
Cerca de 180 brasileiros tripulantes de navios de cruzeiro que estavam retidos no mar conseguiram retornar ao Brasil no �ltimo fim de semana. Dois voos, um vindo de Puerto Vallarta, no M�xico, e outro de Bridgetown, em Barbados, aterrisaram no s�bado no aeroporto de Guarulhos, em S�o Paulo, trazendo al�vio para quem chegou e esperan�a para quem ainda sofre com a dist�ncia da terra natal e os familiares.
Do aeroporto mexicano vieram 52 brasileiros, que tiveram a companhia de argentinos, chilenos e uruguaios. J� da ex-col�nia brit�nica no mar do Caribe foram 127 portadores do passaporte verde amarelo, que mais uma vez tiveram a companhia de vizinhos sul-americanos.
“Estou em casa, com a fam�lia, em volta da lareira, comendo pinh�o e tomando chimarr�o”, afirma o ga�cho Daniel Silva, de 41 anos, cujo �ltimo porto foi em Barbados e que chegou ao lado da noiva, Luciana Moraes, tamb�m tripulante.
H� cinco anos na profiss�o, ele ainda teve de superar mais uma dificuldade: rompeu tend�o de Aquiles jogando futebol h� duas semanas e passou por cirurgia pouco antes de embarcar de volta ao Brasil. “Agora � hora de descansar e repensar. Acho que o �nico mercado que n�o est� sofrendo � o de vendas on-line. Ent�o, vamos ver, temos alguns estudos que talvez nos salve financeiramente. O pr�prio p�blico dos cruzeiros vai mudar o comportamento. Pensamos em abrir uma empresa para ajudar no embarque de pessoas”, diz o ga�cho de 41 anos, que n�o descarta voltar a bordo quando a crise provocada pelo novo coronav�rus passar. “Eu vou voltar a bordo, pois amo o que fa�o, amo turismo, gastronomia. E s� tenho a agradecer tudo que a empresa fez por mim.”
Outros dois brasileiros contatados pela reportagem voltaram via M�xico e pensam um pouco diferente. Para evitar retalia��es, eles preferem n�o se identificar, mas acusam a companhia de uma s�rie de condutas prejudicias, de corte de sal�rios � falta de informa��es, aumentando a ansiedade.
“� complicado, mas tenho duas teses para eles estarem demorando a repatriar todo mundo: primeiro porque � caro, depois que est�o ganhando dinheiro com os tripulantes. Muita gente compra 30 cervejas por dia, tr�s garrafas de vinho, duas garrafas de whisky, ma�os de cigarro. Em situa��es assim, as pessoas acabam se entregando mais ao v�cio. A intenet tamb�m � car�ssima, fora produtos de higiene, como shampoo, pasta de dente”, diz um carioca de 49 anos, que h� quatro vem trabalhando com entretenimento em navios.
J� uma paulistana sabe que havia seguran�a em rela��o � COVID-19, mas faltou respeito. “Eles n�o se preocupam com a sa�de mental da tripula��o. Conheci v�rias pessoas que garantiram que n�o voltam mais a navios de t�o traumatizadas que ficaram”, declara ela, que tem 31 anos e que trabalhou no mar entre 2010 e 2014 e desde 2017 voltou a bordo. “ N�o pod�amos fazer yoga, mas todo dia tinha festa. N�o dava para entender. Isso desgasta.”
Se j� est�o em casa, eles agora torcem para que todos os demais tripulantes consigam ser repatriados, n�o s� os brasileiros. At� porque muitos n�o t�m reagido bem, j� tendo sido registrados at� suic�dios.
“� uma situa��o dram�tica. Todo mundo preso, deprimido, j� teve gente fazendo greve de fome, capit�o amea�ado porque n�o d� resposta aos questionamentos. O que precisam � de apoio, que algu�m tome provid�ncias”, diz o carioca entrevistado.
Daniel reconhece que a situa��o n�o � f�cil. Por isso, aconselha todos que ainda n�o pudera desembarcar a buscarem aux�lio psicol�gico e tamb�m se ajudem mutuamente.
“Eu trabalhei com uma ucraniana que suicidou, era educada, mas muito quieta. Talvez tenha faltado se abrir com algu�m, falar o que estava sentindo. N�o d� para identificar quem est� com problema entre 1,2 mil tripulantes (em cada embarca��o”. Existe uma assist�ncia, n�o precisa se identificar, mas voc� tem de procurar. Eu fiquei muito chateado com o que ocorreu. Se voc� fica dois meses a bordo sem socializar, � um peso muito grande. Mas nada justifica tirar a pr�pria vida”, argumenta o ga�cho.
Ainda h� brasileiros e tripulantes de outras naconalidades retidos e v�rias partes do mundo, como nos EUA e nas Filipinas. Muitos est�o h� mais de dois meses se poder pisar em terra firme.