Amplamente recomendada por cientistas e alvo de desd�m do presidente ao longo da pandemia, a m�scara facial contra a covid-19 poder� ter seu uso flexibilizado no Brasil, segundo anunciou Jair Bolsonaro nesta quinta-feira (10/6).
No mesmo dia em que o pa�s registrou mais 2.504 mortes pela doen�a nas �ltimas 24 horas, chegando a um total de 482.019 �bitos, Bolsonaro afirmou em um evento: "Nosso ministro (da Sa�de) vai ultimar um parecer visando a desobrigar o uso de m�scara por parte daqueles que estejam vacinados ou que j� foram contaminados."
Horas depois, o ministro da Sa�de, Marcelo Queiroga, afirmou que o presidente pediu um estudo sobre a flexibiliza��o do uso de m�scaras, conforme avan�a a vacina��o no pa�s.
O presidente j� apareceu em diversas ocasi�es sem ele pr�prio usar a m�scara, inclusive em aglomera��es e viagens pelo Brasil, e j� deu declara��es questionando os benef�cios do item.
Outras partes do mundo que j� chegaram a um controle da doen�a e percentual de vacinados bem maiores do que o Brasil est�o discutindo o relaxamento do uso de m�scaras para quem foi imunizado e mesmo assim tais medidas est�o sendo alvo de debates e cr�ticas por boa parte da comunidade cient�fica.
O Centro de Controle de Doen�as (CDC) dos Estados Unidos anunciou em abril que pessoas com a vacina��o completa podem deixar de usar m�scaras na maioria dos lugares com exce��o por exemplo da rede de transportes, hospitais e pris�es. O governo brit�nico tamb�m est� conduzindo alguns estudos para avaliar a poss�vel flexibiliza��o de medidas preventivas contra a covid-19, incluindo a exig�ncia de m�scaras.
"Os Estados Unidos e a Europa come�aram a discutir isso com baixos n�veis de cont�gio, mortes e variantes circulantes. � outra realidade, absolutamente incompar�vel com o Brasil", diz o m�dico Estev�o Urbano, diretor da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).

O m�dico epidemiologista Ant�nio Augusto Moura da Silva, professor do Departamento de Sa�de P�blica da Universidade Federal do Maranh�o (UFMA), compartilha da perplexidade do colega.
"L� fora, a decis�o foi tomada baseada na alta efic�cia das vacinas, uma cobertura vacinal que j� chegou a 50%, e a circula��o viral baixa. H� um controle muito maior do que o nosso. No Brasil, a doen�a est� solta", diz Silva, acrescentado que a medida anunciada pelo presidente "n�o faz sentido do ponto de vista t�cnico".
Vamos aos indicadores citados pelos m�dicos.
'Doen�a solta': alta mortalidade, cont�gio e circula��o de variantes
Nesta quinta-feira (10), o Brasil registrou uma m�dia de 1.804 mortes di�rias pela covid-19 na �ltima semana. � um n�mero abaixo do recorde j� registrado nesse indicador m�dia m�vel de 3.124 �bitos, registrado em 12 de abril de 2021 , mas em um patamar nunca atingido em 2020, o primeiro ano da pandemia.
O mais recente Boletim Observat�rio Covid-19, da Funda��o Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicado no dia 9, afirmou que a pandemia no Brasil "se configura como de alto risco", com ligeira queda no n�mero de �bitos, mas manuten��o da transmiss�o do v�rus e taxa de ocupa��o de leitos muito elevada na maioria dos Estados e capitais: "Vinte estados e o Distrito Federal, bem como 17 capitais, encontram-se com taxas de ocupa��o iguais ou superiores a 80%."
A taxa de transmiss�o do v�rus no pa�s tamb�m teve uma ligeira queda, segundo a universidade Imperial College. Ela est� em 0,99, e h� duas semanas, era de 1,02. Quando essa taxa � maior do 1, significa que o v�rus est� se espalhando de maneira exponencial, mas a pandemia s� � considerada controlada quando o �ndice � mantido abaixo de 1 por algumas semanas o que n�o foi atingido pelo Brasil ainda. Ainda h� tamb�m v�rios Estados com taxa acima de 1.
Soma-se a esses fatores preocupantes a circula��o de variantes no pa�s.
"O Brasil tem particularmente hoje infec��es por variantes. Elas representam de 85 a 90% das novas infec��es", aponta Estev�o Urbano, da SBI.
O presidente Bolsonaro afirmou que seu governo estuda desobrigar o uso de m�scaras entre pessoas que j� tiveram a infec��o ou que j� foram vacinadas. Os fatores acima mencionados influenciariam em ambos os casos.
