
Japonvar/Lontra - Na bifurca��o de uma estrada de terra que d� acesso �s comunidades de Nova Minda e Melancias, na zona rural de Japonvar, a 12 quil�metros da �rea urbana da cidade do Norte de Minas, ao longo de d�cadas, um majestoso p� de pequi chamava a aten��o de quem passava por l�. Mas, com cerca de 17 metros de altura, conhecida popularmente como o Pequizeir�o do Entroncamento de Nova Minda, a imponente �rvore morreu h� cinco anos. Hoje, ainda se destaca, mas por causa do tronco e galhos secos, que s�o uma sombra da exuber�ncia de outros tempos.
Cenas como essa, de pequizeiros mortos, se multiplicam em outras comunidades do Norte de Minas. Resultado de uma praga que tem atacado a esp�cie, causando enormes preju�zos � regi�o.
Produtores, t�cnicos e pesquisadores travam uma luta contra a broca-do-tronco do pequizeiro, vista como uma amea�a ao fruto s�mbolo do cerrado. Estimativas apontam que desde que foi identificada, h� oito anos, a larva colocou fim � vida de milhares de �rvores na regi�o, ao se alimentar da parte lenhosa do tronco (cerne). Com isso, impede a passagem da seiva, que alimenta a planta, levando-a parar de produzir, at� provocar sua morte.
“Se fosse em humanos, � como se a lagarta, ao longo do tempo, cortasse as veias que levam o sangue e oxig�nio para todas as partes do corpo. Da� a morte da planta por partes, desde as ra�zes at� os galhos mais altos, pois, se n�o recebem a seiva, eles v�o morrer”, explica Fernando Cardoso de Oliveira, t�cnico da Empresa de Assist�ncia T�cnica e Extens�o Rural de Minas Gerais (Emater-MG).
Cada pequizeiro que interrompe a produ��o ou morre significa perda de alimento e menos dinheiro circulando nos pequenos munic�pios norte-mineiros, j� que nesses locais a esp�cie nativa do cerrado exerce grande influ�ncia econ�mica e social. No caso de Japonvar, estudos apontam que em torno dos 50% dos p�s de pequi do munic�pio foram atacados pela praga, causando grande baque na vida da popula��o, j� que 63% dos cerca de 8,3 mil habitantes locais recebem algum dinheiro catando o fruto no mato ou revendendo-o durante a safra, segundo estudo Emater-MG.
Como maneira de amenizar os preju�zos e salvar a esp�cie, surgiu na regi�o a iniciativa de produzir mudas da planta para recompor os pequizais. Mas a grande esperan�a no combate � broca do pequizeiro vem da ci�ncia e da tecnologia. Est� em andamento no Norte do estado uma pesquisa que visa desenvolver uma forma eficaz de combater e evitar a reprodu��o do inseto que ataca as �rvores do fruto s�mbolo do cerrado, tamb�m conhecido como o “ouro” ou a “carne do sert�o”.
O estudo � coordenado por Ant�nio Cl�udio Ferreira Costa, pesquisador do Laborat�rio de Entomologia da unidade da Empresa de Pesquisa Agropecu�ria do Estado de Minas Gerais (Epamig) em Nova Porteirinha, no Norte de Minas. Segundo ele, o trabalho consiste em um estudo do controle da popula��o da broca do pequizeiro, “usando princ�pios agroecol�gicos e a colabora��o dos produtores rurais propriet�rios dos pequizeiros, dos catadores de pequi e dos extensionistas da Emater-MG”.
“O objetivo � extrair a subst�ncia que a mariposa f�mea libera para atrair os machos (ferom�nio sexual feminino) e utiliz�-la como isca em armadilhas para capturar os machos e, assim, reduzir a multiplica��o do inseto”, explica Costa. O pesquisador salienta que o estudo foi iniciado em 2019, ap�s a Emater-MG ter procurado o Laborat�rio da Epamig em Nova Porteirinha, no chamado Campo Experimental do Gorutuba. O experimento tem financiamento do Fundo Pr�-Pequi de Minas Gerais, com o apoio das prefeituras dos munic�pios atingidos pela broca.
O estudioso da Epamig lembra que a ocorr�ncia da praga que ataca a �rvore s�mbolo do cerrado n�o est� restrita ao Norte de Minas. O inseto j� foi coletado em pequizeiros em Sete Lagoas, na Regi�o Central mineira, e no vizinho estado de Goi�s.
