Em depoimento na Comiss�o Parlamentar de Inqu�rito (CPI) da covid-19, o deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) afirmou que o presidente Jair Bolsonaro sabia que o deputado Ricardo Barros, l�der do governo no Congresso, estaria envolvido em suspeitas de irregularidades no processo de compra da vacina Covaxin.
"Foi o Ricardo Barros que o presidente falou", disse, respondendo � senadora Simone Tebet (MDB).
Durante o depoimento, Miranda contou que ele e seu irm�o, o servidor Ricardo Luis Miranda, se encontraram com Bolsonaro no dia 20 de mar�o para relatar den�ncias de irregularidades na importa��o da vacina.
Segundo ele, o presidente afirmou que sabia que um deputado da base do governo estava envolvido no caso e que levaria a den�ncia ao delegado-geral da Pol�cia Federal, o que n�o foi feito. Apenas nesta sexta-feira (26) Bolsonaro afirmou que a PF iria abrir um inqu�rito sobre o caso.
Segundo Miranda, ao saber da den�ncia, Bolsonaro respondeu: "Se eu mexo nisso a�, voc� sabe a merda que vai dar. Isso deve ser coisa de 'fulano'."
Questionado sobre quem seria esse parlamentar, Luis Miranda disse que n�o se lembrava do nome. Pressionado v�rias vezes pelos senadores, o deputado insistiu n�o se lembrar, at� finalmente apontar Ricardo Barros.
Para o presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD-AM), o presidente Bolsonaro prevaricou (n�o cumpriu com seu dever) ao n�o pedir investiga��o sobre o caso. "O presidente n�o mandou investigar absolutamente nada", afirmou. "Para quem joga pedra em todos, ele prevaricou. Prevaricou", disse.
Em nota publicada nas redes sociais, Barros afirmou que n�o participou "de nenhuma negocia��o em rela��o � compra das vacinas Covaxin."
"N�o sou esse parlamentar citado. A investiga��o provar� isso. N�o tenho rela��o com esse fatos", afirmou o parlamentar.
Importa��o da vacina
Mais cedo, o servidor Luis Ricardo Miranda, chefe da divis�o de importa��o do Minist�rio da Sa�de e irm�o do deputado, afirmou que foi pressionado por superiores da pasta para acelerar o processo de importa��o da vacina Covaxin.
A suspeita de compra superfaturada de 20 milh�es de doses da vacina Covaxin pelo governo federal se tornou nesta semana o principal assunto a ser investigado pela CPI da Covid. O presidente da comiss�o, Omar Aziz (PSD-AM), disse que a den�ncia � a mais grave recebida pelos senadores.
O depoimento foi marcado por acaloradas discuss�es entre membros da CPI, da oposi��o e senadores da base do governo. Parlamentares governistas, como Marcos Rog�rio e Fernando Bezerra, interromperam o servidor diversas vezes, afirmando que as acusa��es eram falsas.
J� o servidor, concursado do minist�rio desde 2011, afirmou que se sentiu pressionado de maneira "at�pica" e "excessiva" por superiores, em liga��es fora do hor�rio de expediente e em mensagens de textos, a liberar a importa��o da vacina.
"Recebi diversos contatos, liga��es, chamadas no gabinete, sobre o status desse contrato. Foi uma press�o at�pica e excessiva", disse o funcion�rio do minist�rio. Em um �udio enviado a seu irm�o, o deputado Luis Miranda (DEM-DF), o servidor afirmou: "Tem muita gente de cima pressionando".
Ele citou tr�s superiores que o teriam pressionado: Alex Lial Marinho, ex-coordenador-geral de Aquisi��es de Insumos Estrat�gicos para Sa�de do Minist�rio da Sa�de, Roberto Ferreira Dias, diretor do Departamento de Log�stica em Sa�de da Secretaria Executiva do Minist�rio da Sa�de, e o coronel Marcelo Bento Pires, ex-assessor do mist�rio.
"Eles eram os meus superiores", afirmou.
Segundo o servidor, outros membros de sua equipe tamb�m estranharam as cobran�as de superiores hier�rquicos e diverg�ncias entre o contrato que seria assinado pelo minist�rio e informa��es enviadas pela empresa em um documento chamado invoice (ou fatura).
"Todos da equipe estavam inseguros pela falta de informa��o. Houve press�o para aprovar o que estava fora do contrato. Ficamos com o p� atr�s", disse.
Miranda citou falhas que chamaram aten��o da equipe sobre a poss�vel importa��o da Covaxin:
1) no contrato, o pagamento pelas vacinas seria feito � empresa Precisa Medicamentos, representante brasileira da indiana Bharat Biotech, fabricante da vacina. Por�m, na fatura inicial enviada � equipe do minist�rio constava que o pagamento pelas vacinas seria feito a uma terceira companhia, a Madison, localizada em um para�so fiscal em Cingapura;
2) A empresa Precisa Medicamentos tinha em seu quadro societ�rio as mesmas pessoas de outra empresa, a Global Sa�de, anteriormente acusada de fraude por n�o ter entregue medicamentos que haviam sido comprados pelo governo federal. O deputado Ricardo Barros era o ministro da Sa�de na �poca, e est� sendo processo por causa do caso;
3) No total, seriam pagos U$ 45 milh�es por 3 milh�es de doses da vacina Covaxin, o que superava o valor de U$ 15 (R$ 80,70), como estava indicado em documento enviado ao minist�rio;
4) A vacina Covaxin n�o tinha autoriza��o da Anvisa para ser aplicada nem Certificado de Boas Pr�ticas, dado pela ag�ncia sanit�ria;
5) O pagamento seria feito de maneira antecipada, incluindo o frete, antes da entrega de qualquer dose da vacina;
6) a vacina tinha prazo de validade ex�guo, de apenas seis meses, o que poderia colocar em risco a aplica��o do imunizante no pa�s.
