
A curva da pandemia parece n�o existir. At� aqui, � uma reta a apontar para cima, apesar de alguns estados tomarem decis�es para afrouxar o isolamento social e recuperar parte de suas atividades econ�micas. Na contagem di�ria dos �rg�os competentes de sa�de, o pa�s, que continua sem ministro da Sa�de ap�s a demiss�o de Luiz Henrique Mandetta e do pedido para sair de Nelson Teich, passou a R�ssia e j� � o segundo com mais n�meros de contaminados no mundo, atr�s apenas dos Estados Unidos, cuja curva de mortalidade parece dar refresco e descer a ladeira - alguns estados norte-americanos retomam parte do que faziam antes da pandemia. Nas �ltimas 24 horas, o Brasil chegou a 363.211 casos.
O cen�rio � s�rio. H� 22.666 �bitos. Na semana seguinte em que a Organiza��o Mundial de Sa�de (OMS) aponta a Am�rica do Sul (com o Brasil no comando) como epicentro da doen�a - eram os EUA -, o Estad�o escolhe e faz um retrato dos cinco principais estados brasileiros onde a COVID-19 avan�a rapidamente, mas cujas administra��es p�blicas se desdobram para evitar o colapso. Na Grande S�o Paulo, por exemplo, onde h� o maior n�mero de mortes, a taxa de ocupa��o de UTIs chega a 91%, segunda maior desde o in�cio da pandemia. O Rio espera pela entrega de hospitais de campanha. Pernambuco, Par� e Amazonas est�o no limite.
Amazonas
Temor e incerteza permeiam o cotidiano dos moradores do Amazonas em meio a pandemia do coronav�rus com o avan�o dos casos da doen�a aliado ao risco de colapso na sa�de estadual. A semana que come�a vai ser ainda mais cr�tica. Um elemento a mais � a falta de cuidados da popula��o para evitar a propaga��o da COVID-19.Ainda que o quadro assuste, o governo estadual aposta no otimismo e aponta avan�os para responder � crescente demanda dos pacientes. Segundo dados da Secretaria de Estado de Sa�de (Susam), o Amazonas aumentou o n�mero de leitos e respiradores. Conta com 1.138 para COVID-19 na rede estadual, sendo 816 leitos cl�nicos, 243 de Unidade de Terapia Intensiva e 79 de Sala Vermelha. A taxa de ocupa��o da UTI � de 87%.
O discurso otimista, por�m, � contestado pelo professor aposentado do curso de Medicina da Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Mena Barreto Fran�a, para quem as autoridades p�blicas de sa�de demoraram a responder �s demandas da pandemia. "A situa��o n�o est� legal e o pico ainda n�o 'estourou', o que deve ocorrer no fim de maio e in�cio de junho, quando os casos come�am, novamente, a subir. Na minha avalia��o, os �rg�os de sa�de est�o fazendo 'imediatismo' sem planejamento. A sa�da � o isolamento, uso de m�scara, tudo que est� sendo recomendado. A nossa estrutura de sa�de � prec�ria."
Fran�a defende maior integra��o do Sistema �nico de Sa�de em todas as suas esferas: aten��o prim�ria, secund�ria e terci�ria, al�m de um comando �nico no Amazonas. "Na aten��o prim�ria, o ideal era visitar pessoas suspeitas de COVID-19 e fazer testagem, mas isto n�o acontece, ent�o, essa pessoa, com sintomas da doen�a, sai de casa para ir a uma unidade de sa�de e acaba contaminando outras tr�s ou quatro, no m�nimo. Vai ao Servi�o de Pronto Atendimento (SPA) e n�o encontra solu��o. Por fim, chega em unidades de emerg�ncias ou urg�ncias, numa situa��o mais grave e n�o tem respirador tampouco leito vago", frisou.
A dona de casa Cleiciany Ribeiro do Nascimento, de 28 anos, moradora do bairro Cidade Nova, zona norte de Manaus, sentiu na pr�tica as dificuldades em conseguir atendimento na capital amazonense. Na primeira semana de maio, ela conta que procurou diversas unidades de sa�de porque a irm� dela, Lidiane, de 35 anos, gr�vida de cinco meses, apresentou sintomas da doen�a.
