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Estado de Minas

Tr�s anos depois, ningu�m foi condenado por trag�dia de Mariana; processo na Justi�a n�o tem data para julgamento

Trag�dia em 2015 do rompimento da Barragem de Fund�o, maior desastre ambiental do pa�s, foi insuficiente para que governo e empresas evitassem sua repeti��o


26/01/2019 07:00 - atualizado 26/01/2019 09:12

Casa em Bento Rodrigues destruída pela lama em novembro de 2015
Casa em Bento Rodrigues destru�da pela lama em novembro de 2015 (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A.Press)


Era 5 de novembro de 2015, 40 milh�es de metros c�bicos de lama e rejeitos de min�rio de ferro soterraram o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, na Regi�o Central de Minas Gerais, e percorreram quil�metros at� o mar. A trag�dia provocou a morte de 19 pessoas, contaminou o Rio Doce, mudou a vida de 500 mil habitantes das mais de 40 cidades de Minas Gerais e do Esp�rito Santo  atingidas pelo vazamento, que se tornou o maior desastre ambiental da hist�ria do pa�s.


Dona da barragem, a Samarco e suas controladoras – a Vale e a BHP Billiton – tratam o rompimento como acidente. O Minist�rio P�blico, como crime. Em meio � disputa judicial, muito pouco foi feito para reparar as perdas das v�timas e o estrago ao meio ambiente.

Respons�vel pela condu��o do caso em Mariana, o promotor Guilherme de S� Meneghin lamentou a reedi��o de um filme que ele j� viu. “O que a gente percebe, claramente, � que o Brasil n�o aprende com as li��es da hist�ria”, diz, em entrevista ao Estado de Minas. “O que foi feito? Absolutamente nada. N�o tem uma lei proibindo esse tipo de barragem, exigindo mais seguran�a para as barragens, nosso licenciamento ambiental continua prec�rio. E, no outro lado, quando esses crimes ocorrem, a responsabiliza��o das empresas e dos respons�veis � muito dif�cil.”

Tr�s anos depois do desastre ambiental, ningu�m foi preso. O processo envolvendo executivos da Samarco, Vale e BHP Billiton tramita na Vara Federal de Ponte Nova, ainda sem data para julgamento. Das 68 multas aplicadas por �rg�os ambientais, apenas uma est� sendo paga (em 59 parcelas). O impacto ambiental permanece, com a contamina��o do Rio Doce. Embora tenham obtido na Justi�a estadual benef�cios como o aluguel de resid�ncia, aux�lio financeiro mensal e assessoria t�cnica para come�ar a refazer a vida, as v�timas ainda lutam por indeniza��o.

Ver galeria . 26 Fotos  Tragédia de Brumadinho - Rompimento de rejeitos da Barragem 1 da Mina Feijão (Córrego Feijão)Gladyston Rodrigues/EM/D.A press
Trag�dia de Brumadinho - Rompimento de rejeitos da Barragem 1 da Mina Feij�o (C�rrego Feij�o) (foto: Gladyston Rodrigues/EM/D.A press )


“Apesar de ainda n�o termos uma indeniza��o final, as fam�lias n�o est�o desamparadas. Mas, infelizmente, nem todas as conquistas foram replicadas na Justi�a Federal para as v�timas do restante da bacia”, afirma Guilherme Meneghin, referindo-se aos moradores dos demais munic�pios atingidos pelos rejeitos de Mariana e cujas a��es tramitam na Justi�a Federal. Para o promotor, o ideal seria que a legisla��o brasileira trouxesse em seu texto essas garantias, de forma que fossem aplicadas a qualquer v�tima de crime ambiental. Al�m de trazer isonomia para uma briga entre grandes empresas e moradores de �reas onde as mineradoras est�o instaladas.

Mesmo quem conseguiu fechar acordos n�o tem a garantia de receber a indeniza��o. O advogado Leonardo Amarante, que representa cerca de 9 mil pescadores – a maioria vinculada � federa��o da categoria –, que o diga. Depois de fechado o acordo entre as mineradoras e cerca de 1,5 mil profissionais, no �ltimo dia 27 de dezembro, ele foi pego de surpresa com a liminar judicial alterando as regras acertadas extrajudicialmente, o que implicar� na  redu��o do valor da indeniza��o. O advogado recorreu da decis�o ao Tribunal Regional Federal da 1ª Regi�o (TRF1). A expectativa � que o recurso seja analisado na semana que vem. “Essas idas e vindas e esses retrocessos � que explicam o acidente de hoje (ontem)”, argumenta.

