
Distante a apenas 10 quil�metros da terra ind�gena Xakriab�, localizada em S�o Jo�o das Miss�es, no Norte de Minas, o primeiro caso de contamina��o pelo novo coronav�rus confirmado no munic�pio vizinho de Itacarambi traz tens�o � maior comunidade ind�gena do estado.
A vulnerabilidade do territ�rio fala por si: o munic�pio, que se mant�m quase que exclusivamente com repasses do Fundo de Participa��o dos Munic�pios (FPM), se soma aos 91% de outros 1.228 no pa�s que abrigam ou s�o vizinhos a terras ind�genas e n�o t�m um s� leito de UTI.
A vulnerabilidade do territ�rio fala por si: o munic�pio, que se mant�m quase que exclusivamente com repasses do Fundo de Participa��o dos Munic�pios (FPM), se soma aos 91% de outros 1.228 no pa�s que abrigam ou s�o vizinhos a terras ind�genas e n�o t�m um s� leito de UTI.
O dado consta da An�lise de Vulnerabilidade Demogr�fica e Infraestrutural das Terras Ind�genas � COVID-19 realizada por Marta Azevedo, dem�grafa e antrop�loga, pesquisadora do N�cleo de Estudos de Popula��o Elza Berqu� /Nepo da Unicamp e colaboradores.
“Temos em nossa cidade apenas unidades de sa�de b�sica sem condi��es de atender � complexidade da COVID-19. Nem na regi�o tem hospital com equipamentos para essa doen�a. Se isso chegar aqui, a nossa refer�ncia � em Montes Claros, que atende a toda a regi�o, que � bastante grande”, afirma o prefeito Z� Nunes (PT), o primeiro ind�gena eleito no estado para um cargo executivo, j� em seu terceiro mandato � frente de S�o Jo�o das Miss�es.
Com cerca de 11 mil pessoas e com o modo de vida coletivo, se o novo coronav�rus chegar � aldeia ir� se espalhar rapidamente, afirma Z� Nunes, que decretou a calamidade p�blica no munic�pio.
Com cerca de 11 mil pessoas e com o modo de vida coletivo, se o novo coronav�rus chegar � aldeia ir� se espalhar rapidamente, afirma Z� Nunes, que decretou a calamidade p�blica no munic�pio.
“Compartilhamos tudo, temos uma vida comunit�ria muito intensa e ser� muito grave se um de n�s for contaminado”, preocupa-se. Segundo ele, � grande o risco de contamina��o, pois a popula��o de S�o Jo�o das Miss�es se desloca para Itacarambi para diversas atividades, como ir ao banco.
''Temos em nossa cidade apenas unidades de sa�de b�sica sem condi��es de atender � complexidade da COVID-19. Nem na regi�o tem hospital com equipamentos para essa doen�a. Se isso chegar aqui, a nossa refer�ncia � em Montes Claros, que atende a toda a regi�o, que � bastante grande''
Z� Nunes (PT), prefeito de S�o Jos� das Miss�es
BARREIRAS SANIT�RIAS
No munic�pio de Bras�lia de Minas, para onde s�o levados tr�s ind�genas para tratamento de hemodi�lise, j� h� cinco casos registrados da doen�a. “Estamos em isolamento social, mas, devido � necessidade de alguns de ir ao banco, sair para trabalhar, comprar alimentos, o risco de contamina��o � grande. Estamos pedindo ajuda para reformar as barreiras sanit�rias que formamos � entrada do nosso territ�rio”, afirma Z� Nunes.
� entrada do territ�rio ind�gena Xakriab�, a comunidade se organizou para a forma��o de oito barreiras sanit�rias, mantidas 24 horas em regime de rod�zio pelos pr�prios ind�genas, que tentam controlar o fluxo de entrada no territ�rio. “Estamos muito preocupados. As barreiras que formamos n�o s�o suficientes. Precisar�amos de ajuda do governo e apoio para nos auxiliar a intensificar o controle sanit�rio nas barreiras”, afirma o cacique Domingos Xakriab�.
Outro complicador � que muitos ind�genas que trabalham em outros estados, como Mato Grosso, S�o Paulo e Bahia, est�o sendo dispensados e est�o retornando � aldeia. Segundo o cacique , com o isolamento social se intensificando, e sem saber ao certo quanto tempo ir� perdurar a pandemia, para sobreviver na aldeia, os ind�genas precisam de alimentos e recursos para as suas necessidades.
