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Estado de Minas Carnaval

Como ser� o amanh�? Sem folia em 2021, blocos de BH enfrentam sufoco

Cadeia produtiva associada � festa de rua tem no cancelamento o mais pesado teste de sobreviv�ncia desde a retomada da folia pelos grupos carnavalescos


08/02/2021 04:00 - atualizado 07/02/2021 21:55

Matheus Brant, músico e idealizador de bloco, vê ameaça à retomada da festa de rua na capital(foto: túlio santos/EM/D.A Press )
Matheus Brant, m�sico e idealizador de bloco, v� amea�a � retomada da festa de rua na capital (foto: t�lio santos/EM/D.A Press )

�s v�speras de um carnaval que definitivamente n�o ser� igual �queles que passaram, a cadeia produtiva ligada � festa e parte do setor cultural amargam o impacto financeiro do isolamento social determinado pela pandemia de COVID-19. “Dentro do setor cultural, a comunidade carnavalesca foi das mais atingidas financeiramente, pois tudo que a envolve est� ligado a grandes aglomera��es. Os blocos sobrevivem das aglomera��es que promovem, como shows, ensaios, eventos e desfiles”, destaca o m�sico Di Souza, que participou da funda��o de grandes blocos respons�veis pela retomada da festa de rua em BH, como o Ent�o, Brilha!.

Ele destaca que a cadeia est� “desamparada em fun��o da pandemia”. S�o m�sicos, artistas diversos, produtores culturais, ambulantes, vendedores, comunicadores, bailarinos, t�cnicos de som, de luz e cen�grafo

“O poder p�blico, j� ciente da impossibilidade da realiza��o da festa desde meados do ano passado, precisava minimamente ter se organizado e estruturado um di�logo mais pr�ximo e intenso com a cidade, com os blocos e agremia��es para compreender as dificuldades e os impactos deste momento sobre o processo de constru��o da festa”, diz o antrop�logo. Rafa Barros defende que as empresas que lucram com a folia em tempos normais tamb�m deveriam, a partir de responsabilidade coletiva, contribuir para manter a cadeia produtiva neste momento de pandemia.

A Liga das Escolas de Samba de Minas Gerais engrossa o coro em rela��o ao papel do poder p�blico. “O momento � de inteiro descaso do poder p�blico, a princ�pio. Vendo as tratativas que outras cidades t�m com o carnaval, a gente percebe como Belo Horizonte n�o est� nem a� para esse segmento”, reclama o presidente da liga, M�rcio Eust�quio Antunes de Souza. Ele afirma que S�o Paulo repassou recursos para as escolas de samba e que o Rio tamb�m abriu editais para subvencionar o carnaval. “BH n�o se posiciona a respeito, o que nos deixa muito tristes. Temos que ter mecanismos para salvaguardar o carnaval, mesmo que ele n�o aconte�a neste ano.”

G�o Cardoso, fundador do Baianas Ozadas, afirma que o sentimento � de abandono em rela��o ao poder p�blico e que, no �ltimo ano, houve  redu��o no di�logo com a Belotur. “L� atr�s, em julho, como representante da liga belo-horizontina, com a liga das escolas de samba, com as ligas de Santa Tereza, liga dos blocos afros, eu tentei. Puxamos uma discuss�o que a prefeitura n�o quer. A quest�o � enfrentar a pandemia, mas se esquecem de que tem toda uma cadeia produtiva de trabalhadores que necessitam disso e t�m uma l�gica de renda at�pica.”

G�o lembra que muitos obt�m renda em janeiro e fevereiro, valores que ser�o dilu�dos pelo resto do ano. E pontua que o Baianas obt�m recursos com a realiza��o de shows, que foram suspensos em decorr�ncia da pandemia. “N�o existe di�logo”, reclama, em rela��o � Belotur.

RETROSPECTO

Em 2020, foram 347 blocos de rua fazendo cerca de 390 cortejos pelas ruas de Belo Horizonte. Mais de 70 artistas fizeram shows nos oito palcos montados pela prefeitura. Tamb�m foi grande o n�mero de eventos privados: 86 ao todo. O p�blico total de foli�es que curtiram as atra��es da festa, entre 8 de fevereiro e 1º de mar�o, foi estimado em 4,45 milh�es.

