�nica mulher a integrar o Superior Tribunal Militar (STM), a ministra Maria Elizabeth Rocha afirmou ao Estad�o que a influenciadora digital Mariana Ferrer foi v�tima de ass�dio moral e teve seus direitos violados em julgamento do caso em que acusa o empres�rio Andr� Aranha de estupr�-la. "O processo de Mariana Ferrer estarrece!", disse a magistrada.
Maria Elizabeth � a primeira mulher de tribunais superiores a comentar o epis�dio e avaliou como equivocada a atua��o do juiz e do promotor. A reportagem procurou tamb�m as duas ministras do Supremo Tribunal Federal (STF) e as seis do Superior Tribunal de Justi�a (STJ), mas elas n�o comentaram at� a noite desta sexta, 6. Rosa Weber e C�rmen L�cia, do STF, nem sequer responderam ao contato da reportagem.
Maria Elizabeth disse ter lido a senten�a e a den�ncia. Ela tamb�m assistiu ao v�deo da audi�ncia em que a jovem � humilhada pelo advogado Claudio Gast�o Filho, que representa o r�u. Nas imagens, divulgadas pelo site The Intercept Brasil, o defensor diz a ela: "Jamais teria uma filha do teu n�vel e tamb�m pe�o a Deus que meu filho n�o encontre uma mulher que nem voc�". A �ntegra do v�deo mostra que ele foi r�spido com Mariana em outras ocasi�es al�m das j� divulgadas. O advogado a chama de "mentirosa" e diz que vai prosseguir sua fala "antes que comece a choradeira".
"(S�o) Cenas dolorosas de assistir, que mesmo editadas, demonstraram equivocada condu��o do magistrado que n�o interveio com a presteza devida e uma flagrante viola��o aos direitos fundamentais de quem buscava prote��o junto ao Poder Judici�rio", disse a ministra.
Na sess�o, o advogado ainda exibiu fotos sensuais feitas pela jovem antes do epis�dio, sem rela��o com o suposto crime. Apesar das intimida��es, o juiz Rudson Marcos n�o intercede. "Excelent�ssimo, estou implorando por respeito, nem acusados s�o tratados do jeito que estou sendo tratada, pelo amor de Deus, gente. O que � isso?", disse ela ao juiz. Aranha foi inocentado por Marcos, que entendeu n�o haver provas suficientes.
"Causa espanto, tamb�m, a postura do Minist�rio P�blico que, refor�ando regras comportamentais sexistas, em alega��es finais pediu a absolvi��o do r�u, desconsiderando os relatos da v�tima, de sua m�e, do porteiro e do motorista do Uber; desconsiderando, inclusive, o laudo que atestou o rompimento do h�men com o material gen�tico do estuprador.", avaliou a ministra do STM.
O advogado, para ela, desestabilizou Mariana de modo covarde valendo-se do sigilo do caso. "Aproveitou-se da surdina, para despi-la de sua humanidade, a servi�o n�o da Justi�a, mas do modelo patriarcal, androc�ntrico e mis�gino que trata as mulheres como coisas que podem ser violadas f�sica, psicol�gica, moral, patrimonial e sexualmente. N�o anteviu o 'defensor' o vazamento da sua crueldade e a indigna��o que ela causaria, inclusive entre seus pares."
As condutas do juiz Marcos, da 3� Vara Criminal de Florian�polis, e do promotor do caso, Thiago Carri�o, do MP de Santa Catarina, ser�o alvos de investiga��o nos conselhos nacionais de Justi�a (CNJ) e do Minist�rio P�blico (CNMP).
Opress�o
Maria Elizabeth disse ainda que o caso refor�a a cultura do estupro. "Fica o gosto amargo de ver mulheres vitimizadas que ousaram n�o se calar virarem r�s nos tribunais que descriminalizam condutas criminosas para silenci�-las na desonra. E a cultura do estupro velado e devastador se perpetua, revelando o car�ter opressivo de pap�is sociais que objetificam e subjugam humanos, impedindo-os/as de viver uma vida digna e livre de viol�ncias."
Das ministras de tribunais superiores, Maria Thereza de Assis Moura, do STJ, disse que n�o se manifestar�, pois o caso est� em segredo de justi�a. A ministra Assusete Magalh�es preferiu deixar manifesta��es sobre o caso para os conselhos competentes. As ministras Laurita Vaz e Isabel Gallotti informaram que n�o se pronunciar�o.
O advogado Gast�o Filho disse ao Estad�o esta semana que atuou "nos limites profissionais e legais" e, para ele, os trechos da audi�ncia "distorcem o contexto". Sobre o uso de fotos de Mariana como modelo e ter falado em "posi��es ginecol�gicas", disse que "din�micas entre acusa��o e defesa abrangem aspectos relacionados a h�bitos, perfis, relacionamentos e posturas dos envolvidos".
'Limites de atua��o das partes'
Por prerrogativa da fun��o, advogados s�o imunes �s den�ncias por inj�ria e difama��o nas manifesta��es feitas em ju�zo. No entanto, ap�s audi�ncia do caso da influenciadora digital Mariana Ferrer, que foi atacada pelo advogado Claudio Gast�o da Rosa Filho no processo que inocentou o empres�rio Andr� Aranha Camargo da den�ncia por estupro, �rg�os de controle e a pr�pria Ordem dos Advogados voltam a discutir o assunto.
Um desses movimentos vem do pr�prio Minist�rio P�blico de Santa Catarina, que enviou ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e ao Congresso sugest�es de altera��o do C�digo de Processo Penal e do C�digo Penal, que aumentam a prote��o � dignidade da v�tima de crimes sexuais e pro�bem perguntas e utiliza��o de refer�ncias � experi�ncia sexual anterior da v�tima, seu modo de ser, falar, vestir ou relacionar-se com outras pessoas.
No pedido, o procurador-geral de Justi�a de Santa Catarina, Fernando Comin, aponta que iniciativas semelhantes j� foram adotadas em pa�ses como Estados Unidos, Austr�lia, Canad� e Nova Zel�ndia. Elas apresentam "dispositivos que vedam �s partes refer�ncias sobre a vida sexual pret�rita de v�timas e pro�bem o uso de evid�ncias para defini-la como tipo mais ou menos suscet�vel". Para Comin, o caso de Mariana Ferrer "levantou, uma vez mais, a necessidade de discuss�o sobre os limites de atua��o das partes no processo penal".
A proposta, no entanto, enfrenta resist�ncia da Ordem dos Advogados do Brasil de Santa Catarina, cujo presidente, Rafael Horn, alega que "a legisla��o atual j� impede que o ato processual seja utilizado para revitimizar o direito da v�tima".
"N�o fomos consultados a respeito, agora a nossa proposta � muito mais eficiente, grava��o de todos os atos processuais para permitir o registro de todas as den�ncias de viola��o de prerrogativa e de direito", explicou Horn ao Estad�o.
Segundo ele, a den�ncia contra a conduta do advogado Gast�o j� foi oficiada �s autoridades e ele passar� pelo comit� de �tica da Ordem. "Pelo excesso, ele pode ser responsabilizado eticamente. A imunidade n�o � salvo-conduto para advogado fazer o que bem entende".
As informa��es s�o do jornal O Estado de S. Paulo.
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