Fevereiro em Minas: mais chuvas, medo e perigo de deslizamentos
Precipita��es cont�nuas, que podem chegar a 100mm na capital, refor�am alerta em BH e no interior de Minas. Tens�o cresce e autoridades correm para retirar fam�lias de �reas de risco
postado em 06/02/2020 06:00 / atualizado em 20/02/2020 14:41
�rea de risco de desmoronamento na Regi�o do Barreiro, onde vive Vanessa Can�ado: 'Aqui ningu�m dorme' (foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press)
Chuva cont�nua, solo encharcado, perigo nas �reas de risco geol�gico e popula��o ainda traumatizada com as tempestades de janeiro. As autoridades apertam o passo para socorrer as fam�lias, pois o sinal � de alerta para hoje, em Belo Horizonte, que ter� dia nublado, com �ndice pluviom�trico entre 50 e 100 mil�metros, conforme o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet/5º Disme). A previs�o � de que haja redu��o de chuvas a partir de amanh�, embora com as pancadas t�picas do ver�o. Os meteorologistas informam ainda que o sol dever� aparecer no fim de semana, com melhoria das condi��es clim�ticas, mas as �guas n�o dar�o tr�gua: a qualquer hora de s�bado e domingo, o tempo poder� “fechar” e os temporais v�o ocorrer com intensidade, exigindo cuidado redobrado dos mineiros.
Mesmo a mais leve garoa desperta tens�o e medo nas dezenas de fam�lias da Vila Bernardete e Bairro Bom Sucesso, na Regi�o do Barreiro. “Aqui ningu�m mais dorme com essa situa��o n�o, mo�o”, resume a desalojada Vanessa Lopes Can�ado, de 37 anos. Fora de casa ao lado dos vizinhos do Bom Sucesso h� 13 dias, desde que os morros no entorno come�aram a desmoronar sobre casas, desalojando moradores e matando sete pessoas, dormir � um luxo que esses belo-horizontinos n�o se concedem. Depois de chuvas ininterruptas e de v�rias tempestades que arrasaram a Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), a capital acumula em seu subsolo um perigo menos evidente, mas ainda assim mortal. Ao todo, das 58 v�timas das chuvas, 13 estavam em BH. O encharcamento do solo faz com que a capital esteja sob alerta de risco geol�gico emitido pela Defesa Civil Municipal em 14 de janeiro, situa��o na qual mesmo uma chuva de menores propor��es se torna gatilho para um grande desabamento, de acordo com o �rg�o.
Enquanto a Defesa Civil de BH chama a aten��o para as chuvas acompanhadas de raios e rajadas de vento de at� 50 quil�metros por hora, at� as 8h desta quinta-feira, a Defesa Civil Estadual alerta para possibilidade de tempestade severa, com chuva torrencial, presen�a de granizo, raios e vendavais no interior do estado, com destaque para Alto Parana�ba (Patroc�nio e localidades de Santa Luzia dos Barros e Silvano, Santa Rosa dos Dourados, em Coromandel, Monte Carmelo, Pedrin�polis, Romaria, Santa Juliana e Zel�ndia, Nova Ponte e Serra do Salitre e a comunidade de Catiara), Tri�ngulo (Ira� de Minas), Sul (S�o Vicente de Minas, Andrel�ndia, Serranos e Cruz�lia) e Central (Tr�s Marias e a comunidade de Andrequic� e Madre Deus de Minas) e Arc�ngelo e Rio das Mortes, em S�o Jo�o del-Rei, na Regi�o do Campo das Vertentes.
(foto: Ed�sio Ferreira/EM/D.A Press)
Os especialistas do Inmet informam que o sol muito forte, como ocorreu na tarde de ontem em alguns pontos de BH, n�o significa ainda fim da temporada de chuva. Com a alta umidade na atmosfera, o sol volta logo a ficar encoberto, com ocorr�ncia de temporais mais fortes. As chuvas tamb�m n�o diminuem o calor, tanto que ontem a temperatura esteve na casa dos 26,5 graus.
Risco de quedas
De acordo com a Defesa Civil, em condi��es de alerta, as “chuvas aumentam o risco de quedas de muros, deslizamentos e desabamentos em BH at� s�bado“. Ao lado do �rg�o municipal, o Corpo de Bombeiros Militar de Minas Gerais (CBMMG) e a Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) prosseguem com vistorias e encaminhamentos de pessoas para fora de �reas de risco, muitas delas direcionadas a programas de acolhimento social. Os �rg�os relutam em especificar quais s�o as �reas mais dram�ticas, mas a reportagem do Estado de Minas apurou junto a fontes do CBMMG que a Regi�o do Barreiro e a do Jardim Teres�polis, em Betim (RMBH) inspiram maior preocupa��o na corpora��o.
