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Estado de Minas PANDEMIA

Time de infectologistas conta como � a guerra de BH contra a COVID-19

Ouvir a ci�ncia e iniciar o isolamento rapidamente foi a decis�o mais acertada de Kalil, avaliam infectologistas que orientam as a��es do prefeito


postado em 24/05/2020 04:00 / atualizado em 24/05/2020 09:41

Estevão Urbano, o secretário Jackson Machado, Carlos Starling e Unaí Tupinambás: time experiente em campo para combater o coronavírus em Belo Horizonte (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
Estev�o Urbano, o secret�rio Jackson Machado, Carlos Starling e Una� Tupinamb�s: time experiente em campo para combater o coronav�rus em Belo Horizonte (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press)
A ci�ncia est� no centro do debate sobre qual a melhor maneira de enfrentar o novo coronav�rus (Sars-Cov-2) para sair da maior crise sanit�ria,  de sa�de, econ�mica e pol�tica do s�culo. Al�m da dificuldade de entender e tratar a epidemia, o Brasil ainda enfrenta uma politiza��o sobre quais medidas devem ser tomadas no que se refere ao isolamento social e ao tratamento dos doentes. No meio desse debate, o prefeito Alexandre Kalil se colocou como defensor da ci�ncia e escalou um comit� formado por infectologistas para aconselh�-lo. O comit� conta com a experi�ncia e o conhecimento de infectologistas com mais de 20 anos no exerc�cio da especialidade: Carlos Starling, Estev�o Urbano e Una� Tupinamb�s. Com a coordena��o do secret�rio municipal de Sa�de, Jackson Machado Pinto, o grupo de not�veis se re�ne uma vez por semana com o prefeito Alexandre Kalil e o secretariado. No entanto, eles se mant�m 24 horas em contato para propor formas de barrar o avan�o do v�rus. Um indicativo de que o comit� tem tomado decis�es acertadas � que a capital mineira, entre as do Sudeste (Rio de Janeiro, S�o Paulo e Esp�rito Santo), registra menor n�mero de mortes. O Estado de Minas tra�a o perfil desses tr�s m�dicos. Em entrevistas concedidas � reportagem antes da decis�o de iniciar a flexibiliza��o das atividades na cidade, anunciada na sexta-feira, eles fazem um balan�o do que foi feito at� agora e o rumo que deve seguido pela capital em seu “novo normal”. Para todos, ouvir a ci�ncia e apostar no isolamento foram essenciais.


entrevista

(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Carlos Starling
Infectologista e epidemiologista hospitalar

“A tranquilidade � a forma madura
de se lidar com problema inusitado”

No Dia de S�o Sebasti�o – 20 de janeiro –, no ano de 1958, nascia em Belo Horizonte Carlos Ernesto Ferreira Starling. Casado com Joana Andr�s, � pai de quatro mulheres: B�rbara, de 34 anos, Maria Eduarda, de 17, Sophia, de 11, e Rafaela, de 6.  Formado em medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Carlos Starling decidiu ser infectologista depois que fazer resid�ncia em medicina preventiva.

Foi quando se viu diante de um campo importante de atua��o da medicina, a epidemiologia. “Desde o segundo per�odo na Faculdade de Medicina atuo na �rea de infectologia, uma vez que ganhei uma bolsa de inicia��o cient�fica do ent�o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq, hoje Conselho Nacional de Desenvolvimento Cient�fico e Tecnol�gico) para trabalhar com esquistossomose. Trabalhei no grupo interdepartamental de estudos sobre esquistossomose no Instituto de Ci�ncias Biol�gicas”, recorda-se.

A inicia��o cient�fica o guiou por todo o curso e o colocou em contato com infectologistas pesquisadores, mestres e doutores como Dirceu Greco e Jos� Roberto Lambertucci, grandes mestres da Faculdade de Medicina que o influenciaram. “A decis�o pela infectologia quase que foi natural na minha vida.” Al�m de m�dico, infectologista e especialista em medicina preventiva e epidemiologia, Carlos tem como paix�o o ciclismo, a literatura e a culin�ria. “Com ciclismo, subo as montanhas; com a literatura, eu as acaricio; e, com a culin�ria, saboreio as nossas Minas Gerais.”