ATAQUES REDUZEM RESIST�NCIA � SECA
O pesquisador Ant�nio Cl�udio Costa salienta que a broca do pequizeiro acaba deixando os p�s de pequi menos resistentes ao clima semi�rido e mais expostos a doen�as e ataques de outros insetos. “O ataque da lagarta causa redu��o na circula��o da seiva, tornando os pequizeiros menos produtivos, mais suscet�veis a doen�as e a outras pragas, al�m de ficarem menos tolerantes a estiagens prolongadas e ventos fortes”, explica.
O t�cnico da Emater-MG Fernando Cardoso ressalta que a colheita predat�ria, quando se arranca o fruto no p� – o ideal � esperar que caia ao ch�o –, acaba facilitando o ataque da praga. “Quando a pessoa retira o pequi do p� antes do tempo correto, sem esperar o fruto cair, deixa uma les�o na planta, que acaba servindo como porta de entrada para doen�as e pragas. Isso facilita o ataque da broca”, explica Cardoso.
Ele ressalta que no Norte de Minas houve um ataque mais severo aos pequizeiros em 2017, com maior incid�ncia nos lugares onde mais se cata o fruto da esp�cie nativa.

Uni�o contra a amea�a biol�gica
Diante da amea�a biol�gica aos pequizais, em munic�pios do Norte de Minas, est� sendo promovida mobiliza��o de produtores rurais propriet�rios de pequizeiros e de catadores de pequi para participar da pesquisa para controle da broca do pequizeiro. A ideia � que o combate ocorra sem agrot�xicos, mas aplicando informa��es sobre a comunica��o qu�mica entre mariposas machos e f�meas da praga. Por�m, especialistas advertem que esse tipo de iniciativa n�o pode ser localizada.
Hoje, a a��o conta com a parceria de extensionistas da Emater-MG, sindicatos rurais, associa��es de produtores e prefeituras. “� necess�rio expandir essa iniciativa, transformando-a em campanha de mobiliza��o para todas as regi�es de ocorr�ncia de pequizeiros no estado de Minas Gerais. Por isso, convocamos todos os cidad�os mineiros a se juntarem a esse esfor�o para preservar o pequizeiro e a sustentabilidade do extrativismo do pequi”, conclama o pesquisador da Epamig Ant�nio Cl�udio Costa.
Ele pede ainda a todos que perceberem algum sinal de ataque da broca do pequizeiro em suas propriedades que comuniquem a ocorr�ncia � Epamig, por e-mail ([email protected] ou [email protected]) ou que avisem os t�cnicos de algum escrit�rio local da Emater-MG.
PLANTIO COLETIVO
Diante do ataque da broca do pequizeiro, agricultores, t�cnicos e entidades t�m feito um esfor�o coletivo para plantar mudas de pequi e, assim, amenizar os preju�zos causados pela praga, afastando a amea�a de extin��o da esp�cie nativa do cerrado.
Diante do ataque da broca do pequizeiro, agricultores, t�cnicos e entidades t�m feito um esfor�o coletivo para plantar mudas de pequi e, assim, amenizar os preju�zos causados pela praga, afastando a amea�a de extin��o da esp�cie nativa do cerrado.
Essa mobiliza��o ocorre em cidades como Lontra, de 9,8 mil habitantes, onde a Emater-MG criou um viveiro de mudas de pequizeiro contando com o apoio da prefeitura local e do Instituto Estadual de Florestas (IEF). Conta tamb�m com participa��o direta de pequenos produtores rurais e catadores de pequi da regi�o, que atuam como volunt�rios.
O viveiro foi instalado nos segundo semestre de 2022, com o cultivo inicial de 1 mil mudas. Mas � um trabalho que exige paci�ncia. A semente de pequi, em condi��es naturais, demora de 60 a 90 dias para germinar. O t�cnico da Emater Ramon Gon�alves, respons�vel pela cria��o do viveiro, explica que, para reduzir o tempo de produ��o de mudas, est� sendo usado o �cido giber�lico, um horm�nio vegetal encontrado no mercado.
Antes de ser plantada, a semente fica submersa por um per�odo de dois a quatro dias em solu��o de �gua misturada ao �cido. A subst�ncia eleva a capacidade de germina��o da semente de pequi, que, com a tecnologia, demora de 40 a 60 dias para brotar.