"Fomos a uma UBS, que nos encaminhou ao hospital Plat�o Ara�jo e l� nos disseram que n�o havia m�dicos. Procuramos o Servi�o de Pronto Atendimento (SPA) e nos falaram que t�nhamos de ir a uma maternidade. No entanto, as maternidades n�o quiseram nos receber porque ela estava com sintomas de COVID-19", disse ao Estad�o. "A desculpa era n�o ter como fazer transfer�ncia por n�o haver leitos nos hospitais para pacientes com covid-19. Ficamos desesperadas. Tivemos de esperar em casa a disponibilidade de um leito. Conseguimos a transfer�ncia para o hospital Delphina Aziz, uma semana depois. Com o diagn�stico da doen�a confirmada, ela agora se recupera em casa", narrou.
A falta de leitos aliada � imprud�ncia dos moradores � um fator que pode agravar ainda mais o quadro da doen�a no Estado. O motorista de aplicativo Jos� Carlos de Alencar, de 48 anos, atende passageiros em toda Manaus e diz ainda haver pessoas que insistem em entrar no ve�culo sem o uso de m�scara.
"Acho que ainda n�o se deram conta da gravidade. Eu me recuso a levar pessoas sem m�scara. N�o � s� isto: na periferia, as pessoas n�o est�o dando a m�nima para tomar os devidos cuidados. O movimento nas ruas e com�rcio � normal. E raramente usam m�scara", diz.
A an�lise do motorista � corroborada pelo professor do Departamento de Matem�tica da Universidade Federal do Amazonas, Wilhelm Alexander Steinmetz. Ele fez parte da equipe de pesquisadores que coordenou o estudo "Curva de Contamina��o COVID-19 - Estado do Amazonas", divulgado h� uma semana. "Percebemos que a classe m�dia aderiu mais tanto ao isolamento social quanto �s medidas de preven��o como o uso das m�scaras", comentou.
Ainda segundo Steinmetz, 40% dos moradores do Amazonas fazem isolamento e que isso evitou n�meros ainda piores no Estado. "Poder�amos ter cerca de 2,5 mil �bitos a mais no m�s de abril", admite.
S�o Paulo
A regi�o metropolitana de S�o Paulo j� tem 13 hospitais lotados e que n�o recebem mais pacientes. A taxa de ocupa��o dos leitos em UTIs est� ao redor de 91%. Mas � o aumento de casos no interior do Estado o que mais preocupa as autoridades de sa�de no momento: a COVID-19 chegou na sexta a 500 munic�pio do Estado (que tem 645 cidades), e a taxa de crescimento no interior � quase quatro vezes maior do que na capital. Na cidade de S�o Paulo, cora��o da doen�a, se em mar�o a abertura de novos leitos foi feita �s centenas, agora o conserto de 12 respiradores � comemorado, uma vez que d� sobrevida a um sistema perto do limite.
S�o Paulo briga para manter ao menos metade dos habitantes em casa e s� conseguiu alcan�ar taxa de isolamento social acima de 50% durante a semana passada por causa do feriad�o. A cidade n�o parou porque conseguiu ativar leitos pr�prios antes da crise, montou quatro hospitais de campanha, alugou espa�o na rede privada e passou a gerenciar na ponta do l�pis cada vaga dispon�vel, de modo a saber o total de leitos livres em cada hospital para transferir pacientes. O modelo permitiu que ningu�m morresse por falta de atendimento, segundo o governo, mas obriga parentes a fazerem deslocamentos cada vez maiores atr�s de not�cias de seus familiares.
Todos os dias, a cabeleireira D�bora Ferreira, de 47 anos, percorre de carro 29 quil�metros entre o Jardim Santa Margarida, no Jardim �ngela, zona sul, e o Hospital Municipal Dr. Ign�cio Proen�a de Gouv�a, na Mooca, zona leste, onde o marido, de 53 anos, est� internado. "Ele foi para o (Hospital de Campanha do) Anhembi e depois veio para c�." Foi transferido porque precisou ser entubado. "Falaram que foi onde conseguiram vaga", diz D�bora, que acompanhava � dist�ncia o oitavo dia de interna��o do marido.
Mesmo assim, pode haver demora para conseguir a vaga. O vendedor Wellington Rodrigues dos Santos, de 31 anos, levou seu pai no dia 10 para o PS da Mooca. Ele foi medicado e aconselhado a voltar para casa. Tr�s dias depois, piorou e voltou ao centro m�dico. "A� eles internaram", conta o rapaz. O pai passou a receber oxig�nio, e o filho foi informado que ele precisava ir para a UTI. "Foi transferido s� dois dias depois."
