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Estado de Minas ENTREVISTA JOS� VICENTE

Magazine Luiza: 'Racismo reverso � falso', diz reitor da Universidade Zumbi dos Palmares

Professor elogia iniciativa de rede varejista e sentencia: discrimina��o por cor da pele no mercado de trabalho tem 'propor��es hom�ricas'


28/09/2020 08:01

(foto: Rovena Rosa/Agência Brasil)
(foto: Rovena Rosa/Ag�ncia Brasil)
Ao anunciar que estavam abrindo vagas exclusivamente para estagi�rios negros, no dia 18 passado, os executivos do Magazine Luiza jamais imaginariam ser acusados de um estapaf�rdio “racismo reverso”— ou seja, “discrimina��o” de jovens brancos. E que, inacreditavelmente, a empresa enfrentaria na Justi�a pessoas que acreditam que tal a��o afirmativa � discriminat�ria — 11 processos com esse argumento foram impetrados junto ao Tribunal Superior do Trabalho, que os arquivou alegando, entre outras coisas, que a iniciativa da rede varejista tem respaldo da Constitui��o e no Estatuto da Igualdade Racial.

Esse epis�dio, para o reitor da Universidade Zumbi dos Palmares, Jos� Vicente, escancara o racismo no mercado profissional. De acordo com a consultoria Talenses, no Brasil, somente 5% dos presidentes de 532 grandes empresas brasileiras s�o negros e apenas 2% ocupam postos em conselhos de administra��o. “Descobriu-se (com o epis�dio do Magazine Luiza) que o racismo estrutural no mercado de trabalho tem propor��es hom�ricas. Apesar da pol�mica, percebemos que � f�cil fazer a mudan�a: se n�o tem negros nos cargos executivos e de ger�ncia no pa�s, � s� prepar�-los; basta criar oportunidades”, sentencia Vicente, acrescentando que “esse discurso de racismo reverso sempre foi falso”. A seguir, os principais trechos da entrevista ao Correio Braziliense.

O fato de o Magazine Luiza abrir um programa exclusivamente para estagi�rios negros trouxe para a superf�cie o racismo que boa parte dos brasileiros negam que exista. Para piorar, houve quem impetrasse a��es judiciais –– todas arquivadas –– alegando discrimina��o aos candidatos brancos. Isso mostra que o Brasil est� indo na contram�o de alguns marcos evolutivos?

Diria que o caso Magazine Luiza nos proporcionou um salto civilizat�rio no tema da discrimina��o e da exclus�o de negros em ambientes corporativos, e nos demais ambientes em nosso pa�s. Porque, primeiro, o Brasil se debru�ou para discutir uma quest�o que era sempre discutida de forma lateral — e veio para o centro da mesa.

Descobriu-se, ent�o, que o racismo estrutural no mercado de trabalho tem propor��es hom�ricas. Todo ambiente corporativo e empresarial deve olhar para si mesmo e refinar o discurso. Apesar da pol�mica, percebemos que � f�cil fazer a mudan�a: se n�o tem negros nos cargos executivos e de ger�ncia, � s� prepar�-los; basta criar oportunidades.

Mas, a parte mais sens�vel que precisava ser superada era o questionamento da legalidade, da constitucionalidade de uma a��o dessa natureza. E vimos que tanto o Minist�rio P�blico quanto a Justi�a do Trabalho assinaram embaixo. Ou seja: � legal, � constitucional e � oportuno. De modo que foi provado que a medida era necess�ria, constitucional e adequada. Esse caso construiu um paradigma no pa�s e vai obrigar todos a seguirem pela mesma r�gua.

As a��es judiciais questionavam um certo “racismo reverso” da empresa, al�m de um suposto oportunismo. Ou seja, seria um vi�s meramente argent�rio, mas com tintas de repara��o social. O que o senhor diz sobre isso?

