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Estado de Minas

EM reconta passagem de Jim Jones por BH 40 anos ap�s massacre religioso

No dia em que se completam quatro d�cadas do suic�dio de 900 pessoas comandadas pelo l�der messi�nico, reportagem especial relembra passos de norte-americano pela capital mineira


postado em 18/11/2018 06:00 / atualizado em 18/11/2018 08:33

O líder da seita era conhecido por sua afinidade com crianças e morou em Belo Horizonte com três filhos adotivos e um natural(foto: Leandro Couri/Reprodução)
O l�der da seita era conhecido por sua afinidade com crian�as e morou em Belo Horizonte com tr�s filhos adotivos e um natural (foto: Leandro Couri/Reprodu��o)

Naquele ano, os irm�os Piri�s, Orlando e Sebasti�o Patr�cio, aterrorizavam o sert�o mineiro, saqueando s�tios e levando p�nico a fam�lias, enquanto Ramiro, o “Bandido da Cartucheira”, dava trabalho � pol�cia e se transformava em uma lenda nos arredores de Belo Horizonte. Temer o trio era a regra, em um tempo em que cada movimento dos criminosos locais que fizeram fama ocupava grande parte do notici�rio local.

Mas, depois de 18 de novembro de 1978, portanto h� exatos 40 anos, eles sa�ram repentinamente de cena. Nas p�ginas dos jornais, ganhava espa�o uma trag�dia que horrorizou todo o mundo: o suic�dio coletivo comandado pelo norte-americano James Warren Jones (1931-1978), o pastor Jim Jones, l�der da seita Templo do Povo. Em um acampamento em Jonestown, na Guiana, Am�rica do Sul, cerca de 900 pessoas morreram depois de ingerir veneno com suco de frutas. O que nem todos sabem � que, para contar a hist�ria desse l�der messi�nico, � preciso passar pela capital mineira. Dezesseis anos antes da trag�dia, Jim Jones morara no Bairro Santo Ant�nio, em uma ent�o pacata Regi�o Centro-Sul. A cidade longe do mar e protegida por montanhas foi considerada, no in�cio da d�cada de 1960, um dos nove lugares no planeta para se esconder do apocalipse nuclear ou fim dos tempos.

Repórteres diante da casa de número 203 da Rua Marabá, dias depois da tragédia: vizinhança perplexa(foto: Alvimar de Freitas/Arquivo EM - 22/11/1978)
Rep�rteres diante da casa de n�mero 203 da Rua Marab�, dias depois da trag�dia: vizinhan�a perplexa (foto: Alvimar de Freitas/Arquivo EM - 22/11/1978)


Morador desde que nasceu de uma casa quase em frente do n�mero 203 da Rua Marab�, onde Jim Jones viveu com a fam�lia entre 1962 e 1963, o banc�rio �der Geraldo de Souza, de 65 anos, casado, se lembra muito bem do “homem alto, rosto arredondado, sempre de terno preto e carregando uma pasta preta”, que ele via sair ou chegar em casa. “Falava ingl�s, nunca portugu�s, da mesma forma que os filhos, que ent�o eram mais ou menos da minha idade”, conta, em refer�ncia ao americano que chegou � capital mineira em 11 de abril de 1962, segundo registro da �poca do Departamento de Estrangeiros da Pol�cia Federal.
Éder Geraldo de Souza mora desde criança na mesma rua do imóvel, que hoje já não guarda semelhanças com a fachada da década de 1970, e conta que brincava com os filhos de Jim Jones: 'Falavam nglês, nunca português'(foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)
�der Geraldo de Souza mora desde crian�a na mesma rua do im�vel, que hoje j� n�o guarda semelhan�as com a fachada da d�cada de 1970, e conta que brincava com os filhos de Jim Jones: 'Falavam ngl�s, nunca portugu�s' (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)


Aquele era um tempo em que Belo Horizonte ainda permitia brincadeiras naquela rua de cal�amento, tranquila, bem diferente da via agitada de hoje, que desemboca na Avenida Prudente de Morais. “�s vezes, lanchava na casa deles, comia biscoitos e chupava laranja. Lembro-me dos adotados, um negro e dois asi�ticos, e do filho biol�gico do casal”, recorda-se o banc�rio aposentado. A casa n�o dispunha de muitos m�veis, acrescenta: “Tinha o b�sico, a mudan�a que trouxeram. E havia uns colch�es espalhados pela ch�o”. A moradia foi ocupada pela fam�lia norte-americana por 10 meses, per�odo em que l� viveram Jim Jones, a mulher, Marceline Mae Jones, o filho biol�gico, Stephan, e os adotivos: James e os coreanos Lew Eric e Suzanne. “N�s cham�vamos o menino negro de Smith”, conta �der.