“RID�CULAS” A mineradora Samarco diz que firmou 16 acordos com parentes de v�timas – cujos valores n�o foram revelados. No final do ano passado, a Funda��o Renova – criada a partir de um acordo entre a Samarco, a Uni�o e os estados prejudicados – contabilizava pagamento de R$ 1,2 bilh�o a t�tulo de aux�lios e compensa��es. Ainda segundo o instituto, 10.777 fam�lias recebem aux�lio mensal de um sal�rio m�nimo, acrescido de 20% por dependente e do equivalente a uma cesta b�sica do Dieese.

A Renova contabilizou ainda cerca de mil obras de recupera��o de infraestruturas danificadas, como casas, propriedades rurais e escolas, reconstru��o de pontes, cercas, currais, po�os artesianos e pinguelas, conten��es de taludes e encostas. Ao todo, 141,6 quil�metros de acessos foram reformados ou passaram por manuten��o e foram refeitos 205 quil�metros de cercamentos em propriedades rurais. Foram reformadas 101 resid�ncias e propriedades rurais, al�m de 26 com�rcios e 186 quintais e lotes, segundo a Renova.

Tamb�m foram reformadas pra�a, avenida, escola e quadra poliesportiva. Parte dos 157 mil metros c�bicos de rejeitos retirados do munic�pio foi deslocada para o Parque de Exposi��es para amplia��o da �rea. Para o promotor Guilherme Meneghin, as a��es ambientais executadas pela Funda��o Renova at� o momento foram “rid�culas”.


At� quando?


“N�o mudou nada, e a barragem que rompeu em Brumadinho n�o estava entre as de risco. Ent�o, a gente v� que n�o tem seguran�a. At� quando? A pergunta � esta: at� quando vamos perder vidas? At� quando?”, afirma Edil�ia M�rcia dos Santos, de 42 anos. Ela � uma das moradoras de Bento Rodrigues, subdistrito de Mariana, na Regi�o Central de Minas, arrasado pelo rompimento da Barragem de Fund�o, da mineradora Samarco. “Estou me sentindo l� em Brumadinho. A gente, que viveu isso na pele, fica pensando o que pode fazer, em que pode ajudar”, diz ela. Desde que Bento Rodrigues foi destru�do, h� tr�s anos e dois meses, Edil�ia mora em casa alugada, com o marido e os dois filhos. Eles ainda lutam pelos seus direitos. “Ficamos brigando para que nossas casas sejam constru�das e para receber indeniza��o.”   (Fl�via Ayer)

 

 


tr�s perguntas para...


Guilherme de S� Meneghin,
promotor de Justi�a em Mariana

Depois do desastre de Mariana, como explicar mais um rompimento de barragem com rejeitos de min�rios?
� lament�vel que um desastre como esse, semelhante ao de Mariana, venha a ocorrer novamente. O que a gente percebe, claramente, � que o Brasil n�o aprende com as li��es da hist�ria. J� s�o v�rios os rompimentos de barragem, n�o � s� o de Mariana. Tivemos em Macacos, outros em Ira�, Mirandinha, isso s� para falar os mais recentes em Minas Gerais. E o que foi feito? Vamos falar sobre Mariana, que foi o mais grave. Absolutamente nada. N�o tem uma lei proibindo esse tipo de barragem, exigindo mais seguran�a para as barragens, o nosso licenciamento ambiental continua prec�rio. E, no outro lado, quando esses crimes ocorrem, a responsabiliza��o das empresas e dos respons�veis � muito dif�cil. Nossa lei � completamente insuficiente e despreparada para lidar com uma quest�o t�o grave, o que � fruto de leni�ncia da nossa classe pol�tica em aprovar leis que realmente protejam as pessoas e o meio ambiente desse tipo de desastre.

