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Estado de Minas PROJETO COMPROVA

Brasil n�o ter� uma nova moeda lastreada em ni�bio chamada 'DIM'

O Banco Central (BC), respons�vel exclusivo pela emiss�o da moeda brasileira, negou de forma taxativa a possibilidade de mudan�a no sistema financeiro nacional


24/07/2020 17:37 - atualizado 24/07/2020 18:19

Verificação foi feita pelo Estado de Minas e pelo Jornal do Commércio(foto: Projeto Comprova)
Verifica��o foi feita pelo Estado de Minas e pelo Jornal do Comm�rcio (foto: Projeto Comprova)

  • Conte�do verificado: V�deo publicado no YouTube que afirma que o real ser� substitu�do por uma nova moeda chamada “DIM”.

Produzido com base em postagem feita no Facebook, um v�deo publicado em 20 de julho no canal “cristina Daflon chicletinho” no YouTube afirma que o Brasil substituir� o real pelo “DIM”. A nova moeda, que seria lastreada em ni�bio, entraria em vigor em 30 de novembro por meio de um “ato interventorial constituinte” assinado pelo “chefe de estado Celio Evangelista Ferreira do Nascimento”. Todo o conte�do � falso.

Constitucionalmente, o Banco Central (BC) � o respons�vel exclusivo pela emiss�o da moeda brasileira. O �rg�o negou de forma taxativa a possibilidade de mudan�a no sistema financeiro nacional.

Al�m disso, um cidad�o brasileiro n�o pode se auto-proclamar presidente da Rep�blica sem antes passar por uma s�rie de ritos de elei��o e posse descritos nos artigos 57, 77 e 78 da Constitui��o.

Celio Evangelista Ferreira do Nascimento, inclusive, foi indiciado na Lei de Seguran�a Nacional por ter amea�ado ju�zes, promotores e procuradores do Distrito Federal. Ele chegou a ser preso pela Pol�cia Civil do Distrito Federal no �mbito da opera��o P�tria Amada, mas conseguiu um habeas corpus e responde ao processo em liberdade.

Como verificamos?

Para esta verifica��o, o Comprova inicialmente realizou uma busca para tentar identificar quem era a autora do v�deo, Cristina Daflon; o autor do texto que ela l�, Lopes Winner; e o homem que prop�s a cria��o do “DIM”, Celio Evangelista Ferreira do Nascimento. Tamb�m tentamos contato com os tr�s por meio de redes sociais e telefones disponibilizados em seus perfis.

Depois, procuramos as assessorias de imprensa do Banco Central e do Minist�rio da Economia para saber se h� debates em curso sobre a mudan�a da moeda no Brasil. A pasta disse que a resposta caberia ao BC.

Entrevistamos o economista Jocildo Fernandes Bezerra, professor de Pol�tica Monet�ria na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), sobre o processo de mudan�a do meio circulante no Pa�s.

Tamb�m procuramos a Pol�cia Civil do Distrito Federal e a Justi�a Federal para levantar informa��es sobre o processo que investiga C�lio Evangelista por uma amea�a de morte enviada para ju�zes, promotores e procuradores do DF.

Por fim, entrevistamos o advogado Marcelo Labanca, professor de Direito Constitucional na Universidade Cat�lica de Pernambuco (Unicap), para entender se qualquer cidad�o pode se autodeclarar presidente da Rep�blica.

Verifica��o
Real continua

Em resposta ao Comprova, o Banco Central negou a ado��o do “DIM” no Brasil em novembro. A Constitui��o garante exclusivamente ao BC a compet�ncia para emiss�o de moeda.

De acordo com o economista Jocildo Fernandes Bezerra, um pa�s s� adota uma nova moeda quando a anterior perde valor. “A moeda � um meio circulante cujo valor tem limite de instabilidade. Uma moeda inst�vel � uma moeda cujo valor n�o � confi�vel. De modo que, se essa instabilidade for muito elevada, ela gera o fen�meno da infla��o. Quanto mais a infla��o se agrava, mais a moeda perde valor. Ent�o, nesse caso, voc� precisa de uma nova moeda”, explica.

