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Estado de Minas GERAL

Retomada verde pode evitar metade do aquecimento global previsto at� 2050


29/08/2020 12:30

No auge da pandemia de covid-19, um meme das redes sociais fazia um alerta de que os tr�gicos impactos do coronav�rus s�o s� a primeira onda a nos atingir. Na ilustra��o, logo atr�s vinha uma segunda onda maior, da recess�o, e depois dela, uma maior ainda, das mudan�as clim�ticas.

N�o era uma brincadeira. Cientistas afirmam que os danos da pandemia e da crise econ�mica s�o s� uma fra��o do que se pode esperar das mudan�as clim�ticas que j� est�o em curso - essa sim considerada a m�e de todas as crises.

Mas se h� alguma boa not�cia nesse cen�rio � que as tr�s crises podem ser enfrentadas de modo interligado. Se � preciso recuperar economias, que isso seja feito de modo a tornar as sociedades mais resilientes � mudan�a do clima, defendem os especialistas, o que de quebra pode torn�-las tamb�m mais preparadas para eventuais novas pandemias.

N�o � � toa que as mudan�as clim�ticas s�o o principal motor por tr�s do movimento de retomada verde em todo mundo. O conceito prev� que os necess�rios novos investimentos sejam direcionados para setores que dialogam com as pol�ticas de combate ao aquecimento global e para empreendimentos sustent�veis com baixo impacto socioambiental.

Um estudo publicado no in�cio do m�s na revista Nature Climate Change - que analisou como a paralisa��o da economia por causa das pol�ticas de isolamento e quarentena reduziu temporariamente as emiss�es globais de gases de efeito e de poluentes -, projetou que incluir medidas de pol�ticas clim�ticas como parte da recupera��o econ�mica pode trazer resultados mais permanentes e de fato desacelerar o aquecimento do planeta.

O trabalho, liderado por pesquisadores da Universidade de Leeds, no Reino Unido, comparou um cen�rio em que a recupera��o econ�mica seja feita com base nos mesmos n�veis atuais de investimento em combust�veis f�sseis com outro em que haja fortes est�mulos verdes e redu��o de carbono.

No primeiro, calcula o grupo, o aquecimento m�dio do planeta provavelmente vai exceder 1,5�C j� em 2050, na compara��o com a temperatura pr�-Revolu��o Industrial. J� no segundo, seria poss�vel evitar um aquecimento de 0,3�C at� aquele ano. Como o planeta j� est� cerca de 1�C mais quente, os cientistas indicam que h� um potencial de reduzir pela metade o n�vel de aquecimento nos pr�ximos 30 anos.

"As escolhas feitas agora podem nos dar uma grande chance de evitar 0,3�C de aquecimento adicional at� meados do s�culo, reduzindo pela metade o aquecimento esperado com as pol�ticas atuais. Isso pode significar a diferen�a entre o sucesso e o fracasso quando se trata de evitar mudan�as clim�ticas perigosas", afirmou Piers Forster, principal autor do trabalho.

O trabalho destaca medidas como incentivo a ve�culos de baixa emiss�o, transporte p�blico e ciclovias. "A melhor qualidade do ar ter� efeitos importantes na sa�de - e come�ar� a esfriar o clima imediatamente", complementa Forster.

N�o deixar o aquecimento do planeta superar 1,5�C � um marco dos esfor�os mundiais de combater as mudan�as clim�ticas. Mas o plano � segurar esse aumento da temperatura at� o fim do s�culo. Este � o objetivo estabelecido pelo Acordo de Paris, compromisso estabelecido por quase 200 pa�ses, por ser considerado o mais seguro para evitar impactos mais dram�ticos � vida no planeta.

Reduzir emiss�es e gerar empregos

Algumas pesquisas j� mostram vantagens tamb�m para o Brasil. Um estudo publicado em meados de agosto pelo WRI Brasil e a alian�a global New Climate Economy calculou que adotar princ�pios de retomada verde em a��es de infraestrutura, inova��o industrial e no agroneg�cio podem reduzir 42% das emiss�es de gases de efeito estufa do Brasil at� 2025, na compara��o com o que era emitido em 2005. E ainda gerar 2 milh�es de empregos, al�m de acrescentar R$ 2,8 trilh�es ao PIB.

