Tudo no C�rio de Nazar�, comemorado em Bel�m do Par�, � de propor��es gigantescas, amaz�nicas. Come�ando pelo n�mero de romarias, 12 ao total, ao longo da quinzena de festejos em torno de Nossa Senhora de Nazar�. Vejamos: s�o o traslado da imagem peregrina da Santa para a cidade de Ananindeua, a romaria rodovi�ria, o c�rio fluvial, a moto romaria, a ciclo romaria, a romaria dos corredores, a traslada��o, o c�rio - que � a mais esperada das romarias - a romaria da Juventude, o c�rio das crian�as, a prociss�o Rec�rio, 15 dias ap�s o c�rio e a prociss�o da festa.
Quem conta esses detalhes � a jovem Carolina Gon�alves, volunt�ria do Museu do C�rio. Pequeno espa�o pr�ximo � Bas�lica onde os viajantes podem aprender um pouco sobre a hist�ria dessa grande festa religiosa. L� Carolina conta sobre o caboclo Pl�cido, que em meio ao antigo Igarap� Murucutu (aterrado para dar espa�o para a constru��o da cidade) encontrou a imagem de uma santa, isso no ano de 1700. Ele pegou a escultura, de 28 cm e feita de madeira, e a levou para sua casa. "Toda vez que ele dormia, acordava e notava falta da imagem, voltando para a beira do Igarap�, encontrava novamente a santa por l�. Ele ent�o decidiu construir uma pequena capela, feita de palha, para abrig�-la. A hist�ria correu os vilarejos mais distantes e muitos come�aram a viajar quil�metros a fim de conhecer Nazinha, como os locais gosta de se referir.
Em 1790, o governador Francisco Coutinho pensou em organizar uma grande feira de produtos locais da regi�o. Ele no entanto adoeceu e fez uma promessa que, se melhorasse, faria uma missa em homenagem � M�ezinha. Ele se curou e esse � o primeiro milagre atribu�do � Nossa Senhora. Em 1793, aconteceu aquele que � considerado o primeiro C�rio da hist�ria. "A gente n�o sabe quem a levou at� o Igarap�, s� sabemos que ela e Deus escolheram o lugar que gostaria de permanecer." Assim, em r�pidas palavras, em meio � casinhas de madeira feitas por fi�is, Carolina conta a saga da santa e sua rela��o intr�nseca com Bel�m.
A hist�ria prossegue para a corda, cheia de simbolismos na festa, Carolina nos conta: "Em um dos C�rios, a Berlinda, o suporte feita de cedro para abrigar a imagem atolou pr�ximo � regi�o do Mercado Ver o peso. Na �poca a Santa era transportada em Carro de Boi. Nada conseguia remover o ve�culo do alagadi�o. Algu�m teve a ideia de pegar uma corda, e a� sim, conseguiram tirar o andor de l�. Desde ent�o n�o h� C�rio que n�o tenha corda, ela � o cord�o umbilical entre os romeiros e Nossa Senhora. Algumas vezes os organizadores quiseram retirar a corda, mas o povo n�o deixa", resume Carolina.
Continuando com os n�meros amaz�nicos, s�o oitocentos metros dela, divididos em 400 metros utilizados na Traslada��o do s�bado � noite, no percurso de mais de tr�s quil�metros entre a Bas�lica a Igreja da S� e mais 400 metros usados para conectar os fi�is no percurso de volta do domingo, quando a imagem retorna da S� para a Bas�lica. Produzida com sisal e curiosamente produzida e trazida de Santa Catarina, tudo sem custos. Empres�rios devotos do Sul do Pa�s bancam as despesas, nos conta a guia do Museu. Al�m da Corda h� anos a organiza��o do C�rio introduziu as chamadas "Esta��es", estruturas geom�tricas feitas de alum�nio, onde os romeiros v�o as puxando, ao todo s�o quatro, a primeira possui 37 metros de comprimento, e a cada uma na sequ�ncia seu tamanho em comprimento e largura vai diminuindo. Os mais antigos relembram a dificuldade que era puxar a corda antes do surgimento das "Esta��es".
Apesar da grandiosidade expressa no n�mero de romarias feitas para celebrar a Santa, nas cenas cinematogr�ficas do C�rio Fluvial, com seus incont�veis barcos, barquinhos, lanchas, chalanas, jet skis e motos aqu�ticas de todos os tipos, nos milh�es de pessoas das principais romarias -- de s�bado e domingo -- o que comove o forasteiro s�o as pequenas hist�rias, pequenos atos que se mostram t�o ou mais grandiosos quanto os exemplos citados.
