
O engenheiro e urbanista Aar�o Reis (1853-1936), quando planejava a futura capital de Minas Gerais, mirou para a regi�o de onde pedras eram retiradas para as obras de constru��o e sentenciou que a cidade cresceria a partir da “regi�o das lagoinhas”. A hist�ria � retomada por Filipe Thales, morador do bairro h� 15 anos e um dos que ser�o retratados pelo Projeto Moradores, a humanidade do patrim�nio, realiza��o da Prefeitura de Belo Horizonte em parceria com a ag�ncia Nitro Hist�rias Visuais.

Idealizado pela Nitro, o projeto foi incorporado �s diversas a��es implementadas pela Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) para a revitaliza��o do bairro e regi�o. Holofote para nomes imortalizados no imagin�rio da cidade e na literatura, como Cintura Fina, malandro que ficou conhecido na zona bo�mia, a Loura do Bonfim, uma das lendas da cidade, ou o bloco carnavalesco Le�o da Lagoinha, criado em 1947 e retomado em 2016 depois do renascer do carnaval de rua em BH.
O bairro, que recebeu o nome gra�as a essa concentra��o de �gua nos fossos de onde as rochas eram retiradas, atraiu imigrantes italianos, negros e moradores das Gerais, que l� chegaram na �poca da constru��o da capital, e tornou-se anos depois importante polo cultural e bo�mio. No entanto, a constru��o do t�nel Lagoinha Conc�rdia e de outros empreendimentos vi�rios, na d�cada de 1970, mudou a face da regi�o.


Se parte da hist�ria de Belo Horizonte pode ser contada pelo que guardam as ruas e casarios da regi�o, para que essa narrativa fique completa, � preciso dar alma ao lugar. E quem faz isso h� 122 s�o as pessoas que l� vivem. A dona de casa Wilmara Svagera Fernandes, de 40 anos, mora no bairro desde que nasceu. Foi l� que conheceu o marido Ricardo Paix�o e onde cria o filho Jo�o Vitor Svagera Paix�o, de 10.
O bairro testemunhar� a uni�o de Wilmara e o marido Ri cardo, que depois de anos vivendo juntos, v�o se casar, em outubro, na Igreja Nossa Senhora da Concei��o, na Rua Al�m Para�ba. O casal resolveu fazer o ensaio fotogr�fico em pontos conhecidos da localidade, como a passarela que liga o terminal rodovi�rio e o metr� � Pra�a Vaz de Melo. “Minha m�e conta hist�rias de quando o bondinho passava pela Rua Itapecerica. Para mim, esse bairro � tudo. Eu e meu marido nascemos e fomos criados aqui. Nada mais perfeito do que fazer nossas fotos de casamento no Bairro Lagoinha”, afirma.
Andar pelas ruas do bairro � fazer uma viagem no tempo, localizando lugares e pessoas que contam a hist�ria da capital. Um exemplo � a Casa de Caridade de Pai Jacob do Oriente. Na Rua Fagundes Varela, o espa�o � um marco da cultura de matriz africana na cidade. Na regi�o em que h� pelo menos nove casas de candombl�, o pai de santo Ricardo de Moura, de 49, empreende trabalho de valoriza��o da cultura africana, como o conhecimento sobre as plantas para o tratamento de doen�as do corpo e da alma.

A entrada da casa � um o�sis na Lagoinha: um jardim e pomar com alfavaca, alecrim, manjeric�o, boldo, alho, couve, serralha, coentro, entre outros. “Os terreiros prestam servi�o de utilidade p�blica, de media��o nas periferias”, afirma. O terreiro foi fundado em 1966 pelo pai de Ricardo, Joaquim Camilo, da linhagem bantu.
Os ensinamentos e a tradi��o s�o repassados para o filho Gabriel Ricardo de Moura. “Vamos �s nossas tradi��es para buscar as t�cnicas”, afirma em rela��o aos conhecimentos de agroecologia empregados para cuidar do jardim e pomar. Ricardo e Gabriel tamb�m fazem parte do Projeto Hortel�os, que criou horta urbana em canteiro da Avenida Ant�nio Carlos.
Outro que dever� ser retratado em fotos do Projeto Moradores � o sapateiro Jorge Abuid Moreira, de 54, que ficou conhecido pelo of�cio de consertar chuteiras de jogadores famosos, como o �dolo atleticano Ronaldo Ga�cho. Nos quartos no fundo da casa de Jorge, na Rua Itapecerica, podem ser vistas centenas de chuteiras consertadas por ele. Com o passar do tempo, as marcas esportivas come�aram a patrocinar as chuteiras dos jogadores e Jorginho n�o recebe mais tanta demanda de celebridades. Mas segue firme no of�cio, reformando os cal�ados de jogadores menos famosos. Conhecido mesmo ficou Jorge no bairro. “Sou nascido e criado aqui. Gosto demais deste bairro”, diz. O �nico por�m � o fato de muitos dependentes de crack consumirem a subst�ncia il�cita nos espa�os p�blicos do bairro.

O PROJETO A edi��o no Bairro Lagoinha � a vig�sima do Projeto Moradores, realizado pela Nitro. “Chegar � vig�sima edi��o do Projeto Moradores na Lagoinha parece um presente para a raz�o de ele existir: lutar pela valoriza��o da mem�ria dos moradores como sendo o maior patrim�nio de um territ�rio”, afirma um dos idealizadores, o jornalista e escritor Gustavo Nolasco. Ele destaca a riqueza cultural do bairro: “A Lagoinha � uma mistura, uma diversidade cultural e social imensa. E planejar pol�ticas p�blicas para repensar um territ�rio tendo a oportunidade de antes ouvir as hist�rias que os seus pr�prios moradores contam � o caminho que acreditamos para respeitar a diversidade da Lagoinha.”
A diretora de patrim�nio da Funda��o Municipal de Cultura, Fran�oise Jean, informou que a prefeitura tem implementado diversas a��es para requalifica��o da regi�o. Foi criado o conjunto urbano Lagoinha, Bonfim e Carlos Prates. O movimento inclui o tombamento de casas da regi�o, a realiza��o de uma cartografia cultural e a valoriza��o do patrim�nio imaterial. “A cidade conhece o casario da Lagoinha, mas sabe pouco do caldeir�o cultural que � a regi�o. Queremos dialogar com a cidade e valorizar esse patrim�nio vivo”, afirma. Ela lembra que h� uma rela��o amb�gua com o bairro. “As pessoas gostam muito do bairro. � refer�ncia quando falamos de bairros tradicionais, mas as pessoas veem a regi�o como muito degradada”, diz.

Veja onde o Projeto Moradores vai colher depoimentos ao longo da semana
Hoje – Pra�a 15 de Junho
Amanh� – Rua Formiga, 140 (em frente ao Mercado da Lagoinha)
Quinta-feira – Arena do Beco Sargento Jo�o Beraldo (Vila Senhor dos Passos
Sexta-feira – Rua Ararib�, 235 (entre o Conjunto IAPI e a Pedreira Prado Lopes)
S�bado – Rua Al�m Para�ba, 449 (em frente ao Supermercado BH)