� mais dif�cil atuar como infectologista em pa�ses em desenvolvimento, como o Brasil? Por que sofremos ainda com dengue, mal�ria e outras doen�as infecciosas controladas em outros pa�ses?

Atuar como infectologista no Brasil � um desafio enorme. Temos grandes endemias – dengue, mal�ria, infec��es hospitalares, bact�rias multirresistentes. Essa foi �rea a que me dediquei muito ao longo dos �ltimos 30 anos. O desafio � motivante. Todas as vezes que temos algo a ser superado, isso gera uma motiva��o diferente. Trabalhar com o controle de infec��es hospitalares, que eu comecei em 1985, foi um enorme desafio. N�o existia praticamente nada. Implantamos programa de controle de infec��es, que hoje tem legisla��o pr�pria no pa�s; praticamente, todos os hospitais t�m seus n�cleos de controle de infec��es, comiss�es e servi�os funcionando melhor ou pior, mas, de qualquer forma, foi um desafio. Hoje, olhando para tr�s, posso dizer que valeu muito a pena. D� enorme satisfa��o ver o resultado daquilo que ajudei construir.

Como atua o comit� de especialistas em BH? 

O comit� foi montado pelo prefeito Alexandre Kalil, que nos chamou e foi de uma sinceridade absurda. Pegou a cadeira dele e disse: ‘Agora voc�s se sentem a� – eu, mais dois colegas infectologistas e o secret�rio municipal de Sa�de – e me digam o que tenho que fazer. Sou engenheiro, n�o entendo nada de v�rus e, portanto, voc�s definem e eu me comprometo a executar o que voc�s orientarem.’ O prefeito foi de uma abertura e honestidade muito grandes. O comit� se re�ne toda semana oficialmente. Tem o encontro das segundas-feiras,  com o prefeito e o secretariado. Ficamos praticamente 12 horas por dia em contato, trabalhando com os dados, que s�o postados a cada hora. No WhatsApp, temos um grupo de trabalho que fica o tempo todo analisando as informa��es que s�o produzidas pelo corpo t�cnico da Prefeitura de Belo Horizonte, seja pelo Planejamento, Secretaria da Fazenda e, principalmente, pela Secretaria Municipal de Sa�de. Existe corpo t�cnico muito bom e ativo, que nos municia de informa��es para que as decis�es sejam tomadas de maneira colegiada. O tempo todo estamos ligados nessas informa��es, avaliando os dados e sugerindo a��es de controle, pesquisas que s�o necess�rias, sejam testes amostrais, sejam as barreiras que est�o sendo colocadas para evitar que pessoas venham de fora infectadas e n�o sejam minimamente orientadas. Ent�o,  esse tem sido o maior desafio que estamos enfrentando em nossa vida profissional.

Qual foi a decis�o mais acertada do prefeito Alexandre Kalil?

A decis�o mais acertada foi o momento de estabelecer regras de isolamento social, de distanciamento social. Ent�o, foram in�meras as decis�es muito acertadas, com firmeza e seguindo exatamente o que temos orientado. Ele tomou v�rias decis�es importantes, mas, certamente, a mais importante foi o in�cio. Foi assumir o isolamento social logo nos primeiros dias, quando percebemos que havia transmiss�o comunit�ria sustentada. Esse foi o momento. Se esperar passar uma semana, voc� perde o momento de ouro de controle da epidemia, exatamente o princ�pio dela. Depois que ela acelera, com muitos casos, � praticamente imposs�vel conter a situa��o. Certamente, vai haver momentos muito importantes, em que ele vai ter que tomar decis�es s�rias, como a quest�o da flexibiliza��o ou mesmo a n�o flexibiliza��o. Essas s�o decis�es dif�ceis. Espero que a popula��o de Belo Horizonte entenda que tudo est� sendo feito no sentido de preservar o maior n�mero de vidas, preservar empregos, preservar a capacidade de as institui��es atenderem os pacientes. Erros podem ser cometidos. � uma situa��o inusitada, mas, com certeza, a inten��o � acertar mais do que errar.