A moradia da dona de casa Vanessa Lopes ficou praticamente ilhada por toneladas de pedras, lama e destro�os dos fundos de duas casas mais altas que desabaram com um barranco de 25 metros no Bairro Bom Sucesso, no dia 25. Ela, o marido e os tr�s filhos est�o impedidos de habitar sua resid�ncia, que foi interditada desde ent�o. At� hoje o medo � presente. A chuva abre sulcos na terra que escorregou, expondo pedras e removendo sua sustenta��o. Aos poucos, o barranco desce mais, algo que at� se escuta e se v� com pequenos deslizamentos.
A apreens�o, aos poucos, se transforma em olheiras e desgaste para Vanessa e seus vizinhos. “A gente nem dorme. Se cair tudo de uma vez com a gente aqui, acabou. Perdemos tudo. Mas n�o � assim. A gente fica naquela expectativa de que ser� que caiu hoje (o barranco sobre suas casas), ser� que est� caindo agora? Meu esposo, eu e meus vizinhos ficamos olhando a situa��o j� �s 4h. Um passa o dia mandando mensagem para o outro. Ningu�m dorme mais aqui nesse bairro com essa situa��o”, reclama.
Depois que o barranco cedeu sobre sua casa e outras tr�s, ela e o marido sa�ram de casa �s pressas para a casa da sogra. Para ter mais seguran�a e n�o depender de ficar na casa de outras pessoas, os tr�s filhos do casal foram levados para o Rio de Janeiro (RJ), onde a av� de 68 anos mora, depois de ela pegar um �nibus at� BH, chegando �s 5h, e os quatro seguirem viagem no mesmo dia, j� �s 9h. “A Urbel vai fazer vistorias para avaliar se a gente vai para alguma bolsa moradia. Estamos esperando”, desabafa.
Duas casas abaixo, o desespero da tamb�m dona de casa Laurinda Alves Rodrigues, de 68, � para que os vizinhos que tiveram quintais destru�dos permitam que ela posicione lonas doadas pela Defesa Civil, a fim de que a moradia dela e da filha n�o sejam atingidas em caso de novo desabamento. Ambas est�o fora de suas casas desde o dia 28. “O barranco tinha descido com as primeiras casas na sexta-feira, mas n�o tinha nos atingido. Na ter�a-feira desceu mais lama, que inundou a nossa casa. A gente n�o dorme mais. S� passa os dias vigiando o barranco, morrendo de medo de ele descer. � para cima da gente. Agora estamos lutando para os vizinhos nos deixarem estender lonas nas partes que est�o desbarrancando para ver se pelo menos amenizamos a situa��o, mas devemos precisar de obras”, disse.
Se na parte alta do Bairro Bom Sucesso, considerado um dos piores de BH em termos de risco geol�gico, o medo � o de deslizamentos de morros, na parte baixo � a cheia do c�rrego de mesmo nome que atormenta moradores por j� ter levado seis casas e deixado mais de uma d�zia condenadas � beira de barrancos protegidos por finas lonas. Em situa��o assim se encontra a dom�stica Sheila Ferreira Santos da Silva, de 55. A pequena casa est� a um palmo do que sobrou do barranco que a erguia do leito do C�rrego Bom Sucesso. Suas prote��es s�o uma lona preta sobre a terra encharcada e as ora��es que faz, enquanto passa as noites em claro ouvindo os pingos nas telhas de amianto e a correnteza do c�rrego. “O pessoal da Defesa Civil disse que estou em uma �rea de risco. Mas estou ficando aqui assim mesmo, porque n�o quero pagar aluguel; meus filhos querem que eu durma com eles, mas prefiro ficar aqui. O barranco que ficava embaixo da casa quase foi todo embora, �s 3h. N�o temos sossego nem para dormir”, desabafa.
Aten��o
Sob alertas de risco geol�gico, a Defesa Civil Municipal recomenda que moradores acionem o �rg�o e se protejam em casos de trincas nas paredes, �gua empo�ando no quintal, portas e janelas emperrando, rachaduras no solo, �gua minando de bases de barrancos, postes e �rvores se inclinando. Algumas medidas podem ajudar a evitar esses processos como a instala��o de calhas no telhado de casa, reparos em vazamentos de reservat�rios e caixas-d'�gua, n�o jogar lixo ou entulho na encosta, n�o despejar esgoto nos barrancos nem promover queimadas.
