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Estado de Minas REF�GIO

A corrida para salvar 'Benta', filhote de queixada v�tima dos inc�ndios no Pantanal

Ambientalistas descrevem � BBC News Brasil cen�rio de completa destrui��o de bioma; mais de 25% da maior plan�cie alag�vel do mundo j� foram consumidos pelo fogo, mostram imagens de sat�lite


30/10/2020 16:11 - atualizado 30/10/2020 17:07

Diretor do Instituto Vida Livre, Roched Seba cuida de Benta, filho de queixada resgatada dos incêndios no Pantanal(foto: Roched Seba)
Diretor do Instituto Vida Livre, Roched Seba cuida de Benta, filho de queixada resgatada dos inc�ndios no Pantanal (foto: Roched Seba)

Sob o sol matogrossense, um grupo de queixadas agoniza nas imedia��es de um lama�al, um dos poucos ref�gios para o calor escaldante que emana de uma terra arrasada por numerosos e devastadores inc�ndios.

Ali, entre animais mortos e feridos, muitos dos quais apresentando queimaduras pelo fogo e ossos expostos, est� uma filhote desse porco selvagem. Ela tem apenas alguns meses de vida e permanece ao lado de sua m�e, � beira da grande po�a, observando outros membros do bando definhar na lama.

 

 

 

� como se estivessem aguardando pela pr�pria morte. Uma morte lenta, pois n�o h� �gua nem comida. O tempo est� seco. N�o h� nenhum sinal de chuvas. E � dif�cil respirar: o cheiro de carne podre se mistura com a fuligem da vegeta��o queimada. Pode-se ouvir o barulho das moscas que se alimentam dos cad�veres dos animais.

A floresta desapareceu. S� restam cinzas.

A cena acima foi observada por ambientalistas que estiveram no Pantanal no in�cio de outubro e descrita � BBC News Brasil em conversa por telefone, antes da chegada das chuvas que deram tr�gua parcial � maior trag�dia experimentada por esse bioma em sua hist�ria.


Incêndios provocaram a morte de todos os animais do bando de queixadas(foto: Mariana Machado)
Inc�ndios provocaram a morte de todos os animais do bando de queixadas (foto: Mariana Machado)

Mais de 25% da maior plan�cie alag�vel do mundo j� foram consumidos pelo fogo, segundo mostram imagens de sat�lite, uma �rea um pouco menor que a do Estado do Rio de Janeiro.

Os inc�ndios, de acordo com especialistas, s�o resultado da pior seca a atingir a regi�o e da a��o do homem com queimadas ilegais.

"Ela (filhote de queixada) estava ao lado da m�e, j� sem os cascos (cobertura que protege os dedos). Os queixadas s�o animais sociais, por isso, n�o abandonam os outros membros do grupo, mesmo que mortos. Ficam, assim, expostos ali, sem �gua e comida, definhando", diz Roched Seba, diretor do Instituto Vida Livre, ONG sediada no Rio de Janeiro que trabalha na reabilita��o e soltura de animais em situa��o de risco.

Seba fez parte de um mutir�o de veterin�rios e volunt�rios que viajou ao Pantanal para salvar animais do fogo a partir da campanha "Pantanal em chamas", lan�ada pela ONG Ampara Animal e a Ampara Silvestre.


Benta sendo resgatada dos incêndios(foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)
Benta sendo resgatada dos inc�ndios (foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)

"Provavelmente, no af� de fugir do fogo e tentar se refrescar, esses animais entraram no lama�al durante � noite e n�o conseguiram sair dali porque n�o tinham mais for�as. Pela manh�, a lama seca, vira um caldeir�o e eles ficam presos. Como muitos est�o cansados e mutilados pelo fogo, com feridas infeccionadas e ossos expostos, acabam morrendo", acrescenta ele, ressalvando que faz parte do comportamento dessa esp�cie entrar na lama.

"Numa situa��o normal, al�m de amenizar o calor, isso garante um repelente natural contra insetos, por exemplo".

Seba conta que, quando viu a filhote de queixada, percebeu que ela talvez teria maior chance de sobreviv�ncia em meio ao grupo.

"Ela estava com a m�e na beira do lama�al e tentou correr da gente. A m�e n�o conseguiu correr. Joguei uma rede em cima dela (filhote) e a segurei em meus bra�os, pois ela, por ser filhote, n�o podia ser anestesiada. Tamb�m resgatamos outros cinco animais, que acabaram n�o resistindo", conta.

Quando, duas horas depois, o grupo voltou para salvar a m�e, ela j� estava morta.

"Foi um momento horr�vel, pois n�o t�nhamos bra�os para levar a m�e".


