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Estado de Minas PANDEMIA

Tr�s erros que levaram � falta de vacinas contra COVID-19 no Brasil

Primeira etapa de vacina��o alcan�ou menos de 6 milh�es de brasileiros pela escassez de imunizantes e desperd�cio causado pela falta de treinamento nos postos


23/02/2021 16:32 - atualizado 23/02/2021 18:29


Primeira etapa de vacinação alcançou menos 6 milhões de brasileiros por causa da escassez de imunizantes e do desperdício de doses(foto: EPA/ANTONIO LACERDA)
Primeira etapa de vacina��o alcan�ou menos 6 milh�es de brasileiros por causa da escassez de imunizantes e do desperd�cio de doses (foto: EPA/ANTONIO LACERDA)

Enquanto imagens de idosos recebendo inje��o traziam esperan�a de avan�os no combate � COVID-19, not�cias sobre desperd�cio de doses e falta de vacinas evidenciavam os erros de planejamento que levariam a atrasos na imuniza��o da popula��o brasileira.

O primeiro m�s de vacina��o contra a covid-19 no pa�s contou com a distribui��o de apenas 12 milh�es de doses, o suficiente para atender a 6 milh�es de pessoas. Isso representa menos de 3% da popula��o brasileira.

V�rias cidades, como Rio de Janeiro, Porto Alegre, Salvador, Cuiab� e Curitiba chegaram a suspender a vacina��o, por causa da falta de doses.

Especialistas ouvidos pela BBC News Brasil apontam tr�s erros do governo federal que teriam contribu�do para a escassez de vacinas. E alertam que problemas de abastecimento devem se repetir ao longo do ano.

"O Brasil teria condi��es de ter uma oferta muito maior de vacina se n�s tiv�ssemos feito o que outros pa�ses fizeram, como, por exemplo, o Chile. O Chile hoje tem tr�s doses de vacina por habitante, s� que ele come�ou a comprar vacina em setembro", disse Gonzalo Vecina Neto, professor da Faculdade de Sa�de P�blica da Universidade de S�o Paulo e fundador da Ag�ncia Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria.


"N�s n�o come�amos a comprar vacina cedo. O governo federal n�o fez nenhuma aposta. Se n�o fosse pelo Butatan e a Fiocruz (respectivamente, respons�veis no pa�s pelas vacinas CoronaVac e Oxford-AstraZeneca) n�o ter�amos nenhuma vacina", critica.


Governo n�o comprou vacinas em 2020

 

Tanto Gonzalo Vecina Neto quanto a a epidemiologista Ethel Maciel dizem que o primeiro e maior erro foi o governo federal foi n�o comprar vacinas antecipadamente, ainda em 2020.


No meio do ano passado, quando fabricantes anunciaram que estavam desenvolvendo vacinas, v�rios pa�ses como Chile, Col�mbia, Reino Unido e integrantes da Uni�o Europeia negociaram a compra desses produtos ainda na fase de testes.


Era uma aposta. A pesquisa podia dar errado, mas fechar o contrato antes significava garantir acesso �s doses.


Uma das estrat�gias para minimizar o risco, diz Ethel Maciel, seria montar uma cesta variada de vacinas. Por exemplo, comprar doses da Oxford-AstraZeneca, CoronaVac, Pfizer e Moderna.


Ethel Macial diz que governo deveria ter comprado vacinas antecipadamente de diferentes fabricantes(foto: Fernando Madeira)
Ethel Macial diz que governo deveria ter comprado vacinas antecipadamente de diferentes fabricantes (foto: Fernando Madeira)


"O Brasil n�o fez isso e ainda recusou um acordo proposto pela Pfizer que garantiria 70 milh�es de vacinas em dezembro", afirma a epidemiologista, que � professora da Universidade Federal do Esp�rito Santo.


Ao falar sobre o fracasso das tratativas com a Pfizer, o governo brasileiro argumentou que as cl�usulas propostas eram abusivas.


Em nota, o Minist�rio da Sa�de citou como exemplo o fato de a Pfizer exigir que, em caso de desaven�a com o governo brasileiro, as negocia��es de arbitragem teriam que se pautar nas leis de Nova York, n�o nas do Brasil.


Outro ponto mencionado pelo governo brasileiro foi a exig�ncia da Pfizer de assinatura de um termo de responsabilidade para isentar a fabricante de penaliza��o civil por eventuais efeitos colaterais graves da vacina.


A Pfizer rebateu, tamb�m com a divulga��o de nota, dizendo que esses mesmos termos foram aceitos por outros pa�ses que compraram a vacina, entre eles Estados Unidos, Col�mbia, Chile, Reino Unido, Jap�o, Equador e a Uni�o Europeia.

Fiocruz e Butantan assumiram riscos

Enquanto o governo federal hesitava em negociar a compra antecipada de imunizantes, os institutos de pesquisa Fiocruz e Butantan tomaram essa iniciativa.

A Fiocruz iniciou tratativas para comprar a Oxford-AstraZeneca, enquanto o Butantan negociou com a chinesa Sinovac a transfer�ncia de tecnologia para produzir a CoronaVac.