No s�bado de tarde, o casal Tales Peterson e Claudia Liliana, naturais do Estado do Maranh�o, erguiam o pequeno Jo�o Lucas Barbosa, de 4 meses, em frente da Bas�lica Nossa Senhora de Nazar�, local onde originalmente era o Igarap� Murucutu, nos anos 1700. Eles participavam do lado de fora da Igreja, pois n�o restava mais espa�o dentro da Bas�lica, assistindo a missa conhecida como descida do Gl�ria. Cada mil�metro de espa�o totalmente tomado pelos romeiros e fi�is. Todos querendo acompanhar a retirada - que acontece poucas vezes ao ano - da imagem original da Santa de sua redoma de cristal. O casal conta � reportagem que h� anos tentava engravidar. "Claudia j� havia feito tr�s insemina��es artificiais. Somos casados h� sete anos e nada. Fizemos uma promessa para Nossa Senhora e conseguimos ter nosso filho, Jo�o Lucas Barbosa", as l�grimas escorriam do rosto do pai, Tales Peterson enquanto erguia o beb�.
Na Casa de Pl�cido, ponto de apoio ao Romeiro, muitos chegam com os p�s feridos e cheios de bolhas, com desidrata��es provocadas pelo calor excessivo da Amaz�nia. L� eles encontram a acolhida dos volunt�rios que lavam os p�s dos promesseiros, fazem massagem nos mais necessitados e servem refei��es para os famintos depois de horas de caminhada. Um desses fi�is, Jo�o Souza, que caminhou cerca de 30 quil�metros para chegar � capital d� um abra�o apertado em Lucia Anuncia��o, de 42 anos, ap�s ter os p�s lavados por ela. N�o falam palavra alguma, mas o gesto diz tudo. A verdadeira grandiosidade do C�rio est� nos pequenos detalhes.
P�blico 'flutua' em meio � multid�o
Todos dizem com orgulho na cidade que o C�rio � maior manifesta��o religiosa do Brasil. Alguns ainda ressaltam que � a maior do mundo. Dif�cil duvidar de tal afirma��o depois de presenciar ao vivo a prociss�o.
Tudo come�a logo de madrugada, quando os romeiros com mais f�lego chegam na regi�o do mercado Ver o Peso e da Esta��o das Docas para garantir seu lugar na corda. Como os 400 metros de sisal e as quatro esta��es s�o objeto de cobi�a, muitos n�o hesitam em chegar as vezes com mais de doze horas de anteced�ncia para n�o perderem a oportunidade de ficar mais pr�ximos da Santa, ao segurarem na corda. � o caso de Sebasti�o dos Santos, de 60 anos, que chegou �s 19h30, foi at� o local que ficam armazenadas as estruturas das esta��es e ajudou a transportar at� o ponto de sa�da. Teria uma espera de doze horas pela frente, esse ano a prociss�o saiu �s 7h30 da manh� de domingo.
"H� 27 anos venho todos os anos. Isso porque pedia a gra�a para "m�ezinha", pois estava com um c�ncer e me curei. O dia que eu me sinto melhor � quando estou aqui. N�o sinto dor nenhuma. Lava a alma e renova o esp�rito", completa. Ao lado de Sebasti�o, aguardava ansioso sua estreia na prociss�o, Jos� Miguel Machado da Cruz, de 16 anos. Ele chegou �s 2 horas da manh�. Veio com o tio Sanderlei Cruz, de 40 anos, que atendeu um pedido do garoto para participar carregando a esta��o. "Acredito que v�m para participar, t�m uma palavra final: agradecimento. A palavra final � essa. Isso � o que move as pessoas a virem para c�".
Quando o C�rio come�a, inicia-se uma forte aglomera��o em torno da corda. As pessoas chegam a "levitar" ou "flutuar" em certos momentos. Enfermeiros ficam a postos colocando em macas as pessoas que passam mal devido ao forte calor. H� uma regra n�o escrita, mas que todos os participantes sabem, n�o se pode ir cal�ado carregar a corda. Todos v�o descal�os para n�o machucar o p� de ningu�m. Volunt�rios e promesseiros distribuem �gua por todo o percurso. Muitas vezes a �gua � arremessada sobre o corpo e a cabe�a que chegam encharcados ao fim do percurso. Ao final da Prociss�o, pr�ximo da chegada � Bas�lica, tio e sobrinho completam juntos, lado a lado os mais de tr�s quil�metros, e v�o embora rumo ao almo�o do C�rio com o restante da fam�lia.
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