
O projeto nasceu na rede social por meio de uma provoca��o da jornalista e podcaster cearense Lyara Vidal. “Li uma mat�ria que falava que 300 mil pessoas n�o conseguiriam fazer o Enem por n�o pagar a taxa de inscri��o, ent�o me ofereci pra ajudar pagando o boleto de dois pretos ou pretas que me seguissem no Twitter. Digo dois porque � o que cabia no meu or�amento. E falei de pretos e pretas porque est�vamos no auge da discuss�o antirracista, imaginando o que a gente podia fazer pra diminuir o racismo”, contou ao Estado de Minas.
Ela disse que um amigo se ofereceu pra pagar uma inscri��o, e outro se ofereceu para pagar outra. Assim, a iniciativa se tornou uma grande corrente. “Quem deu vida de verdade pra essa a��o e a transformou nesse neg�cio gigante foi o Luan Alencar, que mora em Juazeiro do Norte”, contou. Foi o Luan que conseguiu um grupo de 50 a 60 pessoas que se dispuseram a ajudar.
“Nem todo mundo pode doar, ent�o tem gente doando o tempo: procurando institui��es, cursinhos populares e alunos, organizando planilhas de padrinhos, gerenciando redes sociais, cuidando da imprensa, verificando boletos – somos muito cuidadosos com isso. � tudo organizado de forma horizontal. Tem gente de todo lugar do pa�s”, acrescentou a jovem.

"O valor ardeu um pouco no bolso, pois, com essa pandemia, os trabalhos est�o parados e, com isso, ficou dif�cil de pagar. Esse valor, pra quem � de baixa renda, desestimula, nem todos t�m condi��es de pagar a taxa. Eu mesmo n�o consegui, mas gra�as a esse projeto vou estar ocupando uma cadeira para prestar a prova", comentou.
Guilherme conheceu a a��o por meio da Rede Uni�o Brasileira dos Estudantes Secundaristas (UBES) – entidade que luta contra os cortes e desmontes da educa��o, pela qual Guilherme representa sua cidade: "Ser� a segunda vez que irei prestar o Enem. Pretendo cursar hist�ria. Escolhi esse curso, pois sempre gostei de saber do passado e, como negro militante, quero contribuir para essa hist�ria. Ali�s, os negros s�o a 'ra�z' da nossa na��o".
"Um projeto como esse estimula pessoas a conquistarem seus sonhos e ocuparem as universidades p�blicas federais do nosso pa�s", acredita.
S�o milhares de hist�rias de jovens pretos que n�o t�m condi��es financeiras de arcar nem mesmo com a inscri��o do Enem. Lyara conta que o projeto recebeu, al�m de muitos relatos parecidos com o de Guilherme, depoimentos de m�es-solo que precisavam dessa for�a porque n�o podiam tirar o dinheiro da pens�o do filho para fazer a inscri��o.
"Tamb�m recebemos muitas pessoas mais velhas que queriam muito uma oportunidade para ingressar no ensino superior para mudar de vida, principalmente, neste momento em que tantas pessoas perderam o emprego", afirma.
Enem e pandemia
As inscri��es para o Exame Nacional do Ensino M�dio (Enem) 2020 foram abertas no m�s passado em meio a uma s�rie de pedidos de adiamento.
No m�s passado, o Minist�rio da Educa��o (MEC) e o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais An�sio Teixeira (Inep) informaram o adiamento das provas.
A avalia��o, prevista para novembro, deve ser realizada em 30 ou 60 dias ap�s a data divulgada no edital, e ser aplicada em dezembro deste ano ou em janeiro de 2021.
Lyara acredito que o n�o cancelamento vai atrapalhar bastante os estudantes. "O cen�rio � muito complicado. Temos escolas rurais que dependem do transporte rural; pessoas que est�o esperando aux�lio emergencial do governo federal at� agora e n�o est�o conseguindo, por exemplo, ter acesso � internet; pessoas que est�o ilhadas sem nenhum meio de comunica��o e que s� usavam computador na escola. Essa ainda � a realidade de muitos brasileiros", afirma.
Ela pontua que esses estudantes v�o estar em desvantagem se comparados aos alunos que t�m um computador em casa, internet de alta velocidade e dinheiro para pagar cursinho on-line.
"J� � uma vantagem ter tempo de estudar diante a pandemia. Muitos jovens est�o correndo para cima e para baixo entregando comida por aplicativo. Muitos trabalham o dia todo", acrescenta. "Mas a gente esta tentando dar uma for�a e colocar pelo menos um preto na faculdade. Se conseguirmos colocar um, vamos ficar muito felizes."
Alexandre Braga, membro da Comiss�o de A��es Afirmativas e Inclus�o da Universidade Federal de Minas Gerais e presidente da Uni�o de negros e negras pela igualdade (Unegro-MG) exalta a iniciativa: “Tem ocorrido uma s�rie de a��es, e essa vem fortalecer a luta por mais negros e negras nos espa�os de poder. Essa iniciativa pode aumentar o n�mero de negros na disputa do Enem”.
Como fa�o para participar do Pretos no Enem
Volunt�rio
1 - Os volunt�rios preenchem um formul�rio, onde informam a quantidade de boletos com que poder�o arcar;2 - Preenchido o formul�rio, seus nomes v�o para uma planilha, onde � feito o controle de quantas inscri��es est�o com promessa de serem pagas;
3 - Quando algu�m envia o boleto solicitando a ajuda no pagamento, � selecionado o nome de um volunt�rio, que efetua a quita��o e manda o comprovante.
Benefici�rio
1 - Basta mandar uma mensagem para @pretosnoenem (Instagram)2 - Com o boleto em m�os, o grupo entra em contato com algum dos volunt�rios, que pagar� a inscri��o. Posteriormente, � enviado ao beneficiado o comprovante do pagamento
Pretos e pardos na UFMG
De acordo com dados divulgados pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) em 2018, entre os 32 mil alunos matriculados, 14 mil (43%) se autodeclararam negros: 11 mil pardos e 2,7 mil pretos.
Alexandre Braga afirma que n�o h� d�vida de que as a��es de cotas fizeram com que o n�mero de pessoas pretas e pardas evolu�sse nas universidades federais. Por�m, ainda n�o � suficiente.
"N�o temos d�vida de que os programas de a��es afirmativas evolu�ram e aumentaram o n�mero de negros nas universidades. Mas, como � autodeclara��o, muitos estudantes se declaram de acordo com a forma que acham melhor. Ent�o, h� v�rios processos judiciais analisando essas autodeclara��es. Mas, se andar no campo da sa�de, do direito, dos cursos mais elitizados da UFMG, voc� n�o v�, negros", afirma.