Os t�cnicos da Urbel informam que as vilas e favelas com mais solicita��es de vistorias s�o Jardim Alvorada, Novo Lajedo, Beira Linha, Aglomerado da Serra, Taquaril, Cemig e Vila Ecol�gica. Para retirar as fam�lias das �reas de risco geol�gico – o n�mero de pessoas nessa situa��o n�o foi informado – a Prefeitura de Belo Horizonte tem “todas as equipes mobilizadas”. E mais: “Ap�s o per�odo chuvoso, os t�cnicos far�o uma nova avalia��o das resid�ncias para verificar se as fam�lias poder�o retornar, se o local vai precisar de uma interven��o de m�dio ou grande porte ou se a fam�lia ser� removida de forma definitiva”. As �reas que n�o foram contempladas anteriormente ser�o inclu�das no Diagn�stico de Risco Geol�gico.
Na capital
A chuva forte na manh� de ontem deixou o tr�nsito lento nos principais corredores vi�rios de Belo Horizonte. A BHTrans registrou essa situa��o na Avenida Cristiano Machado, no sentido Centro da capital, desde a rodovia MG-010 � Rua das Gaivotas e, depois, na rotat�ria da Esta��o S�o Gabriel e no trecho entre a Avenida Jos� C�ndido da Silveira e o t�nel da Lagoinha. De acordo com a Defesa Civil de BH, a Regi�o Centro-Sul registra, este m�s (at� 17h de ontem), 158,2mm de chuva ou 87% da m�dia hist�rica, seguindo-se a Oeste (153,6mm) e Noroeste (130,8).
Fuga de casa em Betim
Os perigos que os desmoronamentos trazem com o solo saturado pela �gua das chuvas tamb�m preocupam o Corpo de Bombeiros em Betim, na Grande BH. Uma das trag�dias desta temporada de chuvas ocorreu no munic�pio, no Bairro Jardim Teres�polis, onde um desabamento no Beco do Fagundes matou uma adolescente de 17 anos e um senhor de 48, no �ltimo dia 25. No local, onde seis moradias foram destru�das e soterradas pelo desmoronamento de um barranco de 30 metros de altura, v�rias outras est�o sendo esvaziadas.
Entre as fam�lias que deixavam o lugar ontem, estava a da manicure Heliane Moreira da Silva, de 36, que logo cedo saiu da moradia com os filhos de 15, 12 e 1 ano, para procurar um im�vel que a prefeitura local vai alugar at� sua casa ficar novamente segura ou ent�o encontrar um novo destino para a fam�lia.
“Ficaram (a prefeitura) de fazer a vistoria, at� que o barranco desceu e atingiu a casa dos meus vizinhos. L�, derrubou dois c�modos. V�o dar um aluguel para a gente sair. N�o quero ficar depois que perdemos duas pessoas queridas. Ficou complicado”, disse. Moradora do bairro h� 11 anos, ela conta que passa a noite com medo, mas mesmo quem est� longe do barranco est� sendo prejudicado. “A chuva e os desmoronamentos trazem muitos outros problemas. � dengue, ratos, baratas, cobras, mosquitos e escorpi�es. Como criar a nossa fam�lia nesse meio?”, indaga.
Ontem, por toda cidade, ap�s uma chuva constante entre as 6h e as 10h, v�rias encostas sob risco estavam sendo cobertas por lonas para evitar que mais �gua pressionasse sua estabilidade. Um deslizamento no Anel Rodovi�rio, sentido Vit�ria (ES), na altura do Olhos D’�gua, no Barreiro, fez com que m�quinas e oper�rios fossem deslocados e fechassem a pista da direita por 500 metros, trazendo mais transtorno ao tr�nsito. Do outro lado, na pista oposta, acostamento e parte da pista da direita tamb�m estavam interditados para refor�o de sua estrutura de sustenta��o.
A Prefeitura de Betim informou que, de forma emergencial, foi institu�da a Sala de Situa��o, composta por equipe multidisciplinar. O grupo prop�e, diariamente, medidas preventivas, reparat�rias, administrativas e judiciais, al�m de a��es de assist�ncia �s fam�lias atingidas. No Bairro Teres�polis, houve remo��o de fam�lias no Beco Fagundes, Beco do Sossego, Beco Itaparica e alguns outros becos na localidade. No local, foram registradas quedas de taludes, muros e resid�ncias, sendo que, atualmente, algumas casas correm risco de desabar, embora a maioria esteja desocupada. At� ontem, o total de moradores do Teres�polis em abrigos da prefeitura era de 71 pessoas, estando 57 no Centro de Refer�ncia de Assist�ncia Social (Cras) Teres�polis e 14 no Centro Popular de Cultura Frei Estanislau.
As �reas onde houve mais incidentes da chuva s�o Icaivera, regi�o ribeirinha do Rio Paraopeba, na Col�nia Santa Isabel (Citrol�ndia), Avenida Marco T�lio, na altura do Shopping Monte Carmo, Avenida Cordiline, no Bairro Nossa Senhora de F�tima, Teres�polis, na regi�o do Beco Fagundes, becos que saem da Rua Lagoa Santa (principalmente Beco do Sossego), Vila Cemig e Duque de Caxias.