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Estado de Minas RECOME�O

Conhe�a as hist�rias de 3 mulheres migrantes que se tornaram m�es em BH

Lynda, haitiana; Cristina, venezuelana; e Mary, s�ria, encontraram em Belo Horizonte o lugar perfeito para recome�ar a vida e aqui se tornaram m�es


08/05/2022 06:00 - atualizado 08/05/2022 13:21

Lynda Nerat, de 29 anos, haitiana, com a filha Anna e o marido Wilnes
Lynda Nerat, de 29 anos, haitiana, com a filha Anna e o marido Wilnes: "Vim em busca de uma vida melhor, e sou muito grata a todos aqui. Nunca pensei que teria uma filha brasileirinha" (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

A voz suave de Lynda acalanta o sono de Anna Linsay, de quase dois meses, aninhada no colo materno. Com um sorriso aberto, radioso, Cristina brinca com  Luc�a, de 2 anos, protegida do sol forte por um chapeuzinho caribenho. Mary, dona de olhos grandes e luminosos, observa Yasmin, de 7, e Clarissa, de 3, ambas se divertindo com desenhos no papel.

Moradoras da capital e vindas de cantos diferentes do mundo por motivos diversos, as tr�s mulheres migrantes encontraram aqui paz para viver, fortaleceram esperan�as, formaram fam�lia. Ainda como tra�o em comum, todas deram � luz filhas brasileiras, mais exatamente belo-horizontinas.

Neste Dia das M�es, a haitiana Lynda Nerat, a venezuelana Cristina Carolina La Rosa Requena e a s�ria Mary Ghattas Tomeh contam sua travessia at� Minas e agradecem pela acolhida, fator fundamental para tornar a vida menos estrangeira e mais pr�xima de uma “p�tria m�e”.

Tr�s hist�rias, muitas culturas, longos caminhos, sotaques mesclados ao mineir�s e a sobreviv�ncia como guia-mestra. Seria o melhor presente, no Dia das M�es, poder se sentar � mesa, em fam�lia, numa casa sem barulho de bombas, sem falta de comida e fazendo planos? A seguir, respostas, lembran�as e sentimentos.


 

CANTO DE AGRADECIMENTO

“Encontrei em Belo Horizonte muita paz, alegria, amor e trabalho.” As palavras s�o da haitiana Lynda Nerat, de 29 anos, minutos ap�s se despedir do marido e conterr�neo Wilnes Nerozil, de 34, que deixa o apartamento no Bairro Juliana, na Regi�o Norte, em dire��o ao servi�o.

“Vim para o Brasil com a vontade de estudar enfermagem. Ainda n�o foi poss�vel, mas vou conseguir”, diz a mulher com determina��o e todo carinho ao colocar, no ber�o, a filha Anna Linsay. “Ela nasceu no dia do nosso quarto anivers�rio de casamento, 24 de mar�o.”

Natural de Porto Pr�ncipe e tendo o franc�s e o crioulo como idiomas, Lynda chegou h� quatro anos e se encontra como residente com base em acolhida humanit�ria – desde a ocorr�ncia do terremoto que destruiu parte do Haiti, em 2010, o Brasil passou a receber grande n�mero de migrantes do pa�s da Am�rica Central, inicialmente na condi��o de refugiados.

Um ano e cinco meses depois da chegada de Lynda, veio o marido, agora trabalhando como auxiliar de produ��o.

Cuidadora de idosos e desempenhando a fun��o em servi�os gerais, Lynda gosta de cantar, e, com esse talento, participa das missas no Santu�rio Arquidiocesano S�o Jos�, mais conhecido como Igreja S�o Jos�, no Centro de BH.

Em 20 de junho do ano passado, Dia Mundial do Refugiado, ela soltou a voz num festival on-line. Quando est� com a filhinha no colo, como ocorreu diante da reportagem do Estado de Minas, na tarde de ter�a-feira, cantou uma m�sica, que se resume em agradecimento, na “l�ngua materna, o crioulo”.

A can��o-agradecimento parece ecoar pela cidade, traduzindo o sentimento de Lynda Nerat: “Vim em busca de uma vida melhor e sou muito grata a todos aqui. Nunca pensei que teria uma filha brasileirinha”.

Em seguida, revela que o plano de viajar foi favorecido pela presen�a de parentes residentes na capital mineira e a ajuda do Servi�o Jesu�ta a Migrantes e Refugiados (SJMR), obra da Companhia de Jesus presente em sete estados brasileiros e 56 pa�ses para acompanhamento das pessoas, incluindo regulariza��o de documentos, inclus�o na sociedade, busca de trabalho, seguran�a alimentar, aprendizagem da l�ngua portuguesa e outros aspectos.

