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Estado de Minas

Lockdown: Brasil repete sequ�ncia tr�gica de erros da 1� onda e precisa de bloqueio total, diz Miguel Nicolelis

Neurocientista brasileiro, que faz parte do Comit� de Combate ao Coronav�rus do Cons�rcio Nordeste, defende 2 ou 3 semanas de bloqueio para conter doen�a.


08/01/2021 17:21 - atualizado 08/01/2021 18:02

"Guardadas as devidas propor��es, me sinto como se eu fosse um cientista na Idade M�dia, sendo perseguido pela Inquisi��o", diz Nicolelis (foto: Arquivo pessoal)

"Acabou. A equa��o brasileira � a seguinte: ou o pa�s entra num lockdown nacional imediatamente, ou n�o daremos conta de enterrar os nossos mortos em 2021." Essa mensagem foi escrita no Twitter pelo neurocientista Miguel Nicolelis, mundialmente famoso por suas pesquisas sobre a interface entre c�rebros e m�quinas.

Professor da Universidade Duke, nos Estados Unidos, Nicolelis foi um dos criadores do Projeto Mandacaru, grupo formado por volunt�rios das mais diversas �reas que d� orienta��o e consultoria sobre o enfrentamento da pandemia aos nove Estados que comp�em a regi�o Nordeste.

Nessa entrevista para a BBC News Brasil, o neurocientista avalia a repercuss�o de sua mensagem no Twitter e aponta a sequ�ncia de erros que colocam o pa�s em segundo lugar no ranking de mortes por covid-19 no mundo.

Ele diz estar extremamente preocupado com o momento atual, de segunda onda de casos ou repique da primeira, agravado por campanhas eleitorais, aberturas pelo pa�s e festas de fim de ano. "Estamos num momento que era prop�cio e imediato para ter uma interven��o nacional pela primeira vez. Para parar, para ter uma queda dram�tica e r�pida de novos casos at� que a campanha de vacina��o come�asse. Eu estou vendo esse momento com extremo pessimismo, porque a gravidade � �bvia."

Questionado sobre o impacto econ�mico dessa medida dr�stica, Nicolelis afirma que "se realizarmos um isolamento social r�gido, um lockdown por duas ou tr�s semanas, com s� servi�os essenciais funcionando, � poss�vel minimizar os danos econ�micos no futuro".

Nesta quinta-feira (7), Brasil atingiu a marca dos 200 mil �bitos pela doen�a.

BBC News Brasil - O sr.fala em "interven��o nacional" contra a pandemia. O que seria isso?

Miguel Nicolelis - O Brasil precisa fazer algo muito parecido ao que aconteceu na Gr�-Bretanha nos �ltimos dias. Isso, ali�s, veio a partir do comit� cient�fico brit�nico, que pressionou o primeiro-ministro e o governo para fazer um lockdown mesmo com o in�cio da campanha de vacina��o por l�. Era �bvio que n�o dava pra esperar pra vacina fazer seu efeito populacional. � preciso conter a escalada para o sistema de sa�de n�o colapsar.

O que n�s precis�vamos por aqui era justamente isso. Ter um comando central. Uma mensagem �nica, disseminada para o pa�s inteiro, com transpar�ncia, com bons dados, com boas pr�ticas. E n�s precisar�amos, na minha opini�o, de um lockdown por duas ou tr�s semanas para reduzir a press�o no sistema de sa�de.

A press�o n�o � mais s� dos casos agudos de coronav�rus. N�s temos agora todos os casos acumulados do ano passado, que n�o puderam ter atendimento por causa dos hospitais lotados. E temos tamb�m um n�mero enorme de pacientes com sequelas da covid-19 que v�o precisar de atendimento m�dico. Estamos falando de duas enormes demandas por servi�os m�dicos, interna��es e unidades de terapia intensiva. E ainda h� um terceiro grupo, que s�o de todas as doen�as que est�o represadas. Pacientes que est�o sofrendo de doen�as cr�nicas e agudas e precisam de cuidados m�dicos.

N�s vemos algumas particularidades muito espec�ficas dessa segunda onda. N�s temos uma cepa que � mais transmiss�vel, o que significa que vamos ter mais pessoas infectadas. Al�m disso, h� um n�mero de jovens e crian�as afetados que est� aumentando proporcionalmente. At� hospitais pedi�tricos em S�o Paulo est�o com problemas de demandas de vagas para atender casos.