CRIAN�AS
Geralmente no fim da tarde, quando Jim Jones chegava do trabalho, costumava bater papo com um vizinho de frente, que falava ingl�s. O que impressionava �der, ent�o com quase 10 anos, era o n�mero de crian�as adotadas pelo casal. Por isso mesmo, quando soube da trag�dia ocorrida em um s�bado � noite, na Guiana, imaginou que Jim Jones poderia ter estado no Brasil � procura de crian�as. “Todo mundo ficou muito assustado. Nosso pa�s era pobre, atrasado, acredito que ele estivesse aqui na esperan�a de algu�m lhe dar uma crian�a carente.”

Na sala de casa, na tarde de uma segunda-feira, o banc�rio aposentado volta a um per�odo da vida que n�o esqueceu. “Muitos adultos que conheciam melhor essa hist�ria morreram, outros se mudaram, e h� aqueles que n�o est�o com boa mem�ria. Mas, guardadas as devidas propor��es, acho que Jim Jones pode ser comparado a Hitler (Adolph Hitler, 1889-1945, l�der do nazismo), devido ao fanatismo. Talvez at� estivesse pensando em algo bom, mas foi pelo caminho errado”, acredita �der que, orgulhoso do bairro em que vive, conta que mora na mesma casa desde que veio ao mundo.

A equipe do Estado de Minas esteve por duas vezes na casa de n�mero 203 da Rua Marab�, que, depois da fam�lia Jones, teve outros moradores. Na primeira vez, pelo interfone, uma pessoa que trabalha para a fam�lia informou que os patr�es n�o estavam e que n�o poderia fornecer o telefone. Nova investida e outra mulher, tamb�m pelo interfone, contou que Jim Jones viveu na casa ao lado, hoje um centro esp�rita – um equ�voco, j� que os demais vizinhos indicam o local como a antiga resid�ncia do pastor. A constru��o j� n�o guarda semelhan�a com o antigo im�vel, em estilo moderno dos anos 1950/1960.

No lugar da grade, que deixava � mostra o jardim, foi erguido um muro. Reportagem da jornalista Maya Santana (leia depoimento), rep�rter do Estado de Minas na �poca, assegura o endere�o como do l�der da seita Templo do Povo (em ingl�s People’s Temple Church). Inclusive, foto da �poca, pertencente ao arquivo do EM registra um grupo de rep�rteres diante do im�vel de n�mero 203, dias depois da trag�dia na Guiana.

Imóvel onde morou o líder da seita Templo dos Povos durante sua passagem por Belo Horizonte(foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)
Im�vel onde morou o l�der da seita Templo dos Povos durante sua passagem por Belo Horizonte (foto: Leandro Couri/EM/D.A PRESS)


DEPOIMENTO
V�timas de um m�stico ensandecido - Maya Santana, jornalista (*)


“Eu tinha 27 anos, come�ara a trabalhar havia pouco na reda��o do Estado de Minas, quando o editor de Cidade, Rog�rio Perez, me incumbiu de fazer a grande reportagem do dia: contar como havia sido a misteriosa passagem por Belo Horizonte, 16 anos antes, do reverendo americano Jim Jones, que acabava de chocar o mundo ao induzir � morte cerca de 900 pessoas, em Jonestown, na Guiana. O suic�dio coletivo tornou-se a principal not�cia internacional daquele novembro. E meu chefe me deu a miss�o de descobrir tudo o que aquele macabro personagem havia feito durante o tempo em que morou na capital mineira.

Daqueles dias, sem celular nem internet, me lembro muito bem do profundo impacto que as mortes causaram, sobretudo porque entre as v�timas do m�stico ensandecido havia centenas de crian�as. Eu me recordo tamb�m da surpresa dos belo-horizontinos ao tomar conhecimento que Jim Jones havia morado por mais de um ano na cidade, sem chamar a aten��o de ningu�m. Mas o que ficaria para sempre gravado em minha mem�ria � a contradi��o entre o perfil do homem ‘bom e generoso’ tra�ado pelos vizinhos da casa onde morou na Rua Marab�, n�mero 203, no Bairro Santo Ant�nio, e o monstro que revelou ser o l�der da seita Templo dos Povos.