Pode apontar uma falha no processo de enfrentamento em BH? 

Temos v�rias falhas. Mas, certamente, a principal n�o � uma quest�o nossa. � uma quest�o de disponibilidade de testes. Poder�amos estar testando, h� mais tempo, um n�mero maior de pessoas. Entretanto, esse � um problema internacional. N�o � um problema da regi�o de Belo Horizonte. � um problema mundial de disponibilidade de insumos para realiza��o desses testes. Felizmente, agora est�o chegando. Vamos come�ar as pesquisas amostrais na popula��o de BH para poder acompanhar qual tem sido a velocidade de dispers�o do v�rus na comunidade, seja em casos sintom�ticos ou assintom�ticos. Isso � important�ssimo para entender a din�mica da epidemia na cidade.

Qual a sua opini�o em rela��o aos que atacam as medidas de isolamento social?

As pessoas que atacam as medidas de isolamento social n�o t�m outra op��o. Se apresentarem medida mais segura que n�o transforme Belo Horizonte no que estamos vendo no Rio, em S�o Paulo, em Salvador, em Recife e Fortaleza... Aquele n�o � o cen�rio,  tenho certeza de que ningu�m quer. Estamos propondo o que a ci�ncia estabeleceu como mais efetivo no controle da epidemia. A prova disso � Belo Horizonte. Isso n�o significa que n�o vamos defender o emprego das pessoas. Estamos preocupados. Tem sido feito um plano de flexibiliza��o com muita responsabilidade. � compreens�vel quem combate o isolamento social. As pessoas ficam apavoradas, numa situa��o em que muita gente perdeu o emprego, e isso gera ang�stia grande. O isolamento e a perman�ncia em casa para pessoas que est�o confinadas h� mais de 50 dias s�o penosos. D� uma vontade enorme de voltar � normalidade. Entretanto, isso tem que ser feito com responsabilidade, com cuidado, com base em princ�pios cient�ficos e n�o no desespero. O desespero e o caos n�o ajudam nesse momento. Pelo contr�rio. A tranquilidade � a forma madura de se lidar com problema inusitado. Permite-nos vislumbrar sucesso em futuro breve.

Quando as atividades poder�o ser totalmente retomadas em BH?

As atividades produtivas, segundo a Secretaria de Planejamento, est�o em funcionamento em mais de 65% a 70%. A cidade n�o est� parada. A cidade est� em funcionamento. Alguns setores, algumas atividades est�o restritas, aqueles que geram ac�mulo de pessoas em determinados espa�os. Por exemplo, atividades em shopping center, cinema, teatro, grandes eventos culturais, shows, futebol, bares. Isso est� tudo parado,  onde se concentram pessoas. N�o tem como fazer isso neste momento. Foi feito planejamento e, se os dados epidemiol�gicos, ao longo das pr�ximas semanas, permitirem, faremos o processo de flexibiliza��o (que se inicia amanh�), que chamamos de flexibiliza��o intermitente. Flexibiliza uma s�rie de atividades, observa-se o resultado, se n�o tiver impacto grande no setor sa�de, em mortalidade, prosseguiremos. Se tudo correr bem, vamos flexibilizar,  a cada 14 dias, uma �rea, podendo haver retrocesso dependendo dos dados epidemiol�gicos. � important�ssimo que a popula��o entenda que flexibiliza��o � flex�vel. � flexibiliza��o intermitente, pode ir para frente ou para tr�s. N�o � flexibiliza��o que s� tem um sentido. Tudo depende dos dados epidemiol�gicos. Esse per�odo de isolamento social foi fundamental para o sistema de sa�de se equipar, para que as pessoas adquirissem mais experi�ncia na lida com pacientes graves, para que os mecanismos fisiopatol�gicos da doen�a fossem descortinados e, com isso, permitir atua��o eficiente, principalmente diante de pacientes graves. Esse tempo de isolamento social foi fundamental para o que vem daqui pra frente.

entrevista

(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)
(foto: Leandro Couri/EM/D.A Press)

