A batalha judicial que vem sendo apresentada ap�s o Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) aprovar a extin��o de regras de prote��o ambiental pode se prolongar ainda mais. Um dia ap�s o �rg�o revogar resolu��es pr�prias, a Justi�a Federal do Rio de Janeiro suspendeu provisoriamente a decis�o. Em seguida, nesta sexta-feira, 2, o Tribunal Regional Federal da 2� Regi�o restabeleceu a validade das aprova��es iniciais.
Essa discuss�o est� relacionada � din�mica de atua��o do Conama, o �rg�o atua para regulamentar leis j� editadas pelo poder legislativo. As normas, que s�o efetivadas pelo poder executivo, servem para dar diretrizes e detalhar como a lei deve ser tratada e aplicada.
S�o duas as principais resolu��es em debate: a 302, que fala sobre preserva��o de �reas, numa faixa m�nima de 30 metros, ao redor de reservat�rios de �gua e pro�be a explora��o desse espa�o para qualquer uso econ�mico ou habitacional; e a 303, que dita instrumentos para proteger os manguezais e faixas de restinga do litoral brasileiro, passando a consider�-los �reas de preserva��o permanente. Especialistas ouvidos pelo Estad�o avaliam o caso do ponto de vista jur�dico e ambiental.
Yara Schaeffer Novelli, professora s�nior do Instituto Oceanogr�fico da USP, considera prejudicial retirar as regras de prote��o ambiental e que o C�digo Florestal de 2012 ainda mant�m as restingas desprotegidas. Ela colaborou com a c�mara t�cnica jur�dica na elabora��o das normas 302 e 303, criadas em 2002, e diz que em 2017 j� houve uma tentativa de revog�-las. "Tentaram pela primeira vez porque elas delimitam e resguardam muito bem as �reas."
Diante do pedido de revoga��o � �poca, a pesquisadora elaborou um parecer t�cnico para embasar a import�ncia da norma relacionada aos manguezais e restinga, que seria levado para discuss�o junto com o parecer jur�dico. "Na �poca, desistiram da revoga��o porque o pr�prio parecer do minist�rio (do Meio Ambiente) chegou � conclus�o que era melhor tirar a proposta de revoga��o diante do parecer t�cnico de que era importante manter a norma", lembra. Assim, o pedido nem chegou a ir a plen�rio.
Na discuss�o atual sobre revoga��o, Yara aponta para a aus�ncia de parecer t�cnico que respalde a decis�o de revogar as normas do Conama. "� um processo que foi gestado e, de repente, se marca uma reuni�o extraordin�ria em que se est� julgando com um �nico parecer. N�o teve c�mara t�cnica dessa vez. O ministro (Ricardo) Salles levou apenas um parecer da consultoria jur�dica, n�o t�cnica", diz. Ela afirma que Minist�rio do Meio Ambiente "est� ignorando a necessidade de parecer t�cnico, que faz parte do jogo para dar oportunidade para todos se manifestarem".
A professora pondera que os manguezais at� t�m respaldo no C�digo Florestal, mas com "deforma��es graves porque isolaram uma das fei��es do ecossistema". As restingas, por�m, continuam desprotegidas, segundo ela. "N�o reconheceram o que est� na resolu��o 303, de necessidade dos limites. Se voc� tirar essa resolu��o do Conama, vai ficar totalmente desprotegida, a merc� das imobili�rias e constru��o de casas com p� na areia, vai desproteger a linha de costa diante do aumento do n�vel do mar, que vai subir, erodir as praias e chegar nas restingas", explica.
"As restingas s�o uma prote��o natural que temos, gratuita, e ao desrespeitar a necessidade delas e dos manguezais, estamos tirando a defesa natural da nossa linha de costa. Desrespeit�-las, desproteg�-las, descaracteriz�-las, tirando a legisla��o que garante essa prote��o, � tudo o que a �boiada� quer", completa Yara.
Inseguran�a jur�dica
A advogada Rebeca Stefanini, da �rea de Direito Ambiental do Cescon Barrieu, explica que as resolu��es que o Conama quer revogar foram editadas na vig�ncia do C�digo Florestal de 1965, que determinava as regras, dizia o que precisava ser protegido, mas n�o apresentava pormenores, como a metragem de �reas e requisitos t�cnicos. "No �mbito dessa lei de 1965, o Conama foi l� e editou as normas 302 e 303, que vieram regulamentar metragem para as APPs (�reas de prote��o permanente). Na �poca, e mesmo anteriormente, j� tinha muita discuss�o da validade dessas resolu��es porque inovava no ordenamento jur�dico, tinha bastante discuss�o sobre n�o poder criar obriga��es", diz Rebeca.
Quando o novo C�digo Florestal entrou em vigor, em 2012, ele anulou o anterior, o que teoricamente fez com que as normas do Conama se tornassem inv�lidas. "Do ponto de vista jur�dico, essas resolu��es n�o tinham validade porque n�o guardavam rela��o com o (novo) c�digo", explica a advogada.
Apesar disso, as resolu��es permaneceram at� agora e continuam sendo usadas em tratativas ambientais. Mas o fato de elas existirem juntamente com o C�digo Florestal de 2012 causa inseguran�a jur�dica, segundo Rebeca. "Cada tribunal do Pa�s aplica de um jeito. Tem tribunal que aplica regras do Conama porque n�o gosta do C�digo Florestal ou entende que ele tem prote��o menor, e tem tribunal que aplica o c�digo. Mesmo os �rg�os ambientais, que aplicam o C�digo Florestal, mas com receio de sofrer repres�lia do Minist�rio P�blico."
"O STF j� se posicionou sobre v�rios dispositivos do C�digo Florestal. Ainda assim, mesmo com emiss�o do Supremo, com decis�o de que todos deveriam cumpri-lo, tem decis�es descumprindo o que foi decidido l�. N�o sou t�o otimista, n�o sei se vai conseguir ter defini��o disso", afirma a advogada. Para ela, s�o muitas resolu��es conflitantes que resultam em pareceres diferentes. Dessa forma, Rebeca afirma que, no entendimento jur�dico, se o C�digo Florestal for aplicado, a revoga��o das resolu��es do Conama deve ser mantida. "Foi importante a revoga��o porque acaba com as discuss�es."
No caso dos que argumentam que o C�digo Florestal � insuficiente por deixar �reas desprotegidas, a advogada explica que o recomendado � levar o caso ao legislativo. "O foro adequado n�o � Conama, n�o � judici�rio. Quem � contra e tem conhecimento t�cnico para conseguir defender que a lei de 2012 � inadequada tem de juntar embasamento t�cnico e levar ao legislativo."
Mobiliza��o contra a revoga��o
Ap�s as decis�es anunciadas pelo Conama no come�o da semana, parlamentares e a sociedade civil organizada manifestaram-se contra a revoga��o das normas. Parlamentares do Senado e da C�mara foram ao Supremo para pedir que seja declarada a inconstitucionalidade da nova resolu��o ou que ela seja suspensa a fim de que os temas sejam analisados.
Depois dessa mobiliza��o, a ministra Rosa Weber, do STF, solicitou que o ministro Ricardo Salles preste informa��es em at� 48 horas sobre a revoga��o das regras de prote��o ambiental.
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