Segundo Bezerra, as moedas tamb�m n�o podem ser mudadas “da noite para o dia”, porque a estabilidade delas permite que os atores econ�micos se planejem para o futuro. “Se eu sei que um bem custa R$ 100 hoje e vai custar os mesmos R$ 100 amanh�, eu posso contratar trabalhadores ou investir, porque eu sei qual o pre�o que aquele produto vai ter no final. Se, de repente, o Banco Central decidisse trocar de moeda, toda a economia seria perturbada. Imagine que voc� � fabricante de sapato e eu sou vendedor de banana. Quanto � que ser�o os pre�os, na nova moeda, do sapato e da banana? Isso paralisaria a produ��o, o consumo. E incluiria um grau de incerteza na economia que � indesej�vel”, argumenta.

O professor tamb�m diz que lastrear moedas em metais, como sugere a publica��o, � uma t�cnica em desuso h� quase 50 anos, quando os Estados Unidos deixaram de basear o valor do d�lar nas reservas de ouro. Lastrear significa que o valor de uma nota daquela moeda representa uma quantia de metal, geralmente o ouro, guardada em alguma reserva ou banco.

“Em 1971, os Estados Unidos disseram que n�o tinham mais ouro para lastrear o valor d�lar. Isso fez com o que o d�lar acabasse? N�o. Por causa da solidez da economia americana. Por isso, inclusive, que o Banco Central [brasileiro] se comporta de modo a criar expectativa de que o valor do real n�o vai oscilar al�m de um limite aceit�vel, assegurando a confian�a na economia e na sociedade brasileira. Lastrear uma moeda em ni�bio n�o faz sentido”, afirmou.

O Brasil tem, no dia 23 de julho, 8,2 bilh�es de c�dulas e 27,3 bilh�es de moedas que, juntas, somam R$ 341,8 bilh�es em circula��o.

“Peso-real”

Em junho de 2019, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) disse ser favor�vel a estudos para criar uma moeda em conjunto com a Argentina, que seria chamada de “peso-real”. Na �poca, o chefe do Executivo brasileiro apoiava a candidatura � reelei��o do ex-presidente argentino Mauricio Macri, derrotado por Alberto Fernand�z em outubro do mesmo ano.

O ministro Paulo Guedes, que chegou a participar das conversas, n�o deu prazo para implementa��o do “peso-real”. Na ocasi�o, o Banco Central do Brasil divulgou uma nota em que afirmava n�o haver nem projeto, nem estudo para a ado��o de uma moeda em conjunto com a Argentina.

Desde a independ�ncia, em 1822, o Brasil teve nove moedas. Seis delas surgiram em um curto per�odo de dez anos, em que o pa�s passou pela hiperinfla��o. O Real foi criado em 1º de julho de 1994, ap�s quatro meses de transi��o com a Unidade Real de Valor (URV), que existiu ao mesmo tempo em que o Cruzeiro Real.

O conte�do falso

Respons�vel pelo conte�do falso no YouTube, Cristina Daflon � uma pessoa real. O canal “cristina Daflon chicletinho” havia publicado 650 v�deos at� esta sexta-feira. Somadas, as grava��es — cujos temas variam de receitas culin�rias a conspira��es sobre queda de OVNIs no Brasil — tinham mais de 2,6 milh�es de visualiza��es.

No Instagram, um perfil associado a Cristina Daflon possui informa��es de contato. O Comprova enviou mensagens pela pr�pria rede social, pelo e-mail e pelo n�mero de WhatsApp (que n�o pertence a ela), mas n�o teve resposta. Na quinta-feira, o v�deo foi colocado no modo “privado” no YouTube.

Na grava��o, a mulher l� um texto sobre o “DIM”, publicado em 19 de julho no perfil “Lopes Winner” no Facebook. O Comprova enviou mensagem para o respons�vel pela postagem por meio da pr�pria rede social, mas n�o teve retorno. Na p�gina, h� ainda um contato telef�nico. O n�mero, por�m, n�o existe.

O ‘criador’ do “DIM”
O texto lido no v�deo atribui a idealiza��o do “DIM” a Celio Evangelista Ferreira do Nascimento, indiciado na Lei de Seguran�a Nacional por fazer amea�as de morte a ju�zes, promotores e procuradores do Distrito Federal. De fato, o homem de 79 anos mencionou a suposta cria��o da moeda numa publica��o na internet datada de 29 de outubro de 2019.

Em 21 de maio, Celio Evangelista e Rodrigo Ferreira, de 40 anos, foram presos preventivamente pela Pol�cia Civil do Distrito Federal no �mbito da Opera��o P�tria Amada por conta das amea�as. Na semana seguinte, os dois conseguiram habeas corpus e respondem �s acusa��es em liberdade.