Mariana Machado (à esq.) e Roched Seba (à dir.) tratam de Benta(foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)
Mariana Machado (� esq.) e Roched Seba (� dir.) tratam de Benta (foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)

Tratamento

Na base instalada no munic�pio de Bar�o de Melga�o, a beb� queixada foi cuidada pela bi�loga e veterin�ria Mariana Machado, de S�o Jos� dos Campos, no interior de S�o Paulo. Machado � especialista na reabilita��o de animais silvestres e, como Seba, tamb�m se voluntariou para salvar animais do fogo no Pantanal.

"Realizamos o primeiro suporte para restabelecer a hidrata��o e a nutri��o do animal. Logo, verificamos les�es nas quatro patas. Em todas elas, j� tinha perdido uma das unhas, e o dedo que fica debaixo dessas unhas estava queimado", descreve Machado.

"No primeiro momento, trabalhamos com v�rias terapias, entre elas a ozonioterapia, utilizada para acelerar o processo de cicatriza��o dessas les�es. E tamb�m como estimulante do sistema imunol�gico", acrescenta.

Segundo Machado, a cada "tr�s ou quatro dias", "faz�amos a seda��o para que pud�ssemos trocar o curativo. Nesse momento, us�vamos a ozonioterapia. Combinei diferentes terapias para otimizar o tratamento, pois n�o se trata de uma paciente que podemos pegar facilmente, uma vez que manipula��es exacerbadas geram preju�zos para a sa�de do animal".

"Em pouco tempo", diz a veterin�ria, "vimos uma melhora significativa, com o in�cio do crescimento do novo casco que ela tinha perdido. Esse processo de forma��o do casco poderia levar at� 60 dias se n�o tiv�ssemos aplicado o tratamento".

Machado diz que, em paralelo ao tratamento, a equipe voltou ao local do resgate v�rias vezes para acompanhar o movimento do bando.

"H� vest�gios de que os sobreviventes do bando sa�ram do local. Nossa busca hoje � tentar encontrar o bando para tentar junt�-la a ele. Dos que ficaram no local, nenhum sobreviveu".


Curativos eram trocados de três a quatro dias, diz veterinária Mariana Machado (à esq.)(foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)
Curativos eram trocados de tr�s a quatro dias, diz veterin�ria Mariana Machado (� esq.) (foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)

A veterin�ria lembra que v�rios desses animais tiveram que ser eutanasiados (morte assistida) no momento do resgate "para cessar seu sofrimento, pois n�o tinham nenhuma condi��o de recupera��o".

"As les�es eram incompat�veis com qualquer qualidade de vida."

"Isso gera uma carga emocional na equipe, mas temos que manter o equil�brio para conseguir finalizar o procedimento", acrescenta.

Machado, que permaneceu no Pantanal durante quase um m�s, diz ter tratado de 25 animais "n�o s� resgatados a campo, mas v�timas secund�rias, de ca�a e tr�fico". Ela continua fazendo o acompanhamento desses bichos, agora via internet, com a equipe que permaneceu na base de Mato Grosso.

"H� poucos profissionais no Brasil especializados no atendimento a animais selvagens. Decidi me voluntariar para evitar que mais vidas fossem perdidas. Quanto mais profissionais especializados estivessem no local, maior a chance de recuperar os animais", diz.


Benta foi única do grupo a sobreviver(foto: Mariana Machado)
Benta foi �nica do grupo a sobreviver (foto: Mariana Machado)

"O que mais me doeu foram duas situa��es em que estive em campo. Resgatamos 23 peixes da esp�cie cascudo. Eles estavam na lama, quase sem �gua. Conseguimos remov�-los e transport�-los para um outro rio. E num local pr�ximo a esse, vi diversos jacar�s adultos definhando tamb�m na lama, sem �gua nenhuma. Nesse momento, meu emocional caiu. Chorei, respirei fundo e continuei a fazer o que precisava fazer."

Agora, quase um m�s depois do resgate da filhote de queixada, Machado diz que ela deve ser solta "nos pr�ximos dias".

"Ela j� apresenta um comportamento muito pr�ximo do natural. Est� sem curativos e j� tem previs�o de retorno nos pr�ximos dias. A recupera��o dela surpreendeu nossa equipe", comemora.


Benta será solta nos próximos dias(foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)
Benta ser� solta nos pr�ximos dias (foto: Roched Seba/Instituto Vida Livre)

Seba, do Instituto Vida Livre, a batizou de Benta, "bendita ela no meio daquela desgra�a toda".

Um fio de esperan�a em meio � trag�dia que devastou o Pantanal.


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