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Estado de Minas VISITA DE BOLSONARO

Da comida � religi�o: as semelhan�as entre R�ssia e Brasil

Catorze horas de avi�o separam Bras�lia de Moscou %u2014 s�o mais de 11 mil quil�metros. E um sem-n�mero de diferen�as hist�ricas, culturais, �tnicas, sociais, geogr�ficas e clim�ticas, � claro. Mas, olhando bem, h� tamb�m muito em comum entre brasileiros e russos.


14/02/2022 08:21 - atualizado 14/02/2022 10:36
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Kremlin
Catorze horas de avi�o separam Bras�lia de Moscou %u2014 e olhando bem, h� muito em comum entre brasileiros e russos. (foto: Getty Images)

Catorze horas de avi�o separam Bras�lia de Moscou — s�o mais de 11 mil quil�metros. E um sem-n�mero de diferen�as hist�ricas, culturais, �tnicas, sociais, geogr�ficas e clim�ticas, � claro. Mas, olhando bem, h� tamb�m muito em comum entre brasileiros e russos.

"O Brasil exerce uma esp�cie de fasc�nio sobre os russos, e a R�ssia, sobre os brasileiros", diz a jornalista Vivian Oswald, em seu livro Com Vista para o Kremlin. "A grande dist�ncia entre estes pa�ses continentais — quase intang�vel para aqueles que nunca a percorrer�o — se encarrega de apimentar os imagin�rios coletivos com uma dose de exotismo e muitas pitadas de estere�tipos em rela��o ao outro."

"Al�m da dimens�o continental e as temperaturas extremas, o Brasil para mais, a R�ssia para menos, h� pouca coisa [em comum entre os pa�ses]", comenta o pesquisador e escritor Paulo Rezzutti, que j� escreveu livros sobre as duas na��es. "Eles [os russos] t�m um respeito e conhecimento pelo seu passado e pela sua cultura que o brasileiro m�dio n�o chega aos p�s. Eles s�o simp�ticos, mas mais fechados."

A seguir, algumas curiosidades sobre esses dois pa�ses.

Gigantes

Ambos est�o na seleta lista dos pa�ses de dimens�es continentais. A R�ssia — que na �poca da Uni�o Sovi�tica chegou a ter uma �rea de 22,5 milh�es de quil�metros quadrados — lidera o ranking mundial com impressionantes 17 milh�es de quil�metros quadrados. Caberiam na R�ssia quase 39 milh�es de Vaticanos.

O Brasil n�o perde feio. Com 8,5 milh�es de quil�metros quadrados, � o quinto maior pa�s do mundo.

Essas enormidades fazem de ambos os territ�rios espa�o para diversidades clim�ticas e culturais. E isso se reflete at� nos fusos hor�rios: o Brasil tem quatro, a R�ssia tem 11.

Em termos populacionais, o Brasil est� na frente. Tem a sexta maior popula��o do mundo, com 216 milh�es de habitantes. Os russos s�o 145 milh�es — figuram na nona coloca��o.

Por outro lado, parece que atra�mos mais os russos do que o contr�rio. Dados mais recentes do Minist�rio das Rela��es Exteriores registram apenas 1,1 mil brasileiros vivendo na R�ssia. Segundo a Embaixada da Federa��o Russa no Brasil, h� 35 mil russos vivendo no Brasil. No livro Imigrantes Russos no Brasil, o pesquisador Igor Chnee afirma que vivem em solo brasileiro 1,8 milh�o de descendentes de imigrantes russos atualmente.

Novelas e futebol

Russos e brasileiros compartilham alguns gostos em comum. As novelas, por exemplo. Produ��es nacionais s�o exibidas por l� desde a �poca sovi�tica — com A Escrava Isaura. E seguem sendo um hit.

"Fonte inesgot�vel de informa��es sobre cen�rios e comportamentos tipicamente brasileiros, as nossas novelas continuam fazendo sucesso na R�ssia", diz Oswald, em seu livro. "Acho que boa parte da simpatia que nutrem por n�s […] vem das imagens que guarda das novelas. Descobri, inclusive, que as novelas brasileiras est�o entre os itens mais pirateados da internet russa, segundo dados de uma empresa de seguran�a que acompanha movimentos suspeitos de c�pias e reprodu��es piratas na rede."


Vagner Love no CSKA
V�gner Love fez hist�ria no CSKA Moscou, onde jogou de 2004 a 2012 e, depois, novamente em 2013. (foto: Getty Images)

"� comum v�-los sonhando com as praias cariocas", acrescenta ela.

O futebol � outra paix�o em comum. E a� russos n�o pestanejam em exaltar nomes como Pel�, Ronaldinho, Kak�, Neymar… E V�gner Love, atacante que est� longe de ter se tornado uma unanimidade no Brasil, mas que fez hist�ria no clube CSKA Moscou, onde jogou de 2004 a 2012 e, depois, novamente em 2013.