Um exemplo dram�tico disso � Manaus. A cidade colapsou muito mais rapidamente do que na primeira onda. E colapsou a um ponto que o prefeito veio dizer que o sistema de sa�de n�o foi o �nico afetado. Ele teme um colapso do sistema funer�rio neste momento. Essa � uma preocupa��o que existe desde a primeira onda e ficou por debaixo do tapete, sem ningu�m falar sobre isso. Mas foi algo que aconteceu em Nova York, no Texas e est� acontecendo na Calif�rnia neste momento. Essa � uma grande preocupa��o, porque se voc� come�a a perder a m�o do sistema de manejo das v�timas, dos corpos, voc� come�a a gerar problemas de sa�de p�blica secund�rios grav�ssimos.

BBC News Brasil - Nas �ltimas semanas, acompanhamos dois fatores que podem agravar ainda mais a situa��o da pandemia: a quest�o das aglomera��es de final de ano e as novas cepas do coronav�rus detectadas no Reino Unido e na �frica do Sul. Como o senhor analisa esses novos ingredientes numa equa��o que j� se mostra t�o complicada?

Nicolelis - No come�o de novembro, o Comit� de de Combate ao Coronav�rus do Cons�rcio Nordeste prop�s que era preciso ver o que estava acontecendo no cen�rio internacional. Porque j� existia uma segunda onda europeia grav�ssima. A gente ainda n�o sabia de novas cepas, mas essa era uma previs�o que estava em nossas mentes. Porque � algo que ocorre, n�o � uma grande surpresa. Aconteceu na pandemia de 1918 e em outras ocasi�es.

A gente s� n�o sabia de onde viria essa nova cepa e qual seria a gravidade da segunda onda. Em 1918, a segunda onda foi a mais letal de todas. Todos os modelos que n�s apresentamos desde abril para os governadores do Nordeste levavam em conta e tinham a possibilidade dessa segunda onda e quando ela poderia surgir.

No Nordeste, tivemos lockdowns que foram feitos nas capitais e medidas de isolamento social que atrasaram a segunda onda. Mas as campanhas eleitorais e as aberturas econ�micas feitas ao l�u geraram aglomera��es que sincronizam a segunda onda no pa�s inteiro. Esse � o grande drama.

A gente ainda n�o tem os dados completos da letalidade das novas cepas. A cepa da �frica do Sul � muito preocupante. H� mortes acontecendo na Austr�lia por causa da cepa brit�nica. Ela tamb�m j� foi detectada no Jap�o. Isso significa que ela correu o mundo, como era de se esperar.

Com o espa�o a�reo brasileiro aberto, n�s estamos repetindo todos os erros da primeira onda. Com o agravante de que o pa�s inteiro est� tendo curvas de crescimento, algumas mais r�pidas do que l� no in�cio. Ent�o essa � uma situa��o muito assustadora.

BBC News Brasil - Quando se fala em lockdown, em fechar novamente o com�rcio, algumas pessoas argumentam que a economia brasileira n�o vai aguentar e as consequ�ncias podem ser terr�veis. Como o sr. analisa e responde a essas previs�es?

Nicolelis - � evidente que sou sens�vel a todo o debate sobre a quest�o econ�mica. Mas essa dicotomia � falsa. Se o n�mero de mortes come�ar a disparar, o sistema de sa�de colapsa e n�s n�o temos condi��es de manejar a pandemia da maneira correta. O que vai ent�o acontecer com a economia? Ela tamb�m vai colapsar. As pessoas v�o come�ar a morrer em n�meros alt�ssimos por outras doen�as e n�o vamos ter nem gente para fazer a economia girar. N�o vamos ter pessoas para trabalhar, produzir e consumir bens.

Se n�s tiv�ssemos feito um lockdown nacional em mar�o de 2020, como a Gr�cia fez... Ali�s, a Gr�cia detectou dois casos e, em 48 horas, o pa�s estava em lockdown completo. A Gr�cia n�o tinha sistema hospitalar, estava falida do ponto de vista da sa�de p�blica, e conseguiu ser um dos melhores pa�ses europeus durante a pandemia. Quer outro exemplo? O Vietn�, com 100 milh�es de habitantes, � um pa�s pobre com muito menos recursos de sa�de p�blica que o Brasil. E eles tiveram 35 mortes.

A gente sabe como a coisa funciona e essa n�o � a primeira pandemia da hist�ria da humanidade. Existe uma farta literatura sobre isso. E todas as pandemias onde voc� fez isolamento social conseguiram baixar os n�meros de casos e de mortes. Isso vale mesmo para aquelas doen�as com uma taxa de infec��o e de letalidade muito maior a essa que enfrentamos atualmente.