Uma das volunt�rias do viveiro de mudas � Maria Valdete da Silva Niz, presidente da Associa��o dos Pequenos Produtores e Moradores da Comunidade da Vila Uni�o, no munic�pio de Lontra. Ela considera que a produ��o de mudas � a esperan�a para evitar o sumi�o da esp�cie nativa do cerrado, diante do ataque da broca do pequizeiro, que tem causado a morte de �rvores de mais de meio s�culo na regi�o.
“A gente vai recompor as �reas de pequizais que tiveram muitas perdas com o ataque da praga”, projeta Maria Valdete, que contribui com o viveiro de mudas cedendo sementes de pequi.
PARCERIA
O comerciante de pequi Joaquim Antunes, de Japonvar, tamb�m resolveu agir em prol da manuten��o dos pequizais que garantem o movimento do seu neg�cio. Ele adquiriu 550 mudas no Mato Grosso, que foram distribu�das para propriet�rios rurais do Norte de Minas. A maioria foi destinada a dois sitiantes em forma de parceria – quando as plantas come�arem a produzir (no prazo de cinco a seis anos), eles devem dividir a colheita com Joaquim.
O comerciante de pequi Joaquim Antunes, de Japonvar, tamb�m resolveu agir em prol da manuten��o dos pequizais que garantem o movimento do seu neg�cio. Ele adquiriu 550 mudas no Mato Grosso, que foram distribu�das para propriet�rios rurais do Norte de Minas. A maioria foi destinada a dois sitiantes em forma de parceria – quando as plantas come�arem a produzir (no prazo de cinco a seis anos), eles devem dividir a colheita com Joaquim.
O pesquisador Ant�nio Cl�udio Ferreira Costa, da Epamig, ressalta a relev�ncia da a��o dos agricultores e catadores de pequi ao plantar mudas da esp�cie. “� uma iniciativa que merece elogios porque, al�m do empreendedorismo de obter renda com os futuros pomares de pequizeiros, tamb�m colabora com a preserva��o do material gen�tico (a biodiversidade) dos pequizeiros em Minas Gerais. Por isso, � essencial que pequizais plantados sejam formados a partir de sementes de plantas da mesma regi�o”, conclui o pesquisador da Epamig.
Tesouro atual era lenha para carv�o
Em Japonvar, um dos p�los de colheita do pequi no Norte de Minas, o agricultor e comerciante Ednaldo Pereira Barbosa, de 54 anos, recorda que, quando era crian�a, em meados da d�cada de 1970, a atividade carvoeira se expandiu na regi�o, servindo como alternativa de renda diante de forte seca.
“Recordo-me de que o pequizeiros eram derrubados para fazer carv�o, pois a madeira n�o tinha outra serventia”, diz o Ednaldo. Na �poca, ainda n�o existia a proibi��o do corte da �rvore s�mbolo do cerrado em Minas, efetivada pela Lei Estadual 10.883, de 2 de outubro de 1992.
Passadas v�rias d�cadas, o morador de Japonvar destaca que a situa��o da esp�cie nativa � outra. “Hoje, o pequizeiro � uma das principais fontes de renda do Norte de Minas”, assegura Ednaldo, que, al�m de produtor rural, tornou-se um dos grandes comerciantes do fruto na regi�o. Ele compra o produto de catadores de Japonvar e de diversos outros munic�pios do entorno e o revende para outras regi�es de Minas e para Bras�lia, Goi�s e Bahia. Nesta safra, ele estima que deve comercializar 10 mil caixas vendidas, 25% a mais que as 8 mil caixas da colheita anterior.
Como agricultor, Ednaldo tamb�m se dedica � prote��o da esp�cie nativa. Ele tem duas glebas de terra no munic�pio, que somam 70 hectares, onde h� cerca de 2 mil p�s de pequi. “Al�m de preservar os existentes quero plantar mais”, afirma, lembrando que vem investindo na melhoria da estrutura das propriedades rurais. Para isso, recorreu a empr�stimos do Fundo Constitucional de Desenvolvimento do Nordeste (FNE).

A lagarta que se alimenta do cerne do tronco do pequizeiro � a fase jovem de uma mariposa que na vida adulta p�e ovos na casca da �rvore. Quando eles eclodem, as lagartinhas bem pequenas procuram formas de penetrar no tronco, do qual se alimentam. O sinal de ataque � a presen�a das fezes da praga no solo, pr�ximo ao tronco. Ao se alimentar, as larvas abrem galerias internas, tanto na dire��o da copa quanto da raiz, o que vai interrompendo o fluxo de seiva para diversas partes da planta, at� mat�-la.
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