Una� Tupinamb�s
infectologista, professor do Departamento de Cl�nica M�dica da Faculdade de Medicina da UFMG

“Trabalhando nessa uni�o, podemos 
mudar o curso da pandemia na capital”

Quando entrou para a Faculdade de Medicina da UFMG, Una� Tupinamb�s tinha o sonho de trabalhar com os ind�genas na Amaz�nia, no meio da floresta. "As doen�as infecciosas me despertaram e me fizeram optar por ser infectologista. Quando me formei, estava come�ando a pandemia do HIV e fui empurrado pra l�. Os primeiros pacientes na resid�ncia tiveram e faleceram com Aids. A partir da�, e specializei-me e n�o tive d�vida de que seria infectologista", conta.

Una�, que nasceu em 13 de fevereiro de 1962, em Ita�na, � pai de J�lia, que seguiu os mesmos passos na medicina. O exemplo paterno tamb�m foi determinante para que Una� escolhesse a profiss�o. “Meu pai era m�dico em Ita�na e lembro-me de quando ele enfrentou a epidemia de meningite nos anos 1970. No inconsciente, ficou cena dele trabalhando e, ao chegar em casa, um cheiro adocicado de �ter. Isso deve ter me influenciado.”

Professor do Departamento de Cl�nica M�dica da Faculdade de Medicina da UFMG, Una� contribui com a forma��o de m�dicos na maior universidade p�blica do estado. Tamb�m se destaca como pesquisador, com in�meras publica��es em revistas cient�ficas. Sonha com um mundo novo que pode se apresentar ap�s a pandemia. “Estou doido para acabar o isolamento e podermos construir um outro normal. Com menos desigualdade, homofobia, racismo, concentra��o de renda, onde possamos respeitar a natureza e os povos da floresta. E acabar de vez com este neoliberalismo, que come�ou com  (Margaret) Thatcher e (Ronald) Reagan nos anos 1980... Quem sabe n�o construamos um novo ciclo, uma nova forma de viver?”

� mais dif�cil atuar como infectologista em pa�ses em desenvolvimento como o Brasil? Por que sofremos ainda com dengue, mal�ria e outras doen�as infecciosas controladas em outros pa�ses?

No Brasil, tem mais diversidade de infec��es. N�o temos rotina. Zika, ebola, febre amarela, febre maculosa, chikungunya e agora vem a COVID-19. E lembrando que continuam acometendo as pessoas o HIV, s�filis e tuberculose. N�o � nem um pouquinho mon�tono. Mas os outros pa�ses t�m as infec��es hospitalares. O campo de atua��o, de pesquisa especificamente, � muito rico num pa�s como o Brasil, t�o desigual. Tem muito campo para pesquisa. N�o tem nenhum infectologista que teanha t�dio no dia a dia. � sempre uma coisa nova, um desafio a cada ver�o.

Como atua o comit� de especialistas em BH? 

Composto pelo secret�rio Jackson, Starling, Est�v�o e eu, o comit� � para ajudar na tomada das decis�es. Lembro que a Secretaria de Sa�de � muito forte. Os t�cnicos da secretaria s�o muito comprometidos e competentes. A gente ajuda na tomada de decis�es, lemos dados oficiais, atualizamos, a cada dia, os artigos cient�ficos, principalmente em rela��o � pandemia, como controlar e como mitigar. O comit� atua como ap�ndice da Secretaria Municipal de Sa�de. O SUS de Belo Horizonte � exemplar, um dos melhores SUS de capitais do Brasil. Constru�do desde a d�cada de 1990, ele est� bem estruturado, com equipe bem capacitada, trabalhando junto h� muitos anos. Isso facilita muito, inclusive, teve impacto na pandemia. N�o � � toa que Kalil teve a ideia de ter esse comit� para mostrar o qu�o o SUS de Belo Horizonte � potente. � forte. Trabalhando nessa uni�o podemos mudar o curso da pandemia na capital.

Qual foi a decis�o mais acertada do prefeito Alexandre Kalil?