Se realizarmos um isolamento social r�gido, um lockdown por duas ou tr�s semanas, com s� servi�os essenciais funcionando, � poss�vel minimizar os danos econ�micos no futuro.

Eu vou dar uma prova disso. Na pandemia de 1918, todas as cidades americanas que fizeram as medidas de isolamento, bloquearam o fluxo de pessoas e paralisaram suas economias, se sa�ram melhor do que as cidades que n�o fizeram nada, deixaram a pandemia correr solta e censuraram a informa��o para sua popula��o. Locais como Nova York, Boston e Filad�lfia, que n�o reagiram da maneira correta, tiveram grandes perdas humanas e terr�veis problemas econ�micos durante e ap�s a pandemia. Outras cidades, como Pittsburgh, por exemplo, se sa�ram muito melhor.

BBC News Brasil - O sr. comentou que o Brasil est� cometendo os mesmos erros da primeira onda. Mas quais foram as grandes oportunidades que n�s perdemos no manejo da pandemia?

Nicolelis - Foi uma sequ�ncia tr�gica de erros. Primeiro, minimizar a gravidade da pandemia. N�o se preparar antes de ela chegar ao Brasil. N�s tivemos quase tr�s meses para nos prepararmos em termos de material de prote��o, m�scaras, enfim, organizar o pa�s antes do tsunami. O segundo erro foi negar o tsunami. Terceiro, n�o criar um comando verdadeiramente nacional, centralizado, um estado maior de combate � pandemia que tivesse uma miss�o clara.

Esse comando poderia ajudar os Estados n�o s� do ponto de sanit�rio, mas financeiro. Al�m disso, decretar o fechamento do espa�o a�reo internacional brasileiro no come�o de mar�o e fazer bloqueios nas rodovias principais. Era absolutamente previs�vel que as estradas iriam espalhar os casos para o interior do Brasil. Nas primeiras tr�s semanas de mar�o, S�o Paulo foi respons�vel por 85% dos casos do pa�s. Se tiv�ssemos bloqueado s� S�o Paulo... O aeroporto de Guarulhos recebeu o maior fluxo de pessoas vindas do exterior e n�s poder�amos ter barrado esse tr�nsito para o resto do Brasil aqui. Mas n�s n�o fizemos nada.

N�s n�o tivemos uma voz nacional que, ao longo da pandemia, transmitisse as informa��es corretas e cientificamente validadas, que basicamente eliminasse as fake news e n�o promovesse o uso de rem�dios que n�o funcionam, por exemplo. Existem milh�es de brasileiros que ainda acreditam na cloroquina. Ou que ainda creem que existe um tratamento profil�tico contra o coronav�rus.

Olha S�o Lu�s hoje. A capital do Maranh�o fez talvez o melhor lockdown do Brasil. � a �nica capital do Nordeste neste momento que est� h� meses com n�meros de �bitos e casos estabilizados. Fortaleza fez o segundo melhor lockdown. Na sequ�ncia, aparecem Recife e Jo�o Pessoa. Esses lugares se beneficiaram tremendamente dessas pol�ticas, que eram simples e que foram oferecidas efetivamente logo no in�cio da pandemia. Compare os dados de S�o Lu�s com a cidade de S�o Paulo. Voc� v� na hora a distin��o. Enquanto S�o Paulo se arrastou com milhares de novos casos e centenas de mortes di�rias, S�o Lu�s conseguiu levar esse n�mero para o m�nimo poss�vel.

Outro exemplo interessante foi Belo Horizonte, que teve uma resposta impressionante. O prefeito entendeu que tinha que ouvir os t�cnicos, os cientistas e os sanitaristas da cidade. Ele n�o tinha experi�ncia pessoal nenhuma, mas ouviu. Tanto � que foi reeleito logo no primeiro turno. A resposta foi correta e ele procurou quem sabe do assunto.

No Brasil, faltou comando, faltou mensagem, faltou definir prioridades, faltou preparo e faltou acreditar na ci�ncia. O drama que eu sinto nesse momento, por isso que fiz esse tweet h� alguns dias, � que n�s estamos repetindo todos os erros. Acrescidos da total in�pcia na defini��o de um programa nacional de imuniza��o pelo Minist�rio da Sa�de.

� uma incompet�ncia total, uma falta de qualquer tipo de vis�o estrat�gica, log�stica e sanit�ria de qu�o vital � ter essa campanha de vacina��o nas ruas imediatamente. Acabei de ler agora h� pouco uma entrevista do fundador da Anvisa, que eu conhe�o muito bem, falando que � inacredit�vel como o Minist�rio da Sa�de simplesmente n�o moveu um dedo para comprar seringas, agulhas e os insumos necess�rios para organizar o plano nacional de imuniza��o.

