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Estado de Minas

Fam�lias formadas por pai, m�e e filhos j� n�o s�o maioria no pa�s

Sociedade brasileira se acostuma com uma mudan�a, cada vez mais vis�vel, da configura��o tradicional das fam�lias no pa�s


postado em 25/12/2018 18:25

(foto: Arquivo Pessoal)
(foto: Arquivo Pessoal)

O tradicional arranjo de fam�lia — com pai, m�e e filho(s) — mudou. Al�m das forma��es convencionais, novas configura��es crescem e mostram desafios di�rios enfrentados por m�es e pais sozinhos, divorciados que unem as fam�lias, crian�as que s�o criadas pelos av�s, coparentalidade e casais homoafetivos que lutam para que seus afetos sejam respeitados. O que h� de comum entre eles � o amor, cada um � sua maneira. As diferentes formas de composi��o familiar mostram que o g�nero, a idade e o status civil de quem cria n�o importam; prevalecem sempre o respeito e a uni�o.

Dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domic�lios (Pnad) revelam que, desde 2005, o perfil composto unicamente por pai, m�e e filhos deixou de ser maioria nos domic�lios brasileiros. No estudo, o tradicional arranjo ocupava 42,3% dos lares pesquisados — uma queda de 7,8 pontos percentuais em rela��o a 2005, quando abrangia 50,1% das moradias.

Moradores de Teres�polis (RJ), o jornalista Gilberto Scofield Junior, 53 anos, e o corretor de im�veis Rodrigo Mello, 34, vivem juntos h� 15 anos e oficializaram a uni�o na �ltima sexta-feira. Eles s�o pais de Paulo Henrique, 9, e Rafaela, 18, que personificaram um grande sonho do casal. O processo de ado��o do menino durou cerca de um ano e meio. Paulo chegou a ser rejeitado por tr�s casais heterossexuais e acabou adotado em 2014. Rafaela foi acolhida dois anos depois.

A vida do casal mudou completamente em 23 de outubro de 2014, quando o companheiro Rodrigo recebeu a not�cia de um grupo de entidades de ado��o sobre a disponibilidade de Paulo, que, � �poca, tinha 4 anos. Ele estava em um abrigo na cidade de Capelinha (MG), no Vale do Jequitinhonha. “Foram sete horas de viagem, entre carro e avi�o. A primeira impress�o foi emocionante, ele era muito carente, muito carinhoso. Quando chegamos l�, descobrimos que ele tinha uma irm�, a Rafaela. Naquele momento, n�o est�vamos preparados para adotar os dois. O juiz pediu para n�o tirar o contato com ela, e eles iam se falando”, conta Gilberto.

At� a ado��o de Rafaela, muito aconteceu. A decis�o de aumentar a fam�lia veio ap�s um per�odo de trabalho na China. “Por conta da pol�tica de filho �nico (no pa�s oriental), as meninas eram abandonadas, principalmente no interior. Ficamos tocados com isso e a ideia amadureceu”, lembra Gilberto. O carinho e o acolhimento se tornaram os ingredientes necess�rios para romper as barreiras da adapta��o. “� um pouco mais dif�cil quando � uma crian�a que n�o acompanhamos desde o in�cio. Buscamos entender a psicologia por tr�s das a��es e preencher instintivamente lapsos passados. O acolhimento fez com que as crian�as se adaptassem. Paulo foi rapidamente ambient�vel. Rafaela, por ser maior e estar na fase da adolesc�ncia, levou mais tempo”, conta.

Gilberto, Rodrigo, Paulo Henrique, Rafaela e os animais de estima��o da casa formam uma fam�lia como qualquer outra; lidam com as alegrias e as preocupa��es di�rias similares �s de pais tradicionais. Questionado sobre a aceita��o dos filhos em rela��o � presen�a de dois pais em casa, Gilberto afirma que s�o bem resolvidos. “Os amigos perguntam: S�o dois pais? Eles respondem que sim e n�o questionam mais. O col�gio deles � progressista.

Para Gilberto, o estranhamento da sociedade � ligado ao preconceito dela e da maneira como julgam as pessoas que n�o seguem os padr�es considerados tradicionais, da heteronormatividade. “Educar � um exerc�cio di�rio. Isso se passa exercendo, dando exemplo. Negociamos na base da conversa, mas isso n�o me impede de ser r�gido quando preciso, de cobrar disciplina. Buscamos convencer, inspirar naturalmente”, diz. Paulo Henrique, inclusive, fala com emo��o sobre o relacionamento com os pais e garante: “Amo meus pais. Eles fazem tudo por n�s e nos amam muito. Carinho � o que n�o falta”.

(foto: Arquivo Pessoal)
(foto: Arquivo Pessoal)

Ato pol�tico


Mari Mira e Patr�cia Egito, ambas com 32 anos, se conheceram h� cinco anos no trabalho. Pati era produtora cultural do antigo Balaio Caf� e Mari atuava como VJ e produtora cultural no local. N�o demorou para que se tornassem amigas. Logo se apaixonaram e pouco tempo depois estavam morando juntas. Este ano, decidiram fazer uma festa para celebrar a uni�o entre elas. Foi uma forma de reunir os amigos e os familiares “na luta pelo bem viver das fam�lias LGBTs”.