Tudo isso faz circular dinheiro na cidade. Os visitantes participaram, em m�dia, de 3,7 dias do carnaval com um gasto m�dio di�rio, per capita, de R$ 199,88, totalizando despesa m�dia de R$739,56 durante todo o evento. J� os moradores de BH tiveram um gasto m�dio durante todos os dias do evento de R$ 297,66. A avalia��o geral da festa, em uma escala de 10 pontos, atingiu o �ndice de 8,6 na opini�o de turistas e popula��o local.

Agora, os idealizadores de blocos temem pelo futuro das agremia��es que movimentam toda essa engrenagem. “Corre-se o risco de, em um ano, desmontar-se uma cena constru�da a muitas m�os e respons�vel pela retomada da autoestima do belo horizontino quanto ao carnaval de sua cidade, o aquecimento da economia do per�odo, com a gera��o de renda e arrecada��o de impostos e a forma��o musical de tanta gente que aprendeu a tocar um instrumento”, afirma o m�sico Matheus Brant, idealizador do Me Beija que Eu Sou Pagodeiro e integrante da Liga Blocada.

O m�sico destaca que muitos profissionais ligados ao carnaval passam por dificuldades. “Sei de casos de profissionais da cadeia produtiva do carnaval respons�veis por puxar, organizar os blocos que, diante da interrup��o das atividades presenciais desde de mar�o de 2020, aliada � completa falta de apoio da prefeitura e do estado, est�o se mudando de BH, voltando para o interior, onde t�m fam�lia ou mesmo est�o abandonando a carreira art�stica”, alerta.

Desfile das escolas de Belo Horizonte em 2020: carnavalescos se queixam de que a ajuda não chegou para todos durante a pandemia(foto: Isis Medeiros/Área de Servico/Belotur/Divulgação )
Desfile das escolas de Belo Horizonte em 2020: carnavalescos se queixam de que a ajuda n�o chegou para todos durante a pandemia (foto: Isis Medeiros/�rea de Servico/Belotur/Divulga��o )

Verba da Lei Aldir Blanc � considerada insuficiente


Em Belo Horizonte, oito escolas de samba, 29 blocos de rua e dois blocos caricatos foram contemplados com recursos da chamada Lei Aldir Blanc (Lei Federal 14.017), cujo objetivo � reparar danos ocorridos ao longo do ano de 2020, relacionados ao necess�rio distanciamento social e consequente interrup��o de atividades presenciais, fonte de renda do setor. Mas o apoio � considerado insuficiente.

“Os recursos da Lei Aldir Blanc, al�m de terem alcan�ado parcela �nfima – 7,5% dos trabalhadores da cadeia produtiva do carnaval –, ainda se prestaram a recompor o que foi perdido ao longo de 2020, n�o se destinando a compensar os preju�zos, de ordem da sobreviv�ncia pessoal inclusive, com o cancelamento do carnaval em 2021 e demais atividades presenciais ao longo do ano”, afirma o m�sico Matheus Brant.

Procurada para se posicionar sobre as queixas dos carnavalescos, a Belotur informou, em nota, que a Secretaria Municipal de Cultura e a Funda��o Municipal de Cultura contemplaram via Lei Aldir Blanc profissionais e grupos ligados ao carnaval da capital, com o total de R$ 657 mil, ainda em 2020.
Afirmou ainda que, entre os beneficiados est�o blocos e escolas de samba tradicionais de diversas regi�es da cidade, incluindo o Bloco Caricato Os Inocentes de Santa Tereza, o Gr�mio Recreativo Escola de Samba Imperatriz de Venda Nova, a Fanfarra Feminina Sagrada Profana, o Bloco Afro Angola Janga e o Ent�o, Brilha!, entre muitos outros. A prefeitura, acrescentou a Belotur, tamb�m apoiou financeiramente diversos blocos de carnaval e projetos relacionados ao tema por meio da Lei Municipal de Incentivo � Cultura.

ENTREVISTA

Guto Borges, historiador e carnavalesco

“Se tudo der certo, estaremos de volta”

Como voc� avalia essa parada, em fun��o do isolamento social, do carnaval de Belo Horizonte?
Ao longo da hist�ria, j� houve anos que n�o tivemos o carnaval, durante a Segunda Guerra Mundial. Os mais antigos contam isso, o mestre Conga, o pessoal que viveu o carnaval na d�cada de 1940, relata situa��es excepcionais, de escala global, em que o carnaval j� cumpriu esse resguardo. N�o existe alternativa agora. Esse � um dado de realidade que est� acima de nossas vontades, nossos desejos e possibilidades.

