulo, de 1489, e outro com anota��es feitas a bico de pena por dom Pedro II, mant�m as velhas catacumbas e se orgulha da tradicional visita noturna ao adrodo lobo-guar� (Chrysocyon brachyurus), sempre prontopara devorar peda�os de frango postos numa bandeja pelos padres vicentinos. A presen�a do lobo, sem d�vida, � atrativo para gente de todas as idades, principalmente para as crian�as.


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