Voltei para a reda��o do jornal especialmente impressionada com o depoimento de uma senhora que trabalhava para uma fam�lia vizinha dos Jones – o pastor era casado e tinha quatro filhos, tr�s deles adotivos. Para ela, aquele homem alto e sempre alegre jamais poderia ter causado tal trag�dia. ‘� dif�cil a gente acreditar. Ele era muito bom. Enchia sacos de mantimentos e distribu�a entre os pobres’, contava, espantada. Muito surpresos ficaram tamb�m outros vizinhos, evidenciando que, pelo menos em Belo Horizonte, Jim Jones havia se comportado como um verdadeiro pastor. A cobertura das suas pegadas pela capital durou v�rios dias e atraiu a imprensa nacional e internacional.

Investigar as a��es do americano em BH teve profundo impacto sobre mim, naquele distante 1978, quando iniciava minha carreira de jornalista. Fiquei t�o marcada com a hist�ria daquele homem que li praticamente tudo sobre ele. E, 40 anos depois, ainda leio. Nunca saiu da minha cabe�a o trecho de uma de suas biografias, no qual o autor conta que, quando nasceu, em 13 de maio de 1941, sua m�e, Lynetta Putnam, estava certa de ter ‘dado � luz um messias’. Mas Jim Jones passaria para a hist�ria como o mentor do maior suic�dio coletivo de todos os tempos.”


(*) Maya Santana foi rep�rter do Estado de Minas na d�cada de 1970


BH: REF�GIO NUCLEAR PLANET�RIO


Antes de morar na Rua Marab�, no Bairro Santo Ant�nio, Regi�o Centro-Sul de Belo Horizonte, o pastor norte-americano Jim Jones, que horrorizaria o mundo ao liderar o suic�dio de 900 pessoas na Guiana, teria passando algum tempo no Hotel Financial, na Avenida Afonso Pena, Centro da capital. Completando sete d�cadas neste ano, o hotel, de propriedade do empres�rio Ant�nio Luciano Pereira Filho (1913-1990), era dos mais importantes do estado nas d�cadas de 1950 e 1960. Segundo um funcion�rio, hoje n�o h� mais documentos que possibilitem verificar a estada de Jones. “O registro do h�spedes era bem diferente do atual. Cada um preenchia uma ficha com dados pessoais, que era enviada � pol�cia. As mesmas informa��es eram armazenadas em um livro, que ficava no hotel. Mas n�o temos mais esses livros”, contou. Na �poca, o chamado arquivo morto era queimado de cinco em cinco anos. Outra informa��o � que Jim Jones teria trabalhado na extinta lavanderia Eureka, o que foi descartado, em 1978, pelo diretor-comercial da empresa, que fizera levantamento no departamento pessoal e n�o encontrara tal registro de emprego de um estrangeiro.

Coincide com a passagem do l�der messi�nico por Belo Horizonte uma reportagem de autoria da jornalista Carolina Bird, publicada na revista norte-americana Esquire, em janeiro de 1962, ano em que Jim Jones chegou � capital mineira. Em tempos de Guerra Fria, como se tornou conhecida a corrida armamentista e nuclear que op�s os Estados Unidos � Uni�o Sovi�tica, a reportagem listava os nove lugares no mundo para se proteger no caso de uma hecatombe at�mica, paranoia que tomava conta dos americanos. Para escrever a mat�ria, a jornalista se baseou em trabalhos de especialistas militares em radia��o at�mica e da Defesa Civil dos Estados Unidos.

O objetivo dos pesquisadores era “encontrar �reas que n�o fossem afetadas pelos danos diretos de ataques ou pelas cinzas nucleares, mas que tamb�m tivessem recursos suficientes para o homem reconstruir uma civiliza��o industrial”. Na rela��o de locais, constavam, no Hemisf�rio Norte, Eureka, na Calif�rnia (EUA), Cork (Irlanda), e Guadalajara (M�xico). No Hemisf�rio Sul, figuravam o Vale Central do Chile, Mendoza (Argentina), Melbourne, (Austr�lia), Christchurch (Nova Zel�ndia), Tananarive (Madagascar, na �frica), e o �nico representante do Brasil: Belo Horizonte.