“Temos feito campanhas de arrecada��o, buscando apoio, mas a gente ainda necessita de mais, somos uma popula��o muito pobre”, sustenta o cacique. Em meio � pandemia, a situa��o em geral dos povos ind�genas � dram�tica, assinala o cacique. “Estamos todos sofrendo as mesmas consequ�ncias e somos mais vulner�veis ao v�rus. Foram muitas epidemias que dizimaram nosso povo. Por isso, a popula��o ind�gena no geral, est� dentro do grupo de risco”, acrescenta Domingos Xakriab�.
EXTERM�NIO
O problema da contamina��o dos povos ind�genas por doen�as infecciosas � amea�a que retorna historicamente, afirma Ana Maria Gomes, professora da Faculdade de Educa��o da UFMG e do curso de forma��o intercultural para educadores ind�genas (FIEI) e do Observat�rio da Educa��o Intercultural Ind�gena.
“Muitos t�m a mem�ria muito viva de parentes que morreram com esse tipo de contamina��o, que, em diversos momentos, foi inclusive provocada como forma de exterm�nio intencional”, sustenta a professora, que h� 20 anos atua nas frentes de ensino e pesquisa de extens�o com os povos ind�genas de Minas e do Brasil.
“Muitos t�m a mem�ria muito viva de parentes que morreram com esse tipo de contamina��o, que, em diversos momentos, foi inclusive provocada como forma de exterm�nio intencional”, sustenta a professora, que h� 20 anos atua nas frentes de ensino e pesquisa de extens�o com os povos ind�genas de Minas e do Brasil.
“Cada vez que enfrentamos esse tipo de risco de cont�gio, � como se retorn�ssemos e reafirm�ssemos essa rela��o desigual, desrespeitosa e genocida da sociedade ocidental com os povos ind�genas. Foi essa a rela��o que marcou mais de 500 anos de hist�ria”, observa Ana Maria. Segundo ela, ap�s a Constitui��o de 1988, um marco temporal importante, porque passa a considerar os povos ind�genas cidad�os, hoje, parece um pequeno momento de “respiro”, dada a atual precariza��o e desmonte de �rg�os como a Funda��o Nacional do �ndio (Funai e dos distritos especiais de sa�de ind�gena.
“� uma situa��o t�o desesperadora que � como se retom�ssemos de forma exponencial o que foram os 500 anos de viol�ncia no contato desrespeitoso e genocida do branco com o �ndio”, afirma a professora Ana Maria.
Para al�m da falta de leitos com UTIs nos munic�pios com territ�rios ind�genas, ela aponta a grande vulnerabilidade pela proximidade dos centros urbanos. “Historicamente, as pandemias evoluem dos grandes centros para o interior. Estamos tentando acompanhar a evolu��o no entorno das terras ind�genas, para agir com as comunidades e tentar monitorar as rotas de cont�gio”, afirma.
A tentativa � de acompanhamento dos corredores de comunica��o nos munic�pios com as terras ind�genas.
Para al�m da falta de leitos com UTIs nos munic�pios com territ�rios ind�genas, ela aponta a grande vulnerabilidade pela proximidade dos centros urbanos. “Historicamente, as pandemias evoluem dos grandes centros para o interior. Estamos tentando acompanhar a evolu��o no entorno das terras ind�genas, para agir com as comunidades e tentar monitorar as rotas de cont�gio”, afirma.
A tentativa � de acompanhamento dos corredores de comunica��o nos munic�pios com as terras ind�genas.
“Agora, nos perguntamos com eles o que podemos fazer em n�vel de a��o comunit�ria. A UFMG tem um comit�, dentro do curso de educadores ind�genas, para o enfrentamento da pandemia. Mas temos sempre a percep��o da precariedade e dos poucos instrumentos que temos para enfrentar com eles o que est� se colocando. � triste constatar a facilidade com que a viol�ncia sobre os �ndios volta, sempre, em primeiro plano”, diz ela.
A professora lembra que, embora sistematicamente desrespeitados, s�o os povos ind�genas que t�m muito a nos ensinar. “Nosso modo de vida se revelou incapaz de salvaguardar a vida. A li��o come�a por eles, que foram os primeiros vitimados por esse tipo de viol�ncia, mas o que est� colocado para o mundo hoje, em termos de destrui��o ambiental e amea�a planet�ria, est� colocada para todos n�s. Precisamos aprender com eles a recuperar o v�nculo vital com a natureza, pois temos um modo de vida que nos autodestr�i.”