
Bras�lia – Al�m de as taxas de estupros terem explodido no Brasil – passando de 22,1 casos por 100 mil habitantes para 26,1, entre 2011 e 2012, ano em que foram registradas assustadoras 50.617 ocorr�ncias –, o pa�s ainda trata mal as v�timas da mais ultrajante das agress�es. A rede de atendimento a mulheres, adolescentes e crian�as violentadas est� distante do que preconiza uma lei sancionada em agosto passado pela presidente Dilma Rousseff, que entrou em vigor neste m�s. Outras a��es de assist�ncia, como as determinadas no Decreto 7.958, editado em mar�o como parte das comemora��es do Dia da Mulher, tamb�m n�o sa�ram do papel.
O "amparo m�dico, psicol�gico e social imediatos", determinados pela Lei 12.845, "em todos os hospitais integrantes da rede SUS", � um exemplo do descumprimento da legisla��o. O Minist�rio da Sa�de n�o sabe informar quantos estabelecimentos de sa�de t�m psic�logos. Ginecologistas e assistentes sociais est�o presentes em 14 mil unidades, ressalta a pasta, sem dizer, entretanto, quanto isso representa no total dos locais de atendimento no pa�s. H� ainda, segundo o minist�rio, 625 estabelecimentos no Brasil com o Servi�o de Aten��o Integral para Mulheres e Adolescentes em Situa��o de Viol�ncia Sexual.
Quem lida no dia a dia com o tema atesta que a rede � insuficiente. A cr�tica vem do pr�prio governo. Secret�ria Nacional de Enfrentamento � Viol�ncia da Secretaria de Pol�ticas para as Mulheres (SPM), Aparecida Gon�alves ressalta que os servi�os de refer�ncia v�m sendo implantados, mas n�o no ritmo adequado. "Est� ainda abaixo do necess�rio, assim como a abertura de delegacias especializadas de atendimento � mulher", afirma. Hoje, s�o cerca de 500 unidades no pa�s e 160 n�cleos especializados dentro de distritos policiais comuns.
Outro atendimento previsto na legisla��o, e tamb�m no decreto de mar�o passado, � a coleta de vest�gios do crime (como s�men, saliva ou carne debaixo das unhas) ainda no hospital. "Se a v�tima quiser ir para casa, tomar banho, as provas materiais, t�o importantes para punir os estupradores, podem se perder antes que ela v� � delegacia", explica Aparecida. At� agora, entretanto, o SUS n�o implantou a medida determinada nas normas recentes, que previam a capacita��o dos profissionais da sa�de e da seguran�a para a tarefa.
De acordo com a SPM, os cursos presenciais que peritos criminais dar�o aos ginecologistas e outros trabalhadores da sa�de j� est�o formatados e devem come�ar a ser ministrados entre o fim deste ano e o in�cio do pr�ximo. � preciso ainda implantar espa�os especializados, as chamadas salas de cust�dia, dentro dos hospitais, para guardar os vest�gios que poder�o condenar uma pessoa � pris�o no futuro. Al�m de equipamentos espec�ficos, s�o necess�rios itens como cofres e c�meras.
Sem espa�o Os institutos de Medicina Legal, que continuar�o fazendo a coleta de vest�gios, caso a mulher procure uma delegacia antes do hospital, n�o ficaram imunes das novas regras para o atendimento a v�timas de estupro. Est� previsto no Decreto 7.958 deste ano um espa�o humanizado dentro de cada instituto oficial de per�cia para receber as mulheres. Esse tamb�m � um dos objetivos do programa Mulher, viver sem viol�ncia, lan�ado pelo governo federal em mar�o passado. Mas h� apenas dois exemplos no pa�s de ambientes adequados: no IML do Rio Grande do Sul, onde existe a Sala Lil�s, e em Tocantins.
"Os equipamentos na pol�cia para receber essas v�timas s�o muito prec�rios, o que desestimula a mulher a levar adiante a investiga��o e promover a a��o para punir o culpado", ressalta a advogada Fabiane Simioni, da organiza��o n�o governamental Themis — Assessoria Jur�dica e Estudos de G�nero. De acordo com ela, as falhas se repetem na sa�de. "Voltamos � mesma l�gica. Nas capitais em que h� unidades de refer�ncia, ainda existe um atendimento preparado. No restante do pa�s, a falta de assist�ncia � enorme e lament�vel."
"Sabemos das dificuldades dos hospitais, onde falta at� algod�o, para atender casos simples, imagine para lidar com as v�timas de estupro", comenta Leila Rebou�as, assistente t�cnica do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea). A falta de um mecanismo de informa��es que agregue dados da rede de aten��o a mulheres que sofreram estupros, destaca Leila, dificulta o monitoramento. "Simplesmente n�o sabemos se as a��es determinadas por lei, que j� eram previstas em resolu��es ministeriais, est�o sendo cumpridas, como a profilaxia da gravidez."
Dif�cil realmente ter certeza de que a p�lula do dia seguinte, motivo de revolta entre parlamentares religiosos, que chegaram a pedir a Dilma que vetasse o item da Lei 12.845, est� sendo fornecida. O Minist�rio da Sa�de diz n�o poder garantir, embora fa�a a ressalva de que a lei federal refor�a orienta��o da pasta para que disponibilizem contracep��o de emerg�ncia no tempo adequado para evitar a gravidez. "Assim como a p�lula, o pr�prio servi�o de aborto legal, para mulheres que engravidaram, � dificultado em v�rias partes do pa�s por quest�es morais. Depois de violentada, a mulher sofre outra viol�ncia, s� que institucional", critica Fabiane.
Horas de horror
Uma turista americana foi estuprada durante seis horas dentro de uma van no Rio de Janeiro em mar�o passado. Ela e o namorado, um jovem franc�s, embarcaram em Copacabana, na Zona Sul, com destino � Lapa. No Aterro do Flamengo, os criminosos ordenaram que os outros passageiros descessem e seguiram para S�o Gon�alo. O franc�s foi amarrado, espancado e atingido com uma barra de ferro, enquanto assistia � namorada ser estuprada. Em agosto, a Justi�a condenou tr�s homens pelos crimes, com penas que variam de 21 anos a 49 anos de pris�o. Um menor, que participou da viol�ncia, est� apreendido.
Nove integrantes da banda baiana de pagode New Hit e o seguran�a do grupo foram denunciados por estupro de duas adolescentes de 16 anos. De acordo com o Minist�rio P�blico, as meninas teriam pedido, depois de assistir ao show do New Hit, em Ruy Barbosa (BA), para tirar fotos e pegar aut�grafos da banda. Nesse momento, eles sugeriram que fossem para o �nibus. L�, estupraram as duas garotas com "atos vis e animalescos", conforme a den�ncia. O crime ocorreu em agosto de 2012. Os acusados ficaram presos, mas, gra�as a um habeas corpus, aguardam o julgamento em liberdade. As adolescentes foram inclu�das no Programa de Prote��o a Crian�as e Adolescentes Amea�ados de Morte.
Tamb�m em 2012, a coragem de tr�s v�timas de um estuprador que agia na Cidade Industrial, em Contagem, regi�o metropolitana, ajudou a pol�cia a prender o agressor.