A decis�o mais acertada de Kalil… Ele estava com ideia de fechar, orientado pela Secretaria Municipal de Sa�de, ent�o criou o comit� para ter o respaldo. A a��o mais acertada do prefeito Kalil vai ser isso. Ele est� se destacando como grande lideran�a em Minas Gerais. N�o temos um l�der que possa fazer um consenso, indicar um caminho mais correto. Kalil vem ocupando esse espa�o de forma bem interessante, mostrando-se ciente do seu papel. Ele fala o tempo todo que tem sido guiado pela ci�ncia. Recebeu apoio dos professores da UFMG e de outras universidades, com mais de 900 assinaturas, referendando as medidas que ele vem preconizando em Belo Horizonte. A medida acertada dele foi fazer o isolamento social e agora estamos colhendo os frutos.

Pode apontar uma falha no processo de enfrentamento em BH? 

A falha que pode estar ocorrendo em Belo Horizonte n�o � uma falha da cidade, seria do Minist�rio da Sa�de, de n�o propor a testagem em massa da popula��o, o exame RT-PCR. Esse erro n�o � espec�fico da capital. � um erro de gerenciamento do Minist�rio da Sa�de. N�o temos testagem em massa para enfrentar essa epidemia. A prefeitura tem tentado correr por fora. Montou um laborat�rio espec�fico para fazer o RT-PCR, mas dependemos do suporte do Minist�rio da Sa�de. Come�amos a fazer o inqu�rito sorol�gico da prefeitura para ver como anda a dissemina��o do v�rus em Belo Horizonte.

Qual a sua opini�o em rela��o aos que atacam as medidas de isolamento social?

Infelizmente, estamos em ambiente de tanto esgar�amento, de tanto dissenso, ainda mais incentivado pelo governo federal. S�o idiotas, usando as palavras do prefeito Kalil. Eles n�o sabem o que est�o fazendo. Est�o seguindo o negacionismo, o terraplanismo. S�o contra a vacina, contra a ci�ncia. Vai ser interessante, porque eles v�o dar com os burros n'�gua. V�o ser desmascarados de forma t�o r�pida e, de maneira t�o categ�rica, que v�o ficar desmoralizados.

Quando as atividades poder�o ser totalmente retomadas em BH?

Em rela��o � flexibiliza��o do isolamento, colocamos tr�s par�metros para come�ar. Um dos par�metros � a taxa de transmiss�o, R0, que tem que estar abaixo de 1,19; (os outros s�o) ocupa��o de leitos de CTIs e enfermarias. Se todos os tr�s par�metros tiverem um sinal verde ou um amarelo, vamos come�ar a soltar de forma bem lenta aquelas atividades com menos riscos sanit�rios e avaliar a cada semana. A flexibiliza��o ser� em ondas. Se esses par�metros epidemiol�gicos piorarem, aumentar o n�vel de transmiss�o, a gente volta tudo � estaca zero. Daqui pra frente, vai ser uma gangorra, vai e vem. Libera, entra em quarentena. Libera, entra em quarentena. Talvez v� ser essa a pr�tica nossa nos pr�ximos anos.

entrevista

(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)
(foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

Estev�o Urbano
presidente da Sociedade Mineira de Infectologia

“Precisamos atingir melhor o cora��o e
a consci�ncia das pessoas na periferia”

Estev�o Urbano Silva, de 54 anos, nasceu em Belo Horizonte. Formou-se em medicina em 1989 pela Faculdade de Ci�ncias M�dicas de Minas Gerais. “Costumo dizer que resolvi fazer infectologia, no jarg�o do futebol, aos 47 minutos do segundo tempo, ou seja, na prorroga��o”, conta. Estev�o fazia resid�ncia em cl�nica m�dica e, no �ltimo trimestre na forma��o em cl�nica m�dica, antes de fazer prova para cardiologia, percebeu que seu caminho seria outro. Ele fazia est�gio na CTI no Hospital Jo�o XXIII, quando passou a observar muitas infec��es. “Apaixonei-me por aquilo. Quase no fim da minha resid�ncia em cl�nica m�dica, tive que deixar a cardiologia, porque me apaixonei pela infectologia. Foi muito bom. � a especialidade que eu amo e me faz sair todo dia de casa”, argumenta.

