S�o Paulo, 13 - Uma equipe internacional de pesquisadores descobriu que o pirarucu, peixe de maior import�ncia econ�mica da Amaz�nia, j� n�o � encontrado em algumas comunidades locais do Par�, onde sua explora��o � feita de forma predat�ria. Essa conclus�o indica que a pesca pode levar � extin��o os peixes grandes, f�ceis de capturar e com alto valor comercial - exatamente o contr�rio do que diz a teoria bioecon�mica cl�ssica, utilizada para tra�ar pol�ticas p�blicas de prote��o dessas esp�cies.
O estudo, publicado na revista Aquatic Conservation: Freshwater and Marine Ecosystems nesta quarta-feira, 13, foi coordenado pelo brasileiro Leandro Castello, professor da Faculdade de Recursos Naturais e Meio Ambiente da Virginia Tech (Estados Unidos), especialista em ecologia e conserva��o da pesca na Amaz�nia.
De acordo com Castello, na teoria bioecon�mica cl�ssica, assim que um peixe come�a a se tornar escasso por causa da explora��o pesqueira, os custos do pescador para encontrar o peixe tamb�m aumentam. Isso faz com que o pre�o do peixe dispare, diminuindo sua procura e levando o pescador a procurar outras esp�cies para perseguir. Assim, � como se o pr�prio mercado se encarregasse de equilibrar a explora��o do recurso, evitando a extin��o da esp�cie.
"Essa teoria � usada tanto por pesquisadores como pelos tomadores de decis�o, para tra�ar pol�ticas de conserva��o. Mas nossa pesquisa mostrou que, na pr�tica, as coisas s�o bem diferentes", disse Castello. Segundo ele, as conclus�es do estudo s�o mais coerentes com uma teoria bioecon�mica menos conhecida, chamada de "fishing-down", que vai no sentido inverso: os peixes grandes, de f�cil acesso e alto valor comercial podem ser pescados at� a extin��o total.
"A teoria cl�ssica prev� que o pescador vai procurar outras esp�cies quando come�a a escassez. E isso de fato acontece em regi�es temperadas. Mas a Amaz�nia � riqu�ssima em esp�cies e elas est�o todas misturadas nos rios. O m�todo mais econ�mico para o pescador � o uso das redes. Por isso, mesmo quando procura outros peixes, ele acaba pescando o pirarucu involuntariamente", explicou Castello.
Como o pirarucu � a maior esp�cie nos rios da Amaz�nia - pode chegar a ter 200 quilos e tr�s metros de comprimento -, ele acaba sendo capturado pelas redes usadas para pescar qualquer outra esp�cie. "Com a popula��o j� escassa, essa pesca acidental amea�a gravemente a preserva��o da esp�cie", afirmou Castello. Ao focar em esp�cies menores, os pescadores acabam extraindo das �guas os pirarucus juvenis, o que agrava ainda mais a possibilidade de extin��o local. "Com um ano de idade o pirarucu j� tem 80 cent�metros de comprimento", disse ele.
O estudo foi realizado nas v�rzeas do entorno da cidade de Santar�m (PA). As plan�cies de alaga��o do Rio Amazonas s�o zonas pesqueiras altamente produtivas, segundo o pesquisador. Por seu tamanho e por viver em �guas relativamente rasas, o pirarucu se torna ainda mais f�cil de pescar. O peixe sobe � superf�cie em intervalos de cinco a 15 minutos, quando se torna alvo f�cil para os arp�es.
"Outro fator que agrava as amea�as ao pirarucu � a extrema pobreza dos pescadores. Eles conhecem o problema e � claro que n�o querem extinguir seu principal recurso. Mas muitas vezes s�o pessoas em condi��o muito dif�cil, que n�o t�m outra alternativa", explicou Castello.
Extinto
O estudo teve base em entrevistas com 182 pescadores em 81 comunidades. Os resultados mostraram que o pirarucu est� extinto em 19% das comunidades, amea�ado de extin��o em 57% delas e super-explorado em 17%. De acordo com o estudo, tr�s das cinco esp�cies existentes de pirarucu j� n�o s�o vistas h� d�cadas.
Entre as comunidades estudadas, apenas 27% seguem regras de manejo para a pesca de pirarucu. Uma delas, a comunidade de S�o Miguel, baniu o uso de redes de emalhar - nas quais os peixes s�o presos por seus pr�prios movimentos - h� 20 anos. A comunidade tem as maiores densidades de pirarucu da regi�o.
Castello realiza pesquisas sobre o pirarucu h� 15 anos. Em 1999, quando atuava no Instituto Mamirau�, no Amazonas, desenvolveu com outros colegas um m�todo de contagem que permite ao pescador avaliar o tamanho de seu estoque de peixes. Com isso, o instituto implantou um programa de manejo do pirarucu que � utilizado at� hoje. "Com a contagem, o pescador pode estabelecer uma cota de pesca para garantir que n�o vai acabar com o estoque", disse.
No Amazonas, segundo Castello, a pesca do pirarucu foi totalmente proibida em 1996. Mas, caso usem o m�todo de cotas determinadas por contagem, os pescadores conseguem, junto ao Ibama, uma autoriza��o especial para a pesca da esp�cie. De acordo com ele, essa restri��o, combinada com as regras de tamanho m�nimo (s� � permitido pescar peixes com mais de 1,5 metro) e do defeso (suspens�o da pesca entre dezembro e maio, na �poca de reprodu��o dos animais), garantiram a abund�ncia do pirarucu em territ�rio amazonense.
No Par�, onde Castello realiza pesquisas h� cinco anos, n�o h� proibi��o para a pesca do pirarucu. Apenas as regras de tamanho m�nimo e do defeso s�o aplicadas. "A pesquisa deixa claro que as popula��es de pirarucu est�o sofrendo processos de extin��o local por falta de um programa de manejo como o que existe no Amazonas", disse.
Segundo ele, no Amazonas, v�rias popula��es super-exploradas de pirarucu se recuperaram gra�as ao manejo comunit�rio. O Instituto de Pesquisa Ambiental da Amaz�nia (Ipam), segundo ele, tenta implantar um programa semelhante na regi�o de Santar�m. "O principal obst�culo para isso tem sido a falta de apoio do governo estadual, que foi fundamental no caso do Amazonas", disse Castello.