Lynda trabalhou em casa de uma fam�lia no SJMR e depois no Col�gio Loyola. Ao engravidar, o que ainda n�o estava nos planos do casal, diz ter ficado impressionada com o cuidado e a aten��o recebidos.

“Fiquei surpresa, pois encontrei pessoas extraordin�rias. Me senti muito amada. Tenho muita sorte no Brasil. Tudo isso me deixa animada.”

Hoje, ela pretende fazer pratos populares no seu pa�s, onde se comemora o Dia das M�es no �ltimo domingo de maio.

“Ent�o, posso festejar duas vezes”, brinca citando o card�pio: macarr�o ao forno, banana-da-terra frita e um refogado de chuchu com cenoura temperado com pimenta. Para a filha, ainda n�o tem planos, embora certa de que ela vai aprender “franc�s, o crioulo, ingl�s e todas as outras l�nguas que quiser”.

Cristina Carolina La Rosa Requena, de 33, venezuelana, com a filha Lucía e o marido Pedro Luis
Cristina Carolina La Rosa Requena, de 33, venezuelana, com a filha Luc�a e o marido Pedro Luis: "O Brasil � algo diferente, incr�vel mesmo. Tudo o que vivemos, cada momento, foi um ato de Deus" (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

A LONGA JORNADA

Para compreender a jornada dos migrantes (emigrantes na partida do seu pa�s; imigrante na chegada � nova terra), s� mesmo tentando se colocar no lugar de cada um deles.

A melhor forma de entendimento, sem d�vida, est� em ouvir com aten��o os relatos, visualizando situa��es, mergulhando nas hist�rias. A venezuelana Cristina Carolina La Rosa Requena, de 33, percorreu uma longa rota at� Belo Horizonte, incluindo seis dias pelo Rio Amazonas.

Professora de inform�tica na Venezuela, analista j�nior no Brasil, Cristina e o marido, Pedro Luis Salazar, deixaram a cidade de Matur�n, capital do estado de Monagas, em dire��o a Pacaraima, em Roraima, na fronteira dos dois pa�ses.

Depois seguiram de Manaus (AM) a Bel�m (PA), onde ficaram por tr�s meses. “Sobrevivemos vendendo artesanato nas ruas, pulseiras principalmente. Alugamos uma casa e dorm�amos num colch�o t�o cheio de �caros que tivemos problemas de pele. Foi a� que conhecemos a acolhida brasileira. Um senhor que comprava as pulseiras nos ajudou, comprou rem�dios durante dois meses”, conta a simp�tica Cristina, moradora de um apartamento no Bairro Jardim Vit�ria, na Regi�o Norte de BH, com o marido, a filha Luc�a e a m�e, Renata Carolina Requena
.
“N�o est�vamos sendo perseguidos politicamente, n�o”, esclarece Carolina. “O motivo maior foi a inseguran�a... falta de comida mesmo. Acordava �s 3h e ficava cinco horas na fila esperando o supermercado abrir. E n�o tinha quase nada l�.”

Ao lado, a m�e, Renata, compara dois tempos do pa�s rico em petr�leo e lamenta a situa��o econ�mica catastr�fica dos �ltimos anos.

Devido �s quest�es pol�ticas no pa�s vizinho, ao fluxo migrat�rio crescente na dire��o de Pacaraima (RR) e � grave crise social, econ�mica e humanit�ria, o governo brasileiro criou uma resid�ncia para pa�ses fronteiri�os (Venezuela, Guiana e Suriname).

O visto tem validade inicial de dois anos, com renova��o e possibilidade de se tornar permanente.

“Aqui encontramos tranquilidade para viver”, conta a venezuelana, cuja ideia inicial era voltar ao seu pa�s ou se encontrar com familiares no Peru.

Em Bel�m, o casal se informou sobre uma unidade do SJMR e chegou a BH h� quatro anos ap�s outra viagem atribulada, fazendo baldea��es, atravessando regi�es desconhecidas e ainda com as dificuldades do idioma, hoje barreira superada.

“Se voc� est� nessa situa��o, precisa aprender quatro frases: obrigado; onde � o banheiro?; tenho fome; e um copo d’�gua, por favor”, ensina, sem perder o bom humor.

Depois de trilhar vias tortuosas e encarar incertezas, Cristina revela que, no Brasil, e especialmente em Minas, encontrou acolhimento.