Como presidente da Sociedade Mineira de Infectologia (SMI), � uma lideran�a importante entre os m�dicos e refer�ncia na especialidade. Com senso de justi�a, doa parte do seu tempo para ampliar o conhecimento no campo que abra�ou para atuar profissionalmente. “Ser presidente para mim � uma honra, responsabilidade muito grande. Tenho ajuda muito grande das pessoas que est�o l� comigo. Temos grandes infectologistas em Belo Horizonte, que nos apoiam e, exatamente por isso, a responsabilidade � muito grande”, afirma.

Estev�o considera um misto de honra e responsabilidade ocupar tal cargo. “Toda a sociedade m�dica tem papel de assessorar a ci�ncia, e traz�-la para a comunidade, realmente, faz com que seja extremamente prazeroso, mas, ao mesmo tempo, � responsabilidade enorme. Temos o papel de defender a cidadania, defender os cidad�os atrav�s da ci�ncia.”


� mais dif�cil atuar como infectologista em pa�ses em desenvolvimento como o Brasil? Por que sofremos ainda com dengue, mal�ria e outras doen�as infecciosas controladas em outros pa�ses?

Quando h� menos recursos, seja para a parte de pesquisa, seja para preven��o e tratamento, no caso da especialidade em que atuo, das infec��es, � mais dif�cil do que � em pa�ses desenvolvidos, onde h� recursos suficientes para pagar bem as pessoas para fazer pesquisas. Naqueles pa�ses, a �rea de preven��o � mais valorizada, ent�o h� menos epidemias. Com certeza � mais dif�cil (aqui). Abre-se um par�ntese que, por outro lado, voc�, como infectologista, tem tanta pr�tica, v� tantos casos, que, eventualmente, torna-se um m�dico mais completo. Ent�o, h� pr�s e contras. Infelizmente, esse contra atinge a popula��o, que adoece mais e morre mais. Acredito que o baixo investimento na preven��o das enfermidades e na educa��o das pessoas � o que faz com que tenhamos mais doen�as tropicais, como a dengue, que se tornou end�mica e, a cada ano, volta com for�a total. Embora os pa�ses tropicais quentes tamb�m favore�am essas epidemias, j� tivemos v�rias d�cadas sem dengue no pa�s, por exemplo.

Como atua o comit� de especialistas em BH? 

O comit� atua em sinergismos. A gente nunca toma decis�es isoladas. Discutimos todos os dias, por v�rias horas, as novidades que s�o postadas no nosso grupo de WhatsApp, mas temos uma reuni�o presencial semanal com o prefeito e dois ou tr�s encontros em lives por semana. Fora das reuni�es formais, temos contatos praticamente todas as horas. Todas as decis�es que temos que tomar s�o feitas em consenso, depois de muito debate. O material que a gente usa � cient�fico. Exploramos pesquisas em toda a literatura internacional e tamb�m atrav�s de contato de nossos amigos em outros pa�ses, em outros estados, que nos d�o informa��es a partir da experi�ncia. Juntamos tudo isso, levamos para as reuni�es e tomamos as decis�es. Existem as nossas diverg�ncias, mas prevalece, no final, o consenso. E quantas e quantas noites temos passado estudando, pegando artigos e relatos m�dicos para levar no dia seguinte para discuss�o. Est� sendo muito bacana, acima de tudo temos um relacionamento excelente. N�o existe vaidade ou qualquer coisa parecida. � a ci�ncia acima de tudo.

Qual foi a decis�o mais acertada do prefeito Alexandre Kalil?

� dif�cil saber qual a decis�o mais acertada do prefeito, mas diria que, se pudesse resumir em uma �nica, foi a de seguir todas as decis�es pelo que fala a ci�ncia. Kalil � uma pessoa humilde nesse aspecto, diz que n�o entende dessas coisas e deixa as pessoas t�cnicas, cientistas sugerirem as interven��es. Ele � um sujeito que respeita 100% o que a ci�ncia fala. Essa � a decis�o mais correta.

Pode apontar uma falha no processo de enfrentamento em BH? 