O contrato com a Precisa foi assinado em 25 de fevereiro, ap�s autoriza��o de uma servidora do minist�rio, respons�vel por fiscalizar o contrato.
At� agora, o Brasil n�o recebeu nenhuma dose de Covaxin. O governo Bolsonaro alega que nenhum recurso p�blico foi pago � empresa.
Procurada pela BBC News Brasil, a Precisa Medicamentos enviou uma nota dizendo que a dose "vendida para o governo brasileiro tem o mesmo pre�o praticado a outros 13 pa�ses que tamb�m j� adotaram a Covaxin".
Encontro com o presidente
Segundo o servidor, ao receber "press�o incomum" pela aprova��o da importa��o, ele procurou seu irm�o, o deputado federal Luis Miranda, para alert�-lo sobre os problemas.
Alinhado ao governo, o deputado conseguiu um encontro com o presidente Jair Bolsonaro, no dia 20 de mar�o. Os irm�os teriam contato a Bolsonaro sobre os ind�cios de fraude. "O presidente olhou no meu olho e disse: 'isso � muito grave", disse o parlamentar � CPI.
O deputado afirmou, ainda, que enviou v�rias mensagens a assessores do presidente tentando novo encontro para tratar das suspeitas, mas n�o teve sucesso.

Propina
Durante a sess�o, o deputado Luis Miranda tamb�m mostrou um di�logo que teve com o irm�o em 20 de mar�o, a respeito de um suposto pedido de propina para aprova��o de vacinas.
Na ocasi�o, o servidor afirmou ao irm�o: "Aquele rapaz que me procurou dizendo que tem vacina. Disse que n�o assinaram porque os caras cobraram dele propinas para assinar o contrato. Vou perguntar se ele tem provas."
Os senadores questionaram quem � esse servidor que citou propinas. O servidor afirmou que ele se chama Rodrigo.
O que se sabe sobre as suspeitas de irregularidade na compra da Covaxin?
Segundo uma reportagem do jornal Estado de S. Paulo, a CPI obteve telegrama sigiloso enviado em agosto ao Itamaraty pela embaixada brasileira em Nova D�lhi informando que o imunizante produzido pela Bharat Biotech tinha o pre�o estimado em US$ 1,34 por dose.
Em fevereiro, por�m, o Minist�rio da Sa�de concordou em pagar US$ 15 por unidade (R$ 80,70 na cota��o da �poca), o que fez da Covaxin a mais cara das seis vacinas compradas at� agora pelo Brasil. Na ocasi�o, o ministro da Sa�de ainda era o general Eduardo Pazuello.
A compra n�o foi finalizada porque o esc�ndalo estourou, mas o governo j� havia feito reserva de R$ 1,6 bilh�o para o pagamento.
O valor final aceito pelo governo chama aten��o tamb�m porque Pazuello afirmou � CPI que um dos motivos para sua gest�o recusar a oferta de 70 milh�es de doses da americana Pfizer no ano passado seria o pre�o alto do imunizante. A vacina, por�m, foi oferecida ao Brasil por US$ 10, metade do pre�o cobrado pela farmac�utica aos governos dos Estados Unidos e do Reino Unido.
Outra raz�o apresentada por Pazuello para rejeitar a oferta da Pfizer em 2020 foi o fato de a vacina, naquele momento, ainda n�o ter a aprova��o da Ag�ncia de Vigil�ncia Sanit�ria (Anvisa). No entanto, o contrato da Covaxin foi firmado sem essa aprova��o pr�via. Apenas no in�cio de junho a importa��o foi autorizada, com algumas restri��es.
O MPF est� investigando se houve irregularidades no contrato com a Precisa Medicamentos, que intermediou o neg�cio com a empresa indiana.
Luis Ricardo Miranda apontou como um dos respons�veis pela press�o incomum que teria recebido para aprovar a compra o tenente-coronel Alex Lial Marinho, ex-coordenador-geral de Log�stica de Insumos Estrat�gicos do Minist�rio da Sa�de na gest�o Pazuello.
Alex Lial Marinho teve quebra de sigilo pedida pela CPI da Covid e tamb�m foi convocado a depor.
Em nota enviada � BBC News Brasil, a Bharat Biotech, fabricante da Covaxin, diz que as doses do imunizante s�o vendidas ao exterior a valores que variam de US$ 15 a US$ 20.
A Covaxin tamb�m � alvo de desconfian�a na pr�pria �ndia.
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