No primeiro, uma pessoa que j� teve covid-19 e deixa de usar m�scara, em um cen�rio de circula��o significativa do v�rus e suas variantes, est� sujeita � reinfec��o e potencial transmiss�o a outras pessoas.
"A gente sabe que ter tido covid diminui a probabilidade mas n�o elimina o risco de ter a doen�a de novo. E a gente j� sabe que a variante P.1 � capaz de reinfectar quem j� foi infectado. Existem estimativas de que no surto em Manaus do fim do ano, e in�cio do atual, cerca de 30% das infec��es com a P.1eram reinfec��es", aponta Ant�nio Augusto Moura da Silva.
"Todo mundo que est� infectado corre o risco de transmitir. E h� os assintom�ticos, que t�m risco de menor de transmitir, mas podem transmitir", lembra o epidemiologista, acrescentando que o uso de m�scaras no Brasil hoje j� deixa a desejar entre a popula��o.
Baixa cobertura vacinal
O CDC flexibilizou o uso de m�scaras depois que cerca de metade dos americanos recebeu a primeira dose da vacina. At� 19 de maio, cerca de 37% da popula��o dos EUA tinha recebido a vacina��o completa, e cerca de 60% dos adultos americanos, pelo menos a primeira dose.
J� no Brasil, segundo um cons�rcio de ve�culos de imprensa a partir de dados das secretarias estaduais de Sa�de, 11% da popula��o recebeu a imuniza��o completa, e 24,9% ao menos a primeira dose.
Os m�dicos entrevistados pela BBC News Brasil lembram que as vacinas administradas no Brasil, principalmente a CoronaVac, a mais numerosa no pa�s, t�m percentuais altos de prote��o contra gravidade e mortalidade pela covid-19. J� a margem de prote��o contra a infec��o � menor, ent�o mesmo vacinadas, � previsto que um n�mero importante de pessoas ainda v� ter a doen�a.
Por isso, desobrig�-las a usar a m�scara seria mais uma vez imprudente.
"Voc� tem uma parcela importante de vacinados que ainda pode se infectar e transmitir. Liberar a aus�ncia de m�scara para esses grupos vai facilitar muito a perpetua��o da circula��o viral, isso n�o vai acabar nunca", diz Estev�o Urbano. "E tem tamb�m a quest�o de qual � a efic�cia da vacina contra as variantes."
"N�o tem a m�nima chance dessa ser uma medida embasada cientificamente", completa o infectologista.
Discuss�es no exterior
Os especialistas acrescentam que, no exterior, autoridades e cientistas est�o come�ando a testar na vida real a validade da ideia de "imunidade coletiva", conhecida tamb�m como de rebanho quando o n�mero de pessoas com imunidade contra um pat�geno chega a um patamar tal que a doen�a � controlada.
Isso porque alguns pa�ses est�o atingindo um n�mero consider�vel de pessoas vacinadas e de baixa circula��o do v�rus, uma oportunidade para verificar a hip�tese da imunidade coletiva.
Os que chegaram l�, como os EUA, tamb�m est�o lidando com problemas pr�ticos. Por exemplo, como saber se um cliente ao seu lado no supermercado realmente tomou as duas doses de vacina, ou simplesmente deixou de usar a m�scara por outro motivo, mesmo n�o imunizado?
Autoridades americanas afastaram a proposta de um "passaporte de vacina" para provar a imuniza��o de uma pessoa, argumentando que isso representaria uma viola��o de privacidade.
Com isso, governos e empresas locais est�o decidindo se e como v�o exigir alguma forma de comprova��o. Redes importantes, como Walmart e Target, t�m permitido que os clientes fiquem sem m�scara sem este requisito. J� alguns shows e eventos t�m sim exigido o hist�rico de vacina��o.
H� tamb�m a preocupa��o de que o relaxamento com a m�scara gere um sentimento de libera��o geral, incluindo outras medidas preventivas contra o coronav�rus.
"Pode haver uma interpreta��o equivocada ou uma sensa��o de liberdade do tipo 'n�o preciso fazer nada disso'", afirmou � BBC Gabor Kelen, chefe do departamento de medicina de emerg�ncia da Universidade Johns Hopkins, nos EUA.
"Mas acho que o CDC percebeu que, se n�o adotassem medidas que parecessem razo�veis para as pessoas, eles meio que perderam a influ�ncia nas regras fazem sentido."
"Se as regras n�o fizerem sentido, as pessoas n�o seguir�o mais o que o CDC diz", completou Kelen.
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