As amea�as foram enviadas em um e-mail intitulado “Senten�a de morte aos traidores da p�tria”. No texto, a dupla “convoca a popula��o para matar pol�ticos, ju�zes, promotores, chefes de gabinetes, assessores, parentes, amigos, protetores e dem�nios de toda sorte”.

Em v�deo publicado na internet, Celio Evangelista fala em “estado de s�tio” e amea�a nominalmente pol�ticos como o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o vice Hamilton Mour�o (PRTB), os ex-presidentes Lula (PT), Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (MDB).

O caso foi investigado pela Delegacia Especial de Repress�o aos Crimes Cibern�ticos (DRCC). Celio Evangelista e Rodrigo Ferreira foram indiciados no artigo 17 da Lei de Seguran�a Nacional, que prev� de tr�s a 15 anos de pris�o a quem “tentar mudar, com emprego de viol�ncia ou grave amea�a, a ordem, o regime vigente ou o Estado de Direito”. O inqu�rito foi enviado � Justi�a Federal, que deve remeter os autos ao Minist�rio P�blico Federal (MPF). Ap�s an�lise, os promotores podem apresentar den�ncia.

Celio Evangelista se intitula “Presidente Constituinte” do Brasil desde dezembro de 2017. Em v�deo publicado este m�s, diz que, com o “DIM”, o pa�s comandaria o “novo sistema financeiro do mundo”. O Comprova tentou contato com C�lio por meio de n�mero disponibilizado em seu site, mas os telefonemas foram diretamente para a caixa postal.

O presidente no Brasil
O artigo 77 da Constitui��o Federal diz que o presidente da Rep�blica precisa ser eleito, com maioria dos votos v�lidos, mesmo que para isso seja necess�rio realizar um segundo turno de vota��o. Al�m disso, o artigo 78 define que, para tomar posse, o presidente eleito precisa prestar um juramento � Constitui��o e �s leis em sess�o do Congresso Nacional. Se o eleito n�o comparecer ao Congresso para tomar posse em at� dez dias ap�s a convoca��o pelo Legislativo, o texto constitucional diz, que o cargo ser� declarado vago.

O professor de Direito Constitucional Marcelo Labanca explica que ningu�m pode se autoproclamar presidente sem ter seguido os ritos descritos na Carta Magna. “A Constitui��o, inclusive, � muito clara em rela��o a esse rito. Ela diz que a posse tem que ocorrer no dia 1º de janeiro, em uma sess�o solene do Congresso Nacional. Ou seja, n�o pode nem ser uma sess�o s� da C�mara ou do Senado”, lembra.

Outra formalidade, de acordo com Labanca, est� descrita no par�grafo 6º do artigo 57, segundo o qual a convoca��o extraordin�ria para dar posse ao presidente da Rep�blica ser� feita pelo presidente do Senado Federal.

Por que investigamos?

Nesta terceira fase de combate � desinforma��o e a conte�dos enganosos na internet, o Comprova analisa postagens com grande circula��o sobre pol�ticas p�blicas do governo federal, elei��es municipais e a pandemia de covid-19.

At� 21 de julho, antes de ser colocado em modo privado, o v�deo sobre o “DIM” tinha quase 50 mil visualiza��es no YouTube. A vers�o do conte�do em texto no Facebook gerou 116.680 intera��es (soma de rea��es, coment�rios e compartilhamentos) at� 24 de julho, segundo a ferramenta CrowdTangle.

A verifica��o � relevante pelas repercuss�es que a troca de moeda de um pa�s pode causar, como aumento de gastos p�blicos para impress�o de novas notas e os impactos nas pol�ticas externas, al�m das mudan�as no dia a dia at� que as pessoas se adaptem ao novo sistema.

Recentemente, o Comprova classificou como falso ou enganoso outras publica��es sobre pol�ticas p�blicas do governo federal, como a transposi��o do Rio S�o Francisco, a constru��o de uma ponte em Goi�s e um “decreto-lei” para criar um Tribunal Constitucional Militar.

O Boatos.org tamb�m desmetiu duas vers�es em texto do conte�do sobre o “DIM”.

Falso, para o Comprova, � o conte�do inventado ou que tenha sofrido edi��es para mudar o seu significado original e divulgado de modo deliberado para espalhar uma mentira.


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