
M�os postas para rezar, m�os delicadas na hora das costuras, tarimbadas diante da massa de biscoito e incans�veis na tradu��o da genu�na arte mineira. Logo ap�s convidar os visitantes a entrar em sua casa e confessar que
o pres�pio � sua vida
, Nadir Lu�za Marques, a dona Diquinha, de 82 anos, abre o cora��o e a porta de um quarto onde guarda seu tesouro. A vis�o impressiona: na
recria��o do cen�rio do nascimento de Jesus
, h� tal quantidade de pe�as que a senhora residente no Centro de
Jaboticatubas
, na Regi�o Metropolitana de Belo Horizonte, j� perdeu a conta do n�mero: “Acho que tem mais de mil”.
Protegida pela m�scara e no distanciamento certo, dona Diquinha, a exemplo dos moradores de Jaboticatubas, n�o v� acontecer, desta vez, o tradicional circuito de visita��o de pres�pios. “� por causa dessa epidemia”, ela lamenta, o que a impede n�o s� de receber pessoas da capital e cidades vizinhas, como tamb�m de fazer, com amigas e vizinhos, a novena de Natal, rezando diante do pres�pio. “Nesta �poca, a gente sempre fica muito satisfeita em receber o povo”, declara, antes de oferecer suspiros, balas de chocolate... “Aceita um caf�?”
Arte de gera��es
Nos caminhos, entre montes e lagos, com os anjos, h� pe�as de lou�a, madeira, cer�mica e muitas flores de papel crepom, uma especialidade da anfitri�. “Sempre trabalhei em casa, ent�o gosto dessas atividades”, ela resume. A cada cent�metro, nota-se que a criatividade tampouco tem limite. Em comemora��o aos 300 anos do estado (a partir da institui��o da Capitania de Minas em 2 de dezembro de 1720), dona Diquinha colocou este ano no pres�pio pequenas r�plicas dos profetas de Congonhas, originalmente esculpidos por Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho (1738-1814).
Tem tamb�m a Capela Curial S�o Francisco de Assis, a conhecida Igrejinha da Pampulha, um patrim�nio da humanidade recriado em papel�o, com o painel dedicado ao santo padroeiro e um toque bem contempor�neo: a nora Cristina fez uma c�pia da fachada no computador e colou na estrutura. E quem foi crian�a no in�cio dos anos 1960 vai se deliciar com as miniaturas dos atletas ol�mpicos ent�o colecionadas mediante a troca de tampinhas de refrigerantes nos caminh�es das distribuidoras de bebidas que percorriam o interior. Eles tamb�m prestam por l� seu tributo silencioso ao aniversariante do dia.
Para homenagear a terra natal, dona Diquinha fez, no maior capricho, o hospital – “Pena que atualmente est� sempre cheio, n�?” – a farm�cia, a igreja, o dep�sito de material de constru��o, as ruas, os caminh�es passando, o Cristo ressuscitado, com a roupa branca de papel crepom, no alto da montanha, os pastores com as ovelhas, os reis magos... Recuperando um costume bem antigo, ela recorta algumas figuras de revistas e prega nas pe�as marcadas pelo tempo.
E � novamente olhando a enormidade de detalhes que ela destaca o pres�pio como sua vida. Se h� pe�as antigas, o conjunto re�ne tamb�m as recicladas. Dona Diquinha reaproveita embalagens de ovos de galinha e codorna, e o papel de embalagem de ma�� para dar forma � profus�o de flores de todas as cores.
Surpresa
Se a pior parte � guardar as figuras do pres�pio, dona Diquinha deixa seu segredo para o final. Os olhos sempre curiosos percorrem os v�rios n�veis da plataforma montada pela dona da casa, que realiza o desejo de muitas pessoas que fazem pres�pios e se sentem tristes na hora de levar as figuras para as caixas. Para evitar o monta-desmonta, ela retira, ap�s o per�odo natalino, apenas as pe�as da parte de baixo. “Deixo as de cima, a parte das bonecas vestidas de anjo, penduradas por fios. Fecho com uma cortina para n�o pegar poeira, e assim posso rezar aqui, em sil�ncio, durante todo o ano.” Ent�o, depois que tudo passar e chegar a t�o esperada vacina, fica o convite para a visita ao pres�pio cheio de hist�rias e f�. Dona Diquinha espera de portas, e cora��o, abertos.