N�s ainda n�o temos uma defini��o de quais vacinas v�o ser usadas no Brasil. Porque n�o temos a aprova��o da autoridade sanit�ria competente federal, que � a Anvisa.

"Se o n�mero de mortes come�ar a disparar, o sistema de sa�de colapsa e n�s n�o temos condi��es de manejar a pandemia de maneira correta", alerta Nicolelis (foto: Michael Dantas/AFP)

BBC News Brasil - A comunica��o � um dos grandes desafios da pandemia. Como o sr. mesmo disse, h� muitas pessoas que ainda acreditam em tratamentos que j� se mostraram ineficazes ou seguem not�cias falsas sobre as m�scaras ou a origem do v�rus. Como tornar essa comunica��o com a popula��o mais proveitosa?

Nicolelis - N�s temos que utilizar as mesmas armas dos distribuidores de fake news. Temos que usar as redes sociais para difundir verdades. O que as entidades preconizam? Quais s�o os resultados reais? Por que � importante usar m�scara? Por que � necess�rio fazer realmente um lockdown? N�s temos que combater as not�cias falsas onde os rob�s e esses indiv�duos atuam.

Pra voc� ter ideia, quando eu escrevi no Twitter essa proposta de lockdown nacional, toda a comunidade cient�fica come�ou a apoiar. Por outro lado, eu recebi centenas de mensagens fakes, de rob�s, de ataques, de toda a sorte de loucura que nunca imaginei que um cientista profissional com 40 anos de carreira no Brasil estaria sujeito.

Eu tive uma experi�ncia nas �ltimas 48 horas absolutamente dantesca. De ver que no Brasil voc� n�o pode nem tentar disseminar uma opini�o cient�fica balizada, baseada em dados e estudos. Voc�, sua vida, sua fam�lia, seus parentes, sua carreira, tudo o que voc� fez, passa a ser atacado de uma maneira atroz, de uma maneira absolutamente brutal.

Isso est� matando gente no Brasil. Ali�s, no mundo. Esse abismo que n�s ca�mos na �rea da comunica��o est� matando tanta gente quanto a quest�o sanit�ria. Nos Estados Unidos, quando voc� estuda a hist�ria deles, os americanos dizem que nas guerras hist�ricas as doen�as infecciosas mataram tanta gente ou at� mais que as batalhas propriamente ditas. Eu acho que n�s vamos ter que mudar essa frase e acrescentar que, na pandemia do s�culo 21, a desinforma��o matou tanta gente quanto o pr�prio v�rus.

BBC News Brasil - Como � lidar com esses ataques digitais do ponto de vista pessoal?

Nicolelis - � uma coisa muito chocante. Eu paralisei minha vida para fazer um trabalho que eu acredito, pelo meu pa�s. � terr�vel, impactante. Mas nada disso me intimida. Eu nasci no bairro do Bixiga aqui em S�o Paulo. N�o vou parar de dar minha opini�o ou de fazer meu trabalho com meus colegas do comit� porque centenas de... Bom, a gente nem sabe se s�o humanos ou pessoas de verdade. A maioria nem �.

A maioria s�o clones de uma conta s� que repetem a mesma mensagem, a mesma acusa��o. E voc� v� que s�o clones, que s�o rob�s, pelo grau de grosseria, pelo grau de insultos baixos e repetidos. Ent�o voc� v� que � uma pessoa programando e disseminando essas mensagens por milhares de contas.

Mas isso de forma alguma vai impedir que nosso trabalho seja feito, nem no comit� nem como pessoa. Mas que � terr�vel e chocante, �. Guardadas as devidas propor��es, sinto como se eu fosse um cientista na Idade M�dia, sendo perseguido pela Inquisi��o. N�o tinha redes sociais naquele per�odo, mas a sensa��o de choque deve ser a mesma.

BBC News Brasil - Como o sr. analisa a corrida pelas vacinas contra a covid-19 do ponto de vista global?

Nicolelis - Eu falei sobre isso ontem numa videoconfer�ncia. Essa � a maior e a primeira batalha geopol�tica biom�dica da hist�ria. Nunca o mundo enfrentou, presenciou ou testemunhou uma batalha t�o gigantesca na �rea de ci�ncias biom�dicas. Isso mostra o qu�o relevante a ci�ncia biom�dica se transformou para o futuro social, pol�tico e econ�mico do mundo. N�s vemos as grandes pot�ncias de ci�ncia disputando quem tem a hegemonia da vacina que, em teoria, vai salvar o planeta dessa crise. H� interesses gigantescos e as maiores farmac�uticas do mundo envolvidos.