O secret�rio municipal de Sa�de, Edson Aparecido, diz que a Prefeitura passou a estudar a necessidade de contratar leitos de m�dia complexidade em hospitais da rede privada. J� h� mais de 300 de UTI particulares usados por pacientes da rede p�blica. "Estamos avaliando a necessidade e os custos."
Essa medida se soma � instala��o de mais 20 respiradores vindos do governo Federal, a 12 respiradores pr�prios consertados e a equipamentos que ainda devem chegar do governo do estado. S�o a��es que fazem o governo avaliar que ser� poss�vel chegar ao t�rmino da pandemia antes de entrar em colapso.
"Esse aperto que tivemos neste m�s e ainda estamos tendo, talvez a gente consiga superar", disse ao Estad�o. A cidade tem cerca de 600 leitos de UTI ativos, e cerca de mil respiradores ao todo, informa o secret�rio.
As transfer�ncias mais longas de pacientes, da Grande S�o Paulo para o interior, eram apontadas como uma sa�da para a eventual falta de vagas no estado. Agora, o foco do Centro de Conting�ncia do Coronav�rus � justamente o interior.
Das cerca de 5.300 vagas de interna��o em UTI dispon�veis no Estado, mais de 4.400 j� est�o ocupadas. "Todas as regi�es do Estado t�m acelera��o maior do que a regi�o metropolitana nesse momento", diz o secret�rio de Desenvolvimento Regional do Estado, Marco Vinholi. "O ritmo de crescimento de �bitos no Estado em seis regi�es j� � maior do que na regi�o metropolitana." Ocorre que o total de leitos de interna��o no interior � menor. Na regi�o de Presidente Prudente, por exemplo, entre 30 de abril e a segunda-feira passada, houve aumento de 395% no n�mero de casos, de 61 para 302. A regi�o tem 36 leitos p�blicos de UTI, com previs�o de aumento de mais dez.
Vinholi ressalta que o isolamento adotado no in�cio da pandemia foi o que segurou a explos�o de casos no interior. Garante que n�o haver� colapso. "S�o Paulo fez a li��o com isolamento no momento certo, o que possibilita que o sistema p�blico de sa�de n�o entre em colapso."
Rio de Janeiro
Leandro Lima, 33 anos, morador de Nova Igua�u, na Baixada Fluminense, vive, em meio � pandemia de COVID-19, um triplo luto. Em onze dias, entre abril e maio, perdeu o pai e dois irm�os. Como ele, outros tantos lamentam a perda de entes queridos no Rio. Nas �ltimas semanas, com o crescimento nos n�meros de mortos e infectados, as unidades p�blicas de sa�de aproximaram-se perigosamente do esgotamento.Perplexo, Leandro - que, ironicamente, � agente de sa�de - lembra que, a um quil�metro de sua casa, deveria funcionar um dos sete hospitais de campanha prometidos pelo Estado. "Acredito que, se os hospitais estivessem prontos, dentro do prazo, talvez (houvesse uma chance para que os tr�s superassem a doen�a). O hospital de Nova Igua�u ainda est� em constru��o."
Cinco unidades de campanha, prometidas pelo governador Wilson Witzel (PSC), tamb�m est�o atrasadas - e algumas talvez nem sejam abertas. O Maracan� foi inaugurado e funciona com problemas.
Segundo n�meros da Secretaria de Estado de Sa�de, na quinta, no SUS, esperavam transfer�ncia para UTIs 340 pessoas, e para enfermarias outras 238. Os leitos estavam ocupados, a n�o ser no Hospital Zilda Arns, em Volta Redonda. Havia ainda leitos nos hospitais de campanha Lagoa-Barra e Parque dos Atletas, erguidos e operados pela Rede D'Or. No Zilda Arns, a ocupa��o era de 89% na enfermaria e 86% na UTI. No Estado, os mesmos indicadores estavam em 79% e 86%, respectivamente.
Na capital fluminense, epicentro da doen�a, a situa��o era igual. N�o havia, na rede municipal, uma �nica vaga para pacientes da COVID-19. Aguardavam transfer�ncia para UTIs (85% ocupadas) 254 pacientes, e 182 para enfermarias (74% com doentes). No estado e na capital, nos leitos ocupados, h� rotatividade de vagas por causa de altas e �bitos. Os n�meros apontam perspectivas de piora. Os casos de contaminados e mortes se aceleram, dobram a cada doze dias. Esse aumento se deu em um cen�rio de queda gradativa da taxa de isolamento social.