Essa redu��o de emiss�es � mais at� do que o Pa�s prometeu fazer no Acordo de Paris, que � cortar as emiss�es em 37% at� aquele ano.

Para chegar a isso, indica o estudo "Uma Nova Economia para uma Nova Era", � preciso avan�ar na implementa��o de ve�culos el�tricos ou h�bridos, ter maior efici�ncia do setor de constru��o, mais energias renov�veis e uso de materiais de baixo carbono e uma agropecu�ria de maior produtividade. Al�m de tamb�m investir em restaura��o florestal e reduzir as press�es de desmatamento ilegal.

Hoje, a devasta��o da Amaz�nia � a principal fonte no Brasil de emiss�es de gases que provocam o aquecimento global. Para reduzir sua contribui��o ao problema, o Pa�s se comprometeu, no �mbito do Acordo de Paris, a zerar o desmatamento ilegal at� 2030, al�m de adotar uma s�rie de outras medidas que possam reduzir suas emiss�es.

Um grupo de pesquisadores ligados ao Instituto ClimaInfo, ao Observat�rio do Clima e ao GT Infraestrutura elaborou uma an�lise de como algumas das metas nacionais, assim como outras a��es relacionadas com uma retomada verde inclusiva, podem ser uma resposta � crise econ�mica legada pela pandemia e � crise clim�tica.

O trabalho, que ser� lan�ado em um webinar na pr�xima quinta-feira, 3, foi passado com exclusividade ao Estad�o. O grupo calcula que medidas como restaurar 12 milh�es de hectares de florestas at� 2030 geraria 250 mil postos de trabalho.

Tamb�m s�o particularmente boas fontes de emprego as metas de aumentar a efici�ncia energ�tica e a presen�a de fonte solar na nossa matriz energ�tica. "Alcan�ar 10% de ganhos de efici�ncia energ�tica no setor el�trico at� 2030 exige um investimento anual da ordem de R$12 bilh�es at� 2030 que, por sua vez, geram 408 mil empregos nos pr�ximos dez anos", aponta o grupo em relat�rio que ser� divulgado junto com o webinar.

Ainda em energia, eles citam um c�lculo da Absolar, que representa o setor de fonte fotovoltaica no Brasil. A entidade calcula que a cada megawatt de energia solar instalada no Brasil s�o gerados 30 empregos, contra 2,6 empregos de grandes hidrel�tricas, como Belo Monte, e menos de 1 emprego em termel�tricas a g�s. Empregos verdes tamb�m tendem a ser mais bem remunerados.

Outra possibilidade nesse setor, defende o grupo, � instalar placas solares em resid�ncias. Al�m de ser uma fonte mais limpa, o trabalho calcula que investir R$ 1,05 milh�o no per�odo de tr�s meses em energia solar distribu�da permite instalar sistemas fotovoltaicos completos em mais de 260 mil resid�ncias de baixa renda, criando 6.300 empregos no curto prazo.

"Priorizar investimentos em alguns setores-chave gera empregos, crescimento econ�mico e melhora da qualidade de vida da popula��o, al�m de reduzir as emiss�es dos gases respons�veis pela crise clim�tica", escrevem os autores. Eles buscaram identificar a��es que podem come�ar a ser implementadas j� no curto prazo. E que impactem a maioria.

A proposta, explica o f�sico Shigueo Watanabe Jr., pesquisador do ClimaInfo, � que os recursos p�blicos que j� est�o sendo liberados para recuperar a economia e empregos n�o sejam direcionados apenas para algumas empresas e setores. "Em vez de dar dinheiro para salvar atividades econ�micas que nos trouxeram � atual situa��o, a ideia � poder salvar as pessoas e ainda ter benef�cio clim�tico", afirma o coordenador do trabalho.

O documento cita, como exemplo, o setor de res�duos: "Menos da metade do que � gasto atualmente com a coleta de res�duos s�lidos, algo entre um ou dois bilh�es de reais, seriam suficientes para organizar meio milh�o de catadores a mais em cooperativas. Os novos catadores representam cerca de 7% do n�mero de desempregados no pa�s e significam maior movimenta��o na economia local".

Considerando mais uma vez a interface com a crise sanit�ria da pandemia de covid-19, o trabalho tamb�m recomenda investimentos em saneamento. Um dos fatores crueis que mais contribuiu para a dissemina��o da covid em popula��es de baixa renda foi a impossibilidade de elas fazerem a higieniza��o adequada para barrar o coronav�rus.