Eu nunca imaginei ler not�cias de efic�cia e seguran�a de vacinas primeiro em press releases de empresas, e n�o em trabalhos cient�ficos. Eu nunca vi isso na minha vida. Falamos de interesses de trilh�es de d�lares.

Se n�s tiv�ssemos reagido rapidamente, o Brasil teria todas as condi��es de ter sua pr�pria vacina. N�s temos cientistas da �rea, a Fiocruz e o Butantan com toda a capacidade para isso. Se tivessem sido apoiados pelo governo com os recursos necess�rios, o Brasil poderia estar agora a caminho de ter sua pr�pria vacina. N�o era um cen�rio fora da realidade de maneira alguma.

Mas o Brasil optou, na figura de seu governo federal, de se remover da lideran�a dos pa�ses cient�ficos do mundo. N�s j� nos removemos da lideran�a econ�mica. J� fomos autoalijados, por decis�es do nosso pr�prio governo, de ser um player importante na geopol�tica mundial. Agora n�s estamos dizendo que n�o temos interesse em ser um dos grandes pa�ses cient�ficos do mundo. N�s tivemos a chance.

� s� voc� comparar a posi��o cient�fica do Brasil e da China em 1980 e olhar 40 anos depois o que aconteceu nas curvas de produ��o cient�fica e investimento. Se um marciano chegasse ao mundo agora e olhasse essas informa��es, n�o iria acreditar na invers�o do padr�o que se deu nos �ltimos quarenta anos.

N�o � � toa que a China j� se transformou no maior investidor p�blico de ci�ncia do mundo, passando os EUA. Pensa nisso: antes da China ultrapassar os EUA como a maior economia do mundo, ela suplantou os americanos como o maior PIB cient�fico do planeta.

"N�s temos que usar as mesmas armas dos distribuidores de fake news. Por que � importante usar m�scara? Por que � importante fazer realmente um lockdown?", sugere Nicolelis (foto: DANIEL CASTELLANO/AFP)

BBC News Brasil - Podemos tirar algum aprendizado da atual pandemia para as futuras crises de sa�de?

Nicolelis - Em primeiro lugar, � importante mencionar que o mundo tirou a ci�ncia do puxadinho, que ficava no quintal, e trouxe para a sala de estar. N�s percebemos que os cientistas podem contribuir para o desenvolvimento de uma civiliza��o mais justa, mais igual, que corra menos riscos de extin��o e persiga um projeto onde o ser humano consegue se desenvolver economicamente e ter os meios de sobreviv�ncia sem agredir o meio ambiente a ponto de colocar a pr�pria esp�cie em perigo.

A minha primeira dose de esperan�a � que o mundo est� olhando para a ci�ncia com outros olhos nos �ltimos meses. A segunda � que evidentemente a ci�ncia tem seus limites. Como diz o historiador John Barry, respons�vel pelo maior estudo j� feito sobre a pandemia de 1918, a ci�ncia ajudou muito, mas em momento algum ela pode dar todas as respostas. A solu��o de uma pandemia � essencialmente pol�tica e dependente dos estadistas que t�m coragem de tomar as decis�es impopulares e liderar a sociedade.

O mundo precisa de uma lideran�a sanit�ria muito mais eficiente e forte para poder guiar uma resposta global a uma pandemia como a que vivemos. N�o � poss�vel ter de novo a mesma resposta, onde cada pa�s atira para um lado e tenta salvar sua sardinha sem ajudar o pr�ximo. Num mundo extremamente globalizado, onde se transmite um v�rus da China para Nova York em 12 ou 20 horas pela malha aerovi�ria, � preciso criar mecanismos de coordena��o global.

A nossa sorte � que esse v�rus tem uma letalidade que n�o � a mesma da peste bub�nica, na casa dos 50%. Imagine que no mundo atual apare�a um v�rus, como o ebola, que se espalha com uma letalidade de 50%. Foi isso que aconteceu com a peste bub�nica na Idade M�dia na Europa, que matou metade da popula��o do continente.

A pandemia nos ensina que precisamos viver num outro modus operandi, numa outra rela��o com o planeta e com a ci�ncia. N�s precisamos pensar que quando elegemos um l�der, ele n�o est� ali apenas para as coisas mundanas do nosso pa�s. A gente elege um l�der para esses momentos de crise, onde precisamos de pessoas esclarecidas que saibam pensar fora da caixa, abandonar seus preconceitos e guiar uma na��o do tamanho do Brasil para sair de uma crise que poderia ter sido ainda pior.


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