Coincidentemente, Brasil e R�ssia foram os pa�ses-sede das �ltimas duas Copas do Mundo, respectivamente em 2014 e 2018.

Religi�o

Mais de 100 milh�es de russos se declaram crist�os da Igreja Ortodoxa — embora se estime que o n�mero de fi�is ativos esteja entre 20 e 30 milh�es. No Brasil, s�o quase 119 milh�es de cat�licos — e 170 milh�es que se dizem crist�os.


Igreja do Sangue em Honra de Todos os Santos que Resplandeceram na Terra Russa, em Ecaterimburgo
Igreja do Sangue em Honra de Todos os Santos que Resplandeceram na Terra Russa, em Ecaterimburgo, no mesmo local onde os Romanov foram executados: (foto: Edison Veiga)

Al�m da religiosidade em si, a hist�ria das duas principais denomina��es religi�es tamb�m diz muito sobre a forma��o social de ambos os pa�ses. Isto porque as igrejas Cat�lica Apost�lica Romana e Ortodoxa Russa t�m uma raiz comum — e guardam semelhan�as e uma rela��o de respeito m�tuo.

O racha hist�rico entre esses dois mundos ocorreu em 1054, no epis�dio chamado de Cisma do Oriente. Conforme explica o vaticanista Filipe Domingues, doutor pela Pontif�cia Universidade Gregoriana de Roma e vice-diretor do Lay Centre em Roma, uma diferen�a importante � que a Igreja Ortodoxa "n�o tem a autoridade central, como os cat�licos t�m o papa".

"S�o igrejas autoc�falas, com patriarcas, que s�o l�deres locais. No caso russo, h� a figura do patriarca de Moscou, atualmente Cirilo 1º. Para os ortodoxos, papa Francisco seria o "patriarca de Roma".

A rela��o � amig�vel. Em 2016, Francisco e Cirilo se encontraram, em um gesto hist�rico. "Ao mesmo tempo, � uma rela��o de cuidado, diplom�tica. Porque a Igreja Russa � muito influenciada pelo governo russo", diz Domingues.

Nesse sentido, pode haver algum paralelo com o presidente brasileiro Jair Bolsonaro, que costuma adotar pautas moralistas, se aproximando do eleitorado crist�o conservador.

"[O presidente russo Vladimir] Putin usa a Igreja Ortodoxa como um meio de controle. � quase a religi�o oficial. Os bispos agem como parte do governo russo", analisa Domingues.

Uma nostalgia reacion�ria

Na pol�tica, o pesquisador Paulo Rezzutti, autor de diversas biografias sobre personalidades do antigo imp�rio brasileiro e do rec�m-lan�ado Os �ltimos Czares - Uma Breve Hist�ria N�o Contada dos Romanov, observa que "as simpatias monarquias em ambos os pa�ses nunca morreram".

"Acabaram se metamorfoseando com o tempo", pontua ele. "A extrema-direita, em ambos os pa�ses, � anticomunista e tradicionalista, autorit�ria e nacionalista. O que une muitos dentro desse espectro pol�tico � o tradicionalismo, representado pela monarquia, tanto que diversos pol�ticos brasileiros n�o tiveram o menor escr�pulo em surfar na onda o movimento, sem saber o m�nimo sobre nossa hist�ria e seus personagens e ainda tentando emplacar fake news a respeito deles."

"Aqui no Brasil, a bandeira do Imp�rio brasileiro retornou em alguns gabinetes pol�ticos e at� chegou a ser hasteada em algumas cidades", lembra Rezzutti. "Na R�ssia, houve amea�as de bombas em cinemas e uma cr�tica feroz ao filme Mathilde, de 2017, sobre uma bailarina que foi amante do czar Nicolau 2º."

Nesse sentido, a religiosidade tamb�m permeia os discursos. Se entre parcela dos monarquistas brasileiros h� um movimento que pede a canoniza��o da princesa Isabel, os Romanov j� gozam dessa prerrogativa dos altares.

"Nicolau, Alexandra e os cinco filhos foram canonizados em 1981 como neom�rtires pela Igreja Ortodoxa Russa no exterior. Para esse ramo, por ter sido chefe espiritual da Igreja Ortodoxa, Nicolau fora sacrificado por causa de sua f�, e isso era prova de sua santidade", contextualiza o pesquisador.

"A Igreja Ortodoxa Russa, depois de muito debate, tamb�m canonizou posteriormente Nicolau, Alexandra e os filhos, mas como portadores da paix�o, ou seja, pessoas que encararam a morte com resigna��o. A evid�ncia disso seria o sinal da cruz feito por Alexandra e Olga antes de morrerem", completa.

