S�o Paulo, 29 - H� dois meses, quando a prima do interior entregou em suas m�os o pequeno Jos� Pedro, a balconista Alessandra Dias, de 34 anos, de Camaragibe, regi�o metropolitana do Recife, n�o se impressionou com a microcefalia. "Assim que o vi, me apaixonei", contou. O beb� faz parte de um universo ainda n�o dimensionado de crian�as abandonadas pelas fam�lias ap�s a constata��o da m�-forma��o.
Desde outubro, quando a notifica��o se tornou compuls�ria, houve 209 registros de microcefalia em Pernambuco. Por isso, Alessandra diz entender o gesto da m�e biol�gica. "Ela tem outros quatro filhos, um com defici�ncia mental. A fam�lia � muito carente e disse que n�o tinha como cri�-lo com os cuidados necess�rios. N�o tive d�vidas, agarrei e nunca mais vou soltar este menino. � meu filho", disse. Casada h� quatro anos e sem filhos biol�gicos, Alessandra e o marido, o motorista Ivan Lima, de 38 anos, que apoiou o gesto da mulher, foram � Defensoria P�blica de Pernambuco para entrar com o processo de guarda oficial de Jos� Pedro, hoje com 6 meses.
O garoto � acompanhado pela equipe m�dica do Instituto Materno Infantil Professor Fernando Figueira, refer�ncia no atendimento � microcefalia no Estado. "J� sabemos que ele tem problema na audi��o, mas a vis�o est� normal. Estamos fazendo tudo o que os m�dicos mandam. N�o temos medo, temos amor", disse Alessandra.
Presente de Natal
A dom�stica Denise Carla, de 33 anos, tamb�m virou m�e adotiva de um beb� com microcefalia. O "presente", como ela diz, chegou na noite do Natal: os pais biol�gicos da crian�a tinham decidido entreg�-la a um abrigo, quando um amigo da fam�lia os levou at� Denise. "Foi um susto, mas tamb�m uma das maiores emo��es da minha vida", conta. O beb� sofreu uma parada respirat�ria no parto, ficou com sequelas nas m�os e recebe tratamento no Hospital Universit�rio Oswaldo Cruz.
O Lar Rejane Marques, um abrigo para crian�as abandonadas, na zona norte do Recife, recebeu em outubro de 2015 uma menina com microcefalia. Na ocasi�o, a crian�a tinha 13 dias e havia sido entregue a profissionais do Conselho Tutelar ainda no hospital onde nasceu. O Minist�rio P�blico de Pernambuco entrou com a��o de destitui��o do poder familiar para abrir ado��o. De acordo com o juiz �lio Braz, da 2.� Vara da Inf�ncia, familiares da crian�a est�o sendo ouvidos sobre a possibilidade de cuidarem da menina.
Preocupado com o aumento no abandono de crian�as atingidas pela microcefalia, o psic�logo Valter Dutra alerta para a necessidade de refor�ar o acompanhamento a gestantes com suspeita. "Muitas dessas m�es s�o carentes, jovens e t�m outros filhos para cuidar. O beb� com microcefalia surge como uma barreira. Algumas temem ser abandonadas pelos companheiros, como outras j� foram (mais informa��es abaixo). Estamos falando de pessoas que est�o fragilizadas e por isso precisam de apoio e orienta��o."
A neuropediatra Vanessa Van Der Linden Mota, uma das primeiras profissionais de sa�de a identificar a epidemia de microcefalia no Estado, defende aten��o total aos pacientes e familiares. "As m�es precisam ser informadas para terem seguran�a de que seus filhos precisam de cuidados e amor e ter�o apoio para isso. Esse trabalho precisa chegar aos pais, irm�os, av�s. A fam�lia toda precisa estar amparada por uma rede s�lida de aten��o profissional." At� o dia 20, Pernambuco tinha 1.601 notifica��es de microcefalia com suspeita de associa��o ao zika v�rus - 209 confirmadas.
Nunca escolhida
Em Teresina, capital do Piau�, uma mulher deu � luz na Maternidade Dona Evangelina, mas, ao receber alta, foi embora sem levar o beb�. A crian�a havia nascido com microcefalia e a m�e, que reside no interior do Estado, alegou que n�o tinha condi��es de cuidar dela. O destino da crian�a ainda ser� decidido. A dire��o da maternidade promoveu um treinamento para as fam�lias que t�m filhos com alguma defici�ncia para evitar o abandono ou entrega para ado��o.
O fen�meno, agravado pela ocorr�ncia de casos de microcefalia, n�o � recente. No Lar da Crian�a, que abriga 32 �rf�os ou crian�as abandonadas que devem ser encaminhados para ado��o, vive uma adolescente portadora de microcefalia que foi deixada ali beb�. Ela nunca foi escolhida por casais interessados em ado��o.
Na ter�a-feira, um rec�m-nascido com a m�-forma��o deu entrada no Lar. A m�e desistiu do filho, alegando falta de condi��es para cri�-lo com dignidade. A dire��o encaminhou os documentos � Vara da Inf�ncia e da Juventude: ser� mais um beb� com microcefalia na fila da ado��o.
Rede
Um grupo de pais que t�m filhos com microcefalia se uniu para ajudar as fam�lias de baixa renda. Por interm�dio da Maternidade Dona Angelina, que atende gestantes carentes, eles entram em contato com as fam�lias e oferecem apoio e orienta��o para que os beb�s sejam criados de forma adequada. O objetivo � evitar o abandono dessas crian�as. O Piau� tem 40 casos de microcefalia j� confirmados.
As informa��es s�o do jornal
O Estado de S. Paulo.