Os pesquisadores lembram as metas do Plano Nacional de Saneamento B�sico (Plansab), que prev� investimentos da ordem de R$ 30 bilh�es por ano. "Como cada bilh�o investido em saneamento gera 10 mil empregos apenas em obras, cumprir a meta do Plansab gera 300 mil empregos ainda este ano", escrevem.

Impactos atuais e futuros

O tamanho do impacto clim�tico est� diretamente relacionado ao quanto vamos deixar o planeta aquecer ao longo dos pr�ximos. Um relat�rio do Painel Intergovernamental sobre Mudan�as Clim�ticas (IPCC) publicado h� dois anos apontou que 0,5�C a mais j� pode fazer uma grande diferen�a.

Se o planeta aquecer 1,5�C at� o fim do s�culo, os impactos j� existem, mas ainda s�o relativamente manej�veis. Se o aumento for de 2�C, a situa��o j� fica mais dram�tica.

Recuperar a economia p�s-pandemia � a oportunidade para deixar a sociedade mais resiliente, tanto para ser capaz de combater as mudan�as clim�ticas quanto para lidar com o que seja inevit�vel delas.

Isso porque ela pode atingir praticamente todos os aspectos da nossa vida e os v�rios setores da economia. Um clima mais quente, por exemplo, pode levar a secas e enchentes mais extremas, que podem afetar a produ��o de energia e a agricultura, a seguran�a h�drica e a alimentar.

S�o esperadas grandes migra��es humanas a partir de locais que v�o se tornar inadequadas para a vida. Doen�as transmitidas por mosquitos podem mudar sua �rea de distribui��o e o pr�prio aumento da temperatura pode levar a mortes em situa��es de ondas de calor.

Um estudo recente de economistas norte-americanos estimou que se n�o forem adotadas medidas para conter as emiss�es de gases que aquecem o planeta, as taxas globais de mortalidade por causa do calor poder�o chegar a 73 mortes por cada 100 mil pessoas at� 2100. O n�mero supera o total anual de mortes causadas por todas as doen�as infecciosas no mundo, incluindo tuberculose, HIV/Aids, mal�ria, dengue e febre amarela.

Com o aquecimento que temos hoje, diversos efeitos j� s�o sentidos em todo o mundo, como o aumento da ocorr�ncia de eventos extremos. Um trabalho divulgado recentemente pelo climatologista Jos� Marengo, coordenador-geral de Pesquisa e Desenvolvimento do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), revelou que chuvas intensas concentradas em poucos dias, separadas por longos per�odos de seca est�o sendo cada vez mais frequentes na Regi�o Metropolitana de S�o Paulo.

Analisando ocorr�ncias dos �ltimos 60 anos, Marengo e equipe observaram que situa��es que levam a deslizamentos, inunda��es repentinas ou secas v�m aumentando, assim como os seus impactos socioecon�mico e ambientais.

Na semana passada, a Nasa divulgou que o derretimento da Groenl�ndia atingiu n�veis recordes em 2019. Foram 532 bilh�es de toneladas de massa perdidas, o maior volume desde 1948, quando come�aram os registros. "Isso � �gua suficiente para elevar o n�vel m�dio do mar em 1,5 mm, o que � como cobrir toda a Calif�rnia em mais de 1,2 m de �gua", afirmou a ag�ncia espacial norte-americana.

"Os mais vulner�veis s�o sempre os que est�o perdendo, os primeiros a morrer. Na covid, vimos esse n�mero de mortos, que � um horror. Mas quem trabalha com clima sabe que com as mudan�as clim�ticas o n�mero de mortes vai ser muito maior, infelizmente", resumiu Ana Toni, diretora executiva do Instituto Clima e Sociedade, em live realizada no Estad�o na �ltima segunda-feira.

"Vai ser com muito mais dor e quem vai estar na frente dessas mortes novamente s�o os negros, os que moram em periferia, os que est�o mais vulner�veis em termos de pobreza. Ent�o tanto a pol�tica de seguran�a p�blica, a de sa�de, e a de clima, mostram que o tema da desigualdade � absolutamente fundamental. Promover resili�ncia, a adapta��o nas cidades vai ser fundamental para a agenda clim�tica brasileira", alerta a economista e cientista pol�tica. As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.


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