
Quando foli�es cantam com toda empolga��o o verso “Eu quero � botar meu bloco na rua”, da m�sica de S�rgio Sampaio, muitos nem imaginam as dificuldades para que isso aconte�a. �s v�speras dos dias oficiais da festa momesca, blocos famosos em Belo Horizonte est�o com chap�u na m�o e campanhas de financiamento virtual para arrecadar dinheiro e fazer o carnaval na capital mineira, que se tornou um dos maiores do pa�s.
Sem apoio da prefeitura, que financiou somente um quinto dos grupos, e sem patroc�nio de empresas, alguns est�o indo pra rua na marra, com estrutura menor, como o Pena de Pav�o de Krishna. Mas h� desfiles com risco de serem cancelados, caso do Filhas de Clara. N�o bastasse a falta de verba, a tens�o aumenta com a apreens�o de carros de sons usados h� anos pelos blocos de rua pela Pol�cia Militar (PM), que argumenta falta de documento alterando a categoria do ve�culo em fun��o das adapta��es para os desfiles. O mesmo carro � usado por dezenas de grupos com desfile marcado para os pr�ximos dias.
Afinal, quem paga pelo carnaval de rua de BH?
A situa��o do bloco Filhas de Clara, que homenageia a cantora mineira Clara Nunes, ainda est� indefinida. “O desfile vai acontecer mediante a arrecada��o e ainda est� longe de ser o suficiente”, afirma a cantora Aline Calixto, uma das integrantes do bloco, que sai no domingo p�s-carnaval, 1º de mar�o.
Houve a tentativa, sem sucesso, de conseguir patroc�nio, como no ano anterior. Com uma campanha de financiamento coletivo ativa, a mensagem � direta: “Sem sua ajuda, nosso bloco n�o sai”. At� o momento, a organiza��o s� conseguiu levantar 20% do total de R$ 16 mil necess�rios para bancar trio el�trico, seguran�as e brigadistas, alimenta��o, entre outros custos.
“N�o tem como tirar do nosso bolso. Todo mundo est� trabalhando sem ganhar nada”, afirma. A oito dias do evento, a cantora tem esperan�a de que o bloco consiga desfilar pelo segundo ano. “Est� surgindo uma rede de solidariedade muito bacana”, diz Aline, que estar� em cima do trio, no s�bado de carnaval, no Bloco da Calixto.
O Filhas de Clara n�o recebeu nenhum centavo da prefeitura, que este ano apoiou 99 dos cerca de 500 blocos, com verba de R$ 3,5 mil a R$ 12 mil, classificados em categorias de A a D. De acordo com a Empresa Municipal de Turismo de Belo Horizonte (Belotur), houve um aumento de 42% nos recursos destinados aos blocos de rua, que passou de R$ 600 mil, em 2019, para R$ 850 mil, este ano. Ainda assim, representa 6% do or�amento do carnaval, de R$ 14,3 milh�es.
Mapa dos blocos de carnaval de rua de BH 2020
O Angola Janga ficou de fora e a caixinha do grupo, quase na v�spera do cortejo, conta com menos da metade dos R$ 60 mil planejados para o desfile, que ocorre no pr�ximo domingo, no Centro de BH. Mas o bloco afro, dedicado a empoderar a popula��o negra, vai sair de qualquer jeito, garantem organizadores. “Esse ano foi o mais dif�cil do bloco. As empresas n�o est�o t�o interessadas em se alinhar a um bloco afro. Existe um racismo institucional”, critica um dos co-fundadores, Lucas Jupetipe.
Sem apoio da prefeitura e patroc�nio de empresas, eles precisaram ser criativos para arrecadar fundos e colocar o bloco na rua, com seus 50 bailarinos e mais de 70 m�sicos. Al�m do financiamento coletivo na internet, ainda em curso, foram promovidos diversos eventos em parceria com bares.
"Este ano foi o mais dif�cil do bloco. As empresas n�o est�o t�o interessadas em se alinhar a um bloco afro. Existe um racismo institucional"
Lucas Jupetipe, um dos fundadores do Angola Janga
“O que faz a gente se esfor�ar � a vontade de carnavalizar. No Angola Janga, a popula��o negra se encontra”, diz Jupetipe. A falta de recurso n�o torna o desfile menos especial. Em seu quinto, o Angola Janga vai lan�ar seu primeiro �lbum com repert�rio autoral. A expectativa � arrastar 100 mil no domingo.
Se foi uma conspira��o do universo, depende da cren�a de cada um, fato � que, na reta final, o bloco Pena de Pav�o de Krishna conseguiu o dinheiro para garantir a folia em homenagem � divindade hindu – os foli�es saem pintados de azul – no domingo de carnaval. “Este ano a gente est� menor. Conseguimos o m�nimo, em torno de R$ 10 mil e continuamos arrecadando”, afirma uma das coordenadoras, Dezza Coutinho.
Apesar de ser um dos mais famosos de BH, o “Pena”, como � carinhosamente conhecido, n�o foi aprovado para receber recursos da prefeitura e, se fosse necess�rio, sairia at� de bicicleta com caixas de som, como no primeiro ano do bloco, em 2013. “Fizemos festa, pedimos doa��o, vendemos camiseta, passamos chap�u nos ensaios. Procuramos entender a fluidez e que uma hora chegaria. Nossa causa � apoiada tanto espiritalmente quando no plano f�sico”, diz.
Problemas no caminho dos blocos
“Dinheiro � um problema de todos os blocos. O Garotas Solteiras vai conseguir sair a duras penas, com caixinha, vendendo produto”, conta o regente, Jhonatan Melo. O bloco, que sempre homenageia uma diva – este ano, ser� Elza Soares –, n�o foi selecionado para o financiamento da prefeitura, pela falta de um documento. “A burocracia aumentou e s�o muitos blocos concorrendo”, diz Melo.
At� o in�cio do ano, organizadores estavam apreensivos em rela��o � realiza��o do desfile, or�ado em R$ 25 mil. “Acabamos conseguindo um patroc�nio menor”, diz. A maior parte dos recursos, cerca de R$ 15 mil, � para pagar o carro de som, que se tornou mais um imbr�glio.
O Garotas Solteiras vai usar o trio cuja documenta��o est� sendo questionada pela Pol�cia Militar, que apreendeu no fim de semana carros de som utilizados nos desfiles. “N�o tem outra possibilidade de outro carro de som para a gente. Passamos por meses de negocia��o com a Belotur e, em nenhum momento, a obrigatoriedade desses documentos foi passada”, ressalta.