Segundo o Monitor Estad�o/InLoco para isolamento social, ap�s atingir o auge de 62,2% no in�cio da quarentena, em 22 de mar�o, o indicador recuou e chegou a 42,2% na quinta-feira. Desde que a circula��o nas ruas foi restrita, o patamar mais baixo foi em 8 de maio: 40,8%. O ideal, dizem os especialistas, � que seja de 70%.
Em meio �s dificuldades para combater a doen�a, a Pol�cia Federal e o Minist�rio P�blico desencadearam a Opera��o Favorito em 14 de maio. A a��o levou � cadeia Mario Peixoto, empres�rio de neg�cios com o Estado, e o ex-presidente da Assembleia Legislativa Paulo Melo. As apura��es envolvem suposto interesse il�cito em a��es nos hospitais de campanha. O esc�ndalo causou a queda de Edmar Santos da Secretaria de Sa�de.
Pelo Twitter, o governador prometeu que erros "ser�o consertados", e irregularidades "ser�o devidamente apuradas". "Quem se aproveitou desse terr�vel momento para se beneficiar deve ser julgado e punido."
Santos informou ter atuado "de forma transparente". O Estad�o n�o localizou Peixoto.
O aposentado Jos� Gomes de Lima, de 80 anos, morreu em 24 de abril no Hospital da Posse, onde horas antes fora internado. Nos dias anteriores, tinha procurado ajuda m�dica duas vezes, mas, mesmo hipertenso, foi mandado para casa. Seus filhos, Leonardo, 44 anos, e Liliane, 51, que se tratavam havia dias do que parecia ser gripe forte, sucumbiram � enfermidade em 4 de maio, em Mesquita e Belford Roxo, cidades vizinhas.
Em nota, a prefeitura de Nova Igua�u confirmou que Jos� Gomes foi atendido na Cl�nica da Fam�lia de Jardim da Viga. "Foi orientado a manter isolamento e procurar uma unidade de urg�ncia e emerg�ncia em caso de piora." Na UPA de Comendador Soares, tinha os mesmos sintomas de antes. Foi atendido conforme o protocolo do Minist�rio da Sa�de, realizando exame de raio x e mensura��o de sua oximetria, e n�o houve indica��o de interna��o.
Pernambuco
No meio da madrugada, a massagista Fl�via Ferreira, 47 anos, acordou aos sustos com a gritaria na casa da frente. "Meu pai vai morrer! Meu pai vai morrer!", desesperou-se uma vizinha diante da imagem do pai, um senhor de 70 anos, que convulsionava sobre a cama, ap�s tr�s dias de dor de cabe�a, dor no corpo e falta de ar. Por se tratar de caso suspeito de COVID-19, Fl�via conteve a vontade de ir at� l�. Da janela, conformou-se em acalmar a amiga.Como a rua fica perto de um hospital, normalmente a ambul�ncia aparece em minutos. Mas daquela vez o socorro demorou mais de uma hora para chegar � Campina do Barreto, bairro na periferia do Recife, para ang�stia dos moradores que n�o sabiam como ajudar.
Segundo Fl�via, houve um momento que um taxista at� assumiu o risco e se prontificou em lev�-lo � unidade m�dica, mas j� n�o dava mais tempo. Eram 3h16 quando, sem assist�ncia, ele parou de respirar.
"Os param�dicos chegaram, todos com aquelas roupas de prote��o, pareciam homens da Lua. Constataram o �bito, entregaram um papel e foram embora", relata a massagista. O corpo s� foi removido ao amanhecer, pela funer�ria. "Foi uma cena triste. Depois disso, passei tr�s dias com todas as janelas e portas fechadas com medo de o v�rus entrar em casa."
O epis�dio aconteceu na sexta-feira, dia 15, e � um dos reflexos da imin�ncia de colapso do sistema de sa�de em Pernambuco, onde os diagn�sticos de COVID-19, s� de abril para c�, saltaram de 95 para 27.759 casos - 46% destes, de paciente graves.
Com hospitais lotados e at� fila por leito de UTI, o Estado tamb�m ultrapassou a marca de 2 mil mortes, sem indicativo de desacelera��o da curva.