A gente est� sempre procurando acertar, mas, em tema t�o desconhecido, � �bvio que h� erros. Vamos continuar errando. A ideia sempre � acertar mais do que errar. Estamos fazendo o poss�vel e o imposs�vel para errar menos. N�o diria que seria um erro, porque muitas a��es foram feitas. Precisamos infiltrar mais (as informa��es sobre preven��o) no cora��o, na alma, na consci�ncia das pessoas em bairros mais perif�ricos. A gente tem notado que a ades�o �s medidas, seja de isolamento, seja do uso de m�scaras, � menor nas periferias e aglomerados, onde h� grande risco de dispers�o r�pida do v�rus. Precisamos saber melhor como tocar mais essas pessoas, embora o trabalho seja constante com os l�deres comunit�rios. N�o � que tenha sido um erro, mas precisamos atingir melhor o cora��o e a consci�ncia dessas pessoas na periferia, onde o risco � maior de uma pandemia, um n�mero maior de casos.

Qual a sua opini�o em rela��o aos que atacam as medidas de isolamento social?

Classifico em v�rios n�veis as pessoas que atacam o distanciamento. Primeiro, s�o pessoas ignorantes, que n�o sabem a import�ncia das medidas. Podem ter ouvido falar na televis�o, mas olhando para o lado n�o veem grandes problemas. � o caso de Belo Horizonte, acham que isso � desnecess�rio. N�o conseguem entender, do ponto de vista cient�fico, como esse v�rus se distribui e infecta as pessoas, por quest�es intelectuais, capacidade de absorver os conhecimentos. Segundo, � que �s vezes, essas pessoas n�o t�m uma a��o cidad�. N�o foram educadas para ser cidad�s, ent�o n�o se preocupam consigo mesmas, mas se esquecem que n�o � s� com elas que deveriam se preocupar. Que o pr�ximo est� inserido nesse contexto. N�o foram treinadas para exercer a cidadania, n�o se preocupam consigo e tamb�m n�o se preocupam com o pr�ximo. Terceiro: aquelas pessoas que preferem acreditar que atividade econ�mica n�o pode cair. Elas est�o com medo de ter s�rios problemas financeiros e resolvem ignorar medidas que s�o salvadoras da vida, em prol do com�rcio, da atividade econ�mica. Classificam-se na categoria das pessoas que valorizam menos a vida e mais a quest�o financeira. S�o pessoas que costumam ser egoc�ntricas, ego�stas, que n�o olham o pr�ximo, que procuram olhar para si mesmas e o resto que se exploda, por assim dizer. S�o pessoas que t�m problemas com o conceito de humanidade. Elas entendem como o v�rus se propaga, sabem que podem infectar outros, mas preferem manter a atividade econ�mica a salvar vidas. �bvio que a gente entende que algumas dessas pessoas n�o t�m de onde tirar dinheiro. Essas a gente pode at� classificar de outra forma. Aquelas que t�m condi��es de se sustentar por um tempo e ainda assim n�o querem perder dinheiro s�o pessoas completamente desprovidas de responsabilidade social. Um quarto tipo de pessoas s�o as que politizaram, que defendem posi��es n�o pela ci�ncia, n�o pela vida, posi��es que, independentemente de serem corretas ou n�o, s�o politizadas. Defendem um l�der, uma posi��o pol�tica, independentemente se aquela posi��o � correta ou n�o. Pessoas nessa categoria s�o muito ego�stas, chegam ao grau do fanatismo, de colocar a ci�ncia de lado, a prote��o das pessoas de lado, para defender posi��es pol�ticas.

Quando as atividades poder�o ser retomadas em BH?

Temos indicadores que precisam ser seguidos, que se piorarem inviabilizar�o a reabertura, mas, neste momento, ainda estamos em debate, n�o h� uma defini��o exata de quais setores ser�o flexibilizados. Todas as atividades que tiverem grandes aglomera��es n�o ser�o flexibilizadas – eventos, esportes, etc. Outras, como com�rcio, poder�o entrar nessa flexibiliza��o com regras muito r�gidas.
 
 


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