“Sentimos a import�ncia e a necessidade de reafirmar nosso amor perante a sociedade. Queremos nos tornar vis�veis, tanto ao nosso redor quanto dentro das estat�sticas. Fizemos para mostrar que casais como n�s existem e nossos afetos devem ser respeitados e legitimados sempre.  ‘Amor como luta’ foi a frase que norteou a nossa cerim�nia”, explica Mari. S�cias em um restaurante de gastronomia brasileira h� tr�s anos, j� compartilhavam, sob o mesmo teto, ang�stias, realiza��es e alegrias. Tudo isso envolto numa rela��o de respeito e apoio das fam�lias de ambas. “Elas s�o muito integradas � nossa vida. Sabemos que isso � um privil�gio e somos muito gratas. Juntas, n�s nunca sofremos preconceito, mas, nas nossas vidas individualizadas, sim. S�o hist�rias que j� est�o gastas, queremos falar de outras coisas”, pontua.

A psic�loga e economi�ria M�rcia Lopes, 56, � m�e solo e enxerga a estrutura��o da fam�lia como algo que perpassa qualquer r�tulo. O importante � o carinho, o respeito e a uni�o. A filha Rayssa, de 33 anos, nunca teve contato com o pai — e sempre foi algo muito bem resolvido na conjuntura familiar. Isso porque, explica M�rcia, a rede de apoio dela se manteve muito consistente, com o apoio de pais, tios e primos. “Sei que sou muito privilegiada, porque sempre tive apoio emocional e financeiro. Mas reconhe�o as dificuldades das mulheres que resolvem ser m�es sozinhas e n�o t�m essas condi��es. � um caminho muito mais �rduo, com diversos obst�culos e desafios”, destaca.

A vida de M�rcia mudou desde quando se tornou m�e. Apesar dos desafios de conduzir sozinha a educa��o de uma pessoa e de arcar com todos os custos disso, a psic�loga afirma que nunca se sentiu s�. Evidentemente, quando situa��es dif�ceis acontecem, gostaria de ter com quem desabafar, mas nada que a fam�lia n�o consiga dividir. “A maternidade mudou a minha vida. A gente passa a repensar prioridades e abre m�o de alguns desejos pessoais em prol de outro algu�m. � muito prazeroso”, conta, emocionada. Ela ressalta as mudan�as na sociedade que, mesmo lentas, j� amenizaram o preconceito em torno de m�es solo: “Hoje em dia, n�o � algo t�o incomum. Naquela �poca, era mais dif�cil.  Mas � muito prazeroso tamb�m ouvir pessoas que conhecem a minha hist�ria dizendo que me admiram por isso”.

(foto: Luísa Dalé/Divulgação)
(foto: Lu�sa Dal�/Divulga��o)

Sangue


A psic�loga Priscila Preard explica que o conceito de fam�lia vai al�m do compartilhamento consangu�neo. “Fam�lia � um lugar em que, independentemente da orienta��o sexual, condi��o financeira, existe amor, respeito, di�logo, cuidado, afeto. � com quem compartilhamos os problemas e as conquistas. Fam�lia n�o precisa ser de sangue”. A especialista relata que a diversidade do mosaico familiar come�ou h� muitos anos, com o aux�lio de fatores como a entrada da mulher no mercado de trabalho, a chegada da p�lula anticoncepcional, a legaliza��o do div�rcio e, mais recentemente, com a conquista da uni�o homoafetiva.

“Acredito que, no campo homoafetivo, teve o reconhecimento jur�dico. Eles galgaram isso e foram para outra esfera, de criar filhos. Em rela��o aos pais ou m�es solo, a mudan�a vem de muito tempo, desde a Revolu��o Industrial. A mulher entendeu que o campo amoroso n�o necessariamente tem a ver com a forma��o familiar. Tamb�m teve a entrada dela no mercado de trabalho, que deu maior independ�ncia”, aponta.

No entanto, fam�lias formadas por homossexuais e pais e m�es solteiros ainda enfrentam preconceito na sociedade. “Tanto homoafetivos quanto quem cria sozinho enfrentam preconceito. As dificuldades de quem cria sozinho tamb�m s�o maiores, pois, muitas vezes, n�o disp�e de uma rede de ajuda, que facilitaria nos cuidados em alguns momentos”, completa. Para ela, � preciso deixar claro que a orienta��o sexual n�o dita a capacidade de la�o afetivo. “N�o � porque � diferente de algum modo que n�o vai cuidar ou dar amor. � um princ�pio �tico. A sociedade precisa entender que, por mais que n�o ame ou goste daquele modelo familiar, tem que respeitar e considerar o pr�ximo. Pode n�o ser a favor, mas tem que respeitar”.
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"Fam�lia � um lugar que, independentemente da orienta��o sexual, condi��o financeira, existe amor, respeito, di�logo, cuidado, afeto. � com quem compartilhamos os problemas e as conquistas. Fam�lia n�o precisa ser de sangue”
Priscila Preard, psic�loga


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