De acordo com a gest�o Paulo C�mara (PSB), 97% dos 600 leitos de UTI para S�ndrome Respirat�ria Aguda Grave (SRAG) est�o ocupados. Familiares de pessoas infectadas, no entanto, relatam esperar at� mais de uma semana para conseguir interna��o. Na outra ponta, m�dicos e enfermeiros descrevem uma rotina de unidades sobrecarregadas, com equipes exaustas pelo trabalho e por ter de comunicar cada vez mais, por telefone, todas as mortes.
Unidades de Pronto Atendimento (UPAs), destinadas a casos menos complexos, j� precisam lidar com pessoas em est�gio avan�ado de insufici�ncia respirat�ria. Sem tantos ventiladores mec�nicos � disposi��o, socorristas se revezam para, na m�o, manter o doente respirando. "O profissional fica bombeando manualmente com uma bolsa, para evitar que o paciente morra. Passa 30 minutos bombeando, depois troca para outro profissional e assim por diante", conta um m�dico.
Embora seja din�mica, n�o � raro que a fila por vaga em UTI supere 200 pessoas em Pernambuco e o pr�prio governo admite que precisa selecionar qual paciente deve ser transferido primeiro. "A prioriza��o � realizada a partir da discuss�o t�cnica entre o m�dico solicitante e o m�dico regulador, levando em considera��o, primeiramente, a gravidade do caso, a estrutura dispon�vel e a qualidade do suporte cl�nico nas unidades de sa�de onde cada paciente se encontra", informa em nota.
Refer�ncia no tratamento da COVID-19 no Recife, o Hospital Oswaldo Cruz opera em 100% da capacidade da UTI pelo menos desde o in�cio de abril. "Quando abre uma vaga, a demora � s� para fazer a limpeza do leito e o transporte do paciente. Entre a gente, o jarg�o � que n�o se espera nem esfriar o colch�o", diz o infectologista Jo�o Paulo Fran�a, contratado para atuar na pandemia.
Mesmo em hospitais de refer�ncia, h� relatos de momentos em que falta medica��o. No comunicado, o governo de Pernambuco diz que todas emerg�ncias p�blicas t�m capacidade de atender os casos mais graves. Tamb�m informa ter refor�ado unidades de aten��o prim�ria, como as UPAs, com equipamentos e profissionais.
"Neste sentido, os pacientes que est�o aguardando a transfer�ncia para centros de refer�ncia do coronav�rus s�o assistidos em unidades de sa�de que geralmente contam com estrutura de salas de estabiliza��o, inclusive com pontos de oxig�nio e respiradores", afirma. "A Secretaria de Sa�de de Pernambuco reconhece a gravidade do momento em todo o Pa�s e ressalta que vem tomando medidas para aumentar a estrutura da rede estadual."
Respons�vel pela maioria dos casos notificados, a regi�o metropolitana do Recife � o epicentro da doen�a em Pernambuco. Para tentar conter o avan�o, o governo decretou bloqueio na capital e em quatro cidades, o chamado lockdown.
Com alto �ndice de transmiss�o comunit�ria no Recife, o coronav�rus pegou at� o alto escal�o da administra��o p�blica. S� na �ltima semana, foram diagnosticados com COVID-19 o governador Paulo C�mara, a vice Luciana Santos, o chefe de gabinete Milton Coelho e o secret�rio da Sa�de Andr� Longo.
Na capital, a prefeitura abriu sete hospitais de campanha e anunciou a constru��o de 313 leitos de UTI desde o in�cio da crise, mas s� 114 (ou 36,4% do total), de fato, funcionam. Nos demais, faltam m�dicos. "Jamais imaginei passar por isso. A doen�a se espalhou muito r�pido e mudou a vida de todo mundo. A cada dia, a letalidade se aproxima mais da gente", descreve o advogado Lucas Mendes, 28 anos, que perdeu um amigo, de 36 anos e sem comorbidades, para o coronav�rus. Segundo conta, quatro familiares tamb�m contra�ram a doen�a.
Hoje, a preocupa��o maior de Mendes � com a av� - idosa de 86 anos, com problemas de artrose e portadora de Alzheimer - que vive no mesmo espa�o dos outros parentes que foram infectados. Com sinais de interioriza��o da doen�a, a gest�o C�mara anunciou constru��o de hospitais de campanha em munic�pios de refer�ncia como Caruaru, no agreste, e Petrolina, no sert�o. Ao menos 153 das 185 cidades do Estado j� notificaram casos da doen�a.