Depois de conseguirem acordos com as fabricantes estrangeiras, ambos apresentaram as propostas ao governo federal.


Em outubro de 2020, Bolsonaro rejeitou acordo com Butantan para importar vacina CoronaVac(foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)
Em outubro de 2020, Bolsonaro rejeitou acordo com Butantan para importar vacina CoronaVac (foto: REUTERS/Ueslei Marcelino)


O governo Jair Bolsonaro aceitou a proposta da Fiocruz, mas, em outubro do ano passado, rejeitou uma proposta do Butantan que previa a entrega de 45 milh�es de doses da CoronaVac at� dezembro de 2020 e outras 15 milh�es no primeiro trimestre de 2021- isso garantiria ao menos 60 milh�es de doses na primeira fase de vacina��o.

Na �poca, o ministro da Sa�de, Eduardo Pazuello, defendeu fechar o acordo, mas o presidente Jair Bolsonaro foi contra. Pesaram na decis�o uma disputa pol�tica com o governador de S�o Paulo, Jo�o Doria, e a press�o de militantes de direita que levantavam desconfian�a sobre uma vacina produzida na China.


"Da China n�s n�o compraremos. � decis�o minha. Eu n�o acredito que ela transmita seguran�a suficiente para a popula��o pela sua origem. Esse � o pensamento nosso", disse Bolsonaro no dia 21 de outubro, em entrevista � r�dio Jovem Pan.


Depois, em janeiro, o presidente Jair Bolsonaro voltou atr�s e firmou acordo para comprar as vacinas do Butantan. O problema � que essa demora na negocia��o atrasou, tamb�m, o calend�rio de entrega dos produtos.


Isso porque a capacidade de produ��o do Butantan, assim como a da Fiocruz, esbarra no ritmo de importa��o de insumos da China.


"O Butatan levou a proposta e, num primeiro momento, o Minist�rio da Sa�de disse sim, depois disse que n�o, porque Bolsonaro foi contra a compra de uma vacina chinesa. E a� ficou toda aquela discuss�o no ano passado de se era vacina do Doria ou do Bolsonaro. Isso gerou um grande desgaste ao Butantan e atrasou importa��es da China", relembra o m�dico sanitarista Gonzalo Vecina Neto.


No final das contas, s� foram disponibilizadas, em janeiro e fevereiro, 9,8 milh�es de doses da CoronaVac (Sinovac/Instituto Butantan) e 2 milh�es de doses da vacina Oxford-AstraZeneca.

E por que o governo n�o compra, agora, de outras fabricantes?

O problema � que, como o Brasil largou atrasado na negocia��o, grandes fabricantes, como Pfizer e Moderna, j� venderam para outros pa�ses a grande maioria dos seus lotes.

Segundo Vecina Neto, restou para o Brasil apostar agora em vacinas que ainda despertam desconfian�a pela falta de transpar�ncia nos estudos ou que n�o conclu�ram a �ltima etapa de pesquisa, como a russa Sputnik V e a indiana Covaxin.


A Sputnik V, especificamente, j� foi alvo de cr�ticas internacionais pela falta de transpar�ncia no processo de fabrica��o do imunizante. Mesmo na R�ssia o ritmo de vacina��o come�ou lento, porque a popula��o questionava a efic�cia da vacina.


No in�cio do m�s, o instituto Gamaleya de Pesquisa da R�ssia alcan�ou uma etapa importante em comprovar a efic�cia da vacina, ao publicar um estudo na revista cient�fica Lancet mostrando percentual de 91% de prote��o.

S� que tanto essa vacina quanto a indiana Covaxin n�o divulgaram ainda os resultados da fase 3 de testes, quando o imunizante � aplicado num grupo grande e heterog�neo de volunt�rios, para verificar rea��es adversas, por exemplo.

Falta de defini��o sobre quem deveria ser vacinado antes

O segundo erro, que poderia ter mitigado as consequ�ncias da escassez de vacinas, foi a falta de uma defini��o sobre quem deveria receber a vacina primeiro, dentro do grupo de prioridades.


Em várias cidades, profissionais de saúde que não atuam na linha de frente contra a covid-19 foram vacinados antes de idosos(foto: REUTERS/Amanda Perobelli)
Em v�rias cidades, profissionais de sa�de que n�o atuam na linha de frente contra a covid-19 foram vacinados antes de idosos (foto: REUTERS/Amanda Perobelli)


Ou seja, quem � a prioridade das prioridades. O governo federal elaborou uma enorme lista de grupos priorit�rios que, juntos, somam 77,2 milh�es de pessoas. L� h� desde idosos com mais de 90 anos a profissionais de sa�de, caminhoneiros, profissionais da �rea da educa��o e militares.


Quem deveriam ser as 6 milh�es de pessoas imunizadas com as doses dispon�veis?


"N�o tinha uma ordena��o de quem deveria receber a vacina primeiro. No cen�rio de escassez total, quem seria a prioridade das prioridades?

O governo federal n�o tomou essa decis�o", diz a Ethel Maciel, que � professora da Universidade Federal do Esp�rito Santo.


