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Estado de Minas EDUCA��O

Vida de universit�rio: uma gera��o que supera desafios

Mais da metade dos pais dos universit�rios brasileiros n�o tem escolaridade ou n�o chegou ao ensino m�dio, segundo a base de dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes


postado em 25/02/2020 04:00 / atualizado em 25/02/2020 08:44

''Além de ter orgulho de chegar aonde cheguei, estou num patamar muito acima do que estava 10 anos atrás'' - Rosimere Cesário da Silva, estudante de administração (foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A.PRESS)
''Al�m de ter orgulho de chegar aonde cheguei, estou num patamar muito acima do que estava 10 anos atr�s'' - Rosimere Ces�rio da Silva, estudante de administra��o (foto: GLADYSTON RODRIGUES/EM/D.A.PRESS)
Rosimere Ces�rio da Silva, de 31 anos, � filha de pai analfabeto e m�e com pouco estudo. Cursa o 4º per�odo de administra��o. Diego Lucas Neres Rodrigues, de 22, cujos pais cursaram at� o ensino m�dio, est� terminando o mestrado. Rafael Alexandre de Faria, de 32, teve tamb�m tem como refer�ncia quem terminou apenas a educa��o b�sica. Quis ir al�m, estudou direito e passou em concurso para delegado.

Os tr�s s�o o retrato de uma gera��o inquieta, que quer mais e n�o se contenta em ser fruto de um meio sem oportunidades. Representam com precis�o o perfil de quem cursa a gradua��o no Brasil.

Mais da metade dos pais de quem tem hoje acesso ao ensino superior n�o tem escolaridade ou nem sequer chegou ao ensino m�dio, tendo grande parte parado os estudos nos anos iniciais do n�vel fundamental. Em Minas, 52% dos pais e 44% das m�es est�o nessa situa��o.

''Al�m de ter orgulho de chegar aonde cheguei, estou num patamar muito acima do que estava 10 anos atr�s''

Rosimere Ces�rio da Silva, estudante de administra��o



O levantamento, compilado pela Associa��o Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes) em parceria com a Educainsights, � um consolidado de tr�s anos de informa��es da base de dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade).

Foram analisados os n�meros de 2014 at� 2017. “Os dados s�o consolidados, porque a cada ano o Enade avalia determinados cursos. Ent�o, com a soma dos anos, temos cada vez mais cursos representados”, explica o diretor-executivo da Abmes, Solon Caldas.

A assistente financeira Rosimere Ces�rio da Silva, de 31, � natural de Cort�s (PE), veio para BH aos 19, seguindo o noivo, casou-se e, aos 25, divorciou-se. Ela sempre quis estudar e viver destino diferente dos pais e dos seis irm�os – nenhum com curso superior.

O pai s� aprendeu o pouco que os filhos lhe ensinaram em casa. A m�e foi at� a antiga 4ª s�rie. Rosimere queria fazer administra��o, mas o marido n�o deixava. Foi morar sozinha, entrou num curso de ingl�s com a ajuda da empresa em que trabalhava, ficou desempregada e depois retomou o trabalho.

Com a nota do Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem), entrou na Faculdade Arnaldo com bolsa de 40% para realizar o grande sonho. “Vim com a cara e a coragem. Aperto, deixo de comer, de sair”, conta.

No ano passado, ficou novamente desempregada por seis meses. Dividiu as despesas para pag�-las com o dinheiro da rescis�o, trabalhava s�bado e domingo. Conseguiu est�gio e, em fevereiro, foi contratada. H� tr�s anos, n�o v� os pais. Ela conta que a m�e tem orgulho enorme da filha que faz faculdade, o que a deixa emocionada.

“Minha m�e n�o se passa mais por boba. Tudo me pergunta se est� certo. Meu pai tamb�m n�o faz nada sem me consultar”, relata. “Al�m de ter orgulho de chegar aonde cheguei, estou num patamar muito longe do que estava 10 anos atr�s.” Com um passo de cada vez, ela j� sonha mais alto: fazer p�s-gradua��o e estudar fora do pa�s. E para daqui a alguns anos, o desfecho j� est� tra�ado. Os pais estar�o na primeira fila para v�-la receber o diploma.

Dif�cil explicar para a fam�lia

Sair do Brasil � op��o que tem sido avaliada tamb�m pelo pesquisador Diego Lucas Neres Rodrigues, de 22. Mestrando no Instituto de Ci�ncias Biol�gicas (ICB) da UFMG, ele driblou muitas adversidades para n�o deixar o sonho morrer. Morador de Vespasiano, na Grande BH, � filho de casal que estudou at� o ensino m�dio. Os pais t�m um pequeno a�ougue, de onde tiram o sustento da fam�lia.

“Nunca tivemos uma conversa sobre ensino superior. Ainda � dif�cil explicar para eles o que � faculdade e p�s-gradua��o. Sou o primeiro do meu n�cleo a estar na universidade”, afirma. “Apesar de duas tias e alguns primos terem feito faculdade, ainda assim � complicado falar do sobre mestrado e doutorado, qual a import�ncia disso para a sociedade e a vida pessoal. Dif�cil explicar qu�o importante � o conhecimento para quem n�o teve essa experi�ncia.”

E para chegar at� aqui n�o foi f�cil. Diego passou os �ltimos tempos na expectativa de conseguir a bolsa de R$ 1,5 mil do mestrado. Com os �ltimos cortes nas principais ag�ncias de fomento � pesquisa no pa�s, viu qualquer possibilidade ir por �gua abaixo. Mas n�o desistiu. Sai de casa �s 7h para ir � UFMG, onde fica at� as 17h.