Entre as caracter�sticas positivas apontadas pela reportagem da Esquire em BH, cidade ent�o com cerca de 600 mil habitantes, estavam a localiza��o, distante do mar e protegida por montanhas; a produ��o de latic�nios, fundamental para longos per�odos de escassez de alimentos; a riqueza mineral, essencial para a produ��o industrial; e tamb�m o clima tropical, seco, o que garantiria a sa�de, em especial para impedir doen�as pulmonares.

TRAG�DIA NA GUIANA
Quem tem em torno de 50 anos ou mais certamente se lembra do suic�dio coletivo na Guiana. Para os mais jovens, interessados em hist�ria, uma pesquisa em arquivos de jornais ou na internet descortina o horror em massa. O tr�gico fim dos seguidores do Templo do Povo come�ou com a morte do deputado americano Leo J. Ryan, que investigava den�ncias contra a seita, e tamb�m as do rep�rter Don Harrys, de 42, da rede NBC, do cinegrafista Robert Brow, de 36, da mesma emissora, do fot�grafo Gregory Robinson, de 27, do jornal San Francisco Examiner e de Patr�cia Park, de 18, uma das seguidoras da seita. O epis�dio causou como��o e levou o ent�o presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, a destacar que o “empenho de Harrys em conseguir informa��es o levou a uma tr�gica morte”.

Segundo pesquisa em jornais da �poca, Jim Jones pregava o suic�dio coletivo caso surgissem amea�as � sua seita, “e, aparentemente, deu ordem e o exemplo ap�s a investiga��o do representante da Calif�rnia no congresso (deputado americano Leo J. Ryan) e dos jornalistas”.

A “imola��o coletiva” come�ou com uma rajada de 85 tiros de armas semiautom�ticas, conforme um advogado contou � imprensa na capital da Guiana, Georgetown. A testemunha prosseguiu: ap�s matar o congressista americano e outros integrantes da comitiva, “os fan�ticos religiosos usaram veneno durante um culto”. Entre os seguidores da seita Templo do Povo havia “grupos de negros pobres, pessoas de classe m�dia de todas as etnias, viciados em drogas, criminosos, prostitutas que viviam nas ruas, bem como enfermeiras, engenheiros, universit�rios, funcion�rios do governo e advogados”.

Logo depois do culto fatal, cerca de 80 pessoas, a maioria na faixa de 60 anos, conseguiram escapar, alegando “que ainda n�o era hora de morrer”. Segundo os relatos, o pastor falava em “fraternidade e igualdade, exortando � integra��o”, mas tamb�m dizia que a matan�a e a destrui��o estavam pr�ximas. Um dos filhos do pastor, que estava nos Estados Unidos na �poca do suic�dio coletivo, contou que o pai, ent�o com 46 anos, andava “doente, paranoico e drogado”. Jim Jones foi encontrado com um tiro na cabe�a. Na propriedade de 12 mil hectares, foram achados mais de US$ 1 milh�o em moeda e ouro.

Cronologia fatal

 

 

(foto: San Jose Mercury Photo/Arquivo EM - 1978)
(foto: San Jose Mercury Photo/Arquivo EM - 1978)

1950
O norte-americano James Warren Jones, que se tornou conhecido como pastor Jim Jones, funda a seita Templo do Povo, em Indian�polis, capital do estado de Indiana, nos Estados Unidos. Mais tarde, a sede � transferida para S�o Francisco, na Calif�rnia, atraindo maior n�mero de pessoas.

 

1962
Em janeiro, a revista norte-americana Esquire publica reportagem indicando nove locais no mundo para se proteger do apocalipse. Belo Horizonte � a �nica cidade brasileira citada.

 

1962/1963
Durante cerca de 10 meses, Jim Jones e fam�lia vivem em uma casa da Rua Marab�, no Bairro Santo Ant�nio, Regi�o Centro-Sul de BH. Antes, o pastor teria morado no Hotel Financial, no Centro da capital.

(foto: Alvimar de Freitas/Arquivo EM - 22/11/1978)
(foto: Alvimar de Freitas/Arquivo EM - 22/11/1978)

 

1978
Em 18 de novembro, integrantes da seita Templo do Povo, liderada por Jim Jones, matam cinco pessoas: um deputado dos Estados Unidos, que havia ido � Guiana para investigar o grupo, tr�s jornalistas e uma jovem.

 

1978
Na noite de 18 de novembro ocorre o suic�dio coletivo em Jonestown, na Guiana: cerca de 900 integrantes do Templo do Povo morrem depois de ingerir veneno com suco de fruta.

(foto: AFP)
(foto: AFP)

 


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