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Estado de Minas GERAL

Pesquisadores rebatem argumentos do agroneg�cio sobre estudo da Science


03/08/2020 18:07

Um grupo de cientistas do Brasil se uniu para escrever uma carta em defesa do estudo liderado pelo pesquisador Raoni Raj�o, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), publicado em julho na revista Science. O estudo, intitulado "As ma��s podres do agroneg�cio", na tradu��o em portugu�s, levantou que pelo menos 17% da carne e 20% da soja produzidas nos biomas Amaz�nia e Cerrado e exportadas para a Uni�o Europeia estariam "potencialmente contaminadas" com o desmatamento ilegal.

A pesquisa despertou forte pol�mica, sendo questionada por v�rios segmentos do agroneg�cio, entre entidades de produtores, representantes do governo e consultores. Essa rea��o, entretanto, � "contraproducente", de acordo com a carta assinada por pesquisadores da Universidade de S�o Paulo (USP), da Universidade de Bras�lia (UnB), da Universidade Cat�lica de Louvain, na B�lgica, al�m da Funda��o Florestal do Estado de S�o Paulo (SMA-FF) e tamb�m pelo climatologista Carlos Afonso Nobre, que j� atuou no Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e colaborou com o Painel Intergovernamental de Mudan�as Clim�ticas (IPCC).

Para eles, "n�o h� como ocultar a gravidade do desmatamento ilegal, do descumprimento expl�cito do C�digo Florestal, das invas�es de terras p�blicas e protegidas, da apropria��o de recursos naturais, dos inc�ndios criminosos, entre outros problemas associados ao mau uso da terra sob a �tica equivocada de expans�o crescente e cont�nua das fronteiras de produ��o agropecu�ria. Tais problemas demandam solu��es para as quais a Ci�ncia pode, mais uma vez, ser uma importante aliada dos produtores rurais".

De acordo com os cientistas signat�rios do documento, a rea��o do agroneg�cio ao estudo "despreza as contribui��es cient�ficas passadas e atuais para a efici�ncia e a sustentabilidade da agropecu�ria". Al�m disso, assinalam que "vale lembrar que o Brasil s� � uma pot�ncia agropecu�ria hoje, em grande parte, devido aos avan�os cient�ficos e tecnol�gicos". Ainda segundo o documento, todos os avan�os no setor agropecu�rio - inclusive os ligados � sustentabilidade - foram conquistados com "ci�ncia robusta e ancorada em pesquisas s�rias e auditadas".

Desta forma, reafirmem, a pesquisa liderada pelo professor Raj�o e publicada na Science seguiu os mesmos e s�rios preceitos. "Como � a pr�tica nessa revista, o estudo passou por um rigoroso escrut�nio de v�rios editores e revisores", lembram os cientistas, que continuam: "Eles auditaram a metodologia usada, os resultados obtidos e avaliaram se as afirma��es contidas no artigo estavam sustentadas na ci�ncia, na realidade de campo e nas an�lises feitas pelos pesquisadores".

Ainda de acordo com a carta, as conclus�es do estudo publicado na Science "convergem com as de muitos artigos cient�ficos e de levantamentos regulares de dados oficiais feitos no Brasil". E ainda "s�o conservadores" em rela��o � �rea de fato ilegalmente desmatada no Pa�s para a expans�o do agroneg�cio. Segundo os cientistas, o estudo do professor Raj�o olha para desmatamentos "comprovadamente ilegais", e "qualifica provavelmente menos propriedades ilegais do que uma an�lise mais direcionada apontaria".

Neste ponto, os pesquisadores discordam de cr�ticas de consultorias do agroneg�cio, que argumentaram, ao rebater o estudo, que a ilegalidade de �reas desmatadas est� "superestimada", ao deixar de incluir nas an�lises algumas premissas, "como as autoriza��es de supress�o (florestal) concedidas pelos Estados". "� importante esclarecer que os n�meros mostrados por este estudo na Science s�o conservadores", reafirma a carta. "Por exemplo, visto a aus�ncia de dados de autoriza��es de supress�o de vegeta��o para todos os Estados, o estudo considerou todos os desmatamentos que respeitam as regras da reserva legal como 'potencialmente legais'."

Sob este aspecto, a carta menciona que o estudo avalia que em Mato Grosso - um dos poucos Estados que disp�em de dados -, por exemplo, somente 3% dos im�veis possu�am de fato uma autoriza��o para desmatar, o que tornaria legal a retirada da floresta. "Ou seja, muito do desmatamento que o estudo considerou como 'potencialmente legal' na verdade tende a ser ilegal por n�o ter autoriza��o, como mostra este exemplo do Mato Grosso", dizem os pesquisadores.