Como n�o houve uma coordena��o federal, cada munic�pio criou as pr�prias regras e surgiram distor��es. Por exemplo, a lista do governo federal inclui "trabalhadores da sa�de", mas n�o especifica quais se enquadrariam na prioridade.


Na aus�ncia de uma defini��o, esteticistas, psic�logos, dermatologistas, veterin�rios e at� instrutores de pilates foram vacinados antes de idosos com mais de 80 anos em algumas cidades.


Diante dessa situa��o, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, determinou, no dia 8 de fevereiro, que o governo federal divulgasse a ordem de prefer�ncia dentro do grupo priorit�rio.


Na ausência de uma definição, esteticistas, psicólogos, dermatologistas e até instrutores de pilates foram vacinados antes de idosos com mais de 80 anos em algumas cidades(foto: EPA/ANTONIO LACERDA)
Na aus�ncia de uma defini��o, esteticistas, psic�logos, dermatologistas e at� instrutores de pilates foram vacinados antes de idosos com mais de 80 anos em algumas cidades (foto: EPA/ANTONIO LACERDA)


Mas �quela altura, as doses da primeira remessa j� estavam acabando. "A gente deixou de vacinar os idosos para vacinar uma amplitude muito grande de profissionais de sa�de que nem estavam na linha de frente", lamenta Ethel Maciel.

Falta de treinamento provocou desperd�cio de doses

O terceiro erro, segundo os especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, foi a falta de treinamento e orienta��o �s equipes que administram a vacina.

N�o houve uma campanha nacional de vacina��o, com informa��es � popula��o e treinamento espec�fico �s equipes dos postos de sa�de, destacam Ethel Maciel e Gonzalo Vecina Neto.


Em alguns munic�pios, profissionais de sa�de relataram desperd�cio de doses, especialmente nas cidades que decidiram escalonar por idade.

No Rio de Janeiro, foi amplamente noticiado que doses da Oxford-AstraZeneca foram jogadas fora por causa do baixo comparecimento de idosos em algumas �reas da cidade.


Uma vez aberto o frasco para colocar nas seringas, o conte�do da vacina de Oxford s� tem validade por seis horas. J� a CoronaVac dura oito horas depois de aberto o frasco.


Como n�o havia orienta��o clara sobre o que fazer na aus�ncia do grupo-alvo da vacina��o, as doses que sobravam nos recipientes abertos foram perdendo a validade.


Ou seja, al�m de termos pouca vacina, a falta de orienta��o aos profissionais levou a uma redu��o ainda maior do estoque.

Segundo Ethel Maciel, seria o caso de orientar que, em situa��es assim, � melhor administrar a vacina em quem estiver por l�, por exemplo, no acompanhante do idoso, a desperdi�ar as doses.


"O que a gente come�ou a ver no Brasil? V�rias doses desperdi�adas. A gente abriu um espa�o muito grande para a judicializa��o, com a falta de instru��es claras, e n�o houve uma informa��o, um treinamento para as pessoas na sala de vacina sobre o que fazer com os frascos abertos", afirma epidemiologista.

Brasil teria condi��es de imunizar 60 milh�es por m�s

Segundo Gonzalo Vecina Neto, que j� foi secret�rio Nacional de Vigil�ncia Sanit�ria, se o Brasil tivesse vacina e um planejamento pr�vio m�nimo, o Sistema �nico de Sa�de teria condi��es de imunizar at� 60 milh�es de pessoas por m�s.

Como existem 159,1 milh�es de brasileiros com mais de 18 anos, segundo a Pesquisa Nacional de Sa�de (PNS) 2019, seria poss�vel concluir as duas doses, diz Vecina Neto, em meados de julho. Por enquanto, as vacinas contra covid-19 n�o s�o administradas em crian�as e adolescentes, por isso o c�lculo s� considera adultos.


"Temos hoje 38 mil unidades b�sicas de sa�de com pelo menos uma sala de vacina��o com geladeira especializada em m�dulos, que conserva a temperaturas de dois a oito graus. Na pior das hip�teses, se consegue vacinar 10 pessoas por hora", explica Vecina Neto.


"Se vacinarmos 10 pessoas por hora, num dia de trabalho de oito horas, d� 80 vacinas. Ent�o, eu tenho condi��o te�rica de vacinar 3 milh�es de pessoas por dia �til. Isso para 20 dias �teis, tenho condi��es de vacinar, em um m�s, sem fazer muito esfor�o, 60 milh�es de pessoas", calcula.


O Minist�rio da Sa�de diz que reservou mais 364,9 milh�es de doses de vacinas com o Butatan, a Fiocruz e o cons�rcio internacional Covax Facility, ligado � Organiza��o Mundial da Sa�de. Mas a distribui��o desses lotes vai ocorrer ao longo do ano.


"A nossa experi�ncia com a vacina da gripe mostra que temos capacidade de imunizar rapidamente. No ano passado, em 2020, vacinamos 80 milh�es em tr�s meses. Temos condi��es de fazer. O que falta? Faltam vacinas", lamenta Gonzalo Vecina Neto.


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