V�cios

Bebe-se muito em ambos os pa�ses, � verdade. Nos dois casos, acima da m�dia global — em torno de 6,2 litros por pessoa ao ano. Mas entre cacha�as e vodcas, os russos s�o muito mais exagerados do que os brasileiros: 15,2 litros anuais per capita, contra 8,7.

"O risco de morte violenta entre os homens […], em geral causada pelo abuso de �lcool ou drogas, � de tr�s a quatro vezes superior ao de outros pa�ses da Europa e das Am�ricas", pontua Oswald, em seu livro sobre a R�ssia. "O �lcool, o tabaco e, mais recentemente, as drogas est�o entre os principais respons�veis pela morte precoce dos locais, sobretudo dos homens."

Segundo a autora, o �lcool � visto como um dos maiores vil�es da na��o. "Chama a aten��o do estrangeiro a rela��o dos russos com a bebida. Homens e mulheres podem ser vistos a qualquer carregando garrafas gra�das de cerveja pela rua", frisa ela.

"Uma das imagens cl�ssicas do inverno � a de garrafas de vodca enterradas parcialmente na neve", conta. "Alguns dos seus donos acabam na mesma situa��o. Reza a lenda que se a nevasca for muito intensa e o gelo durar por muito tempo, s� s�o encontrados depois de passado o inverno."

E se no Brasil cigarro � algo visto como fora de moda, e principalmente os jovens n�o demonstram interesse pelo tabagismo, na R�ssia o cen�rio � preocupante. De acordo com dados do livro Com Vista para o Kremlin, 75% dos homens fumam e 70% dos estudantes na faixa entre os 13 e 18 anos tamb�m alimentam o v�cio. Al�m disso, o tabagismo faz parte do cotidiano de metade das gr�vidas.

No prato

De um lado, del�cias como a feijoada. De outro, pratos famosos como estrogonofe.

Que, vale ressaltar, ganhou tamb�m suas vers�es brasileiras e caiu no gosto popular. A jornalista Vivian Oswald conta, em seu livro, que os russos "surpreendem-se ao descobrir que o brasileiro come seu aportuguesado estrogonofe sempre, desde crian�a".


Estrogonofe
Estrogonofe, um prato russo, caiu no gosto popular brasileiro (foto: Getty Images)

Mas as diferen�as est�o nos ingredientes. Na R�ssia, n�o vai tomate. E o creme de leite � uma vers�o um pouco diferente, chamada de smetana, comum ali�s aos pa�ses de cultura eslava. "O prato costuma ser servido com batatas cozidas ou pur� de batatas", detalha a jornalista. "Arroz, muito de vez em quando. E n�o � lenda: as russas, de fato, t�m a receita na ponta da l�ngua."

O mais importante, contudo, � a carne. Ao contr�rio das inven��es brasileiras — com vers�es de frango e at� camar�o —, para um russo n�o � admiss�vel estrogonofe que n�o seja feito de carne de boi.

Na alta gastronomia os russos tamb�m t�m seus expoentes. No mesmo estilo do brasileiro Alex Atala — ou seja, com a ideia de fazer um mergulho nas tradi��es culin�rias e reinvent�-las com pose contempor�nea e pre�os exorbitantes — o White Rabbit faz sucesso em Moscou. Em comum, ambos s�o h� anos figurinhas f�ceis nos rankings dos melhores restaurantes do mundo e estrelam epis�dios da cultuada s�rie Chef's Table, da plataforma Netflix.

A nostalgia pelo passado

S�o dois lados opostos, mas muito provavelmente da mesma moeda: a nostalgia russa e a saudade brasileira tem bem aquele esp�rito que jocosamente costuma ser chamado de "vi�vo da ditadura".

Assim como no Brasil muitos celebram com "bons tempos" aquele per�odo de regime militar opressor, muito provavelmente pela mem�ria emba�ada pelo passar do tempo, pela censura que n�o permitia saber das corrup��es e das viol�ncia impostas pelas institui��es, na R�ssia n�o s�o poucos os que lamentam pelo passado glorioso — no caso, o per�odo socialista sovi�tico.

"[A nostalgia] est� na maneira como idealizam o passado da pot�ncia que querem ressuscitar com o capitalismo e velhos sonhos prometidos pela propaganda sovi�tica que alguns juram ter sido realizados", comenta Oswald, em seu livro.

"Fala-se com saudade dos tempos em que a vida era mais dura, mas em que os aposentados n�o precisavam arranjar bicos ou pedir esmolas para viver os anos que lhes restavam depois de uma vida inteira de trabalho", exemplifica ela.

Como brincam os memes, s�o as "saudades do que n�o vivi". Quem nunca?

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