Par�
"Foi tudo muito r�pido e desesperador. Ele apresentou os sintomas e, ap�s dois dias, morreu. Passei quase 22 horas ao lado do meu pai no hospital at� ver o seu fim", lembra o contador George Pinto Gon�alves, de 38 anos. O aposentado Pedro Damasceno Gon�alves, de 67 anos, � uma das v�timas fatais do coronav�rus no Par�.Ele travou uma luta n�o apenas contra o v�rus, mas com o sistema de sa�de do Estado. Aos familiares, al�m da dor da perda, restou a impot�ncia e o sentimento de revolta. Depois de cinco dias j� morto, um servidor do hospital que o aposentado foi atendido, em Bel�m, ligou para saber como ele estava.
Foi na cidade de S�o Caetano de Odivelas, no nordeste paraense, que Pedro Damasceno come�ou a sentir os sintomas. Foi levado � Unidade de Sa�de do munic�pio, quando o m�dico que o atendeu disse � fam�lia que teria de ser atendido na capital, devido aos poucos recursos da cidade de 17 mil habitantes. Seu filho George, que mora em Bel�m, foi ent�o busc�-lo.
Ap�s percorrer 114 quil�metros at� Bel�m, o aposentado deu entrada no Hospital Abelardo Santos, no distrito de Icoaraci, no fim da noite do dia 1.° de maio. Ele piorou. "A satura��o chegou a 25% e n�o foi entubado. Usava oxig�nio que, por tr�s vezes, o m�dico cubano que o atendeu, repassou para outros pacientes. Revoltante, n�o?", comentou George ao Estad�o.
� medida que as horas avan�avam, o desespero tomava conta. "Vi cinco pessoas morrendo no corredor. Estava um caos. Os m�dicos e enfermeiros estavam perdidos, sem saber o que fazer. As pessoas n�o paravam de chegar", recorda. Mas, foi � noite que o pior aconteceu. "Meu pai j� n�o estava respirando, e comecei a gritar, pedir por socorro. Fui colocado para fora, at� que depois me chamaram com a not�cia da sua morte."
Quando George foi ao cart�rio para dar entrada na certid�o de �bito, a guia estava sem a assinatura e o registro profissional do m�dico. "Voltei ao hospital e um m�dico assinou e colocou insufici�ncia respirat�ria. Retornei ao cart�rio e, novamente, tive de ir ao hospital liberar o corpo, que j� n�o estava l�. Depois da procura, informaram que estava no IML", detalha.
Do necrot�rio, o corpo seguiu direto ao cemit�rio, sem direito a uma despedida. Foram dez minutos ao lado do caix�o.
O aposentado morreu no dia 2 de maio, e no dia 7, um funcion�rio do hospital Abelardo Santos, em Bel�m, ligou para a fam�lia perguntando por Pedro.
Silencioso, o coronav�rus, assim como assolou parte da fam�lia de George, deixa um rastro de destrui��o no Par�: interrompeu sonhos, devastou o sistema p�blico e privado de sa�de, colapsou o servi�o funer�rio, arruinou a economia e enclausurou mais de 3,5 milh�es de pessoas. A partir de hoje, o Estado se prepara para juntar os cacos, unir for�as e retomar a vida.
Quando os n�meros da doen�a eram t�midos no Par�, e poucos casos estavam confirmados, o governo reagiu com medidas de distanciamento social, anunciou a constru��o de hospitais de campanha, criou leitos, colocou atendimento itinerante e comprou equipamentos.
Aos poucos, agora, as filas nas portas das unidades de sa�de est�o desaparecendo, no sistema p�blico e privado. As atividades n�o essenciais est�o sendo retomadas. Ontem, terminou o prazo do lockdown, que teve in�cio dia 7 em dez cidades e depois em outras seis, totalizando 3,5 milh�es de pessoas dos 8,5 milh�es do Estado. Mais de 3,8 mil multas foram aplicadas. Os 16 munic�pios em lockdown tiveram m�dia de 49,28% de isolamento. O Par�, hoje, tem 390 leitos de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) adulto, com taxa de ocupa��o em 94.8%.
O sistema funer�rio colapsou. Desde 5 de abril, quando morreu a primeira pessoa com na capital, dezenas de fam�lias aguardam por mais de um dia a libera��o dos corpos dos seus entes. � frente do local, tendas foram montadas para amenizar a espera. Os cemit�rios n�o comportaram a demanda de enterros. Faltaram caix�es. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.