Esse conceito de racismo reverso sempre foi falso. Al�m de ser antigu�ssimo, foi superado e sacramentado pelo que tem sido as discuss�es te�ricas, doutrin�rias e as discuss�es sociais. N�o existe “racismo reverso”; o que existe � o racismo, que tem como v�tima o negro. E, por conta disso, � mais do que leg�timo e necess�rio que se fa�am as corre��es do que esse racismo significou.

Porque, caso contr�rio, seria o caso de questionar: se o racismo contra os negros vale, n�o vale o reverso? Sobre a possibilidade de ser oportunismo da empresa, n�o � o caso. Particularmente, acredito que n�o, pelo perfil da empresa. Primeiro, que a Luiza Trajano e a sua empresa demonstram uma postura s�ria, com clareza nas suas quest�es e nos encaminhamentos. N�o tenho d�vida de que se trata de uma disposi��o e de uma vontade sincera e honesta.

Mas, qualquer empres�rio mede o risco das suas a��es. Se fosse apenas marketing, poderia haver um estrago terr�vel, a ponto de jogar a opini�o p�blica contra o Magazine. E n�o foram poucas as empresas que lan�aram projetos de inclus�o parecidos nos �ltimos dias, como tamb�m n�o s�o poucas as que, mesmo antes desse projeto do Magalu, t�m praticado diversas a��es afirmativas de inclus�o do negro no ambiente corporativo.

Trata-se de uma mudan�a de postura de empresas ligadas � Iniciativa Empresarial pela Igualdade Racial e de empresas como o Magazine Luiza, que compreenderam que chegamos no fundo do po�o. Damos um passo civilizat�rio acerca desse tema ou vamos produzir um retrocesso de profundidade terr�vel, que talvez nem permita um caminho de volta.

Fala-se muito que, em outros pa�ses, o racismo � vis�vel e que, no Brasil, escondemos a discrimina��o. Esse epis�dio n�o desmente isso, ou seja nosso racismo � t�o escancarado quanto o dos Estados Unidos ou da �frica do Sul?

O nosso racismo n�o deixa de ser menos violento e menos agressivo do que os outros, sobretudo o americano. Somos 54% e estamos brigando pelo compartilhamento das verbas do processo eleitoral para que consigamos eleger os primeiros deputados negros na propor��o do que somos no pa�s.

Ainda estamos brigando para conseguir um presidente negro nas cinco mil maiores empresas do Brasil. As nossas cinco maiores empresas n�o t�m um vice-presidente ou presidente negro, isso em um pa�s miscigenado como o nosso. Nossa democracia racial � mais danosa do que o racismo americano e do que tantas outras xenofobias que existem pelo mundo. O fato � que, para tratar dessa viol�ncia, o pa�s nunca se debru�ou com profundidade para combat�-la.

E quanto ao estere�tipo de que o negro s� est� gabaritado para falar sobre negritude, africanidade e quest�es afins, quando, na verdade, est� apto para abordar qualquer assunto. Como resolver isso?

Com mudan�a de mentalidade e com uma a��o intensa dos �rg�os que possuem a obriga��o legal de fazer a fiscaliza��o da implementa��o da lei. A solu��o �, sobretudo, com a puni��o daqueles que fraudam e transgridem a legisla��o. Por exemplo: aprovaram uma legisla��o de combate ao racismo estrutural na sua g�nese, ao determinar que, na educa��o privada e p�blica, desde os anos iniciais, tenha-se pelo menos 20% da grade curricular falando da hist�ria do negro e da hist�ria da �frica.

Ou seja, uma forma de combater as intoler�ncias, promover empatia e mostrar as constru��es e realiza��es importantes dos negros brasileiros e africanos. No entanto, passados 15 anos, at� hoje, essa lei n�o � cumprida. Avan�amos em alguns aspectos, e isso precisa ser celebrado, mas temos, tamb�m, outros lugares em que o tema do racismo n�o conseguiu andar, consolidar-se, nem cumprir seus objetivos.

*Estagi�rio sob a supervis�o de Fabio Grecchi


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