E o que pode representar para a festa?
Falando da minha experi�ncia, � uma oportunidade de intervalo. N�o � o fim do carnaval. Estamos h� mais de uma d�cada vivendo esse crescente e n�o ter a festa em um ano � interessante para pensar um pouco sobre esse processo, entender as fragilidades, a for�a que ele tem, inclusive que vai fazer ele superar e sobreviver, pensar o que a gente ganhou com ele, e o que tem a conquistar. Pensar por que se tem um carnaval na cidade. A pandemia vem trazer isso para a gente tamb�m: a import�ncia dessas festividades coletivas, movimentos e espa�os coletivos, porque sem eles a cidade n�o faz sentido. A gente vive em cidade pelo sentido das coletividades e n�o desses n�cleos privados. Agora estamos vivendo a radicaliza��o dessa priva��o do contato com os outros. E a gente est� vendo que n�o � para isso que as cidades foram feitas. Na falta, talvez se reflita melhor.

Voc� considera que as lives, as atividades no ambiente digital podem ser uma alternativa?
A gente viveu, logo que come�ou a quarentena, esse movimento do ambiente virtual, que pode ser paliativo, mas n�o substitui. A experi�ncia da coletividade est� suspensa. Posso dizer dos grupos que fa�o parte: n�o existe a possibilidade de virtualiza��o disso. A gente faz outro tipo de festa, festa no sentido coletivo, n�o tem separa��o p�blico, banda e nem muito menos palco. Vamos ter uma retra��o: vamos viver um carnaval muito de mem�ria, de reflex�o. � bom entender isso e tentar tratar das outras possibilidades que este momento traz.

E os dilemas financeiros?
N�o estou falando do ponto de vista financeiro, pois essa nunca foi minha entrada no carnaval. O bloco de que eu fa�o parte n�o tem patroc�nio, tem apoio do poder p�blico no sentido log�stico, mas n�o tem aporte financeiro. Ent�o, n�o posso falar sobre isso. Meus blocos s�o autossustent�veis. Mam� na Vaca, Peixoto, Tico Tico Serra Copo, Praia da Esta��o, Filhos de Tcha Tcha e Vira o Santo – essa turma da primeira leva, que luta para manter o formato original, nadando contra a mar� da financeiriza��o muito violenta da festa. A gente trata este ano como intervalo. No ano que vem, se tudo der certo, estaremos de volta sem maiores danos. A gente faz um carnaval de valor hist�rico e cultural na cidade. Ele n�o movimenta as massas como outros carnavais movimentam. Importante no sentido hist�rico e cultural fazer essa reflex�o.

Embora n�o seja o seu foco, o que pensa em rela��o ao suporte que o poder p�blico pode oferecer a esses grupos?
Acompanho a discuss�o, acompanho v�rios amigos, e grande parte do ano deles se faz com os shows e apresenta��es de carnaval. Existe cadeia produtiva, e dimens�o econ�mica: n�o s� m�sicos, mas uma cadeia de agentes que v�o sentir o impacto econ�mico. O carnaval se justificava, no n�vel p�blico em Belo Horizonte pelos valores que movimentava. Sempre foi assim que a prefeitura justificou o carnaval perante a cidade. Este ano n�o vai ter esse volume. Ent�o � dram�tica a situa��o dos profissionais. Cito os blocos caricatos e escolas de samba, que dependem das verbas. � um assunto com que a prefeitura vai ter que lidar.

H� solu��o � vista?
N�o nego que exista majoritariamente a preponder�ncia dessa quest�o econ�mica, muito forte e muito grande nessa cadeia. Talvez seja o momento em que Belo Horizonte gire dinheiro num curto espa�o de tempo do ano. Ent�o, vai ser um corte e tanto. � uma economia complexa, n�o se faz s� dos blocos, � mais ampla. Se a prefeitura lan�ar editais cruzados, de v�rias �reas, oferecendo aportes a grupos economicamente mais h�bridos, pode ser uma sa�da. Carnaval sempre foi territ�rio da criatividade, da inven��o. Pode ser muito importante inventar essa modalidade emergencial do ponto de vista econ�mico.

%u201CNão é o fim do carnaval. Estamos há mais de uma década vivendo esse crescente e não ter a festa em um ano é interessante para pensar um pouco sobre esse processo%u201D(foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press - 26/4/17)
%u201CN�o � o fim do carnaval. Estamos h� mais de uma d�cada vivendo esse crescente e n�o ter a festa em um ano � interessante para pensar um pouco sobre esse processo%u201D (foto: Alexandre Guzanshe/EM/D.A Press - 26/4/17)


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