Gasta uma hora e meia de �nibus para ir e duas para voltar. A fam�lia se reuniu para garantir os R$ 11,40 di�rios de passagem. Sua luta sensibilizou tanto os colegas de laborat�rio que um doador an�nimo passou a deixar todo m�s, na secretaria do local, o dinheiro da alimenta��o – eles descobriram que o jovem estava ficando sem comer para n�o ter mais um gasto e poder prosseguir com a pesquisa.

Ele adiantou em um ano a conclus�o da tese, que defender� em fevereiro. Para o doutorado, j� est� sentenciado. Se n�o tiver bolsa nos tr�s meses seguintes � conquista da vaga, n�o o far�.

“O sonho dos pais � ver o filho na ind�stria, com emprego e estabilidade. Os meus ficaram desiludidos ao ver que a situa��o n�o permitiu que eu tivesse bolsa. Mas passaram a acreditar na import�ncia do pesquisador depois de a m�dia ter divulgado os cortes e o impacto disso para a sociedade. Tentam ser bem atualizados em rela��o a isso. T�m cabe�a aberta, mas era dif�cil p�r nessa cabe�a aberta a import�ncia da ci�ncia.”

Primeira gradua��o na fam�lia

''Do meu círculo familiar inteiro, sou o primeiro a ter curso superior. É motivo de muito orgulho e meus pais se empolgam até demais às vezes'' - Delegado Rafael de Faria, com os pais, Alfredo e Margarida (foto: JAIR AMARAL/EM/D.A. PRESS)
''Do meu c�rculo familiar inteiro, sou o primeiro a ter curso superior. � motivo de muito orgulho e meus pais se empolgam at� demais �s vezes'' - Delegado Rafael de Faria, com os pais, Alfredo e Margarida (foto: JAIR AMARAL/EM/D.A. PRESS)

Os universit�rios de hoje s�o, na maioria, os primeiros da fam�lia a fazer gradua��o. Na compara��o entre as redes p�blica e particular, a diferen�a de escolaridade dos pais dos alunos de cada uma das redes varia pouco, mas quando o quesito verificado � a modalidade presencial ou a dist�ncia, o abismo se alarga tanto para homens quanto para mulheres.

 

''Do meu c�rculo familiar inteiro, sou o primeiro a ter curso superior. � motivo de muito orgulho e meus pa�s se empolgam at� demais �s vezes

Delegado Rafael de Faria, com os pais, Alfredo e Margarida



 
Em Minas, enquanto 78% dos pais e 72% das m�es dos alunos da educa��o a dist�ncia (EAD) n�o estudaram ou fizeram at� o ensino fundamental, esse percentual cai para 49% e 42%, respectivamente, quando se trata de pais de estudantes do ensino presencial.

“O EAD tem permitido mais o acesso ao n�vel superior de pessoas cujos pais t�m um n�vel de escolaridade menor e, por consequ�ncia, podem tender a ter uma renda menor”, afirma o diretor-executivo da Associa��o Brasileira de Mantenedoras de Ensino Superior (Abmes), Solon Caldas.

O levantamento da Abmes em parceria com a Educainsights indica ainda a diferen�a entre pais e m�es – eles estudaram menos e t�m representa��o maior em rela��o a elas em todas as categorias analisadas. As informa��es s�o um consolidado de 2014 at� 2017 da base de dados do Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade).

No meio de n�meros, hist�rias de frustra��o do passado se revertem no presente para alegria e orgulho. A costureira Margarida Rodrigues de Faria queria ser m�dica. Mas o pai dela nunca permitiu. N�o achava que mulher devesse estudar.

Formou-se no ensino m�dio e assumiu o of�cio atual. O marido, Alfredo Jos� de Faria, tamb�m s� terminou a educa��o b�sica e d� duro num t�xi. Coube ao filho ca�ula realizar os desejos entrecortados pelo destino. Rafael Alexandre de Faria, de 32 anos, � um exemplo dessa gera��o de forma��o superior. O menino, que come�ou a trabalhar como vidraceiro aos 13 e exerceu a fun��o de office-boy, nunca se deu por vencido. Chegou � faculdade de direito e se tornou delegado da Pol�cia Civil de Minas Gerais.

Na pr�-adolesc�ncia, escolheu trabalhar mesmo diante do receio dos pais, que o achavam novo demais. Mas ele queria conquistar mais e esse foi o caminho escolhido, diante da situa��o financeira de casa, que n�o era muito favor�vel. Depois de sair da vidra�aria – o dono teve medo de ser denunciado – fez panfletagem para pol�tico, para supermercado, fez bico em marcenaria. Aos 15 anos, se candidatou a uma vaga na Associa��o Profissionalizante do Menor (Asprom). Foi reprovado na avalia��o social, pelo fato de ter pai e m�e presentes e morar em casa pr�pria. Ficou chateado, mas n�o se deixou abater.

Em 2003, conseguiu o primeiro emprego formal, como office-boy, e rapidamente assumiu outras fun��es na empresa. Em 2006, entrou para a faculdade. Passou num concurso da MSG e, por quatro anos, trabalhou como coordenador da Uai Venda Nova. No 9º per�odo, passou no exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e, pouco mais tarde, foi aprovado como delegado.

Rafael descobriu a voca��o quando, ainda como office-boy, aos 17 anos, passou a estudar para um concurso no Tribunal de Justi�a (TJMG). “Do meu c�rculo familiar inteiro, sou o primeiro a ter curso superior”, conta. E a fam�lia � numerosa. A m�e tem cinco irm�os e o pai, 16. “Esse � motivo de muito orgulho e meus pais se empolgam at� demais �s vezes”, brinca.
 




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