“� algo diferente, incr�vel mesmo. Tudo o que vivemos, cada momento, foi um ato de Deus. E confesso que, se algu�m quiser conhecer Deus, deve viajar para o Brasil.”

A exemplo da haitiana Lynda, que tamb�m teve beb� no Hospital Maternidade Sofia Feldman, ela tamb�m n�o imaginava ser m�e de uma brasileirinha.

“Minha neta adora feij�o. E n�o pode ser o que fa�o, n�o. Gosta mesmo � do mineiro, que compramos na marmita”, diz a vov� Renata.}

Mary Ghattas Thome, de 33, síria, com as filhas Yasmin, de 7, e Clarissa, de 3
Mary Ghattas Thome, de 33, s�ria, com as filhas Yasmin, de 7, e Clarissa, de 3: "Em Belo Horizonte, nunca me senti estrangeira nem nunca me fizeram sentir assim" (foto: Juarez Rodrigues/EM/D.A Press)

DE OUTRAS TERRAS

No Centro da capital, moram Khaled Tomeh e Mary Ghattas com as filhas Yasmin, de 7, e Clarissa, de 3, ambas nascidas na Santa Casa, na regi�o hospitalar.

H� oito anos em BH, desde que deixou a S�ria, no Oriente M�dio, pa�s destro�ado pela guerra civil, o casal refez a vida e j� se naturalizou brasileiro, o que enche de alegria a mam�e, de 33 anos, nascida em Damasco, considerada a cidade mais antiga do mundo.

“Sou mineira, uai!”, brinca Mary, que trabalhava como contabilista numa empresa grande e hoje divide o tempo, ao lado do marido, no comando das duas lojas de comida �rabe abertas no Bairro S�o Pedro e no Mercado Central.

“Cresci no mercado de Damasco, conhecia tudo por ali. Nunca havia pensado em sair da minha terra, no m�ximo o L�bano, que � bem perto”, conta Mary, que sonha estudar gastronomia.

Mas tudo no tempo certo, avisa. Formado em engenharia de agricultura e engenharia de alimentos na S�ria, Khaled, de 38, descobriu, ao chegar ao Brasil, que os certificados n�o eram v�lidos no pa�s, sendo necess�rio recome�ar os estudos para se reestabelecer – assim, graduou-se em ci�ncias biol�gicas na PUC Minas.

Na sala do apartamento, Mary conta que aprende muito com Yasmin, especialmente sobre a cultura mineira, express�es, palavras novas em portugu�s. 

“Meu marido e eu somos fluentes em ingl�s, o que ajudou na nossa chegada. Mas, no in�cio, principalmente na gravidez da primeira filha, quando n�o sabia nada de portugu�s, tive ajuda de muitas pessoas. Sentia vergonha, �s vezes solid�o, mas ningu�m nunca desistiu de mim.”

Em 2017, o casal voltou � S�ria para apresentar Yasmin aos av�s, tios e outros parentes: “Ficamos l� 40 dias, mas me senti estrangeira em meu pa�s. Estava tudo diferente. Em Belo Horizonte, nunca me senti assim... nem nunca me fizeram sentir estrangeira.” 

Embora a situa��o n�o estivesse t�o desesperadora como quando emigraram, o quadro desanimava. “J� pensou n�o ter �gua na torneira?”, pergunta, para, logo em seguida, se mostrar bem tranquila e feliz. Afinal, ainda este m�s, a m�e dela, Thanaa, de 58, vai se juntar � fam�lia, em BH.

A palavra fam�lia � pronunciada em tom de ora��o, com entusiasmo e delicadeza, enquanto a mam�e abra�a as meninas. “Estar nesta cidade � um al�vio, d� tranquilidade. Somos muito gratos ao Brasil”, diz Mary. Em BH, moram os pais de Khaled, Waled e Maria, professora de l�ngua �rabe, e o irm�o dele, George, arquiteto e tradutor de l�ngua �rabe para o ingl�s.

A exemplo da fam�lia Tomeh, migrantes e refugiados de outros pa�ses, como Haiti e Venezuela, recebem apoio da PUC Minas, por meio da C�tedra S�rgio Vieira de Melo, entidade da Ag�ncia da Organiza��o das Na��es Unidas para Refugiados (Acnur). O objetivo � garantir que pessoas refugiadas e solicitantes de ref�gio tenham acesso a direitos e servi�os no Brasil, oferecendo apoio ao processo de integra��o local.


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