� essa legisla��o insuficiente que justifica a impunidade no caso de Mariana?
Podemos olhar sob tr�s aspectos: penal, ambiental e civil. No penal, de fato, ningu�m foi punido. O processo est� tramitando na Vara Federal de Ponte Nova e, at� o momento, ningu�m foi preso e ningu�m foi punido. Do ponto de vista ambiental, as a��es que eles executaram por meio da Funda��o Renova foram rid�culas at� o momento. N�o houve uma repara��o, o rio continua polu�do e grande parte das margens do rio est� completamente deteriorada. Do ponto de vista c�vel, pelo menos conseguimos nos afastar dos limites da lei, no sentido positivo. Conseguimos uma s�rie de garantias que n�o est�o previstas em lei e conseguimos judicialmente.

Que garantias s�o essas?
Por exemplo, a casa alugada, aux�lio financeiro mensal, assessoria t�cnica, direito a invers�o ao �nus da prova (possibilidade de o juiz interpretar mais favoravelmente � v�tima), tudo isso foi fruto de uma a��o civil p�blica ajuizada em Mariana e que, depois, foi em parte copiada para o restante da bacia pelo Minist�rio P�blico Federal. Ter�amos que ter uma lei que pegasse todas as inova��es que trouxemos e as aplicasse a todas as v�timas de desastres. Se voc� aplicar o C�digo Civil friamente a um desastre como esse, voc� vai tratar partes absolutamente desiguais, grandes empresas com escrit�rios enormes, contra uma pessoa que tinha um patrim�nio pequeno e tem at� dificuldade de provar esse patrim�nio. A pessoa �s vezes teria que esperar 10, 20, 30 anos para algum tipo de repara��o.

 

an�lise da not�cia
A reprise do descaso
Marc�lio de Moraes


Quantas outras barragens ter�o que se romper para que acionistas, executivos, governos municipal, estadual e federal sejam responsabilizados e punidos de forma a impedir que novas trag�dias se repitam? Exatos 1.176 dias depois do rompimento da Barragem de Fund�o, em Mariana, no maior desastre ambiental do estado, a barragem da mina C�rrego do Feij�o, da Vale, em Brumadinho, se rompe,  no que  ser� a maior trag�dia em vidas perdidas. N�o houve terremoto. N�o houve uma tempestade. O que rompeu a barragem na Grande BH foi o total descaso das autoridades, que continuam fazendo vistorias que atendem ao interesse das empresas – j� que os “ambientalistas s�o xiitas” –; dos acionistas, que enxergam na maximiza��o do lucro um fim em si, e dos executivos, que se sujeitam � press�o por resultados e repassam essa busca, por vezes insana, a todo o corpo da empresa.

Os estragos ambientais e as vidas que se perderam em Mariana e em Brumadinho, n�o t�m volta. E n�o h� dinheiro que pague – at� porque as v�timas de Mariana n�o receberam a indeniza��o devida pela mineradora –, as perdas de moradores que tiveram suas casas destru�das, de horticultores, que tiveram suas culturas perdidas total ou parcialmente, e das pousadas, que est�o fechadas. Mas todas as perdas materiais viram detalhe diante do fato de haver 150 desaparecidos. � inadmiss�vel que se possa imaginar que Minas, um estado minerador desde a sua funda��o, n�o tenha o devido zelo com a atividade na qual sua economia se estruturou.

As empresas fazem o que est� previsto na lei? Ent�o que se mude a lei para tornar as exig�ncias mais rigorosas. Que se obriguem os acionistas a abrir m�o de parte do lucro para que as barragens ofere�am nenhum risco. Que se estabele�a a pris�o de diretores e respons�veis t�cnicos em casos graves, como o ocorrido em Mariana e ontem em Brumadinho. H� quase 500 barragens de empresas em todo o estado. As de concreto das hidrel�tricas foram constru�das para n�o romper. Mas as das mineradoras e ind�strias, n�o. A que ruiu ontem teve sua licen�a renovada h� um m�s. As popula��es que vivem na �rea dessas barragens – 50 delas oferecem risco – v�o passar seus dias com medo e sujeitas a novos rompimentos? Definitivamente, isso n�o � mais admiss�vel.
 

 


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