Outro argumento utilizado pelos consultores do agroneg�cio e que n�o � fact�vel, conforme a carta agora publicada pelos cientistas, � o de que as propriedades qualificadas no estudo do professor Raj�o como "ilegais" poderiam estar compensando passivos florestais em suas propriedades em outras �reas, dentro do mesmo bioma. "N�o poderiam, pois, de acordo com o C�digo Florestal a compensa��o n�o pode ser usada para viabilizar novos desmatamentos em propriedades que j� tenham passivos", dizem os pesquisadores.

Ao Broadcast Agro, um dos signat�rios da carta, o pesquisador em Sustentabilidade de Cadeias Produtivas na Universidade Cat�lica de Louvain, Tiago N. P. Dos Reis, lembra ainda que o mecanismo de compensa��o ambiental s� pode ser feito em propriedades que desmataram antes do marco temporal definido pelo C�digo Florestal, de julho de 2008.

"Depois desta data o C�digo n�o permite o uso do mecanismo de compensa��o", diz. Da� o argumento dos consultores n�o ser fundamentado, opina ele, refor�ando o "conservadorismo" do estudo do professor Raj�o. "O estudo publicado na Science foi conservador porque considerou de fato ilegais apenas aqueles produtores que j� tinham passivo ambiental (antes de julho de 2008) e mesmo assim continuaram desmatando, ou seja, continuaram atuando na ilegalidade", explica Reis. "J� para aqueles que tinham ativo florestal e excedente de reserva legal e desmataram depois de julho de 2008, o estudo n�o considerou como 'ilegais', embora eles possam ter desmatado ilegalmente caso o tenham feito sem autoriza��o, o que � muito prov�vel, mas que o estudo desconsiderou."

Assim, na carta, os pesquisadores s�o enf�ticos (apesar de repetirem que os n�meros de propriedades ilegais do estudo de Raj�o serem subestimados): "Logo, as propriedades que o estudo classifica como 'ilegais' s�o indiscutivelmente ilegais, e muitos desmatamentos que o estudo considera como 'legais' s�o potencialmente ilegais. O argumento da superestimativa, portanto, est� equivocado".

A carta defende, ainda, que a cr�tica honesta ao estudo "� essencial para o progresso do conhecimento cient�fico" e que Raoni Raj�o e equipe usaram "dados p�blicos, metodologia aberta, transparente e replic�vel". "Todos os resultados do artigo est�o dispon�veis e acess�veis para avalia��o na pr�pria revista Science e no site do Centro de Sensoriamento Remoto da UFMG", dizem. "Dessa forma, � poss�vel checar as premissas e auditar os dados e c�lculos realizados."

Adicionalmente, os cientistas lembram que "as cr�ticas feitas � boa ci�ncia por parte minorit�ria do agroneg�cio, sem argumentos robustos e embasamento, representam uma tentativa de usar o conhecimento cient�fico somente quando for conveniente ou quando esses conhecimentos confirmam suas percep��es e vis�es de mundo", dizem. "No entanto, cabe esclarecer que a Ci�ncia n�o funciona assim." E acrescentam: "Confrontar achados cient�ficos com especula��es e inverdades pode parecer uma resposta f�cil, mas s� nos mant�m mais afastados das solu��es reais e necess�rias".

Por fim, sentenciam que "n�o h� trilha vi�vel" para o agroneg�cio brasileiro se n�o forem equacionados seus equ�vocos e inconsist�ncias legais, ambientais e sociais". E dizem ainda que "uma grande parte do agroneg�cio est� buscando se adequar de forma respons�vel �s demandas da sociedade por sustentabilidade. Esta parte encontrar� apoio no bom conhecimento cient�fico".

Os pesquisadores que assinam o documento s�o a professora titular da UnB em Ecologia de Ecossistemas, Mercedes Bustamante; o pesquisador em sustentabilidade de cadeias produtivas na Universidade Cat�lica de Louvain, B�lgica, Tiago N. P. Dos Reis; o pesquisador Gerd Sparovek, coordenador do Laborat�rio de Geoprocessamento e Intelig�ncia Estrat�gica e Espacial da USP e presidente da Funda��o Florestal do Estado de S�o Paulo; o professor de Sistem�tica e Ecologia da Esalq/USP, Ricardo Ribeiro Rodrigues; o pesquisador e climatologista Carlos Afonso Nobre, que teve atua��o no Inpe e no IPCC;.

A �ntegra da carta pode ser lida no link https://cienciasociedade.org/o-agronegocio-brasileiro-continua-precisando-do-conhecimento-cientifico/


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